3º PÁSCOA-A

3º DOMINGO DA PÁSCOA-ano A

23/04/2023

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


Primeira Leitura: Atos 2,14.22-33

Salmo Responsorial: 15(16)-R-Vós me ensinais vosso caminho para a vida; junto de vós felicidade sem limites!

Segunda leitura: 1 Pedro 1,17-21

Evangelho: Lucas 24,13-35

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas: Naquele mesmo dia, o primeiro da semana, dois dos discípulos de Jesus iam para um povoado, chamado Emaús, distante onze quilômetros de Jerusalém. 14Conversavam sobre todas as coisas que tinham acontecido. 15Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles. 16Os discípulos, porém, estavam como que cegos, e não o reconheceram. 17Então Jesus perguntou: 'O que ides conversando pelo caminho?' Eles pararam, com o rosto triste,18e um deles, chamado Cléofas, lhe disse: 'Tu és o único peregrino em Jerusalém que não sabe o que lá aconteceu nestes últimos dias?' 19Ele perguntou: 'O que foi?' Os discípulos responderam: 'O que aconteceu com Jesus, o Nazareno, que foi um profeta poderoso em obras e palavras, diante de Deus e diante de todo o povo. 20Nossos sumos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para ser condenado à morte e o crucificaram. 21Nós esperávamos que ele fosse libertar Israel, mas, apesar de tudo isso, já faz três dias que todas essas coisas aconteceram! 22É verdade que algumas mulheres do nosso grupo nos deram um susto. Elas foram de madrugada ao túmulo 23e não encontraram o corpo dele. Então voltaram, dizendo que tinham visto anjos e que estes afirmaram que Jesus está vivo. 24Alguns dos nossos foram ao túmulo e encontraram as coisas como as mulheres tinham dito. A ele, porém, ninguém o viu.' 25Então Jesus lhes disse: 'Como sois sem inteligência e lentos para crer em tudo o que os profetas falaram! 26Será que o Cristo não devia sofrer tudo isso para entrar na sua glória?' 27E, começando por Moisés e passando pelos Profetas, explicava aos discípulos todas as passagens da Escritura que falavam a respeito dele.28Quando chegaram perto do povoado para onde iam, Jesus fez de conta que ia mais adiante. 29Eles, porém, insistiram com Jesus, dizendo: 'Fica conosco, pois já é tarde e a noite vem chegando!' Jesus entrou para ficar com eles. 30Quando se sentou à mesa com eles, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e lhes distribuía. 31Nisso os olhos dos discípulos se abriram e eles reconheceram Jesus. Jesus, porém, desapareceu da frente deles. 32Então um disse ao outro: 'Não estava ardendo o nosso coração quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?' 33Naquela mesma hora, eles se levantaram e voltaram para Jerusalém onde encontraram os Onze reunidos com os outros. 34E estes confirmaram: 'Realmente, o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão!' 35Então os dois contaram o que tinha acontecido no caminho, e como tinham reconhecido Jesus ao partir o pão. Palavra da Salvação. 


DOM JULIO ENDI AKAMINE -Arcebispo de Sorocaba-SP 


Lc 24,13-35

Dois discípulos empreendem uma viagem. Normalmente as nossas viagens são alegres e esperançosas: turismo, descanso, companhia dos familiares, lua de mel, aprendizado, cursos, intercâmbio cultural, etc. Aquela era uma viagem triste, parecia mais uma fuga. Os dois discípulos conversavam sobre o que tinha acontecido em Jerusalém: “Jesus, foi um profeta poderoso em obras e palavras, diante de Deus e diante de todo o povo”. Ele despertou tanta esperança! Ele parecia prometer tanto! Tudo o que ele fazia e falava prometia, de fato, um mundo novo: novo céu e nova terra! Quando mais esperávamos, aconteceu o que não esperávamos: “Nossos sumos sacerdotes e nossos chefes o entregaram para se condenado à morte e o crucificaram”. Esperávamos tanto, e só tivemos decepção. “Nós esperávamos que ele fosse libertar Israel, mas apesar de tudo isso, já faz três dias que todas essas coisas aconteceram”. 

Nessa viagem triste, porém, acontece uma surpresa: “o próprio Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles”. Aproximou-se e começou a caminhar com eles. Ele está presente, mais presente e atuante do que nunca; mais próximo, mais enviado do que nunca. Mas eles não o reconhecem. Pensam que se trata de um peregrino meio lesado, meio alienado: “tu és o único peregrino em Jerusalém que não sabe o que lá aconteceu nestes últimos dias?” Essa impressão é confirmada pela pergunta daquele peregrino estranho: “o que foi que aconteceu em Jerusalém?”

Jesus ressuscitou em sua inteira realidade humana. Ele não é espírito desencarnado ou alma penada. Não é um fantasma ou uma alucinação saudosa. Ele ressuscita na sua corporeidade humana, mas é uma corporeidade glorificada, não pertence a este mundo, pertence agora à condição divina. Nessa nova condição, Jesus está realmente presente, está continuamente presente. Os dois discípulos não estão acostumados a essa nova forma de presença de Jesus, por isso não o reconhecem.

Jesus precisa abrir brechas na cegueira dos discípulos de Emaús para se revelar à evidência dos sentidos deles. Somente depois que eles estiverem convencidos do fato e tiverem aprendido a reconhecer o seu novo modo de presença, Jesus desaparecerá da vista deles.

O corpo glorificado de Jesus participa agora da liberdade do espírito: ele pode tomar a figura de antes para atestar a sua identidade, mas pode também assumir a forma de um peregrino que se junta aos viajantes de Emaús, pode se apresentar como um jardineiro, pode assumir a figura de um comprador de peixes. A causa da incapacidade de reconhecer o ressuscitado não é a condição de glorificado, mas a cegueira dos discípulos que não esperam mais ver Jesus que está morto já há três dias. Eles são cegos porque julgam a morte como fato definitivo e último. Não esperam mais e por isso não podem ver Jesus.

Apesar da cegueira, os discípulos de Emaús acolhem aquele peregrino estranho como companheiro de viagem. 

Jesus perguntou aos discípulos: “o que aconteceu?” Há aqui uma ironia. Aquele peregrino parece desconhecer o que aconteceu, mas na realidade são os discípulos que não sabem o que realmente aconteceu. Jesus está vivo e conversa com eles, e eles não sabem o que está acontecendo. 

A pergunta de Jesus faz com que saia do coração dos dois discípulos tudo o que está corroendo por dentro. A mesma pergunta Jesus faz para nós: o que está acontecendo? Ele espera que digamos o que nos corrói por dentro. 

Os discípulos revelam toda a decepção que corrói por dentro. Jesus foi uma decepção para eles. Frustrou as suas expectativas e esperanças. Eles esperavam que Jesus fosse um conquistador que impusesse politicamente uma independência nacional. Esperavam dele uma imposição esmagadora do poder divino pelos milagres. Esperavam dele uma segurança construída sobre a prosperidade econômica e a riqueza. Jesus frustrou todas essas expectativas.

Graças a Deus! A profunda decepção dos discípulos não foi causada por promessas falsas de Jesus. Jesus nunca prometeu o que os discípulos esperavam.

Foi bom para os discípulos manifestar a decepção que corroía por dentro. Agora eles têm condições de reconhecer que o problema não era o que Jesus prometeu, mas o que os discípulos esperavam. Eram as esperanças que estavam erradas, não as promessas de Jesus.

Com razão Jesus adverte os discípulos: “Como sois sem inteligência e lentos para crer em tudo o que os profetas falaram”. Eles não tinham entendido nada dos profetas, por isso começa uma aula pascal na qual Jesus explica as Escrituras. Os discípulos conheciam a Escritura, mas a interpretavam mal: tinham selecionado da Escritura somente as partes triunfais e imaginaram um messias segundo essa seleção. Jesus mostra que os discípulos devem também ler as passagens do Servo sofredor, a paixão de Jeremias e os salmos de lamento dos sofredores. Mais importante ainda é ler toda a Escritura a partir da vida e obra de Jesus. Somente assim terão acesso ao sentido autêntico das Escrituras.

A explicação aquece o coração dos discípulos, por isso eles pedem com insistência: “Fica conosco, pois já é tarde e a noite vem chegando”. Convidemos nós também o Senhor vivo: fica conosco, Senhor!

Jesus toma refeição com os discípulos e repete gestos que tinha feito na última ceia: “tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e lhes distribuía”. Isso abre os olhos dos discípulos e revela a identidade daquele misterioso peregrino: é Ele; está vivo; as Escrituras falaram, de fato, de tudo o que deveria acontecer! Jesus desapareceu da vista deles, porque agora a sua presença física não é mais necessária. Jesus permanece presente e eles experimentam isso.

A experiência do Ressuscitado é grande demais para ficar com eles. Imediatamente, sem se importar com o cansaço e a distância, retornam para Jerusalém para anunciar a Boa nova da Ressurreição.



3°Dom Pascoa - Lc 24, 13-35 – Ano A – 23-04-23.


Páscoa: da estrada para a casa, da casa para a mesa - Adroaldo Palaoro


“Quando se sentou à mesa com eles, tomou o pão, abençoou-o, partiu-o e lhes distribuía” (Lc 24,30)


Todos temos experiência que o passado carrega lembranças de fatos e de vivências negativas: crises, fracassos, decepções, rejeições, erros, pecados... Os desencontros, quebras e rupturas... costumam deixar feridas. Tudo isso pesa na memória e continua influenciando negativamente no presente.

Com isso, ela se torna “memória mórbida, doentia”: depósito de rancores, ressentimentos, hostilidades...; ao se fixar no passado, a “memória mórbida” alimenta remorsos, sentimentos de culpa, desânimo, angústia..., embotando a vida, queimando energias, paralisando a pessoa e não abrindo futuro de sentido.

Pessoa doente na memória é doente no seu coração, na sua afetividade, nos seus sentimentos...

Se a memória não é “evangelizada”, ela continua remoendo aquilo que aconteceu, num desgaste muito grande de energia. Não há mudança e conversão se não houver mudança e conversão da memória.

Somente através da “memória redentora”, a pessoa será capaz de se colocar diante do passado, de modo livre e aberto, dando-lhe um novo significado.

A memória sadia não muda o passado, mas “recorda” (visita com o coração) de modo novo e inspirador. A memória resgata referências, cura feridas, reconcilia-se com a vida e consigo mesma, com as próprias riquezas e fraquezas, com o próprio passado; ela tem sua função de lugar santo do louvor e da gratidão, pois ajuda a tomar consciência dos benefícios recebidos e possibilita ter acesso às recordações não neutras, mas aquelas que tem um significado para o presente. Ela é capaz de tirar proveito de todas as vivências pessoais (nada é descartado, tudo é integrado); abre possibilidade para rever a própria história e lê-la como História de Salvação.

A cena do encontro de Jesus Ressuscitado no caminho de Emaús nos revela um longo diálogo amigável, que certamente ficou marcado na memória dos dois discípulos que fugiam de Jerusalém, após o evento da Paixão. Tudo o que havia acontecido com Jesus continuava presente na memória e no coração dos dois discípulos. Conversavam sobre o que significou para eles o encontro com Jesus, a convivência com Ele, o fascínio exercido sobre eles pelo anúncio do Evangelho e pela esperança da libertação de Israel.

Conversavam e discutiam também sobre a crucifixão e a morte de Jesus.

No fundo do coração dos discípulos havia um grande vazio que, inconscientemente, queriam preencher “conversando”. Estavam confusos e desorientados, mas não se separaram; não conseguiam entender-se, mas continuavam a caminhar lado a lado e a conversar; uma conversa carregada de tristeza, sem sentido, um diálogo de fracassados que não levava a lugar nenhum.

Foi justamente no meio desta “conversação”, triste e sem esperança, que o Ressuscitado se fez presente.

O Forasteiro, ao juntar-se a eles no caminho, ajudou-os a recontar a história, gentil e gradualmente. Partindo dos relatos bíblicos o Ressuscitado foi aquecendo o coração dos dois discípulos para que eles pudessem reinterpretar e ressignificar os fatos que tinham “acontecido em Jerusalém” até surgir uma nova perspectiva. Lentamente, eles foram fazendo a “travessia” de uma memória pesada, triste, doentia... a uma memória saudável, curativa e aberta ao futuro.

As viagens que fazemos em direção à reconciliação com nosso passado, muitas vezes se parecem com a viagem dos discípulos de Emaús. Na maioria das vezes, procuramos fugir da dor do passado e não sabemos para onde nos dirigimos. A viagem torna-se tediosa e pesada, marcada pelo fracasso e carregada de culpa, pois parece que não chegamos a lugar algum, embora nos movimentemos o tempo todo. É como estar preso a um moinho que nos mantém em movimento, mas não nos faz sair do lugar.

Reler o passado à luz de um horizonte maior de sentido é altamente libertador; novos recursos internos são mobilizados e a vida começa se movimentar, saindo do “fatal ponto morto”. As lembranças e os pesadelos dos relatos traumáticos sempre reaparecem e, apesar da passagem do tempo, permanecem tão nítidos e incontroláveis. No entanto, é preciso iluminá-los e situá-los no contexto dos relatos da História da Salvação. Só assim tudo adquire novo sentido, a história pessoal deixa de ser inimiga que alimenta culpa e torna-se companheira de estrada.

Quando alcançamos uma nova perspectiva sobre determinada experiência traumática ou frustrante, a esperança e o entusiasmo por viver vem habitar nosso interior. Trata-se de um momento tão fortalecedor e jubiloso que estremecemos reverentes diante do que vemos.

A narrativa de Emaús é um dos melhores exemplos de como podemos colocar nossas histórias dentro da História maior da paixão, morte e ressurreição de Jesus. “A Páscoa ocorre quando encontramos em Jesus não um amigo morto, mas um forasteiro vivo” (Rowan William).

Na narrativa de Emaús, o Forasteiro cria um círculo de amor em que os discípulos contam sua história em segurança e começam a reconstruir a confiança. Foi criado um ambiente de hospitalidade e acolhida.

Nesse círculo, a memória manifesta-se paulatinamente e revela suas feridas; lentamente, acontece uma “passagem” da memória mórbida à memória redentora.

A experiência do encontro com o Senhor e de seu reconhecimento transforma radicalmente a vida dos dois discípulos. O itinerário da fé pascal é longo e penoso, mas realiza uma verdadeira reviravolta nos pensamentos e sentimentos, nos ideais e na conduta daqueles que o percorrem até o fim.

Por meio da benção e do ato de partir e compartilhar o pão, os discípulos fazem a ligação com o passado.

Chega o momento do reconhecimento, e eles se transformam. Cheios de estímulo e esperança, e também de um novo propósito, apressam-se a voltar para Jerusalém a fim de partilhar a nova descoberta.

Que representa para nós a experiência de Emaús?

É na estrada que essa história começa a se desenrolar. O nó do problema não é a situação de fracasso de Jesus, como os discípulos pensam; o que está verdadeiramente em foco é a situação deles. Não é Jesus que desaparecera, eles é que ainda não conseguem vê-Lo e reconhecê-Lo, prisioneiros de uma tristeza e de uma cegueira tal que os impediam de aceitar a condição pascal de Jesus. Também eles precisam passar pela experiência de ressurreição, pois permanecem enfaixados no túmulo do passado e do fracasso.

Os dois discípulos veem Jesus, mas não o reconhecem, porque a visão deles é, ainda, a pré-pascal. Foi preciso despertar a “memória redentora”, ativada pelo próprio Jesus, para que a experiência de intimidade fosse construída na Estrada, na escuta da Palavra, no convite a entrar em Casa e no ato de sentar-se à Mesa, onde acontece a benção e a fração do pão.

O relato deste domingo não fornece pormenores sobre a casa nem nos garante que ela seja a de um dos discípulos. Contudo o convite “fica conosco” destaca um elevado grau de aproximação. Jesus deixa de ser um forasteiro. O convite a que permaneça com eles traduz um desejo de relação e hospitalidade.

As casas, em Lucas, são territórios onde Jesus desenvolve preferencialmente o seu ministério sobre o anúncio do Reino. A casa chega mesmo a representar uma alternativa ao Templo, e a tudo o que ele simboliza.

O centro das casas, no Evangelho, é a mesa; também aqui o movimento de Jesus vai nessa direção: “sentou-se à mesa com eles”. Aquele que era o forasteiro agora é o anfitrião; Aquele que estava morto convida a partilhar a sua vida.


Para meditar na oração:

O Tempo Pascal é uma escola de “leitura orante da nossa história”, pois nos ajuda a abrir os olhos para a sua novidade inesgotável, faz “arder o coração”, desperta o desejo e mobiliza todas as nossas capacidades para um compromisso de ação na história pessoal e coletiva.

“Há feridas que em vez de abrir nossa pele, abrem nossos olhos” (Pablo Neruda). 

A memória desempenha aqui um papel essencial. Quando evangelizada, é a que permite abrir as portas e pôr em movimento os dinamismos de vida, muitas vezes reprimidos pelas crises, feridas e fracassos.


- Na estrada de sua vida, o que tem predominado: “memória doentia” ou “memória agradecida”?


Duas experiencias chaves - José Antonio Pagola


Ao longo dos anos, nas comunidades cristãs, foi-se colocando espontaneamente um problema muito real. Pedro, Maria Madalena e os outros discípulos tinham vivido experiências muito «especiais» de encontro com Jesus vivo após a Sua morte. Experiências que os levaram a «crer» em Jesus ressuscitado. Mas os que se aproximaram mais tarde do grupo de seguidores, como podiam despertar e alimentar essa mesma fé?

Este é também hoje o nosso problema. Nós não vivemos o encontro com o Ressuscitado que viveram os primeiros discípulos. Com que experiências podemos contar? Isso é o que é suscitado pelo relato dos discípulos de Emaús.

Os dois caminham para suas casas, tristes e desolados. A sua fé em Jesus apagou-se. Já não esperam nada Dele. Tudo foi uma ilusão. Jesus, que os segue sem se fazer notar, alcança-os e caminha com eles. Lucas expõe assim a situação: «Jesus começou a caminhar com eles, mas os seus olhos não eram capazes de reconhecê-Lo». Que podem fazer para experimentar sua presença viva junto deles?

O importante é que estes discípulos não esqueçam Jesus; «conversam e discutem» sobre Ele; recordam suas «palavras» e seus «atos» de grande profeta; deixam que aquele desconhecido lhes vá explicando o que aconteceu. Seus olhos não se abrem imediatamente, mas «seus corações começam a arder».

É a primeira coisa que necessitamos nas nossas comunidades: recordar Jesus, aprofundar a sua mensagem e na sua atuação, meditar na Sua crucificação... Se, em algum momento, Jesus nos comove, suas palavras nos alcançam por dentro e o nosso coração começa a arder, é sinal de que nossa fé está despertando.

Não é suficiente. Segundo Lucas, é necessária a experiência da ceia eucarística. Embora ainda não saibam quem ele é, os dois caminhantes sentem necessidade de estar com Jesus. Faz-lhes bem sua companhia. Não querem que os deixe: «Fica conosco». Lucas enfatiza com alegria: «Jesus veio para ficar com eles». No jantar, eles abrem os olhos.

Estas são as duas experiências-chaves: sentir que o nosso coração arde ao recordar sua mensagem, sua atuação e toda sua vida; sentir que, ao celebrar a Eucaristia, sua pessoa nos alimenta, nos fortalece e nos conforta. Assim, cresce na igreja a fé no ressuscitado.



No Caminho de Emaús – Ele está no meio de nós! - Mesters e Lopes.

1. De que estavam falando pelo caminho?

Duas pessoas andando pela estrada. Desanimadas. Tristes! Estavam indo na direção contrária. Fugindo. Buscando. Imagem de ontem e de hoje. Imagem de todos nós. No ano de 85, muitos discípulos e discípulas andavam pelo caminho, tristes, desanimados, sem saber se estavam no caminho certo. Parece que a cruz ficou maior e mais pesada. O desemprego, a violência, a droga, a falta de atenção séria à saúde e à educação, a falta de dinheiro, as dívidas… o desespero. Sentimo-nos impotentes frente à corrupção que desvia fundos dos cofres públicos, ou frente à má administração que deixa o povo no desamparo. O sistema neoliberal vai gerando cada dia mais exclusões de indivíduos, grupos e países. Parece que vivemos em um caos, em uma situação sem saída. Temos a impressão de estarmos caminhando ladeira abaixo, para o pior.

2. Tinham os olhos vendados

A experiência da morte de Jesus tinha sido tão dolorosa que eles perderam o sentido de viver em comunidade, abandonaram o grupo de discípulos e discípulas. Sentiram-se impotentes diante do poder que matou Jesus e procuraram salvar pelo menos a própria pele. Sua frustração era tão grande, que nem reconheceram Jesus, quando este se aproximou e passou a caminhar com eles (24,15). Tinham um esquema rígido de interpretação sobre o Messias, e não puderam ver a salvação de Deus entrando em suas vidas. Algumas discípulas tentaram ajudar os companheiros a perceber que Jesus estava vivo (24,22-23). Mas eles se recusaram a acreditar (24,24). Esta notícia era por demais surpreendente. Era o mesmo que dizer que Jesus era o vencedor do caos e da morte. Só podia ser fantasia, sonho, delírio de mulheres (24,11). Impossível acreditar! Quando a dor e a indignação pegam forte, há pessoas que ficam depressivas, desesperadas. Outras se tornam coléricas e amargas. Algumas invocam o fim do mundo com catástrofes que vão tirar os maus da face da terra. Outras buscam evadir-se numa oração sem compromisso social e político. Mas nenhuma dessas posturas ajuda a abrir os olhos e analisar a situação com fé lúcida e responsável, capaz de inventar saídas para esta situação aparentemente sem saída.

3. A Bíblia esquentou o coração, mas não abriu os olhos

Caminhando com eles, sem eles se darem conta, Jesus fazia perguntas. Escutava as respostas com interesse. Dessa maneira, obrigava-os a irem fundo no motivo da sua tristeza e fuga. Procurava fazê-los expressar a frustração que sentiam. Depois, ia iluminando a situação com palavras da Escritura. Procurava situar os discípulos na história do povo, para que pudessem entender o momento que estavam vivendo. Foi uma experiência apaixonante. Mais tarde, eles iriam fazer uma reflexão e perceber que o coração deles ardia, quando Jesus lhes explicava as Escrituras pelo caminho (24,32). Mas a explicação que Jesus dava a partir das Escrituras não conseguiu abrir os olhos dos discípulos.

4. Eles o reconheceram na partilha do pão

Caminhando com Jesus, os discípulos sentiram o coração arder. Cresceu dentro deles uma atitude de acolhida: “Fica conosco! Cai a tarde e o dia já declina” (24,29). Foi só então que a partilha aconteceu. Partilha de vida, de oração e de pão. Partilha que abriu os olhos e provocou a mais importante descoberta da fé: ele está vivo, no meio de nós! (24,30-31). Esta descoberta lhes deu forças para voltar a Jerusalém, mesmo de noite. Tinham pressa de partilhar com os outros a descoberta que os fez renascer e ter coragem para enfrentar o poder da morte. Sim, Jesus era de fato o vencedor do caos e da morte! Não era fantasia das mulheres. Era uma realidade escondida, misteriosa, que só pode ser descoberta por quem aprende a partilhar, a se entregar, a sair do círculo vicioso dos interesses egoístas, para lutar junto com os outros pela vida de todos. Quando seus olhos se abriram, livres das trevas e travas por poder dominante, puderam descobrir a morte de Jesus como expressão máxima de um amor sem limites. Amor que tem sua origem no Pai cheio de ternura, gerador incansável da vida. Amor que tomou carne em Jesus de Nazaré para visitar e redimir a humanidade. Amor que se mantém fiel até ao extremo de dar a própria vida, para que todos tenham vida (Jo 10,10). Amor que foi confirmado pelo Pai, quando ressuscitou Jesus da morte.

5. Renascer para uma nova esperança

Esta experiência fez os discípulos renascerem para uma nova esperança. Ao redor de Jesus vivo, eles se uniram de novo e assumiram o projeto de vida para todos. A esperança é como um motor que leva a acreditar nos outros e a inventar práticas de fé. Com a esperança renovada, aquilo que parecia uma total impossibilidade passou a ter um novo significado para eles. Perderam o medo, superaram a experiência de incapacidade e de impotência. Deixaram de lado o negativismo derrotista e voltaram, em plena noite, como se fosse de dia. Voltaram para recomeçar, para reconstruir a comunidade, expressão, sinal e sacramento da presença de Jesus Ressuscitado.

6. Refazer hoje a experiência do caminho de Emaús

Desafiados pela atual conjuntura, somos chamados a viver hoje a experiência de Emaús e descobrir, na partilha solidária, a presença de Deus no meio de nós. Como comunidade de fé, somos chamados a reconstruir, no diálogo, na abertura e na acolhida, o projeto de Jesus, pelo qual ele entregou sua própria vida. A solidariedade leva à descoberta da força libertadora de Deus na história. Com olhar lúcido e criativo procuraremos expressar esta fé numa solidariedade bem concreta e articulada, seja em nível de grupo, de bairro ou de cidade. Dizer articulada quer dizer que esta ação solidária deve ser comunitária. Só assim será de fato sinal do Reino e poderá intervir em favor da vida, da vida indefesa dos pobres, os preferidos de Jesus.



Jesus caminha conosco - Ana Maria Casarotti

Neste terceiro domingo de Páscoa continuamos aprofundando na experiência das comunidades evangélicas no seu encontro com Jesus Ressuscitado. Nos evangelhos as aparições do Ressuscitado narram as diversas experiências do encontro com Ele numa linguagem que utiliza diferentes gêneros literários e religiosos da época. Descrevem-se sentimentos de estupor junto com o medo e a alegria, a desconfiança, a dúvida e a certeza da sua presença, a insegurança, o desejo de tocá-lo.

Também se contam diversas atitudes como, por exemplo, a de dois discípulos que escutam as mulheres e correm ao sepulcro, ou outros que estão juntos com as portas fechadas por medo dos judeus, e neste texto apresenta-se que “dois discípulos iam para um povoado, chamado Emaús, distante onze quilômetros de Jerusalém”.

Estes discípulos caminham para um lugar que possivelmente seja o povoado onde conheceram Jesus. Eles tinham partilhado com Jesus muitos momentos da sua vida nos caminhos da Galileia. Escutaram suas palavras, experimentaram sua presença misericordiosa no meio deles, mas agora Ele havia morrido. E junto com sua morte, morreram suas expectativas, tudo aquilo que esperavam de Jesus, que era o Salvador, o Messias, o Libertador, tudo isso morreu na sua morte! Eles aguardavam um profeta poderoso em palavras e obras e isso não aconteceu.

Tristes e desanimados porque seus projetos e esperanças ficaram frustrados, sem possibilidade de serem realizados, saem de Jerusalém a caminho de um povoado, abandonando possivelmente o grupo de discípulos e discípulas porque já não teria sentido viver em comunidade. A presença de Jesus os reunia, mas sem Ele tudo perdeu seu sentido.

Vão a caminho afastando-se de Jerusalém, possivelmente regressam ao habitual e àquilo que tinham renunciado para seguir Jesus. Sair de Jerusalém sem acreditar na ressurreição é caminhar sem orientação, sem uma meta clara e sem rumo.

“Conversavam a respeito de tudo o que tinha acontecido. Enquanto conversavam e discutiam, o próprio Jesus se aproximou, e começou a caminhar com eles.”

Aquilo que tinham vivido com Jesus não desaparece dos discípulos, não foi uma experiência passada, mas ainda permanece entre eles. Não desaparece da sua vida nem do seu coração, o vivido permanecia neles porque não vão esquecer tudo o que aconteceu e que tinham experimentado junto com Jesus.

Enquanto os dois discípulos discutem porque possivelmente não há unanimidade entre eles, “Jesus se aproximou e começou a caminhar com eles”. Jesus se aproxima da sua realidade, da sua situação e pergunta-lhes: “O que é que vocês andam conversando pelo caminho?”.

Jesus está ao nosso lado, apesar de que muitas vezes podemos desconhecer sua presença ou não ter olhos para vê-lo. Ele se faz vizinho e achega-se à situação seja qual for, sem distinção. Interessa-se pelas nossas conversas, “entra” nos nossos diálogos e discussões e está presente naquilo que nos preocupa.

Como diz o Papa Francisco: “Jesus caminha conosco. Frente às interrogações que brotam do coração do homem e frente aos desafios que a realidade apresenta, podemos sentir uma sensação de extravio e perceber que nos faltam energias e esperança [...] Mas se contemplamos a Jesus Ressuscitado, que caminha junto aos discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 13-15), nossa confiança pode se reavivar. Nesta cena evangélica temos uma autêntica e própria ‘liturgia do caminho’, que precede a da Palavra e a do Pão partido e que nos comunica, em cada um de nossos passos: Jesus está ao nosso lado!”.

Francisco recordou e observou que os dois discípulos, feridos pelo escândalo da cruz, retornaram para casa “percorrendo o caminho da derrota: levam no coração uma esperança rompida e um sonho que não se realizou”. Contudo, Cristo “não os julga, caminha com eles e, ao invés de levantar um muro, abre uma nova trilha”. 

Jesus caminha com eles, escuta o relato do “que aconteceu a Jesus, o Nazareno”, mas recebe sua tristeza e desânimo porque, apesar de terem escutado a proclamação das mulheres, o desencanto e desalento apodera-se deles porque “ninguém viu Jesus”.

Jesus torna-se assim confidente da frustração deles, escuta a narrativa do olhar dirigido simplesmente aos fatos, ao histórico e acontecido cronologicamente. Mas sua pergunta “faz que com que os discípulos levantem os olhos do chão e olhem para o rosto do peregrino desconhecido. Sem perceber, começam a sair de seu fechamento e a alegrar-se porque alguém está interessado em saber quais são as causas de sua tristeza e quer escutá-los.  

Como consequência desta conversação, os discípulos não querem que Jesus os abandone, insistem para que Jesus permaneça com eles. No momento da ceia eles reconhecem o que havia acontecido no caminho e entendem a origem da alegria que experimentaram no caminho: “Não estava o nosso coração ardendo quando ele nos falava pelo caminho, e nos explicava as Escrituras?”

Jesus aceita o convite e entra para ficar com eles. “Sentou-se à mesa com os dois, tomou o pão e abençoou, depois o partiu e deu a eles”. “Foi durante a “fração do pão” que os olhos dos discípulos se abriram e reconheceram Jesus”. Mas depois de reconhecê-lo “é necessário realizar imediatamente o ‘caminho de volta’ para a comunidade, para partilhar com os outros a experiência do encontro com o Senhor, professar juntos a fé comum e realizar as obras do Reino”.

Nos discípulos de Emaús também podemos reconhecer-nos. Quantos/as de nós, tantas vezes, caminhamos assim pela vida desorientados, abatidos, carregando o peso da injustiça, da incompreensão. E aqui vem uma primeira boa notícia deste evangelho: neste caminhar não estamos sozinhos, Jesus, o Emanuel (Deus conosco) caminha conosco.

Neste tempo de Páscoa, somos convidados a acompanhar tantas pessoas que ao nosso lado caminham tristes e desanimadas para gerar nelas a esperança da vida que é Jesus, que, apesar de tanto sofrimento, está ao seu lado. Ao ressuscitar seu Filho crucificado, Deus manifesta a justiça de seu amor. Não deixa que a morte triunfe. A ressurreição é uma força de esperança que se grava no coração da humanidade e grita aos crucificados deste mundo para não desistirem, pois o Deus da vida caminha conosco e nos ressuscitará.

Como disse o Papa Francisco, “Neste tempo convidar à alegria pode parecer uma provocação, e inclusive, uma atitude de mau gosto diante das graves consequências que estamos sofrendo pela Covid-19. Não são poucos os que poderiam pensá-lo, assim como os discípulos de Emaús, como um gesto de ignorância ou de irresponsabilidade (cf. Lc 24, 17-19).

Porque “este é o tempo – continua Francisco - é o tempo propício do Senhor, que nos pede para não nos conformarmos nem ficarmos satisfeitos e menos ainda justificarmo-nos com lógicas substituíveis ou paliativas que nos impeçam de assumir o impacto e as graves consequências que estamos vivendo. Este é o tempo propício para nos animarmos a uma nova imaginação do possível com o realismo que apenas o Evangelho pode nos proporcionar”.

Neste domingo e neste momento especial que estamos vivendo, nos unimos ao pedido do Papa Francisco para descobrir o sopro do Espírito que abre horizontes, desperta a criatividade e nos renova na fraternidade para dizer presente (ou seja, estou aqui) diante da enorme e imperativa tarefa que nos espera.

Oração

Obrigado porque nos necessitas

Em teu silêncio acolhedor

nos ofereces ser tua palavra

traduzida em milhares de línguas

adaptada a toda situação.

Queres expressar-te em nossos lábios

no sussurro ao doente terminal,

no grito que sacode a injustiça,

na sílaba que alfabetiza uma criança.

Em teu respeito a nossa história,

nos ofereces ser tuas mãos,

para produzir o arroz,

lavar a roupa familiar,

salvar a vida com uma cirurgia,

chegar na carícia dos dedos

que alivia a febre sobre a testa

ou acende o amor na face.

Em tua aparente paralisia,

nos envias a percorrer caminhos.

Somos teus pés e te aproximamos

das vidas mais marginalizadas,

pisadas suaves para não despertar

as crianças que dormem sua inocência,

passos fortes para descer até a mina

ou entregar com pressa uma carta perfumada.

Nos pedes ser teus ouvidos,

para que tua escuta tenha rosto,

atenção e sentimento,

para que não se diluam no ar,

as queixas contra tua ausência,

as confissões do passado que remói

a dúvida que paralisa a vida

e o amor que partilha sua alegria.

Obrigado, Senhor, porque nos necessitas.

Como anunciarias tua proposta

sem alguém que te escute no silencio?

Como olharias com ternura,

sem um coração que sinta teu olhar?

Como combaterias a corrupção

sem um profeta que se arrisque ?

Benjamin González Buelta

Para sentir e saborear as coisas internamente



Nós esperávamos - Enzo Bianchi


Tradução Moisés Sbardelotto.


O relato do encontro entre Jesus ressuscitado e os dois discípulos no caminho para Emaús foi sabiamente colocado por Lucas no último capítulo do seu Evangelho, o que quer significar uma conclusão e, ao mesmo tempo, uma abertura da narrativa que prosseguirá nos Atos dos Apóstolos.

Estamos diante de uma síntese de todo o Evangelho, porque esse texto resume não só toda a história de Jesus de Nazaré, mas também toda a história da salvação que Jesus mesmo traça ao “explicar todas as Escrituras” (cf. Lc 24,27). Justamente a segunda parte da obra lucana, os Atos, será uma interpretação, uma explicação de todas as Escrituras do Antigo Testamento que se completaram em Jesus e, ao mesmo tempo, a narrativa dos eventos ocorridos na recordação de suas palavras.

Com o reconhecimento de Jesus “verdadeiramente ressuscitado” por parte dos Onze, ou seja, daqueles que o tinham seguido – como diz Pedro – “durante todo o tempo em que o Senhor vivia no meio de nós, desde o batismo de João até o dia em que foi levado ao céu” (At 1,21-22), encerra-se a época do testemunho ocular: aqueles que foram “testemunhas oculares” (Lc 1,2) devem se tornar “servos da Palavra” (ibid.) e, portanto, “enviados”, “apóstolos” (cf. Lc 24,49) para “anunciar a conversão e o perdão dos pecados a todas as nações” (cf. Lc 24,47).

Nesse último capítulo, Lucas, narrando eventos contidos em um único dia, o dia da ressurreição do Senhor, revela-nos que se trata de um dia sem fim, um dia único, o “dia um” (Gn 1,5) da nova criação, o “dia único que só o Senhor conhece” (Zc 14,7). Mas é também o dia “nosso”, o nosso tempo, o hoje no qual caminhamos pelas estradas do mundo, enquanto o Ressuscitado caminha conosco, até que o reconheceremos definitivamente à mesa do Reino eterno.

Quanto à estrutura desse capítulo, ele é, evidentemente, composto por três relatos:

1) as mulheres no sepulcro (vv. 1-12);

2) discípulos de Emaús (vv. 13-35);

3) os Onze em Jerusalém (vv. 36-53).

Acima de tudo, as mulheres que se dirigiram ao sepulcro no primeiro dia depois do sábado, no início da manhã, encontram a pedra rolada para fora da entrada do túmulo e, ao entrarem, não encontram o corpo morto de Jesus. Enquanto estão na aporia (cf. Lc 24,4), dois homens se apresentam a elas em vestes fulgurantes e dizem às mulheres assustadas e com o rosto inclinado ao chão: “Por que vocês estão procurando entre os mortos aquele que está vivo? Ele não está aqui! Ressuscitou! Lembrem-se de como ele falou, quando ainda estava na Galileia: ‘O Filho do Homem deve ser entregue nas mãos dos pecadores, ser crucificado, e ressuscitar no terceiro dia’” (Lc 24,5-7).

Eles pedem a recordação das palavras de Jesus, e as mulheres efetivamente se recordam e, portanto, creem. Logo depois, voltando do sepulcro, anunciam a boa notícia aos Onze e aos outros. Mas “aquelas palavras lhes pareceram como um devaneio”, uma alucinação, uma tolice, “e não acreditaram nelas. Pedro, porém, levantou-se e correu para o túmulo. Inclinou-se, e viu apenas os lençóis de linho. Então voltou para casa, admirado com o que havia acontecido” (Lc 24,11-12). No centro dessa primeira parte, está o anúncio da ressurreição, fundamentado nas palavras de Jesus: recordando as suas palavras, chega-se à fé pascal.

Segue o nosso relato, ao qual dedicaremos um espaço adequado. Limito-me, por enquanto, a evidenciar o traço fundamental, que o torna paralelo aos outros dois trechos, em uma sábia construção narrativa e teológica. Os dois discípulos a caminho não reconhecem Jesus ressuscitado, mas veem apenas um viandante que lhes diz que, segundo as palavras de Moisés e dos Profetas, o Cristo devia sofrer e morrer para entrar em sua glória: ele pede a fé nas palavras dos Profetas, nas escrituras (cf. Lc 24,25).

A última parte nos testemunha que Jesus em pessoa aparece no meio dos Onze reunidos na câmara alta, em Jerusalém (cf. Lc 22,12; At 1,13). O Ressuscitado está lá, no meio deles, cumprimenta-os, dando-lhes a paz, mas eles, “espantados e cheios de medo, pensavam estar vendo um espírito” (Lc 24,37). Jesus, então, faz-se reconhecer nos sinais da paixão impressos para sempre em sua carne, pede que os discípulos o olhem e o toquem, mas os Onze permanecem incrédulos, entre alegria e aturdimento.

Jesus, então, anuncia também a eles – como já fizera em seus dias terrenos – a necessidade do cumprimento em sua vida daquilo que estava escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos. “Então Jesus abriu a mente deles para entenderem as Escrituras” (Lc 24,45), e, com essa operação terapêutica (cf. Lc 24,31-32), dá-lhes a inteligência das Escrituras, torna-os crentes, habilitando-os a serem “testemunhas” (mártyres: Lc 24,48).

Para que tudo isso se realize plenamente, Jesus declara que em breve lhes enviará “a promessa do Pai” (Lc 24,49), o Espírito Santo (cf. At 2,1-12), depois os conduz a Betânia e, abençoando-os, ascende ao céu. Agora, finalmente, os discípulos, tendo voltado para Jerusalém repletos de alegria, podem elevar a Deus um louvor sem fim.

Eis o resumo do último capítulo do Evangelho segundo Lucas, no qual é revelado a cada leitor, a cada um de nós, o caminho da fé do discípulo. É preciso escutar e compreender as Escrituras do Antigo Testamento, é preciso recordar as palavras de Jesus recolhidas no Novo Testamento, e então será possível crer em sua ressurreição.

Mas passemos para o trecho litúrgico, centro do nosso capítulo e síntese doxológica de todo o Evangelho. Quando Jesus foi capturado, os discípulos fugiram todos com medo, com desencorajamento, e alguns deles também foram tentados a abandonar a comunidade. Eis, de fato, que dois deles partem de Jerusalém, deixam os outros e vão rumo ao vilarejo de Emaús, onde quase certamente estava a casa deles.

Estão desiludidos, repletos de tristeza – sentimento que também transparece em seus rostos –, mas conversam, dialogam, trocam palavras, repassando os eventos de que foram testemunhas: captura, condenação e crucificação de Jesus. Tudo lhes parece um fracasso, e é grande a frustração de suas esperanças depositadas em Jesus: tinham-no seguido crendo nele, escutando-o, mas sua morte foi verdadeiramente o fim para ele, para sua comunidade, para a expectativa de cada discípulo. Ele era um profeta, tinha uma palavra performativa, fazia ações significativas, mas os chefes dos sacerdotes o entregaram aos romanos, e ele foi crucificado. Já se passaram três dias, e, portanto, Jesus está morto para sempre, e vida deles parece não ter mais sentido, direção, fundamento. É a condição em que muitas vezes nós também nos encontramos, e, por isso, o anonimato de um dos dois discípulos nos ajuda a nos colocarmos dentro do relato...

Mas, naquele caminho, eis que aparece outro viandante que se aproxima dos dois e lhes faz perguntas. Ele não se aproxima com uma mensagem a proclamar, mas com o desejo de escutar aquele diálogo, de compreender o que os dois têm no coração, de acompanhá-los. Acima de tudo, ele lhes pergunta: “O que são esses discursos que vocês fazem enquanto caminham, pensativos?”. Em resposta, Jesus – do qual, por enquanto, apenas o leitor conhece a identidade – escuta um relato repleto de afeto pelo seu rabi: escuta aquilo que aconteceu, escuta o que dizem sobre ele, escuta suas esperanças desiludidas, e somente no fim os interroga com muita delicadeza sobre sua fé, sobre sua confiança nas Escrituras. Por que não são capazes de crer nos profetas? Por que não são capazes de ler as Escrituras?

Então, Jesus, como tantas vezes tinha feito com seus discípulos, relê a Torá de Moisés e os profetas, e, por meio das Escrituras, faz com que os dois compreendam a necessitas de sua morte. Atenção, não é o destino, mas sim a necessitas que ilumina a morte de Jesus: em um mundo injusto, o justo é rejeitado, hostilizado e tirado do meio do caminho, porque “somente vê-lo já é insuportável” (Sb 2,14); e se o justo, o Servo do Senhor, permanece fiel a Deus e à sua vontade, rejeitando as tentações do poder, da riqueza e do sucesso, então é conduzido à morte, rejeitado por todos.

Esses eventos, que a uma leitura humana significam apenas fracasso e vazio, também podem ser compreendidos de forma diferente, se Deus o conceder, com seus dons. Mas, justamente porque esses discípulos não creem nas Escrituras, também não podem sequer reconhecer Jesus no viandante que caminha com eles.

Tendo chegada em casa, o misterioso viandante parece querer prosseguir sozinho, mas os dois, que, tendo ficado do lado de Jesus, aprenderam com ele ao menos a atenção aos outros, mostram-se hospitaleiros. Por isso, insistem: “Fica conosco, pois já é tarde, e a noite vem chegando”. E assim o viandante permanece com eles, entra na casa deles.

Quando estão à mesa, depois das palavras, ele faz gestos sobre o pão e especialmente o parte para lhes dar. Diante desse gesto, o mais eloquente realizado por Jesus na última ceia (cf. Lc 22,19), sinal de uma vida inteira oferecida e dada por amor, “os olhos dos discípulos se abriram, e eles reconheceram Jesus”: mas logo o viandante, o forasteiro, o peregrino desaparece da vista deles. Presença elusiva, mas suficiente para os dois discípulos, que reconhecem que, diante da sua palavra, o coração ardia no peito deles e que, com sua vida eterna, podia se fazer presente e partir o pão.

Nesse admirável relato, fala-se de caminhar juntos, de recordar e pensar, de responder a quem pede a conta e, portanto, de celebrar a presença viva de Jesus, o Ressuscitado para sempre. Mas isso só pode ocorrer na plenitude da comunidade cristã, na Igreja: por isso, os dois “voltaram para Jerusalém onde encontraram os Onze reunidos com os outros”, que os precedem e lhes anunciam a ressurreição.

É isso que também ocorre conosco em cada domingo, dia pascal; é o que também ocorre hoje, na comunidade reunida pelo Senhor: a Palavra contida nas Escrituras, a Eucaristia e a comunidade são os sinais privilegiados da presença do Ressuscitado, que não se cansa de se dar a nós, “tolos e lentos de coração”, mas por ele amados, perdoados, reunidos em sua comunhão. 


TEXTO EM ESPANHOL - DOM DAMIÁN NANNINI, ARGENTINA


TERCER DOMINGO DE PASCUA CICLO "A"

Damian Nannini

Primera lectura (He 2,14.22-33):


De esta primera lectura sería bueno resaltar los sujetos y sus diversas acciones. Tenemos entonces a Dios que acredita a Jesús dándole poder para realizar milagros, prodigios y signos. El sentido de esta expresión es que Dios da pruebas mediante los milagros de estar a favor de Jesús, de estar con él. Luego están los hombres, los judíos de aquel tiempo, que lo hacen morir clavándolo en la cruz por medio de los infieles (de los romanos). Ahora bien, Dios vuelve a intervenir resucitando a Jesús. Y esto ya estaba, en cierto modo, profetizado por el Salmo 16 (15) que en su sentido pleno se refiere a Jesús. Luego vuelve a insistir en que Dios Padre resucitó a Jesús, lo exaltó y le comunicó el Espíritu Santo prometido. Hacia el final aparece Jesús resucitado y exaltado como sujeto de una acción: comunicar el Espíritu Santo a los apóstoles. También los apóstoles tienen su acción: son testigos de todo esto.


Segunda lectura (1Pe 1,17-21):


El texto de hoy quiere motivar a la perseverancia en la vida cristiana recordando el "precio del rescate": “la sangre preciosa de Cristo, el Cordero sin mancha ni defecto”. Pero no se queda allí, sino que también proclama la obra de Dios Padre: la resurrección y glorificación de Jesús. Y esta obra maravillosa de Dios es la fuente de nuestra fe y de nuestra esperanza. 

Es bueno que, aún en el clima pascual, recordemos que Jesús llega a su glorificación habiendo primero sufrido la pasión para rescatarnos a nosotros del pecado. Teniendo presente esto, la invitación es a poner nuestra fe y nuestra esperanza en Dios que resucitó a Jesús. 


Evangelio (Lc 24,13-35):


Nos encontramos ante uno de los más hermosos relatos del evangelio, casi una presentación sintética del mismo.

Comienza presentando a los protagonistas: dos de los discípulos (el griego dice literalmente dos de ellos). Como el evangelista viene tratando de las actitudes de los apóstoles, se supone que se trata de dos del grupo de los seguidores de Jesús, no de los doce, pero sí del círculo íntimo de Jesús. 

Luego da una indicación temporal: aquel mismo día. Esto nos remite a Lc 24,1 donde encontramos la última indicación temporal que nos ha dado el evangelista: "el primer día de la semana", que según la cuenta judía es nuestro domingo. Por tanto, nos encontramos en el mismo domingo de la resurrección, por la tarde.

La indicación espacial o geográfica es que se dirigen a un pequeño pueblo llamado Emaús, distante unos 60 estadios de Jerusalén. Dado que un estadio corresponde a 190 metros, la distancia de Jerusalén sería de unos 11,4 km. Es la única vez que aparece en el NT esta localidad. La opinión de los arqueólogos se divide entre los que la identifican con una localidad llamada Emaús (luego Nicópolis por los romanos) y que se encuentra a 160 estadios (29 km) al noroeste de Jerusalén; y los que, dando por cierta la distancia que señala Lucas, la identifican con un sitio llamado el-Qubeibeh que se encuentra situado a 11 km. al oeste de Jerusalén (60 estadios).  

El texto dice que iban charlando "sobre lo que había ocurrido" (24,14), en referencia a la pasión y muerte de Jesús. Enseguida (24,15) precisa que no sólo hablaban, sino que discutían. Esto revela que están enojados, amargados porque las cosas terminaron mal. Y discuten buscando entender de quién fue la culpa, cuál de los dos se equivocó primero al entusiasmarse por Jesús. Como bien comenta J. J. Bartolomé : "Caminar juntos dialogando acorta un tanto el camino pero agranda su desencanto. Cuanto más hablan tanto más se alejan, efectiva y afectivamente, de Jerusalén y de cuanto allí había ocurrido".

Mientras van caminando y discutiendo, Jesús se acercó y se puso a caminar con ellos, pero ellos no podían reconocerlo. Es decir, Jesús en primer lugar se hace cercano y, sin demasiado protocolo, comparte el camino con ellos. Luego, con gran discreción, pregunta acerca de lo que están discutiendo. Esto los hace detener y también manifestar ya en el rostro la tristeza que les oprime el corazón. Entonces uno de los dos, de nombre Cleofás, le contesta con un tono algo agresivo. Pero Jesús mantiene la calma y se muestra dispuesto a escuchar, a que le cuenten su versión de lo que ha pasado en Jerusalén en esos días. 

Ante la insistencia de Jesús los dos discípulos le cuentan todo lo que ha sucedido, su versión de los hechos. Y nos encontramos con que le cuentan a Jesús un resumen del evangelio, de la vida de Jesús. En efecto, a grandes pinceladas describen los momentos y acciones más importantes de Jesús, terminando con su crucifixión. Luego añaden la visita de las mujeres a la tumba vacía y el testimonio de unos ángeles que anuncian que está vivo. También refieren la incredulidad de los Apóstoles ante el testimonio de las mujeres y que Pedro corre a verificar lo dicho por ellas, pero que a Jesús no lo ven. Por tanto, lo dicho por los discípulos de Emaús recapitula en cierto modo todo el Evangelio, incluso lo inmediatamente anterior (cf. Lc 24,1-12). 

Ahora bien, esto que los discípulos de Emaús le cuentan a Jesús, coincide en su mayor parte con lo que Pedro y Pablo predican como kerigma, esto es, el primer anuncio de la salvación (cf. He 2,22-24; 3,13-15; 4,10-12; 10,37-41; 13,27-31). Lo llamativo es que mientras Pedro y Pablo hacen de este kerigma un anuncio gozoso de salvación, los discípulos de Emaús lo dicen apesadumbrados, sin entusiasmo. Es que está incompleto, les falta la fe en la resurrección, que da sentido a todo. Se han quedado en el anuncio de la muerte de Jesús, sin llegar a creer en la resurrección. Y como dice San Pablo: "si Cristo no resucitó, la fe de ustedes es inútil y sus pecados no han sido perdonados, en consecuencia, los que murieron con la fe en Cristo han perecido para siempre. Si nosotros hemos puesto nuestra esperanza en Cristo solamente para esta vida, seríamos los hombres más dignos de lástima" (1Cor 15,17-19).

Entonces Jesús toma la palabra e interviene respondiendo en dos tiempos. En un primer momento con una especie de reproche o reto pues trata a los dos discípulos como duros de entendimiento y lentos para creer en las Escrituras, en lo anunciado por los profetas. Luego va "al grano", a lo que representa un obstáculo para la fe de los discípulos: los sufrimientos de Cristo, la cruz. 

Jesús les dice que "era necesario que el Mesías padeciera para entrar así en su gloria". La expresión "es necesario", frecuente en Lucas, suele referirse a sucesos que deben ocurrir o acciones que Jesús debe realizar porque están determinadas por el Padre. El ejemplo más claro son las referencias a la necesidad de la pasión de Cristo (cf. 9,22; 17,25; 22,37; 24,7.44). Aquí podemos encontrar la justificación del "reproche" de Jesús a sus discípulos por cuanto en los tres anuncios de su pasión ya les había hablado de la "necesidad" de "pasar" por la cruz para llegar así a la gloria de la resurrección. Entonces, para probarles que la pasión del Mesías estaba en el plan del Padre "empezando por Moisés y continuando por todos los profetas, les explicó lo que había sobre él en todas las Escrituras". Con esto les quiere enseñar que los sufrimientos y la muerte de Cristo estaban previstos por Dios, se hablaba de ellos en la Escritura, por tanto, los mismos no menoscaban el poder de Dios ni su bondad. Y al mismo tiempo nos enseña que "los pensamientos de ustedes no son los míos, ni los caminos de ustedes son mis caminos -oráculo del Señor-" (Is 55,8). Es decir, el designio de Dios, sus caminos, son misteriosos para nosotros, se mueven con otra lógica, la lógica divina del amor. Y a la pregunta que espontáneamente nos surge: ¿por qué debía ser así, por qué era necesario esto?, este texto no responde, nos deja en la oscuridad. Pero es esta oscuridad la que hace meritoria nuestra fe y nuestra confianza en Dios.

Al parecer, mientras van escuchando la explicación de las Escrituras por parte de Jesús, se les pasó rápido el tiempo y ya están llegando a Emaús. Jesús "amaga" seguir de largo, pero los discípulos le ruegan con insistencia: "Quédate con nosotros, porque atardece y el día ya ha declinado." Y se quedó con ellos.

Sentado a la mesa Jesús realiza un gesto: toma el pan, bendice a Dios, lo parte y se los da a los discípulos. Es el mismo gesto descrito con los mismos verbos que utilizó el evangelio poco antes en la última cena cuando Jesús instituye la Eucaristía (cf. Lc 22,19). Y ante este gesto sucede algo increíble: "se les abrieron los ojos y le reconocieron, pero él desapareció de su vista".

Por tanto, el reconocimiento de Jesús Resucitado tiene lugar en la "fracción del pan". Lucas utiliza esta expresión otras veces y siempre para referirse a la Eucaristía (cf. Lc 24,35; He 2,42), por lo que parece ser uno de los primeros nombres que se le daba. Por tanto, es muy clara la referencia a la Eucaristía como lugar de la Presencia de Jesús Resucitado, sobre todo porque el texto señala que, una vez que lo reconocieron después de la fracción del pan, Jesús desapareció de su vista, se hizo invisible.

La reacción de los discípulos es volver a hablarse, pero ya no discuten sino que están de acuerdo, han tenido el mismo sentimiento y la misma experiencia: las palabras de Jesús le habían calentado e iluminado el corazón a lo largo del camino y ahora lo habían reconocido en la fracción del pan. Las palabras de Jesús, al explicar las Escrituras, dan calor y luz al corazón. De hecho, el verbo "arder" que se utiliza en 24,32 Lucas lo aplica a una lámpara encendida en 12,35; y de igual modo Mt 5,15. Notemos también que en Lc 24,32 el texto griego dice literalmente "cuando nos abría las Escrituras", utilizando el mismo verbo (dianoígó = abrir) que en 24,31 cuando dice que se les abrieron los ojos a los discípulos de Emaús. Es también el mismo verbo que en 24,45, cuando Jesús se aparece a los Once, se utiliza para decir que les abrió la inteligencia para que comprendieran las Escrituras. En fin, se trata del "don de la fe" presentado como una "gracia de apertura" de la mente, de las Escrituras y de los ojos que el Señor tiene que darnos para poder comprender el sentido de sus padecimientos y de su muerte, y para reconocerlo resucitado, vivo y presente en la Eucaristía.

"Al momento" se levantan y vuelven a Jerusalén, a la comunidad de los apóstoles y discípulos que se encuentra reunida allí. El evangelista no se detiene a explicar más el cambio interior de los discípulos de Emaús, pues la inmediata decisión de volver a Jerusalén, a la comunidad, deja en claro que han superado la prueba, han vencido el desaliento y el desencanto. Ya no huyen de la comunidad de fe, sino que regresan a ella con entusiasmo.

Y apenas llegan a la comunidad de los apóstoles son confirmados en su fe al recibir el alegre anuncio de la Resurrección del Señor: "¡Es verdad! ¡El Señor ha resucitado y se ha aparecido a Simón!". "Es verdad", ahora estamos en lo cierto, ha resucitado. Antes estábamos equivocados, no habíamos entendido lo sucedido, juzgamos la muerte de Jesús como el fin de todo y no como un paso necesario a la vida nueva. Bien podemos suponer que estos serían los pensamientos de los dos discípulos de Emaús.

Una vez que han escuchado el anuncio, el kerigma de los Apóstoles, toca ahora a ellos dar su testimonio personal de que Cristo ha resucitado, pero añadiendo algo muy importante para la vida presente y futura de la Iglesia: lo reconocieron en la fracción del pan. 


Algunas reflexiones:


El relato de los discípulos de Emaús tiene un dinamismo especial pues todo está armado en torno a un viaje que sale de Jerusalén y vuelve allí. Salen de Jerusalén hacia Emaús con un particular estado de ánimo: tristeza y desaliento; y regresan a Jerusalén llenos de alegría y entusiasmo. ¿Qué ha pasado en el camino? Han reconocido al Señor Jesús Resucitado en la explicación de las Escrituras y en la Fracción del pan. Por tanto, la comprensión de las Escrituras y la Fracción del Pan son para los discípulos el punto culminante del relato: llegan a la fe Pascual, tienen la certeza de que Jesús está vivo y, entonces, emprenden el camino de regreso a Jerusalén como hombres nuevos y convertidos en testigos de Cristo Resucitado.

También el relato deja en claro que ante la oscuridad de los misteriosos caminos de Dios la solución no está en huir, en alejarse de la comunidad creyente. Por eso el Señor se une a su equivocado camino para hacerlos volver a la comunidad de los apóstoles. Y les queda la enseñanza: se lo reconoce a Jesús resucitado en la Eucaristía que celebra la Iglesia. 

Como bien nota A. Vanhoye , "este episodio muestra las conversiones que Jesús resucitado obra en dos discípulos: conversión de la tristeza a la alegría; conversión de la oscuridad a la luz de la fe; conversión a la vida comunitaria". Estas conversiones bien podrían servirnos como criterio de discernimiento de nuestra experiencia cristiana, de nuestra vivencia de la Pascua, de nuestra participación en la Eucaristía dominical. Pues siempre aquí el Señor viene a nuestro encuentro y provoca estas conversiones en nuestro corazón y en nuestras vidas.

En el contexto del tiempo pascual el Evangelio de hoy nos ofrece dos "lugares clásicos" de la presencia de Jesús Resucitado. En primer lugar, la Eucaristía o "fracción del pan". Sobre esto meditaba el Papa Juan Pablo en su carta apostólica "Mane nobiscum Domine" (que traducido significa justamente: "Quédate con nosotros Señor"): "Cuando los discípulos de Emaús le pidieron que se quedara «con» ellos, Jesús contestó con un don mucho mayor. Mediante el sacramento de la Eucaristía encontró el modo de quedarse «en» ellos. Recibir la Eucaristía es entrar en profunda comunión con Jesús. «Permaneced en mí, y yo en vosotros» (Jn 15,4). Esta relación de íntima y recíproca «permanencia» nos permite anticipar en cierto modo el cielo en la tierra. ¿No es quizás éste el mayor anhelo del hombre? ¿No es esto lo que Dios se ha propuesto realizando en la historia su designio de salvación? Él ha puesto en el corazón del hombre el «hambre» de su Palabra (cf. Am 8,11), un hambre que sólo se satisfará en la plena unión con Él. Se nos da la comunión eucarística para «saciarnos» de Dios en esta tierra, a la espera de la plena satisfacción en el cielo" (nº 19).


En segundo lugar, tenemos que Jesús Resucitado nos sigue hablando por medio de las Escrituras. Ellas son "Palabra de Dios" para quien las escucha con fe. Un hermoso ejemplo lo tenemos en la liturgia de rito armenio donde al mostrar el diácono el libro de los evangelios que va a leerse proclama: "Nos va a hablar el Señor" . 

Ahora bien, antes de iluminarnos con su Palabra y hacerse presente en la Eucaristía, Jesús se acercó y caminó con los discípulos hacia Emaús. Por tanto, una “liturgia del camino” debe preceder a la “liturgia de la Palabra y de la Eucaristía”. De ella nos hablaba el Papa Francisco en su mensaje para la jornada mundial de oración por las vocaciones del año 2017: “en esta escena evangélica tenemos una auténtica y propia «liturgia del camino», que precede a la de la Palabra y a la del Pan partido y nos comunica que, en cada uno de nuestros pasos, Jesús está a nuestro lado. Los dos discípulos, golpeados por el escándalo de la Cruz, están volviendo a su casa recorriendo la vía de la derrota: llevan en el corazón una esperanza rota y un sueño que no se ha realizado. En ellos la alegría del Evangelio ha dejado espacio a la tristeza. ¿Qué hace Jesús? No los juzga, camina con ellos y, en vez de levantar un muro, abre una nueva brecha. Lentamente comienza a trasformar su desánimo, hace que arda su corazón y les abre sus ojos, anunciándoles la Palabra y partiendo el Pan. Del mismo modo, el cristiano no lleva adelante él solo la tarea de la misión, sino que experimenta, también en las fatigas y en las incomprensiones, «que Jesús camina con él, habla con él, respira con él, trabaja con él. Percibe a Jesús vivo con él en medio de la tarea misionera» (Evangelii Gaudium, 266)”.

Estas son las verdades fundamentales que nos transmite el evangelio de hoy, pero ahora hay que apropiárselas. En efecto, al meditar el texto evangélico tratamos de encontrar algo que tenga sentido para nuestra vida hoy; y para hacerlo lo mejor es ponerse en el lugar de uno de los discípulos de Emaús. De hecho, sólo se da el nombre de uno de ellos, Cleofás, mientras el otro permanece anónimo. Pues bien, hay quien piensa que la intención de esta omisión es para que cada lector ponga el propio nombre allí. Se trata, entonces, de contarle al Señor, libremente, aquella situación de mi vida que me genera tristeza y desaliento; o hablarle de aquella cruz-sufrimiento-defecto-límite-pecado que me tiene paralizado, que me bloquea o de la que vivo huyendo. Abrirle a Jesús mi corazón y contarle mi visión de la realidad que me oprime. 

También nosotros vamos de camino, buscamos y esperamos que algo cambie. Y vamos cansados de hacer el mismo recorrido, los mismos kilómetros de cada día. Caminamos con la vista cansada. Con los oídos cansados. Con el corazón cerrado por el ritmo inexorable de lo cotidiano...Bajando los brazos... Es el comento de descubrir la presencia de Jesús Resucitado en nuestra vida para recuperar la alegría y la esperanza.

Otra opción es pensar que puede ser el camino de un matrimonio desolado, dos personas que recorren el camino juntos, pero sin hacer presente al Señor. Y necesitan que Él esté a su lado para superar esos momentos difíciles (por ejemplo: noche de la infidelidad, de la falta de trabajo, de la incomprensión de los hijos...). 

Podría ser también el camino de dos muchachos desorientados que recorren su camino con el gran vacío del mundo, llenos de ansiedad y de inseguridad, de oscuridad. Y que van hablando de muerte pues no ven nada más allá de ella y piensan que en ella todo termina. Que no pueden esperar más, que quieren ser libres, pero buscan la libertad que les da un falso libertador. No pueden ver a Jesús, Vivo y que los quiere vivos.

Después de esto, nos conviene hacer silencio y dejar que el Señor ilumine, con su Palabra (las Escrituras) esta situación haciéndome saber que él está vivo, camina junto a mí y con la fuerza de su resurrección puede iluminar toda mi oscuridad, darle sentido a toda situación negativa; puede reanimar todo desaliento y enfervorizar todo desencanto. 

Acerca de la conversión o cambio que vivieron los discípulos de Emaús y que tenemos que vivir nosotros decía el Papa Francisco en el Regina Coeli del 26 de abril de 2020: “pasar de los pensamientos en torno a mí mismo a la realidad de mi Dios; pasar —con otro juego de palabras— del “si” al “sí”. Del “si” al “sí”. ¿Qué significa eso? “Si Él nos hubiera liberado, si Dios me hubiera escuchado, si la vida hubiera sido como yo quería, si tuviera esto y aquello...”, en tono de queja. Este “si” no ayuda, no es fecundo, no nos ayuda ni a nosotros ni a los demás. Aquí están nuestros “si”, similares a los de los dos discípulos... Pero pasan al sí: “sí, el Señor está vivo, camina con nosotros. Sí, ahora, y no mañana, nos ponemos en marcha de nuevo para anunciarlo”. “Sí, puedo hacer esto para que la gente sea más feliz, para que la gente sea mejor, para ayudar a tanta gente. Sí, sí, puedo”. Del si al sí, de las quejas a la alegría y a la paz, porque cuando nos quejamos, no estamos en la alegría; estamos grises, grises, ese aire gris de tristeza. Y eso ni siquiera nos ayuda a crecer bien. De si a sí, de la queja a la alegría del servicio”.

La finalidad o meta de la meditación es despertar el deseo de la Presencia del Señor en mi vida. Despertar el deseo de ser iluminado, consolado por la presencia de Jesús Resucitado. Y este deseo se transforma en oración: ¡Quédate con nosotros, Señor, porque anochece, porque sin Ti todo el oscuridad y temor. Quédate con nosotros porque te necesitamos para vencer el desaliento y la falta de fe!

También podemos hacer nuestra esta oración del Papa Benedicto XVI en Aparecida:


Quédate con nosotros, Señor, acompáñanos aunque no siempre hayamos sabido reconocerte. Quédate con nosotros, porque en torno a nosotros se van haciendo más densas las sombras, y tú eres la Luz; en nuestros corazones se insinúa la desesperanza, y tú los haces arder con la certeza de la Pascua. Estamos cansados del camino, pero tú nos confortas en la fracción del pan para anunciar a nuestros hermanos que en verdad tú has resucitado y que nos has dado la misión de ser testigos de tu resurrección. 

Quédate con nosotros, Señor, cuando en torno a nuestra fe católica surgen las nieblas de la duda, del cansancio o de la dificultad: tú, que eres la Verdad misma como revelador del Padre, ilumina nuestras mentes con tu Palabra; ayúdanos a sentir la belleza de creer en ti. 


Quédate en nuestras familias, ilumínalas en sus dudas, sostenlas en sus dificultades, consuélalas en sus sufrimientos y en la fatiga de cada día, cuando en torno a ellas se acumulan sombras que amenazan su unidad y su naturaleza. Tú que eres la Vida, quédate en nuestros hogares, para que sigan siendo nidos donde nazca la vida humana abundante y generosamente, donde se acoja, se ame, se respete la vida desde su concepción hasta su término natural. 


Quédate, Señor, con aquéllos que en nuestras sociedades son más vulnerables; quédate con los pobres y humildes, con los indígenas y afroamericanos, que no siempre han encontrado espacios y apoyo para expresar la riqueza de su cultura y la sabiduría de su identidad. Quédate, Señor, con nuestros niños y con nuestros jóvenes, que son la esperanza y la riqueza de nuestro Continente, protégelos de tantas insidias que atentan contra su inocencia y contra sus legítimas esperanzas. ¡Oh buen Pastor, quédate con nuestros ancianos y con nuestros enfermos. ¡Fortalece a todos en su fe para que sean tus discípulos y misioneros! 



PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):


Entrarás con nosotros…

 

Insistimos Señor, pasa, entra a nuestra casa

Siempre podemos celebrar con nuestro poco

La alegría de salirnos al encuentro

Conversar contigo será el tesoro escondido…

 

Y podrás sentarte a observar los preparativos

Irá la conversación hacia la historia de los Hechos

Los inolvidables acontecimientos…

Prepararemos la mesa con el pan y un vino nuevo.

 

Observarás nuestra mirada confusa

Hombres duros de entendimiento

Pero el corazón latirá tan fuerte

Sospechará lo deseado: ¡Dios no está muerto!

 

Y nos abrirás los ojos y se llenarán de lágrimas

Será la amargura enterrada en el festejo

Nada se comparará a tenerte tan cerca

Viéndote partirnos el Alimento.

 

Revestido de tu gloria estarás

Frente a nuestro altar tan modesto

Y tu sonrisa quedará sellada en la memoria

Por el Espíritu Eterno. Amén.