VIGÍLIA E PÁSCOA-A

PÁSCOA DO SENHOR

08 e 09/04/2023

LINK AUXILIAR:

AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


1ª Leitura: Atos 10,34a.37-43

Salmo Responsorial 117(118) R Este é o dia que o Senhor fez para nós: alegremo-nos e nele exultemos! Aleluia, Aleluia, Aleluia!  

2ª Leitura: Colossenses 3,1-4 

   ou

 1 Coríntios 6b-8

Evangelho: João 20,1-9 

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo João 20,1-9 1No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao túmulo de Jesus, bem de madrugada, quando ainda estava escuro, e viu que a pedra tinha sido retirada do túmulo. 2Então ela saiu correndo e foi encontrar Simão Pedro e o outro discípulo, aquele que Jesus amava, e lhes disse: 'Tiraram o Senhor do túmulo, e não sabemos onde o colocaram.' 3Saíram, então, Pedro e o outro discípulo e foram ao túmulo. 4Os dois corriam juntos, mas o outro discípulo correu mais depressa que Pedro e chegou primeiro ao túmulo. 5Olhando para dentro, viu as faixas de linho no chão, mas não entrou. 6Chegou também Simão Pedro, que vinha correndo atrás, e entrou no túmulo. Viu as faixas de linho deitadas no chão 7e o pano que tinha estado sobre a cabeça de Jesus, não posto com as faixas, mas enrolado num lugar à parte. 8Então entrou também o outro discípulo, que tinha chegado primeiro ao túmulo. Ele viu, e acreditou. 9De fato, eles ainda não tinham compreendido a Escritura, segundo a qual ele devia ressuscitar dos mortos. Palavra da Salvação.

ou

 nas missas vespertinas Lucas 24,13-35


 Dom Júlio Endi Akamine, arcebispo de Sorocaba SP  

Jo 20,1-9

No quadro dos acontecimentos da Páscoa o primeiro elemento é o túmulo. Ele é mencionado explicitamente 7 vezes ao longo de 9 versículos (só em dois não aparece essa palavra). Outro detalhe (que não é um detalhe) é que o túmulo está vazio. Trata-se de um sinal essencial. Com efeito, não havia dúvida quanto à sepultura de Jesus: José de Arimatéia e Nicodemos tinham deposto o corpo de Jesus no túmulo, e agora Jesus não está mais lá.

Maria Madalena tinha chegado ao túmulo de manhã bem cedo antes do amanhecer. Ela esperou todo o sábado e a noite do dia seguinte, mas se levanta impaciente de madrugada. Ela está ainda envolta nas trevas da dor. Aquela mulher continua a amar o Mestre, mesmo depois de sua morte. Por isso ele vai ao túmulo: deseja encontrar o cadáver de Jesus, que é sinal de sua presença. É uma pobre consolação, porque o corpo de um falecido é sinal de uma presença de alguém ausente. Madalena quer oferecer ao mestre a homenagem do seu amor, um amor impotente porque o mestre morto não pode mais corresponder a seu amor.

Por isso, quando ela chega ao túmulo vazio, experimenta uma outra dor e uma outra decepção. “Tiraram o Senhor do túmulo e não sabemos onde o colocaram”. Essa é a primeira interpretação do sinal do túmulo vazio: um cadáver não pode sair sozinho e, por isso, alguém deve ter roubado o corpo de Jesus. De qualquer forma, Maria Madalena desempenha a missão de ser anunciadora para os outros discípulos do túmulo vazio.

Simão Pedro e o discípulo amado saem correndo para ver o que tinha acontecido. Os outros discípulos estão muito amedrontados para sair. Somente os dois saem.

Pedro é o chefe indiscutido; mas o outro discípulo é o predileto. Numa espécie de competição os dois correm. Por ser mais jovem, por ter mais energia, por amar mais, o outro discípulo chega antes ao túmulo. Ele viu as faixas de linho que envolviam o corpo de Jesus no chão, constata que o corpo de Jesus não está no túmulo, mas não entra nele. Espera Pedro; só entra depois dele.

Pedro entra no túmulo e constata o que o outro discípulo já tinha vista do lado de fora: as faixas de linho deitadas no chão e o pano que cobria o rosto de Jesus, não posto com as faixas, mas enrolado em lugar à parte. Os dois constatam que não foi roubo de cadáver: o túmulo está vazio, mas não por causa de roubo de cadáver. Com efeito, quem rouba cadáver carrega-o sem ter o cuidado de desenrolá-lo das faixas. Se não foi roubo de cadáver, o que foi então?

O evangelho diz que o outro discípulo entrou e que ele “viu e acreditou”. Os lençóis de linho são sinais da morte que Jesus deixou para trás. Ao constatar a ausência de Jesus, o discípulo amado descobre uma realidade. Ele não tem necessidade de ver Jesus para crer. Ele constata que Jesus não está envolto nos panos de linho porque está vivo.

Jesus ressuscitado se manifestou primeiramente com os sinais de sua ausência: o túmulo vazio, as faixas de linho, o sudário, deitados no chão e a mensagem da Madalena. Depois Jesus se manifestará de modo misterioso: como o jardineiro, o forasteiro que caminha para Emaús, o homem que vem para comprar peixes dos pescadores. Por fim, Jesus se manifestará corporalmente com sua voz e com os sinais da paixão.

Ao mesmo tempo, os discípulos vão progredindo na fé. Primeiro creem sem ver como o discípulo amado; depois reconhecem Jesus ressuscitado pela voz, pela visão e pelo tato como Maria Madalena. Por fim, é o grupo todo que reconhece Jesus vivo, mesmo que haja um teimoso e atrasado que exige ver para crer.

Todas as aparições são acompanhadas de uma missão. A aparição a Maria Madalena a faz Apóstola dos Apóstolos. A aparição aos apóstolos os transforma em portadores dos dons da paz, do Espírito Santo e do Evangelho a todo o mundo. A aparição a Tomé comunica a ele a bem-aventurança de crer sem ter visto. 


VIGÍLIA PASCAL  


Sábado Santo – Vigília Pascal - Mt 28,1-10 – A – 08-04-2023


“Jesus apareceu primeiro às discípulas às mulheres”- Tomé McGrath


Neste dia, o primeiro dia depois do sábado, início de uma nova semana, começa um novo tempo, o tempo da vitória do amor sobre a morte. É o tempo em que Jesus, o Senhor vivo, "vem" ao encontro dos homens e mulheres que procuram dar sentido à sua vida; é o tempo em que os discípulos de Jesus, sem o terem visto, convencidos de que está vivo, procuram segui-lo e conformar a sua vida à sua própria existência. Este dia marca uma virada na história. É a Páscoa do Senhor, o Dia do Senhor! 

O que aconteceu, na madrugada daquele dia? Todos os Evangelhos nos dão um testemunho uniforme: o túmulo em que Jesus foi sepultado está vazio. Depois do sábado, na madrugada do primeiro dia da semana, as mulheres que testemunharam a morte de Jesus na cruz, e acompanharam o seu sepultamento vem até o túmulo de Jesus, para "contemplar" o sepulcro.  O seu carinho pela pessoa de Jesus empurrou-as a ir ao lugar onde Jesus foi colocado, porque elas continuam a serem atraídas pelo mestre e profeta. São Maria Madalena e a outra Maria, que veio da Galileia para Jerusalém com Jesus. 

Naquele momento estão ausentes os discípulos. Está presente somente as mulheres, as discípulas, que agora se tornam as primeiras testemunhas da Ressurreição. Assim que elas se aproximam do túmulo, o indizível acontece: uma revelação de Deus e um anúncio é dado às mulheres. A própria terra parece participar dessa revelação - tremendo - como um terremoto, e um mensageiro do Senhor desce do céu, enviado por Deus, com o rosto resplandecente de luz e as vestes resplandecentes. 

Aqui temos as imagens do Antigo Testamento que tentam retratar o mistério que não pode ser dito em palavras e, ao mesmo tempo, é a descrição do medo que sempre toma conta de quem se aproxima de Deus. Um anjo desce do céu e rola a grande pedra que fechava o sepulcro, a pedra que havia sido colocada pelos guardas e pelas autoridades religiosas. A pedra que fechava o túmulo, sinal da morte, é retirada pelo mensageiro que, sentado sobre ela, proclama que a morte não venceu, que a morte não tem mais a última palavra. O anjo se impõe aos guardas, que "estão abalados e permanecem como mortos".  

O mensageiro dirige-se às mulheres, dizendo: “Não tenham medo! Eu sei que vocês estão procurando Jesus, o crucificado. Ele não está aqui. Ele ressuscitou como ele havia dito. Venham, observem o lugar onde ele estava deitado”. O mensageiro as tranquiliza confirmando que sabe o que elas procuram: Jesus! Procuravam aquele que foi crucificado, aquele que morreu na cruz e foi sepultado. Mas o túmulo está vazio, e isso é um sinal para passar da incerteza à fé. No sepulcro vazio não há nenhuma prova da Ressurreição: de fato, chegaram até dizer que os discípulos roubaram o corpo, que Jesus não morreu, mas fugiu; outras explicações poderiam ter sido apresentadas... Mas o que é decisivo é que no anúncio: “Ele não está aqui. Ressuscitou”.

Assim as mulheres iniciam o processo de recordar, de reviver as palavras de Jesus como confiáveis. É assim que a fé nasce nelas: lembrando as palavras de Jesus, recordando o Antigo Testamento, interpretando tudo isso à luz do sepulcro vazio, elas acolham à revelação: "Jesus, o crucificado, ressuscitou, está vivo!". E assim que as mulheres passam a entenderem o acontecimento do túmulo vazio, sentem imediatamente o impulso, o desejo, a força de anunciar o fato. Eles devem ir até os discípulos assustados, que estão fechados na casa em Jerusalém, para anunciar-lhes a boa nova da ressurreição de Jesus, e os mande a ir até a Galileia encontrar com Ele. Isso vai acontecer no lugar do primeiro chamado feito por Jesus, onde Jesus havia entrado na vida deles. Era para lá que precisavam voltar, não como lugar geográfico, mas um lugar existencial. É voltar ao início para recomeçar e assim superar o momento da negação, do abandono do Senhor, da própria queda. 

As mulheres correm, saem às pressas do túmulo, que já não tem mais sentido para elas e, convencidas de que Jesus está vivo, ressuscitado, vão levar a Boa Notícia aos seus discípulos. Sim, as mulheres foram as primeiras destinatárias do anúncio da Páscoa, e foram enviadas aos que se consideraram em sidos os escolhidos e enviados – os apóstolos do Senhor. 

Aqui nós temos um dado ainda hoje não muito bem aceito pela cultura eclesiástica...  É um fato inegável, que não pode ser esquecido, ou lembrado de forma superficial, mas que deve nos questionar, e ser fonte de questionamentos para a cultura cristã dominante nas nossas igrejas, todas elas. Aquela manhã da Páscoa, aquele início de vida nova, tem como protagonistas as discípulas: os homens ficam dentro de casa, os sacerdotes e escribas continuam convencidos de que Jesus está morto. Eles até subornam os guardas para testemunhar falsamente E o povão vive a habitual indiferença de não perguntar ou fazer nada.  

Mateus nos diz que as discípulas não apenas anunciaram a fé Pascal aos discípulos, mas puderam ver uma manifestação de Jesus ressuscitado. Jesus vem encontrar com elas, como para agradecer a missão que vão desempenhar com os discípulos, e as saúda dizendo: "Alegrem-se!”. Aproximam-se então de Jesus e apertam-lhe os pés, isto é, caem por terra e prostrados, abraçam-lhe os pés, provando que ele está vivo, manifestam-lhe o seu fiel afeto, regozijam-se porque a sua morte não foi um fracasso, mas uma passagem (uma “Páscoa”) para a vida nova, a vida eterna de Deus. Jesus, em resposta, dá-lhes a ordem já dada pelo mensageiro: “Não tenham medo; ide dizer a meus irmãos que se dirijam à Galileia: lá me verão”. 

Esta ordem de ir para a Galileia significa: “Reorganizem de novo a comunidade depois da dispersão ocorrida em Jerusalém. Retomem juntos o caminho da fé e comecem a anunciar a boa nova da Ressurreição, porque este é o fundamento do Evangelho”. É este evento da ressurreição que as discípulas e os discípulos, os evangelistas e todos os cristãos vão contar, interpretar, celebrando assim a sua fé até hoje. Cristo ressuscitou: esta é a nossa fé. Jesus venceu! Jesus está vivo! Jesus está no meio de nós. 

Baseado numa reflexão por Enzo Bianchi



Um longo e esperançoso sábado santo- Pe Adroaldo Paloro


“Eles pegaram o corpo de Jesus e o envolveram, com os perfumes, em faixas de linho...” (Jo 19,40)


Sábado Santo é o dia da “solidão dos vivos”: Jesus ausente; os discípulos escondidos e cheios de medo; a dor de Maria e das mulheres discípulas.... 

Domina na comunidade cristã um ambiente carregado de morte, um dia esvaziado de toda esperança.

No caminho do seguimento de Jesus também há sábados santos, tanto no nível pessoal como comunitário. Noites escuras, silêncios carregados de tristeza, incapacidade para orar e falta de esperança.

Mas este dia também nos ajuda a ressignificar o sentido da solidão. Há solidão vazia, que deprime..., mas há solidão que nos faz ter acesso a dimensões desconhecidas de nossa vida.

É preciso, com Jesus, descer ao túmulo de nossa interioridade, transitar por espaços e dimensões não integradas e nem pacificadas. Só quem mergulha nas profundezas de sua existência é capaz de morrer às exigências do “ego” e vislumbrar as potencialidades de vida que ainda não foram ativadas. “Se o grão de trigo que cai na terra, não morre, fica só” (Jo 12,24).

Este espaço de silêncio não é de morte, mas de vida germinal, é noite que aponta à aurora, são as noites escuras da vida que desembocam na alegria da alvorada; é tempo de fé e de esperança, é momento de semear, mesmo que não vejamos os resultados, é tempo de crer que o Espírito do Senhor, criador e doador de vida, está fecundando a história e a terra para seu amadurecimento pascal e escatológico, para a terra nova e o céu novo. 


Todos queremos fugir da solidão: queremos escapar de nós mesmos, ocultar nossa fragilidade e impotência, distanciar de nossa responsabilidade. Com isso, nos refugiamos no ativismo, nas distrações da superficialidade, na conexão descompromissada... E assim desembocamos numa solidão egoísta, sem espírito e nem vida, sem amor aos outros, sem verdadeira companhia.

Um dos maiores problemas de nosso mundo ocidental é a falta de solidão verdadeira: temos medo de enfrentar a realidade, de viver em profundidade, de doar nossa vida em transparência. Temos medo de estar sozinhos. Por isso nos cercamos do espetáculo da vida impessoal, dos meios de comunicação, de notícias sem fim. Dessa forma inventamos solidões sem comunicação, comunicações sem solidão e sem encontro pessoal. E enquanto isso, há milhões de pessoas condenadas à solidão da doença, da fome, da exclusão, morrendo, como Jesus, em uma Cruz. 


Sábado Santo vem nos dizer que só aquele(a) que se conhece e se aceita na solidão, pode sair de si mesmo(a) para viver o encontro. Só um verdadeiro solitário no amor pode ser solidário, só um coração desprendido pode atrair e congregar no amor os outros, formando com eles uma “rede” de vida. Dessa forma, a intimidade do solitário, que é senhor de si mesmo, se transforma em comunhão de vida que enriquece. Esta é a solidão para o encontro, uma intimidade para a companhia.

Na paciente espera pelo Deus Amor, descobrimos o quanto Ele já preencheu nossas vidas. Nossa relação com Ele fica mais profunda e mais madura através da experiência purificadora da sua ausência (assim como duas pessoas que se amam, redescobrem-se depois de longos períodos de ausência).

Dando ouvidos a nossos anseios, ouvimos Deus como Criador.

Tocando o centro de nossa solidão, sentimos que fomos tocados por mãos misericordiosas.

Sentindo nosso infinito desejo de amor, compreendemos que só podemos amar por termos sidos amados antes e que podemos oferecer nossa intimidade apenas porque nascemos da intimidade de Deus.


Sábado Santo, portanto, é o dia do lamento e da espera paciente, carregada de esperança. Acompanhamos Maria e os(as) discípulos(as) neste silêncio denso, nesta espera confiante. 

Algo pulsa em nosso eu profundo, rebelando-se contra toda apatia e nos recordando a faísca de esperança ali presente. Escutemos nosso interior, em meio ao silêncio!

Contemplemos a espera angustiada de mundo, dos povos, das pessoas. Contemplemos o mundo e a humanidade em seu sábado santo, em seu dia de silêncio, em seu isolamento social.

Esse parece ser o estado da humanidade neste momento; um estado de paralização e de espera que parece não ter saída. Envolve-nos a obscuridade; estamos no túnel e não vemos a saída. O corpo da humanidade encontra-se ferido, des-vitalizado. Não é a morte, mas tampouco é a vida.

Como os discípulos de Emaús, somos fustigados pela incredulidade, pelo desencanto. Ainda não há razões fortes para esperar. Experimentamos o Deus na noite escura, o Deus ausente. Parece que guarda silêncio e que não lhe importa que “desçamos aos infernos”.

Nosso mundo carrega as feridas da doença e da morte; geme em dores de parto. “Sabemos que toda a Criação, até o presente, está gemendo como que em dores de parto, e não só ela, mas também nós, que temos as primícias do Espírito, gememos em nosso íntimo, esperando a condição filial, a redenção de nosso corpo” (Rom 8,22-23).

Só há uma pequena luz que permanece acesa da casa do discípulo amado, na casa daquele a quem Jesus confiou sua Mãe, no momento de sua morte. A Mãe é o símbolo da esperança no Sábado Santo. É o dia “mariano” por excelência. Nunca, como neste dia, ela se sentiu tão só, tão sem corpo. Mas, com certeza, o Abbá de Jesus tinha para ela um segredo, um advento inesperado: o momento de exclamar: “tu és o meu Filho, eu hoje te gerei” (Heb. 1,5).

As mães geram a vida; por isso, custa-lhes crer na morte. Maria continua crendo na vida; ela é mãe demais para esquecer. Seu filho é muito Filho para morrer.


Envolve-nos a noite de uma crise global que afeta a todos de maneira igual; mas, a “noite sabática” reacende a paixão pela vida, desafio mais urgente de nosso tempo; paixão por toda expressão de vida, especialmente pelas vidas mais ameaçadas. Dar vida foi a paixão de Jesus, expresso nestas palavras: “Eu vim para que todos tenham vida e vida abundante” (Jo. 10,10). Dar vida, protegê-la, curá-la, cuidá-la, defender sua dignidade, denunciar tudo o que a ameaça e lutar contra isso foi o que levou Jesus a perder sua própria vida. Tal é a disposição que hoje precisamos cultivar para iluminar a noite de nosso tempo.

Lentamente, o olhar se faz penetrante, o ouvido se faz sensível, o tato se faz delicado e o imperceptível se faz concreto; o longínquo torna-se próximo, o desconhecido torna-se familiar, o extravio torna-se direção, a solidão torna-se companhia, o ignorado torna-se revelação.

A noite é o tempo do mistério e da promessa, é o lugar da espera e da realização, o espaço do desejo e do encontro, da invocação e da revelação, do sofrimento e da paixão, do silêncio e da oração, da vida e da morte... Na noite o que conta, o que vale não se diz, não se vê, não se sabe: deseja-se, espera-se, recebe-se, realiza-se. Não é um simples eco aquela voz que anuncia no escuro o início do cumprimento de uma promessa que vem de longe e traz luz, festa, alegria, canto...

A fidelidade da promessa ouvida na noite é uma semente. Existe, mas tem necessidade de permanecer escondida. Realiza-se, mas exige habitar espaços de penumbra.


Textos bíblicos:  Mc 15,42-47   Jo19,38-42


Na oração: “A espera paciente e expectante é o fundamento da vida espiritual” (Simone Weil).

A humanidade inteira, frente à pandemia do Coronavírus, vive uma espera angustiante, muitas vezes impaciente, vazia, sem sentido...

- Sábado Santo é tempo não só de espera, mas de esperança, é deixar que o grão de trigo morto comece a germinar, é tempo de imaginar, de criar, de abrir-se a algo novo e inesperado, de sonhar um mundo melhor e uma humanidade mais samaritana. 

- É preciso envolver este “sábado santo da vida” com os perfumes da compaixão, solidariedade, comunhão...


Se o túmulo está vazio, o motivo é nosso coração estar cheio- Luiz Alexandre Solano Rossi

I. Introdução geral

            A Vigília Pascal constitui o âmago de todo o ano litúrgico. Ela pode ser considerada a mãe de todas as vigílias, e, por isso mesmo, é fundamental que todos participem dela e vivam essa experiência. A vigília começa após o pôr do sol, no sábado santo, fora da igreja, onde o fogo é abençoado pelo celebrante. Esse fogo simboliza o esplendor do Cristo ressuscitado dissipando as trevas do pecado e da morte. Apresentamo-nos como discípulos do Ressuscitado com uma única palavra nos lábios – “Eis-me aqui” – e com a disposição para seguir o mesmo caminho trilhado por ele. Da escuridão nascerá a luz de Cristo. Jamais nossos caminhos serão marcados pela escuridão. Nele e por causa dele, a luz brilhará eternamente em nosso coração a fim de que possamos também iluminar a vida daqueles que nos cercam. A Vigília Pascal se divide em quatro momentos: 1) liturgia da luz – o fogo é abençoado e torna-se novo para nós. Acende-se o círio pascal, o mesmo fogo que guiou o povo do Antigo Testamento na caminhada rumo à terra prometida; 2) liturgia da Palavra – todas as leituras e salmos recordam a ação de Deus no meio do seu povo. Pela proclamação da Palavra, a morte foi vencida, tudo se fez novo, agora só há luz e vida; 3) liturgia batismal – os novos cristãos são acolhidos pela comunidade. Todos os santos são invocados para interceder por aqueles que serão batizados, e estes professarão a fé; há a renovação das promessas batismais daqueles que já receberam o sacramento. Sendo assim, todos são batizados pela ressurreição de Jesus; 4) liturgia eucarística – o Cristo proclamado na Palavra como Ressuscitado é o mesmo da Eucaristia. A Palavra e a Eucaristia são alimentos essenciais para a vida dos batizados.

II. Comentários aos textos bíblicos

(Os comentários sugeridos abaixo referem-se apenas a duas leituras das 8 possíveis para a vigília)

I leitura: Gn 22,1-18[F1] 

Levantar-se cedo indica a prontidão de Abraão e seu desejo de obedecer. Diante do chamado, ele responde prontamente: ”Eis-me aqui!” (v. 1). Estou presente! Eu não fujo! É a expressão de quem assume o projeto divino. Resposta de quem é chamado por Deus para uma missão. Diante do Deus que chama, não cabe qualquer outra resposta que não seja “eis-me aqui”. Quando o profeta Isaías foi chamado, sua resposta foi semelhante. Quando Deus nos chama, não há outra possibilidade válida a não ser nos apresentarmos diante dele. Isso não depende absolutamente de nossa boa vontade, se desejamos ou não, se estamos dispostos ou tomados pela preguiça, se temos talentos ou nos achamos incapazes de servir. Absolutamente não! Ao ouvirmos a voz de Deus nos chamar, devemos ouvir atentamente e, com espírito de servos, seguir os passos a nós destinados.

Um dos muitos nomes pelos quais Deus pode ser conhecido é Providência. Em meio a tantas lutas e desafios que enfrentamos diariamente, devemos ter a plena certeza de que Javé é o Deus de toda a providência. Diante dos temores de que alguma coisa nos falte, devemos recuperar a mensagem de Abraão e meditar nela. Ele, num momento marcado pela angústia e pela incerteza, pela contradição e por um desafio enorme, levanta os olhos (cf. v. 13). Não permanece com os olhos presos ao chão e a respostas humanas. Levanta os olhos como se estivesse à procura de uma saída e, ao fazê-lo, enxerga a resposta. Seus olhos encontram a resposta dada por Deus. Este já havia providenciado tudo quanto era necessário para resolver os maiores temores de Abraão. O patriarca já havia experimentado a presença do Deus peregrino, do Deus todo-poderoso, do Deus do impossível, e, agora, o Deus da providência estava bem à sua frente. É importante saber e reconhecer que o Deus da providência conhece cada uma das nossas necessidades e, mais do que isso, caminha alguns passos à nossa frente. Não estamos a mercê das contradições deste mundo. Podemos ter a plena certeza de que o Deus que caminha ao nosso lado providencia as soluções necessárias e definitivas. A experiência de Abraão foi tão significativa, que o lugar ficou conhecido como aquele em que Deus providenciou a resposta (cf. v. 14). O povo de Deus, quando no deserto, experimentou de muitas maneiras a providência divina. Possivelmente a história da providência de Deus, alimentando-os com o maná, tenha se refletido na maneira de viverem. Contudo, tanto a história do maná quanto muitas outras existentes na Bíblia são relatos distantes de cada um de nós. Precisamos perguntar sobre nossas próprias experiências! Afinal, o Deus da providência é o mesmo ontem, hoje e será para sempre! Às vezes, no entanto, é tão difícil confiar na providência de Deus. A exemplo de Abraão, cabe-nos aprender que ser dependentes de Deus não representa nenhum contratempo, porque ele sempre há de se manifestar como o “Deus da providência”.

II leitura: Is 55,1-11

A leitura traz um oráculo dirigido aos pobres. A situação deles é por demais crítica, pois carecem de alimentos básicos para a sobrevivência. A vida deles se encontra ameaçada. Correm, na verdade, o risco de morrer antes do tempo. Morrerão não porque seja vontade de Deus ou porque não tenham nenhum projeto de vida pelo qual valha a pena lutar. A morte se aproxima deles por mãos de outros: dos injustos e violentos que os ameaçam e, com isso, agridem a imagem de Deus neles. Encontramos no texto interessante releitura da tradição davídica, ao afirmar a dimensão comunitária da aliança; ou seja, Deus faz aliança diretamente com o povo. Nesse sentido, o poder, que nas mãos dos reis era geralmente utilizado para oprimir o povo mediante a cobrança de impostos, é, agora, entregue à comunidade a fim de que viva a prática da justiça e do direito.

Evangelho: Mt 28,1-10

            Se o Império Romano produz morte, a ação de Deus produz vida. Há completa desestabilização e inversão de papéis no relato do evangelho: Jesus é ressuscitado e os guardas que cuidavam do túmulo “ficaram como mortos” (v. 4). Grande alegria invade as mulheres ao receberem a mensagem do anjo. Elas são as primeiras testemunhas da ressurreição. São as protagonistas do maior e mais fundamental evento da vida cristã. As mulheres discípulas fazem o primeiro anúncio. Pode-se até mesmo dizer que são as mulheres que evangelizam os discípulos nesse momento. Deve-se observar que o conteúdo da mensagem que elas anunciarão é, como o próprio anjo identifica, “Jesus, o crucificado” (v. 5). Nesse caso, a ressurreição é um dos sinais principais de que a violência do império contra Jesus e contra todos os pobres jamais terá a última palavra. Anunciar que Jesus, o Crucificado, ressuscitou é uma mensagem contracultural.

Enquanto as mulheres correm em direção aos discípulos, Jesus lhes aparece e sua primeira palavra como ressuscitado é: “Alegrem-se” (v. 9). Ressurreição é sinônimo de alegria. A morte foi vencida e, por isso, é necessário vibrar de alegria. O império da morte e da violência foi vencido, alegrem-se. O projeto de justiça, fraternidade e misericórdia de Jesus está vivíssimo, alegrem-se. Vida e alegria aproximam-se de tal forma em Jesus, que ficamos surpresos. Viver com alegria mesmo em meio à violência do império – de ontem e de hoje – é consequência do Ressuscitado entre nós. A ressurreição implica, dessa forma, repensar a vida desde o avesso – ou desde o contrário; representa resistência em meio à violência, alegria em meio à tristeza, protagonismo em meio à sujeição.

III. Pistas para reflexão

1) Talvez possamos absorver a real intensidade da experiência abraâmica alterando os termos que ali aparecem para sentir o forte impacto das palavras: retiremos, por alguns momentos, o nome de Abraão e insiramos nosso próprio nome. Conseguimos notar a diferença? Como responderíamos? Saibamos que Deus não se confunde nem, muito menos, nos confunde. Ele nos chama pelo nome a fim de vivermos intensamente seu projeto. O princípio é bem claro: o chamado é sempre individual. Dessa forma, algumas perguntas se fazem urgentes: O que o Senhor quer de nós? Como podemos ser úteis para sua missão e para seu projeto de transformação deste mundo?

2) A presença do Cristo ressurrecto em nós tem a capacidade de nos libertar ou nos guardar do marasmo. Somente a força da ressurreição pode interromper os passos dados nos descaminhos da vida. Nele podemos repensar a vida, os caminhos, os projetos e a maneira de vivermos como discípulos. Basta tão somente dizermos: “Eis-nos aqui, Mestre”.

[F1]Registro que não está claro por que apenas duas leituras foram escolhidas para serem comentadas (das 8 possíveis, incluindo a carta do Novo Testamento) e por que justamente essas.


DOMINGO DE PÁSCOA


 Jo 20, 1-9- Ano A – 09-04-2023


Reflexão para o Domingo de Páscoa- VATICAN NEWS


Cristo, a Vida, venceu a morte e ressuscitou e, todos nós fomos redimidos e ganhamos a vida plena e feliz, para sempre!

Padre Cesar Augusto, SJ – Vatican News


Chegamos ao ponto mais alto da vida litúrgica e espiritual. Cristo, a Vida, venceu a morte e ressuscitou e, todos nós fomos redimidos e ganhamos a vida plena e feliz, para sempre!

Para muitas pessoas, a paixão, o sofrimento e a morte dizem mais que a celebração da Vida, haja vista o numeroso público presente em nossas igrejas na sexta-feira santa e a ausência na noite em que celebramos a Ressurreição e no dia seguinte, Domingo de Páscoa. O mesmo podemos dizer da presença forte nos funerais e a ausência nos casamentos e missas em ação de graças. Infelizmente o sofrimento e a morte, o luto, falam mais forte e mais alto que a celebração da Vida, que a alegria e o júbilo. Não deveria ser assim, se cremos que nosso Deus é o Deus da Vida, que venceu e destruiu a morte e que Jesus é a nossa alegria!  Maria foi a senhora das Dores, mas hoje ela é a senhora da Glória. Mesmo no momento mais duro, mais dolorido de sua vida, aos pés da cruz, vendo seu filho ser supliciado injustamente como um bandido, Maria não caiu, não desmaiou, mas permaneceu firme, porque acreditava nas palavras Dele, de que ressuscitaria.


A primeira leitura deste domingo, retirada do Livro dos Atos dos Apóstolos 10, 34.37-43, conclui relatando a fala de Pedro: “Todo aquele que crê em Jesus recebe, em seu nome, o perdão dos pecados.” Esse é o legado do Senhor, nossa redenção, nossa filiação divina, o perdão de nossos pecados, a Vida Eterna.


A segunda, Colossenses 3, 1-4, nos incentiva a “alcançarmos as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus” e a promessa de que nos revestiremos de glória quando Cristo, nossa vida, aparecer em seu triunfo.


Finalmente, o Evangelho, extraído de João 20, 1-9, nos relata a nova criação.    “No primeiro dia da semana...” João relata a criação redimida, o primeiro dia, agora denominado “dies dominica”, dia do Senhor, domingo, marcado não pelo descanso do Senhor como está em Gênesis 2, 1-3, o sétimo dia, mas como o primeiro Gen 1, 1-3 onde Ele separa a luz das trevas, acabando com o caos e agora, inicia a nova criação, dando ao homem a imortalidade e a felicidade sem fim.


Maria Madalena vai ao túmulo ainda quando está escuro, não apenas no tempo, mas também dentro dela, pois seu senhor, seu amado estava morto, assim ela acreditava. Ela encontra o túmulo aberto, sem o corpo de Jesus e o clima interno piora. Diz Jo 20, 11-18 que ela não se cansava de olhar para baixo, para o túmulo vazio e não enxergava mais nada até que homens com vestes brilhantes a questionaram por que chorava tanto e ela fala do desaparecimento do corpo do Senhor. Maria ouve a voz do Senhor, mas crê que seja o jardineiro. Ele havia ressuscitado como prometera. Também nós, enquanto ficarmos com nossos olhares e coração voltados para os sinais de morte e procurando o corpo do Senhor e não Ele ressuscitado, estaremos ‘pra baixo’ tomados pelo desânimo e pela dor. É necessário fazer um pequeno esforço e olhar para o alto, crermos na vitória da Vida.


Mas voltemos para a perícope escolhida para este domingo. Ela, a Madalena vai avisar Pedro e João, do sumiço do corpo de Jesus. Eles chegam ao túmulo, entram, veem as faixas de linho jogadas ao chão e o pano que cobrira a cabeça do Senhor, dobrado e colocado à parte. Diz o versículo 8, que João viu e acreditou. A notícia da ressurreição é tão extraordinária, que apesar de Jesus sempre falar nela, no momento propício para acreditar, todos ficam perplexos e com dificuldade para crer no que estão vendo, até que pela tarde, e com tudo fechado, Jesus aparece a eles, em Jo 20, 19-23. E nós, apesar de sabermos que por trás das nuvens escuras existe um céu azul com um sol brilhante, custamos a acreditar em nossa inteligência e ficamos presos aos nossos sentidos?


Neste tempo de pandemia, tempo longo, mais longo do que imaginávamos, cremos na ação de Deus através da ciência, já que foi Ele que a criou e nos deu o mandamento de dominar e transformar as coisas criadas para o bem nosso e de toda a Criação? A pandemia terá fim e será, não através de atos mágicos e de crendices, mas através da aliança fé e ciência, juntas para a maior glória de Deus e bem de toda a Humanidade!

Como saio após situações difíceis, doloridas? O mesmo, ou melhorado?

Como sairá a Humanidade depois desta pandemia? A mesma, com suas crenças e perversões ou melhorada, mais fraterna, solícita e colhedora?


RESSURREIÇÃO: quando os túmulos se esvaziam...- Pe Adroaldo Paloro


“Tiraram o Senhor do túmulo e não sabemos onde o colocaram” (Jo 20,2)


Em Jesus ocorre algo totalmente novo. Ele traz uma nova maneira de viver que não cabe em nossos esquemas, que não se encaixa em nossos hábitos, sempre limitados e estreitos. 

O “mistério pascal” é o salto para a novidade, para a beleza, para a transcendência. Imersos na história e na natureza, a Ressurreição nos faz descobrir a verdadeira extensão da Vida.

Não encontramos o Ressuscitado no sepulcro, mas na vida. Não encontramos o Ressuscitado enfaixado e paralisado pela morte, mas livre como a brisa da vida.


A pedra que fora removida do túmulo de Jesus indicou a Maria Madalena uma novidade que seu coração buscava, uma novidade que espanta, enche o coração do desejo de procura: “Ele vive”.

O caminho dela em direção ao túmulo é símbolo da coragem de atravessar o escuro da madrugada para ver resplandecer uma nova aurora em sua vida, pela força criadora da única Presença que tudo sustenta, tudo recria e enche de amor. A presença do Cristo Ressuscitado.

Na madrugada da Páscoa, Maria Madalena vai ao sepulcro; ela é símbolo daquela comunidade que se movia entre a luz e a obscuridade. Ainda vive focada no sepulcro (morte); por isso, “ainda estava escuro”. Mas, ao mesmo tempo, começava a clarear (“ao amanhecer”) e a “pedra estava removida” (a pedra da dúvida, da tristeza e da resignação fatalista). Tudo parece anunciar algo definitivamente novo: é “o primeiro dia da semana”; trata-se, nada menos, que de uma nova Criação.

Segundo os evangelistas, as mulheres são as primeiras testemunhas da ressurreição de Jesus Cristo, pois Ele aparece primeiramente a elas. Segundo Tomás de Aquino o motivo desta precedência é porque elas estavam melhor preparadas que os homens para entender e acolher a maravilha da Vida. 

E estavam melhor preparadas porque O tinham amado mais.


Na ressurreição, a vida emerge de forma misteriosa; ela se impõe, simplesmente. Tal realidade desperta fascinação, provoca admiração e veneração..., porque a vida é sempre sagrada. Diante dela ficamos exta-siados, boquiabertos, escancarados os olhos e afiados os ouvidos. Ela nos atrai por sua força interna. 

Portador de uma vida inesgotável, revelada na madrugada pascal, o ser humano vive para mergulhar em algo diferente, novo e melhor. A vida, desde o mais íntimo da pessoa humana, deseja ser despertada e ilu-minada em plenitude. Amar é romper a casca para que a vida se expanda na doação. A morte do falso “eu” é a condição para que a vida se liberte.

Vida plena prometida por Jesus: “Eu vim para que tenham vida e vida em abundância” (Jo. 10,10).

“Viver como ressuscitado” implica esvaziar-se do “ego”, para deixar transparecer o que há de divino. 

Quem se experimenta a si mesmo como “Vida” é já uma pessoa “ressuscitada” e isso faz a grande diferença, pois tem um impacto no seu modo de ser e de viver.

Marcadas pela ressurreição, as pessoas captam muitos detalhes que antes não haviam percebido, vivem intensamente, amam com mais paixão, prestam atenção a muitas coisas que antes lhes passavam desaper-cebidas. Tem um comportamento diferente para com os outros; há, nestas pessoas, mais ternura, são mais sensíveis à dor e à injustiça. Ao saborear o presente da vida, vivem como se fossem ressuscitadas.  Crêem que, amando mais a vida, se afastarão mais da morte e resistirão às hostilidades do mundo presente.

E, no entanto, continuam vivendo na mesma casa, no mesmo trabalho, fazendo as mesmas coisas... , mas seu olhar audacioso desperta as consciências, sacode as velhas estruturas, derruba os muros da exclusão.

A Ressurreição não só “dá o que pensar”, mas sobretudo, “dá o que fazer”.


O encontro com o Ressuscitado é fonte de vida e vida em crescente amplitude. Quando nos dispomos a caminhar com Ele, sob a ação do Espírito, realiza-se em nós um processo de abertura e de superação, de crescimento e de reconstrução de nós mesmos...; tomamos consciência de uma dimensão profunda de nosso interior, que nos permite experimentar uma outra vida, que supera tudo o que vivemos até então.

A “vida eterna”, então, não é um prolongamento ao infinito de nossa vida biológica. É a dimensão inesgotável e decisiva de nossa existência. Ela torna-se “eterna” desde já.

A experiência da Ressurreição nos revela que a “vida” é uma totalidade, ou seja, a vida presente, a vida atual, é uma vida que tem tal plenitude que, com toda razão, podemos chamá-la de “vida eterna”, uma vida com tal força e tão sem limites, que nem a morte mesma terá poder sobre ela.

Precisamos adquirir uma consciência mais profunda da vida do espírito, perceber as pulsações desta vida eterna que está em nós, do mesmo modo que, prestando atenção, percebemos as batidas de nosso coração.


A experiência do Ressuscitado nos faz ter um “caso de amor com a vida”.

Pois a vida autêntica é a vida movida, iluminada, impulsionada pelo amor. 

Nem sempre sabemos viver: conformamo-nos com uma vida estreita, estéril, fechada ao novo, carregada de “murmurações”. Quando acolhemos a presença do Ressuscitado, nossa vida se destrava e torna-se po-

tencial de inovação criadora, expressão permanente de liberdade, consciência, amor, arte, alegria, com-paixão.... É vida em movimento, gesto de ir além de nós mesmos; vida fecunda, potencial humano. Vida com fome e sede de significado, que busca o sentido... Vida que é encontro, interação, comunhão, solida-riedade. Vida que é seduzida pelo amor, pela ternura. Vida que desperta o olhar para o vasto mundo. Vida que é voz, é canto, é dança, é festa, é convocação...

Com sua presença compassiva, o Ressuscitado desperta nossa vida, arrancando-a de seus limites estreitos e constituindo-a como vida expansiva em direção a novos horizontes.

O Ressuscitado nos precede, nos sustenta e, na liberdade de seu amor, nos impele a ampliar nossa vida a serviço. Toda peregrinação, em clima de admiração e assombro, se revela rica em descobertas e surpresas, e desperta o coração para dimensões maiores que a rotina de cada dia. 

Nesse sentido, a vida tem a dimensão do milagre e até na morte anuncia o início de algo novo; ela carrega no seu interior o destino da ressurreição.


Essa nova Vida é capacidade de amar como Jesus amou; é “passar pela vida fazendo o bem”. Somos seres ressuscitados se vivemos os mesmos critérios e valores de Jesus, engajados em seu mesmo projeto.

A “vivência pascal” leva a querer algo mais. É “antecipação criadora”; ela tem “rosto novo”.

É o futuro que ainda pode ser convertido em “história nova”; é vida vivida com encantamento.

A “pedra pesada” da nossa impotência diante da dor, do fracasso e da morte, foi tirada pelo Mestre, que, nos chama pelo “nome” e nos desafia a viver como ressuscitados. 

Nossa vida é uma experiência a acolher, uma aventura a amar e um mistério a celebrar. Rompido o túmulo, removida a pedra, resta caminhar... 

Deixemo-nos iluminar, levemos a Luz da Ressurreição nas nossas pobres e frá-geis mãos, iluminando os recantos do nosso cotidiano.

Pois vida é um contínuo despedir-se e partir; é inútil permanecer junto ao túmu-lo. Porque o ausente “aqui” está presente na “Galiléia”. E a Galiléia é o lugar do compromisso com a vida, a justiça e a paz.


Texto bíblico:  Jo. 20,1-9


Na oração: Para viver a partir do ser mais profundo, é preciso dedicar uma atenção especial ao próprio coração e aprender a regozijar-se da maravilhosa vida de Deus em cada um. Basta um repouso e o estar presente para fazer acalmar a agitação interior e aproximar-se da fonte da vida.

- É tempo de esvaziar sepulcros; é tempo de remover as pedras da entrada do coração que impedem a entrada da luz, da vida, do canto...? O que lhe impede afastá-las?

- Faça memória das experiências de ressurreição: nos encontros, na missão, sentimentos oceânicos de consola-ção, clareza diante do sentido da vida, amar e sentir-se amado(a), a vivência da bondade e do bem...



ACREDITAR NO RESSUSCITADO - José Antonio Pagola


Tradutor: Antonio Manuel Álvarez Perez


Nós, cristãos, não devemos esquecer que a fé em Jesus Cristo ressuscitado é muito mais do que o assentimento a uma fórmula de credo. Muito mais inclusive, que a afirmação de algo extraordinário que aconteceu ao Jesus morto cerca de dois mil anos atrás.

Crer no Ressuscitado é acreditar que agora Cristo está vivo, cheio de força e criatividade, impulsionando a vida em direção ao seu destino final e libertando a humanidade de cair no caos definitivo.

Crer no Ressuscitado é acreditar que Jesus se faz presente no meio dos crentes. É tomar parte activa nos encontros e tarefas da comunidade cristã, sabendo com alegria que, quando dois ou três de nós nos reunimos em Seu nome, ali está Ele colocando esperança nas nossas vidas.

Crer no Ressuscitado é descobrir que a nossa oração a Cristo não é um monólogo vazio, sem interlocutor que escute a nossa invocação, mas um diálogo com alguém vivo que está junto a nós na raiz da vida.

Crer no Ressuscitado é deixar-nos interpelar pela Sua palavra viva recolhida nos evangelhos, e ir descobrindo praticamente que as Suas palavras são «espírito e vida» para quem sabe alimentar-se delas.

Crer no Ressuscitado é viver a experiência pessoal de que Jesus tem força para mudar as nossas vidas, ressuscitar o bem que existe em nós e nos libertar do que mata a nossa liberdade.

Crer no Ressuscitado é saber descobri-lo vivo no último e mais pequeno dos irmãos, chamando-nos à compaixão e à solidariedade.

Crer no Ressuscitado é acreditar que ele é «o primogênito de entre os mortos», em quem se inicia já a nossa ressurreição e em quem se nos abre já a possibilidade de viver eternamente.

Crer no Ressuscitado é acreditar que nem o sofrimento, nem a injustiça, nem o cancro, nem o ataque cardíaco, nem a metralhadora, nem a opressão, nem a morte têm a última palavra. Somente o ressuscitado é o Senhor da vida e da morte.



A ressurreição de Jesus, razão de nossa esperança - Maria Cristina Silva Furtado


Neste momento em que estamos vivendo uma pandemia, a meu ver, o que mais precisamos é de Esperança! Força! Fé! E a liturgia de hoje está repleta dessa esperança! Então... vamos refletir um pouco sobre ela.


Na primeira leitura, temos o discurso de Pedro em Cesareia, onde ele faz o anúncio de Jesus, apresenta-o como Cristo, e mostra que Deus está além da lei de Moisés. Pedro fala sobre a abertura da salvação para todas as pessoas. “Todo aquele que crê em Jesus recebe em seu nome, o perdão dos pecados”. No discurso Pedro marca a função histórica privilegiada do povo hebreu, entretanto enfatiza que Jesus é o Salvador de todas as pessoas, indiscriminadamente. O importante é crermos, termos fé.

Em seguida temos o Salmo, que diz: “devemos dar graças porque o Senhor é bom”. Em outro trecho, “A mão direita do Senhor, me levantou”. [...] Não morrerei, viverei para cantar as grandes obras do senhor”. E finalmente, “A pedra que os pedreiros rejeitaram tornou-se a Pedra Angular”.

E não é isso que a ressurreição nos traz? Jesus venceu a morte. E como diz a carta de Paulo aos Colossenses, Cristo encontra-se à direita do Pai. Portanto, se ressuscitamos com Cristo, nossa vida com Cristo em Deus está.


E todas essas passagens se completam com o evangelho de Jo 20, 1-9, onde encontramos o túmulo vazio. Neste evangelho, Maria Madalena, uma mulher, vai ao túmulo, não para passar bálsamos, pois no evangelho de João, outras mulheres já o tinham feito. Ela foi para chorar a morte de Jesus, seu mestre e amigo querido, mas ao chegar vê que a pedra havia sido retirada, e é ela, uma mulher, a primeira a ver o túmulo aberto, e vai ao encontro de Pedro e ao discípulo que Jesus amava dar esta notícia. Ambos, então, correm para ver o que havia acontecido.

E, hoje, nós como discípulos amados, devemos correr para ver o que está acontecendo. Isto me lembra o Papa Francisco solitário, rezando na Praça São Pedro, e quando esta cena chocou a multidão de católicos, alguém logo disse: Ele não estava sozinho, eu estava lá. E muitos foram dizendo através das mídias sociais, que estavam naquele momento, juntos com o Papa Francisco. Sim, nós estávamos lá.


E na Páscoa da Ressurreição, estamos juntos com Pedro, diante do túmulo vazio. Os panos mortuários estão dobrados, o lenço que cobriu a cabeça de Jesus também. O que isto significa? Não pode ter sido ladrão, pois ele não deixaria tudo organizado. Não..., isso mostra a soberania daquele que tem o poder de retomar a vida. Lázaro teve que ser desamarrado de sua mortalha; Jesus, não precisou de ninguém.

Como prescreve a lei, duas testemunhas presenciaram o túmulo vazio, mas o evangelho não deixa Madalena de fora, e nos informa que foi ela quem deu a notícia a Pedro, que com o outro discípulo, o discípulo amado, correu para o local do túmulo. Pedro entrou, e logo depois o outro discípulo, que vê e crê.

Na atualidade, nós somos o outro discípulo, o discípulo amado. E assim precisamos entrar em nosso interior, em nossos corações para ‘ver’ e ‘crer’.


Como diz o evangelho, eles ainda não tinham compreendido as Escrituras, e começaram ali a lembrar que estava escrito que Jesus iria ressuscitar dos mortos.

A ressurreição fez brotar a compreensão das Escrituras para eles, como hoje, deve nos lembrar: Jesus está vivo! Vivo! Espalhando o seu amor! Sofrendo com os que estão dentro de suas casas assustados, chorando com as famílias pelos que morrem, mas também curando com cada profissional de Saúde que trabalha incessantemente para salvar milhões de vidas. Servindo junto àquela pessoa que deixa a sua casa para trabalhar, com o cientista que busca encontrar o remédio certo, a vacina, e tudo o que poderá vir a nos ajudar a vencer essa pandemia, para fazer a vida retornar, acredito que não às condições que vivíamos antes.

Mas da mesma maneira que os discípulos de Jesus, diante da Ressurreição, compreenderam as Escrituras, nós também diante da Ressurreição, venhamos a compreender e nos deixar impregnar pelo amor incondicional de Jesus, que nos mostra o Deus solidário, Deus da vida. E a partir daí perceber que somos uma enorme família interligada entre nós e dependente de uma natureza, que precisa do nosso respeito e cuidado.

A ressurreição é o fundamento da nossa Esperança. E a salvação é para todos, sem distinção de gênero, sexualidade, religião, raça, etnia etc.

Terminamos esta reflexão, lembrando novamente o Salmista que diz: Eterna é a misericórdia de Deus! E assim, desejo a todos e todas uma Feliz Páscoa!

NESTA SEMANA NÃO PUBLICAREMOS O TEXTO EM ESPANHOL.