5º QUARESMA-B

5° DOMINGO DA QUARESMA ANO B

17/03/2024

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


1ª Leitura: Jeremias 31,31-34

Salmo 50(51)-R- Criai em mim um coração que seja puro!

2ª Leitura: Hebreus 5,7-9

Evangelho de João 12,20-33

Havia alguns gregos entre os que tinham subido a Jerusalém para adorar durante a festa. 21 Eles se aproximaram de Filipe, que era de Betsaida da Galiléia, e disseram: “Senhor, queremos ver Jesus”. 22    Filipe conversou com André, e os dois foram falar com Jesus. 23        Jesus respondeu-lhes: “Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado. 24     Em verdade, em verdade, vos digo: se o grão de trigo que cai na terra não morre, fica só. Mas, se morre, produz muito fruto. 25      Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem não faz conta de sua vida neste mundo, há de guardá-la para a vida eterna. 26          Se alguém quer me servir, siga- me, e onde eu estiver, estará também aquele que me serve. Se alguém me serve, meu Pai o honrará. 27          Minha alma está perturbada. E que direi? ‘Pai, livra-me desta hora’? Mas foi precisamente para esta hora que eu vim. 28  Pai, glorifica o teu nome!” Veio, então, uma voz do céu: “Eu já o glorifiquei, e o glorificarei de novo”. 29       A multidão que ali estava e ouviu, dizia que tinha sido um trovão. Outros afirmavam: “Foi um anjo que falou com ele”. 30    Jesus respondeu: “Esta voz que ouvistes não foi por causa de mim, mas por vossa causa. 31         É agora o julgamento deste mundo. Agora o chefe deste mundo vai ser expulso, 32e quando eu for levantado da terra, atrairei todos a mim”. 33         Ele falava assim para indicar de que morte iria morrer.


DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, ARCEBISPO DE SOROCABA SP

Jo 12,20-33

Alguns gregos, talvez por curiosidade, se dirigem a Filipe, que também falava grego, pedem para ver Jesus. O pedido é preciso: “Queremos ver Jesus”.

Somente esse pedido já revela as diferenças entre a cultura grega e a dos judeus. A espiritualidade do homem bíblico é a espiritualidade do ouvir e não do ver: “Ouve, Israel, o Senhor...”. O essencial para a espiritualidade hebraica é a palavra. Por sua vez, a espiritualidade grega está ligada à visão: a religiosidade deles privilegia não o profeta que prega, mas o vidente; Deus se manifesta mais nos ciclos da natureza do que nos acontecimentos da história. O hebreu se maravilha ouvindo a palavra de Deus na história do povo, enquanto que o grego se encantava mais com as grandes manifestações divinas nos cosmos.

Certamente aqueles gregos eram prosélitos, isto é, pagão que tinham se convertido ao judaísmo e que, portanto, como todos os membros do povo eleito, tinham a obrigação de peregrinar a Jerusalém para celebrar a páscoa. O pedido daqueles gregos revela que, mesmo tendo abraçado a religião bíblica, continuavam apegados à curiosidade religiosa própria de sua cultura. Eles estavam prontos para ver Jesus e se admirar com o que Ele podia fazer. Eles esperam ver algo grandioso, um milagre espetacular.

A resposta de Jesus desmonta completamente essas expectativas. Jesus se compara ao grão de trigo caído na terra, que morre para dar fruto. Em vez de orientar o olhar para o alto e para o céu, Jesus atrai o olhar para baixo, para a terra. Em vez de exibir um prodígio extraordinário e um milagre impactante, Jesus indica um acontecimento ordinário natural: o grão caído na terra, que morre e germina! Eles já tinham visto isso tantas vezes! Nada de extraordinário pode ser visto no grão de trigo caído por terra!

Estamos no coração do mistério cristão: a vida na morte, a glória divina através da humilhação da cruz; a altura do céu na profundidade da terra. Esse mistério cristão realiza o amor de Deus que é em si mesmo e que se derrama sobre a humanidade decaída. O coração da fé cristã é isso: acolher o amor que aceita morrer para dar e ser a nossa vida. O onipotente se faz servo; a glória se manifesta na cruz! Deus onipotente se faz grão de trigo, entra nos sulcos da terra, carrega consigo todo sofrimento e a morte da humanidade para, do ventre da terra, ressuscitar.

A história do grão de trigo conta a história de Jesus e, por isso, conta também a nossa história. Somos destinados a morrer, mas sabemos pela fé em Cristo que estamos destinados à ressurreição. O grão de trigo morre para uma vida nova; o nosso corpo morre para ser revestido de Cristo, para ser nele transfigurado. A semente de trigo deve morrer, assim como nós devemos nos abrir. Sim, porque a ressurreição não é uma ação automática: é necessário permitir que o Senhor rompa a casca do nosso egoísmo e pecado. É o difícil processo de conversão a que somos chamados a viver nesta quaresma e nesta CF.


Desata a vida de Deus que já está em ti! - Adroaldo Palaoro 


“Quem se apega à sua vida, perde-a” (Jo 12, 25)


O percurso quaresmal está chegando ao seu cume; aproxima-se o desenlace final de uma vida entregue em favor da vida. Jesus sente o clima pesado de rejeição por parte das autoridades religiosas. Estamos no cap. 12 do quarto evangelho. Depois da unção em Betânia e da entrada triunfal em Jerusalém, e como resposta aos gregos que queriam vê-lo, João põe na boca de Jesus um pequeno discurso que não responde nem aos gregos, nem a Felipe e André. Mais uma vez Jesus fala da Vida, da sua vida; Ele tem plena consciência que não viveu em vão: viveu des-centrado, investiu suas melhores energias vitais em favor de uma causa, sua vida deixou transparecer um profundo sentido.

Compreendemos melhor o evangelho deste domingo se o situamos no contexto da última viagem de Jesus a Jerusalém: nesta viagem se entrelaçam a vida e a morte com muita força.

E, ao chegar a Jerusalém, proclama de novo o triunfo da vida, como fizera durante sua itinerância pela Galileia. Ele nos revela esta verdade, nem sempre muito clara para nós: embora pareça que a vida se decompõe como o grão de trigo, na realidade, o que acontece é uma eclosão de sua fecundidade. Embora pareça que amar os outros e entregar a vida, dia após dia, é uma perda, na realidade é o maior ganho, porque nossa limitada vida se transforma numa vida plena, intensa, com sentido (eterna). Embora pareça que pôr-se a serviço do Reino é perder a liberdade, na realidade significa investir o melhor que há em nós, potencializando nossos recursos para investir numa causa mobilizadora, que é a causa do mesmo Jesus.

Embora estejamos tão perturbados como Jesus, desejando que nos livre de qualquer processo que conduza ao sofrimento e à cruz, há um horizonte de glorificação e plenitude. Onde nos situamos neste confronto entre a vida e a morte?

A vida e a morte não são inimigas que se destroem; elas são amigas, irmãs inseparáveis. Morre-se ao longo da vida. Este é o caminho normal de morrer.

A vida é o lento amadurecer da morte. Morre-se na vida, durante a vida, na medida em que a morte é fruto maduro das opções de toda a vida. As decisões fazem e farão a nossa morte. A morte nos ronda e nós rondamos a morte. “Começamos a morrer no dia em que nascemos”.

A experiência cristã nos revela o caminho de uma morte preparada ao longo da vida, porque a entende em relação com a vida e a vida em relação com a morte. Vida sem morte é irresponsável; viver sem morrer é viver menos. Tira a seriedade da vida.

Só assumida em liberdade e ativamente, a morte se humaniza. Na fé, cristianiza-se. A consciência de nosso próprio fim nos leva a pensar num sentido para a existência, para que não termine no vazio e no absurdo. Podemos afirmar, então, que “a morte está na vida”.

Entre os valores humanos fundamentais está o sentido. A questão do “sentido da vida” ou a “vida com sentido” é fundamental na existência humana.


- Por que vivemos? Para que vivemos? Quanto vale uma vida e o que vale na vida?

- Quem quer ficar ancorado? Quem não aspira preencher a própria vida de relatos, encontros, paixões, gestos, lições, projetos, ideias e sentimentos?

Qual o sentido da vida? Pergunta inquietante e parece que todos são por ela assombrados de vez em quando: “vale a pena viver?”


Ninguém tem uma razão pela qual viver se não tem ao mesmo tempo uma razão pela qual morrer.

O ser humano tem necessidade de uma causa, de canalizar todas as suas forças, seus desejos, energias, impulsos vitais e recursos internos e externos em direção a um objetivo no qual acredita apaixonadamente. E a ele dedicar-se com tudo que é e possui. Com intensa paixão.

Sabemos que, para viver uma vida verdadeiramente humana, precisamos de sentido. Segundo Nietzsche, “aquele que tem um porquê pelo qual viver pode tolerar praticamente qualquer como”.

Para Victor Frankl, fazemos a experiência do “sentido da vida” quando respondemos aos questionamentos da situação concreta em que vivemos, permitindo-nos a nós mesmos confiar em um “sentido último” que podemos chamar ou não de Deus.

Ao perder o sentido de sua origem e do seu fim, o ser humano perde o sentido da própria vida.

Portanto, o sentido da vida é algo que experimentamos visceralmente, sem que saibamos explicar ou justificar. Não é algo que se constrói, mas algo que nos ocorre de forma inesperada e não preparada, como uma brisa suave que nos atinge, sem que saibamos de onde vem nem para onde vai; é uma intensificação da vontade de viver a ponto de nos dar coragem para morrer por aquela causa que dá à vida o seu sentido.

É uma transformação de nossa visão de nós mesmos e do mundo, na qual as coisas se integram como uma melodia; isso nos faz sentir reconciliados com o universo ao nosso redor, possuídos por um sentimento oceânico, sensação inefável de eternidade e infinitude, de comunhão com algo que nos transcende, envolve e embala, como se fosse um útero materno de dimensões cósmicas.

Por trás do ritmo acelerado e estressante dos nossos tempos, esconde-se um enfraquecimento do sentido da existência. A crise pós-moderna que vivemos revela este traço sinistro: as pessoas não percebem mais razões e causas pelas quais se entregar, pelas quais dar a vida. E assim não encontram igualmente motivações para viver intensamente. Segundo S. Inácio, uma pessoa vale pela causa à qual se entrega.

Muitas vezes, nossas fomes viscerais, nossos desejos que nos devoram as entranhas, nossos sonhos que nos inquietam... não encontram canais amplos para jorrar. E então se atrofiam, permanecendo reféns de uma triste mediocridade. “E a mediocridade não tem lugar na cosmovisão de Inácio” (dr.).

Surge então a “normose” que mina as forças, atrofia os sonhos e mata a criatividade. E o pior de tudo: anestesia a paixão. Se não há paixão naquilo que fazemos, tudo vira rotina cansativa, não há empenho e nem compromisso possível.

“Viver a fundo” é não passar pela superfície da vida, é não perder a capacidade de amar, de vibrar, de buscar... Aqueles que são movidos pela paixão apostam que o ser humano tem potencial criador e foi feito para voar alto, para tentar, mil e uma vezes, alcançar cumes distantes.

Inspirados pelo evangelho deste domingo, somos convidados a tomar consciência de como estamos gerenciando esta dinâmica: viver para nós mesmos (ego) ou entregar a vida (oblação).

Enquanto o ego for o centro, doar soa estranho; ele só se preocupa consigo, conquista, executa, quer ser o melhor (“se outros perdem, eu ganho”) e é obeso por natureza (ego inflado); devorador.

“Se alguém quer me servir, siga-me...”. “Diakonos” significa servir, mas por amor. É no serviço e no seguimento de Jesus que as potencialidades de vida são ativadas.

Jesus convida a segui-lo no caminho que acaba de traçar, ou seja, doar a vida a serviço da vida. Seguir Jesus é entrar na esfera do divino, é deixar-nos conduzir pelo Espírito. Nossa vida só se reveste de pleno sentido quando se põe a serviço da Vida maior. Participando da morte de Jesus, podemos também fazer de nossa morte um ato de decisão, de entrega, de oblação.


Para meditar na oração:

Examine, à luz do coração misericordioso do Pai, o percurso quaresmal vivido; des-velar estas três dinâmicas: a da gratidão, a do perdão e a da compaixão.


Em que medida elas se fizeram presente ao longo deste tempo litúrgico.


- São três atitudes que mobilizam o “melhor” que há em cada pessoa; três dinamismos que dão sentido à própria existência e abrem horizontes inspiradores; três forças que revelam a essência da vida cristã: identificação com Aquele que as viveu em plenitude.



Uma lei paradoxal - José Antonio Pagola.

 

Poucas frases encontramos no Evangelho tão desafiadoras como estas palavras que reúnem uma convicção bem própria de Jesus: «Garanto-vos que se o grão de trigo cai na terra e não morre, fica infecundo; mas se morre, dá muito fruto».

 

A ideia de Jesus é clara. Com a vida acontece o mesmo que com o grão de trigo, que tem de morrer para libertar toda a sua energia e, um dia, produzir fruto. Se «não morre», fica sozinho sobre o chão. Pelo contrário, se «morrer» ressurge, trazendo consigo novos grãos e nova vida.

 

Com esta linguagem tão gráfica e cheia de força, Jesus deixa antever que a Sua morte, longe de ser um fracasso, será precisamente o que dará fecundidade à Sua vida. Mas, ao mesmo tempo, convida os seus seguidores a viverem de acordo com esta mesma lei paradoxal: para dar vida é necessário «morrer».

 

Não se pode gerar vida sem dar a própria. Não é possível ajudar a viver se não estivermos dispostos a «desvelar-nos» pelos outros. Ninguém contribui para um mundo mais justo e humano vivendo apegado ao seu próprio bem-estar. Ninguém trabalha seriamente pelo reino de Deus e a Sua justiça se não está disposto a assumir os riscos e rejeições, a conflitualidade e perseguição que Jesus sofreu.

 

Passamos a vida a tentar evitar sofrimentos e problemas. A cultura do bem-estar obriga-nos a organizar-nos da forma mais cômoda e agradável possível. É o ideal supremo. No entanto, há sofrimentos e renúncias que é necessário assumir se queremos que a nossa vida seja fecunda e criativa. O hedonismo não é uma força mobilizadora; a obsessão com o próprio bem-estar empequenece as pessoas.

 

Estamos a habituar-nos a viver fechando os olhos ao sofrimento dos demais. Parece o mais inteligente e sensato para ser felizes. É um erro. Seguramente conseguiremos evitar alguns problemas e dissabores, mas o nosso bem-estar será cada vez mais vazio e estéril, a nossa religião cada vez mais triste e egoísta. Entretanto, os oprimidos e aflitos querem saber se alguém se importa com a sua dor.

 

Uma decisão fundamental perder a própria vida - Ana Maria Casarotti


A multidão, que aí estava e ouviu, dizia que tinha sido um trovão. Outros afirmavam: “Foi um anjo que falou com ele”. Jesus respondeu e disse: “Essa voz que ouvistes não foi por causa de mim, mas por causa de vós. É agora o julgamento deste mundo. Agora o chefe deste mundo vai ser expulso, e eu, quando for elevado da terra, atrairei todos a mim”. Jesus falava assim para indicar de que morte iria morrer.

O Evangelho deste domingo nos traz novas pessoas no ambiente de Jesus. "Havia alguns gregos entre os que tinham subido a Jerusalém para adorar durante a festa".

De acordo com o texto, eram gregos, possivelmente judeus, que estavam indo a Jerusalém para celebrar a festa da Páscoa. O evangelho enfatiza que eles queriam ver Jesus. Podemos pensar que eles sabiam algo sobre Jesus e queriam vê-lo, conhecê-lo e estar com ele. No início do evangelho, quando André e outro discípulo, motivados por João Batista, perguntam a Jesus onde ele mora, ele lhes responde: "Vinde e vede" (Jo 1,39). Ele também dirá a Filipe: vem e vê (Jo 1,46). No diálogo com Natanael, Jesus também lhe dirá: "Antes de te chamar Filipe, eu te vi debaixo da figueira". Neste domingo, são os gregos que se dirigem a Filipe e lhe dizem: "Senhor, gostaríamos de ver Jesus". É quando Jesus recebe esse desejo que ele exclama: "Chegou a hora em que o Filho do Homem vai ser glorificado".

Lembremos que o Evangelho de João é construído sobre essa "hora" que marca os momentos decisivos da vida e da missão de Jesus: a revelação do mistério salvífico de Deus. Na presença dos gregos, que representam os gentios, ou seja, toda a humanidade, Jesus reconhece que chegou a hora, que é, em última análise, a hora de sua entrega total. Mas não se trata de uma morte serena; ele terá de passar pelo insulto, pelo abandono dos seus, pela zombaria do povo e pela profunda angústia que o acompanha nesse momento diante da realidade que se aproxima.

Diante disso, Jesus faz uma declaração profunda: “Se o grão de trigo que cai na terra não morre, ele continua só um grão de trigo; mas, se morre, então produz muito fruto” e continua dizendo: “Quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem faz pouca conta de sua vida neste mundo, conservá-la-á para a vida eterna”.

Nos perguntamos: o que morre no grão de trigo quando ele cai na terra? Aquilo que o cobre morre para abrir caminho para o crescimento da vida mais profunda que está dentro dele. No grão de trigo há uma vida que bate no fundo e que não pode germinar se não lhe for dado espaço, e por isso aquilo que o cobre, aquilo que é visível aos nossos olhos, morre. Podemos dizer que o acidental morre para dar espaço ao que está escondido atrás do que vemos para germinar e crescer. Jesus diz: "Quem se apega à sua vida, perde-a". A partir da afirmação do grão de trigo que precisa morrer na terra para dar vida, podemos entender que apegar-se à vida é apegar-se aos diferentes momentos de uma vida que passa como se quisesse parar o tempo.

Atualmente, há muitas correntes espirituais que nos convidam a viver o hoje, que nos chamam a tomar o presente em nossas mãos e a vivê-lo com consciência e seriedade. Jesus nos convida a perdê-lo, ou seja, a vivê-lo de forma dedicada aos outros, a não deixar que o efêmero, o passageiro ou os diferentes deuses que alimentam nosso ego determinem nosso caminho. Podemos dizer que, à medida que a vida passa, ela "se perde". Jesus nos chama a não deixá-la ir por perder oportunidades, mas a perdê-la conscientemente, a entregá-la! Jesus não está nos convidando a investir nossa vida em um determinado projeto, por mais dedicado que ele possa parecer, mas nos convida a perder nossa vida, ou seja, a seguir seu Caminho e, dessa forma, participar da novidade de sua Páscoa. É por isso que ele nos diz: Se alguém me quer seguir, siga-me, e onde eu estou estará também o meu servo.

Talvez para que possamos perceber a grandeza e a profundidade do caminho que Jesus nos convida a seguir, o Evangelho nos dá a experiência de Jesus nesse momento: "Agora sinto-me angustiado. E que direi? 'Pai, livra-me desta hora? ' Mas foi justamente para esta hora que eu vim. Pai, glorifica o teu nome!" Jesus abraça a missão que lhe foi confiada e se entrega a ela com total confiança, deixando tudo nas mãos do Pai. Dessa forma, Ele abre o caminho para que todos nós o percorramos. Se decidirmos "investir nossa vida", ou seja, perdê-la, doá-la, temos o modelo e o caminho que Ele abriu para nós por meio de sua Páscoa.

Na situação atual em que vivemos, em que tantas vidas parecem se perder por causa do ódio, da busca pelo poder e do desejo de dominação de alguns, somos convidados a não nos apegarmos à nossa vida, mas a perdê-la à maneira de Jesus. Apresentamos as palavras do Papa Francisco no Angelus, quando ele comenta o texto do evangelho sobre o qual meditamos neste domingo: "Ainda hoje muitas pessoas, muitas vezes sem dizer isso, de forma implícita, gostariam de 'ver Jesus', encontrá-lo, conhecê-lo. Disso compreendemos a grande responsabilidade de nós cristãos e de nossas comunidades. Também nós devemos responder com o testemunho de uma vida que se doa no serviço. Uma vida que toma sobre si o estilo de Deus: proximidade, compaixão, ternura e se doa no serviço. Trata-se de plantar sementes de amor, não com palavras que voam para longe, mas com exemplos concretos, simples e corajosos" ("Quem quiser ver Jesus, olhe para a cruz", diz o Papa Francisco).


 

 O Deus das alianças - Marcel Domergue

Tradução Francisco O. Lara, João Bosco Lara e José J. Lara.

 

De Noé até Jesus, Deus multiplicou as alianças com o seu povo. Alianças da parte de Deus alianças sempre generosas, mas inúmeras vezes ignoradas ou rompidas pelo povo. Então, Deus prometeu a Jeremias a Aliança das alianças: perpétua e impressa no fundo dos corações.

A glória do Nome

«Pai, glorifica o teu Nome», diz Jesus no evangelho. Assim, mais uma vez, temos palavras que não dizem grande coisa. Glorificar ainda passa: podemos entender tratar-se de reconhecer que «Deus», «o Pai», só mereça elogios, que podemos colocá-Lo acima de tudo o que temos experimentado; que, diante d’Ele, ficamos boquiabertos, sem palavras. As Escrituras, no entanto, insistem numa palavra: no Nome. O nome é algo tão importante que se torna outro, quando a vida assume um novo rumo, como foi o caso de Simão que virou Pedro. Ora, em Filipenses 2-9, Paulo diz que Jesus recebeu «o Nome que está acima de todo nome». Nome, portanto, que não é um nome como outro qualquer: não é um nome que designe um ser entre outros, mas que o situa fora e acima de tudo. Ainda em Êxodo 3,14, Deus se deu um nome que propriamente não era um nome, e que se tornaria impronunciável: «Aquele que é» ou «Eu sou porque sou», ou «Eu sou Aquele que sou». São Justino explica que ninguém é capaz de atribuir um nome a Deus e que a palavra «Deus» não é um nome. São João da Cruz, em um de seus poemas, nomeia-O como «Este eu não sei o quê». Este Deus aí não poderá distinguir-se dos outros exceto pelo que colocarmos sob esta palavra. A Bíblia emprega-a, dizendo que «o Deus de nossos pais» (aquele que é Origem) é como isto ou como aquilo. Jesus finalmente é quem dará um conteúdo verdadeiro ao Nome divino. Ele o «glorificará». Por isso, o Nome de Jesus receberá a mesma glória, conforme diz Filipenses 2,10.

A hora da Glória

Diz o evangelho que alguns gregos convertidos ao judaísmo queriam ver Jesus. Ora, em certo sentido, Jesus ainda não estava visível em toda a sua verdade, pois ainda não se revelara tudo o que havia nele: a última palavra sobre o próprio Deus em Si mesmo. Mas eis que, para Jesus, havia «chegado a hora» de «tomar o poder» que até então estivera detido por um soberano perverso: «o príncipe deste mundo». O mundo governado pelo culto a si mesmo e à sua própria glória, pelo gosto do lucro e pela vontade de dominar os outros. Mas o «príncipe deste mundo» vai ser jogado fora. Eis que existe agora no mundo Alguém que, por sua conduta, nega tudo o que representa o príncipe deste mundo. Alguém que vai agora até o fim da sua verdade de Filho, imagem e semelhança perfeita do Pai. Alguém que, agora, vai ser a visibilidade do Deus invisível. E esta espécie de publicidade, de levar ao conhecimento de todos o que até ali estivera confuso e imperceptível, é esta a «glorificação». O Nome do Senhor já havia sido, de certo, glorificado pela Criação («Eu o glorifiquei»), e o será ainda mais, pela Páscoa do Filho («E o glorificarei de novo»). Teremos compreendido que vamos receber a revelação da última verdade sobre Deus. O que ainda, no entanto, só percebemos numa imagem confusa, como que num espelho de má qualidade (1 Coríntios 13,12). Ainda não estamos na visão “face a face”. Busquemos compreender por que.

«Se alguém me quer servir...»

O conhecimento que podemos ter de Cristo - e, por consequência, de Deus - não pode permanecer puramente intelectual. É verdade que podemos estar convencidos de que ser Deus é dar a própria vida, não colocar o «viver» acima de todas as coisas. Podemos estar persuadidos de que devemos apreciar os outros assim como a nós mesmos. Mas, enquanto nos contentamos somente com isto, a nossa compreensão permanece imperfeita. O que mais é preciso? Seguir o Cristo; passar por onde ele passou. Não estamos todos destinados à cruz, mas temos todos de viver para os outros, até o dia em que também nós conhecermos a morte. A imagem verídica que Deus nos dá de Si mesmo, em Cristo, não nos é imposta. Só podemos apreendê-la se livremente escolhemos e nos pomos a segui-lo, fazendo nossos os seus comportamentos. Acolher o seu Espírito. Esta mesma liberdade reproduz a de Cristo. Em João 10,18 lemos: «Minha vida, ninguém a tira de mim, mas eu a dou livremente: tenho poder de entregá-la e poder de retomá-la.» Quando Cristo vê que lhe querem tirar alguma coisa, antecipa-se ao rapto e, assim, o anula. Dá o que lhe querem tirar. Quem quiser entrar nesta lógica divina, não irá somente compreender o sentido da Páscoa, mas, ainda mais, tê-la-á sempre atual por toda a vida. Só pode verdadeiramente compreendê-la na medida em que revivê-la. A última luz lhe será dada somente na hora da sua morte. Então, retomará a vida que havia dado e, por sua vez, será «glorificado». 



O grão de trigo que morre e dá frutos - Enzo Bianchi

Tradução de Moisés Sbardelotto.

 

De acordo com o quarto Evangelho, Jesus, com o sinal da ressurreição de Lázaro, desencadeia a oposição dos sacerdotes do templo e dos fariseus, que decidem que ele deve morrer (cf. Jo 11, 1-54). Justamente Caifás, o sumo sacerdote no cargo, afirma que a morte de Jesus é uma coisa boa: “É melhor um só homem morrer pelo povo” (Jo 11, 50). Palavra subjetivamente homicida de Caifás, mas objetivamente profética, porque a morte de Jesus é dar a vida pelos outros, por toda a humanidade.

Jesus, portanto, ao se aproximar a festa da Páscoa, entra em Jerusalém em meio aos gritos que o proclamam como Aquele que vem em nome do Senhor e Rei de Israel (cf. Jo 12, 12-14), mas esse seu sucesso junto ao povo desperta a constatação dos fariseus: “Todo mundo (ho kósmos) vai atrás de Jesus, segue-o!” (Jo 12, 19). Agora, a decisão de condenar Jesus à morte foi tomada, e ele sente que o círculo dos inimigos se estreita ao seu redor, e que aquela Páscoa será a sua “hora” tantas vezes anunciada. Por outro lado, a afirmação dos fariseus encontra uma clara ilustração no pedido de alguns dos presentes em Jerusalém para a festa: alguns gregos, isto é, pertencentes aos gentios, não circuncidados e, portanto, pagãos. Eles querem conhecer Jesus, porque ouviram falar dele como mestre de autoridade e profeta capaz de operar sinais.

Então, eles se aproximam de um dos seus discípulos, Filipe (proveniente de Betsaidada Galileia, cidade habitada por muitos gregos, assim como seu nome é grego), e lhe pedem: “Queremos ver Jesus”. Mas isso não era algo fácil, porque encontrar pagãos, impuros, por parte de um rabino, não estava de acordo com a Lei e não respeitava as regras de pureza. Filipe, hesitante, vai informar isso a André, o primeiro chamado ao seguimento (cf. Jo 1, 37-40); depois, juntos, os dois decidem apresentar a demanda a Jesus. E como ele responde? O quarto Evangelho não diz, mas testemunha algumas palavras decisivas, uma verdadeira profecia que Jesus faz sobre aquela hora, a hora da sua paixão e morte, revelada como glorificação.

Acima de tudo, Jesus diz que o pedido para o ver por parte dos pagãos é sinal e anúncio da hora que finalmente chegou, a hora em que o Filho do homem é glorificado por Deus. No início do Evangelho, em Caná, Jesus havia dito à sua mãe: “Minha hora ainda não chegou” (Jo 2, 4), e, em seguida, inúmeras outras vezes essa hora privilegiada é evocada como hora próxima, mas que ainda não chegou (cf. Jo 4, 21-23; 5, 25; 7, 30; 8, 20). Agora, diante desse pedido, Jesus compreende e, portanto, anuncia que sua morte será fecundo, fonte de vida inaudita: a sua glória será glória de Deus. Para expressar isso, Jesus recorre ao relato do grão de trigo que, para se multiplicar e dar fruto, deve cair na terra e depois apodrecer, morrer, caso contrário, permanece estéril e sozinho. Aceitando apodrecer e morrer, o grão multiplica sua vida e, portanto, atravessa a morte e chega à ressurreição.

Sim, parece paradoxal, mas – como Jesus esclarece – “quem se apega à sua vida, perde-a; mas quem faz pouca conta de sua vida neste mundo conservá-la-á para a vida eterna”, porque o apego à vida é o que impede de pôr a própria vida a serviço dos outros. Para Jesus, a verdadeira morte não é a física, aquela que os homens podem provocar, mas é precisamente a recusa de gastar e dar vida pelos outros, o fechamento estéril sobre si mesmo; ao contrário, a verdadeira vida é o ápice de um processo de doação de si.

A história do grão de trigo é a história de Jesus, mas também a do seu servo, que, justamente seguindo Jesus, conhecerá a paixão e a morte assim como seu Senhor, mas também a ressurreição e a vida para sempre. Não é só Jesus que será glorificado pelo Pai, mas também o discípulo, o servo que, seguindo o seu Senhor, se torna seu amigo. A esse respeito, com grande fé, um Padre do deserto chegava a afirmar com ousadia: “Jesus e eu vivemos juntos!”.

O que, então, Jesus promete aos pagãos para ver? Sua paixão, morte e ressurreição, seu abaixamento e sua glorificação, a cruz como revelação do amor vivido até o fim, até o extremo (cf. Jo 13, 1). A cada discípulo, proveniente de Israel ou dos gentios, no visível é dado ver o invisível; seguindo Jesus com perseverança, aonde quer que ele vá, é dado contemplar na sua morte ignominiosa a glória de quem dá a vida por amor.

De acordo com o quarto Evangelho, aqui é antecipada aquela convocação dos gentios, aquela reunião que acontecerá quando Jesus for elevado na cruz. Os profetas haviam anunciado a participação dos gentios na revelação feita a Israel, e esta hora está prestes a chegar, porque Jesus oferece a sua vida “para reunir os filhos de Deus que estavam dispersos” (Jo 11, 52).

João abre aqui uma lacuna sobre os sentimentos vividos por Jesus. Assim como os evangelistas sinóticos relatam a angústia de Jesus no Getsêmani (cf. Mc 14, 32-42 e par.), na hora que precede a sua captura, aqui também lemos sua confissão: “Agora sinto-me angustiado”. Sim, diante da sua morte, Jesus ficou perturbado, como já havia se perturbado e chorado diante da morte do amigo Lázaro (cf. Jo 11, 33-35). Mas essa angústia muito humana não se torna uma pedra de tropeço posta no seu caminho: Jesus é tentado, mas vence radicalmente a tentação com a adesão à vontade do Pai. De maneira diferente da narrativa presente nos sinóticos, mas profundamente em harmonia com ela, Jesus não quis se salvar daquela hora, nem ficar isento dela, mas permaneceu sempre fiel à sua missão de cumprir a vontade do Pai no caminho da humilhação, da pobreza, da mansidão e não através da violência, do poder, da dominação. Compreendemos, portanto, sua oração: “Pai, glorifica teu Nome”, isto é: “Pai, mostra que tu e eu, juntos, realizamos em mim a mesma vontade”.

Em resposta a tais palavras, eis uma voz do céu, a voz do Pai que testemunha o reconhecimento de Jesus como Filho amado, que revelou a glória de Deus em toda a sua vida e a revelará novamente na sua “hora”. De acordo com a inteligente interpretação da Carta aos Hebreus, Jesus, “nos dias de sua vida terrestre, dirigiu preces e súplicas, com forte clamor e lágrimas, àquele que era capaz de salvá-lo da morte. E foi atendido, por causa de sua entrega a Deus (eulábeia)” (Hb 5, 7). Essa submissão não é a rendição a um destino implacável, mas sim a adesão aos sentimentos do Pai, sentimentos de amor pelo mundo até lhe dar seu Filho unigênito (cf. Jo 3, 16).

Eis que, então, Jesus pode gritar com convicção: “É agora o julgamento deste mundo. Agora o chefe deste mundo vai ser expulso, e eu, quando for elevado da terra”, como a serpente levantada por Moisés (cf. Nm 21, 4-9; Jo 3, 14), “atrairei todos a mim”. A “hora” finalmente chegou, a hora de Jesus, mas também aquela em que o mundo, com sua estrutura malvada, é julgado, e assim o príncipe deste mundo, o príncipe das trevas, o inimigo de Deus e da humanidade, é expulso.

Esse grito de Jesus é um grito de vitória: na luta entre o príncipe das trevas e o Filho de Deus, este último é vencedor e, elevado da terra sobre a cruz, atrai todos a si. Sim, justamente na cruz, no alto, Jesus será o vencedor do inimigo, o diabo, o pai da mentira, e, portanto, vencedor sobre o mundo de trevas que se opõe a Deus: sobre a cruz, revelou-se plenamente a glória de Deus e de Jesus.

Da cruz, “Jesus, o Nazareno, o Rei dos judeus” (Jo 19, 19) – título escrito em hebraico, grego e latim, as línguas de toda a oikouméne (cf. Jo 19, 20) – atrairá todos a si, judeus e gregos, que verão aquele que transpassaram e baterão em seus peitos (cf. Zc 12, 10; Lc 23, 48; Jo 19, 37 Ap 1, 7). Todo olho o verá, e aqueles que, vendo-o, aderirem a ele crendo no seu amor, serão salvos e conhecerão a vida eterna. Eis a verdadeira resposta para aqueles que queriam, e ainda hoje querem, “ver Jesus”.

Essa é a boa notícia da página de hoje do Evangelho, boa notícia especialmente para aqueles discípulos e aquelas discípulas que conhecem a dinâmica de cair na terra, do “apodrecer” no sofrimento, na solidão e no escondimento.

Em algumas horas de vida, parece que todo o seguimento se reduz apenas à paixão e à desolação, ao abandono e à negação por parte dos outros, mas, então, mais do que nunca, é preciso olhar para a imagem do grão de trigo que nos foi entregue por Jesus; mais do que nunca, é preciso renovar o fôlego da fé, para dizer: “Jesus e eu vivemos juntos!”.


Jeremias 31.31-34 e João 12, 20-33 - Thomas McGrath


O texto fala sobre os dias em que o Senhor firmará (não criará) uma “nova aliança” com seu povo. Essa é a única vez em que aparece essa expressão no Antigo Testamento. 

“Novo” no Antigo Testamento não significa de outra natureza ou essência, como muitas vezes entendemos. Não significa que o “antigo” foi descartado para dar lugar ao “novo”. Na verdade, “novo” tem a ver com cumprimento, plenitude. Assim, o Novo Testamento não é novo; é a continuidade, o cumprimento do Antigo Testamento. Temos coisas do NT no AT e coisas do AT no NT. Em ambos os Testamentos, a graça e a salvação de Deus para com seu povo são o centro das narrativas. Embora se prefira “testamento” a “aliança” (especialmente no contexto luterano), os termos são sinônimos. Nesse sentido, “aliança” é equivalente a “promessa”, “juramento”, “bênção”. Claro, Israel entendeu mal a aliança de Deus, associando-se a outras alianças. Contudo, o Senhor quer reparar essa situação e promete “firmar” o que o povo “anulou”. Na “nova aliança” está a promessa de Deus de que seu povo o conhecerá com exclusividade: “Eu serei o seu Deus, e eles serão o meu povo.” Porque “perdoarei as suas iniquidades e dos seus pecados jamais me lembrarei”.

João 12.20-33

Comentando

O episódio do nosso texto acontece cinco dias antes da festa da Páscoa (cf. 12.1; 12.12). Embora o fato mencionado no texto ocorra depois da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, essa perícope é escolhida para o domingo de hoje como um prelúdio aos eventos da Semana Santa. Vários momentos marcantes têm ocorrido ultimamente, em especial que Jesus havia ressuscitado Lázaro. Esse milagre, por um lado, atrai multidões fascinadas (12.18) e, por outro, suscita a ira dos principais sacerdotes e fariseus que o procuram prender e matar (11.53,57). 

Nesse momento, contudo, esses lutavam contra a maré porque reconheciam que “aí vai o mundo após ele” (12.19). Os fariseus, sem o saber, são profetas. A chegada dos gregos confirma as suas palavras. Tais gregos querem ver Jesus. Onde ele está? Qual a sua aparência? Onde pode ser encontrado?

Os vv. 20 e 21 apenas nos falam de “gregos”. Nada mais sabemos sobre eles. Quem sabe chegaram a ouvir de Jesus pela leitura da Septuaginta. Na época, havia pouca evidência de que o Cristo seria também para eles, que eram gentios. Os zelotes, por exemplo, bem como os discípulos do rabino Shamai afirmavam que o Messias vinha para salvar o povo de Israel, não os estrangeiros.

O v. 22 diz que Filipe e André são de Betsaida, cidade da província de Ituréia, onde boa parte dos habitantes são gregos e gentios. Por serem os únicos dos discípulos que têm nomes gregos, eles, por certo, devem falar grego.

Os vv. 23 e 24 falam da glorificação de Jesus. Mas sua glorificação passa pelo antagonismo de sua morte. Não há glória para Cristo sem a passagem por seu sofrimento, morte e ressurreição. O exemplo desse processo está no grão de trigo. Sem a sua morte não há como surgir a vida.

Seguir a Jesus, no v. 26, é segui-lo na sua morte; é seguir o caminho da cruz; é sofrer por causa do nome de Cristo. A vida dos seguidores de Jesus (e os gregos devem também saber) não é fácil. O próprio Jesus angustiou-se diante da morte, como se vê nos vv. 27 e 28 e no texto de Hebreus 5.7-9.

O levantamento de Cristo na cruz pode ser visto como decepção para muitos que gostariam de ter um Messias que viesse para ser servido, não para servir. Os gregos vieram para ver Jesus, mas todos ao redor ouviram a voz de Deus. Jesus explica por que ouviram a voz: “Agora” é o momento da glorificação do Filho; “agora” é o momento de o mundo ser julgado; “agora” o príncipe do mundo será expulso. Na cruz, Satanás sucumbe e Cristo é exaltado – e atrai todos, judeus e gentios, para junto de si (v. 32).


Alargando

3.1 –Esses gregos eram estrangeiros e vêm para ver Jesus. Os gregos dirigem-se a Filipe; Filipe atrapalha-se e vai falar com André, que também não sabe o que fazer. Resultado: ambos decidem consultar Jesus. E o que Jesus faz é dar um discurso sobre agricultura: “Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, diz Jesus, fica ele só; mas, se morrer, produz muito fruto”. O que Jesus queria dizer com essas palavras? 

Num discurso anterior, Jesus afirmara que ele era o pão da vida, que desce do céu para dar vida à humanidade. A figura do pão indica que a sua vida haveria primeiro de ser sacrificada antes de poder dar-se aos outros. Aqui Jesus muda a figura e diz ser a semente de trigo que precisa primeiro ser semeada e morrer para que haja colheita de trigo e a provisão de pão.

3.2 – Ver Jesus só pode acontecer por meio de sua morte e ressurreição. Naquele pedido dos gregos, Jesus vê a sua obra como o Messias chegando a seu ponto climático. Em Is 53, Deus, o Pai, lhe prometera: “Quando der ele a si mesmo como oferta pelo pecado, então verá a sua semente, a sua posteridade”. Tal episódio vai acontecer em menos de uma semana. Antes da sexta-feira santa e da Páscoa, a mensagem de Jesus não deveria ser levada oficialmente ao mundo pagão para que eles não tivessem uma imagem parcial e distorcida de Jesus e sua obra. A obra do Messias não se caracteriza apenas por sinais, milagres, curas.

Fosse assim, ele seria um guru, professor, curandeiro ou bom moralista que ensina a viver bem. Não será essa a visão que nós mesmos temos de Cristo por vezes? Sua obra, entretanto, caracteriza-se por seu sacrifício voluntário, por sua morte e ressurreição. Para enfatizar esse aspecto, Jesus fala de sua morte. Ele diz: “É chegada a hora de o Filho do Homem ser glorificado”. Jesus fala de sua morte não como um fim, como derrota, mas como vitória, glorificação.

3.3 – O projeto da salvação de Deus é como a história da semente de trigo. Não há fruto sem morte e ressurreição. Se não for sepultado, permanece isolado e fenece como qualquer semente, tornando-se improdutiva. Morte é o único meio pelo qual vem a vida e vida em abundância. Longe da cruz não há colheita espiritual; longe da cruz a missão de Deus não acontece. A morte de Cristo na cruz e sua ressurreição é o prelúdio para a missão no mundo. Os gregos faziam parte da multidão que viera a Jerusalém para adorar por ocasião da Páscoa que se aproximava. Seria a primeira vez que vinham? A verdade é que eles não podiam ver Jesus nem ouvi-lo falar no templo de Herodes. 

No Museu Nacional de Jerusalém preserva-se um fragmento de pedra em que há a inscrição proibindo a entrada de gentios naquele templo sob pena de morte. Por isso ficavam do lado de fora, no pátio dos gentios, sem poder participar da festa da Páscoa. Agora procuram Jesus fora do templo. E a ocasião parece ser um dia depois da entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, onde foi saudado pelas multidões que estavam extasiadas por ter Jesus ressuscitado Lázaro. Os gregos querem ver Jesus? Por quê?

3.4 – Querer ver Jesus significa segui-lo. Seguir Jesus talvez não pareça tão difícil. Seguir Jesus é aparentemente mais fácil do que tentar os inúmeros caminhos e opções religiosas propostas pelos homens. Seguir Jesus parece mais fácil, mas é um caminho que leva à cruz. Se alguém me serve, diz ele no texto, siga-me. E o caminho que Ele segue é o caminho da cruz.

3.5 – Por que os gregos se dirigiram a Filipe pedindo: Senhor, queremos ver Jesus? Por que algumas pessoas perguntam a você algo semelhante? Porque de alguma forma você se torna parecido com Cristo. 

O apóstolo Paulo em 2 Co 4.10 diz: “Levamos sempre nos nossos corpos mortais a morte de Jesus para que também se veja a vida dele nos nossos próprios corpos”. Em outro lugar ele diz como Deus nos destinou para ser conforme à imagem de seu Filho, assim que somos transformados em sua semelhança mais e mais, dia após dia. É isso o que aconteceu em nosso Batismo. 

3.6 – Os gregos viram Jesus? Três ou quatro dias depois, Jesus foi crucificado. E aqueles gregos certamente puderam ler em sua própria língua a inscrição sobre a cruz de Jesus de que ele era rei. 

E no dia de Pentecostes, 50 dias após a Páscoa, lá certamente estavam esses gregos, ouvindo de novo na sua própria língua o apóstolo pregar: que esse Jesus, que foi crucificado, Deus o ressuscitou e o fez Senhor e Cristo e aquele que invocar o seu nome será salvo.


 

TEXTO EM ESPANHOL De Dom Damian Nannini, Argentina


(TEXTO TRADUZIDO PELO GOOGLE SEM CORREÇÃO NOSSA)


QUINTO DOMINGO: A FERTILIDADE DA CRUZ

Primeira leitura (Jr 31,31-34):

Jeremias é considerado o primeiro professor doconselho(banimento ou exílio), embora a sua pregação tenha começado antes da queda de Jerusalém, a qual, apesar de tudo o que disse e fez, não conseguiu evitar. Para este profeta, o exílio, paradoxalmente, será um lugar e um momento privilegiado para procurar e encontrar Deus. Aqui está a única esperança de salvação.Mas Esta salvação de Deus não ocorrerá no lugar da prova, mas através dela(Jeremias 30:14-24). Esta atitude de buscar a Yahweh, se for sincera, implica arrepender-se dos pecados para voltar a Deus (Jr 31,18-19). Mas a conversão do povo é uma condição, não uma causa, da salvação. Jeremias passou por muitos contratempos e rejeições para colocar esperança novamente nos homens. Isto depende exclusivamente da novidade que Deus vai operar e que está descrita no chamadolivro de consolação(Jer 30-31) que inclui o texto da primeira leitura deste domingo.

O oráculo de Jr 31,31-34 é muito importante tanto pela novidade do seu anúncio como pela sua utilização no Novo Testamento (cf. Lc 22,20; Hb 8,8-12). A expressão aparecenova aliança, que só encontramos aqui em todo o AT e que se apresenta como uma alternativa ao fracasso da anterior aliança do Sinai. Com este último há continuidade na medida em que também se refere à relação com Deus em termos de aliança (antes); enquanto a novidade está na forma de realizá-la e vivê-la, pois haverá internalização e personalização.

Escrever a lei nos corações significa que o que Deus ordena coincidirá com a decisão livre e própria do povo. Isto significa que não haverá mais necessidade de continuar com a transmissão, explicação e inculcação da lei, porque haverá conhecimento direto ou intuitivo da vontade de Deus. Neste sentido já não se trata de uma imposição externa de obrigações, mas antes do cumprimento da vontade de Deus por um impulso interno. Num nível mais profundo, trata-se da possibilidade de uma relação íntima e direta com Deus, que através do seu perdão removerá o grande obstáculo que também estava escrito no coração dos israelitas: o pecado (cf. Jr 17, 1). O resultado final será então uma verdadeira pertença recíproca (“Eu serei o Deus deles e eles serão o meu povo”); uma relação pessoal de cada um com o Senhor que tornará inúteis as exortações, antes tão necessárias e, no entanto, ineficazes, segundo a amarga experiência do profeta.

Além disso, no contexto da crise institucional típica do exílio, a esperança proposta por Jeremias é que Israel sobreviva em cada um dos hebreus que carregam a Aliança no coração, o que implica umapersonalizaçãoDe fé. Deus operará neles que "circuncisão do coração"que o profeta reivindicou em vão (Jr 4,4; 9,25; cf. Dt 10,16; 30,6).

Naquela situação de crise podemos dizer que Deus pediu ao povo através do profeta duas ações:desistir e receber. Saber desistirà velha forma de ligação com Deus, mortalmente ferido pelo pecado. Saberrecebera novidade de uma nova Aliança que Deus reconstruirá além do que se pode calcular ou prever. É esperar com fé em Deus.

Segunda leitura (Hb 5,7-9):

Esta perícope da carta aos Hebreus integra a seção que trata da superioridade do sacerdócio de Jesus Cristo em relação ao sacerdócio do Antigo Testamento. O autor da carta, depois de ter descrito o sumo sacerdote judeu que“...ele é tirado dentre os homens e colocado para intervir em nome dos homens em tudo que se refere ao serviço de Deus...”(5,1-4), marca cuidadosamente os contrastes com o sacerdócio de Cristo.


Jesus Cristo não é tirado dentre os homens, mas é o Filho de Deus que deve assumir a condição humana para se tornar sumo sacerdote. Ele não oferece dádivas e sacrifícios externos a si mesmo, mas oferece-se a si mesmo: “Ele ofereceu... súplicas e orações, com altos gritos e lágrimas”(5,7). A. Vanhoye1Ele comenta assim: "A sua oração não era uma liturgia convencional, com ritos pré-determinados, mas a expressão viva de uma angústia extrema, pois acompanhava a sua oração com gritos e lágrimas veementes.". Pode ser uma referência ao Getsêmani ou ao Gólgota, mas sempre no contexto da paixão.

E foiOuvidopelo Pai que, embora não o tenha libertado da morte, ressuscitou-o gloriosamente depois de morto.

O exercício do sacerdócio de Cristo consistiu na entrega da própria vida em obediência ao Pai, o que implica que a morte do Senhor seja entendida como um verdadeiro sacrifício. A carta salienta que esta obediência era umaprendizadoatravés do sofrimento que levou Jesus como homem a alcançar a perfeição (Hb 5,8-9); perfeição que inclui a instituição na ordem sacerdotal. O texto nos orienta a pensar que a ordenação sacerdotal de Cristo se realizou através do sofrimento na cruz, no momento da oferta do seu sacrifício ao Pai.2.

Como também observado por A. Vanhoye3O autor da carta revela dois aspectos da paixão de Cristo:ouvi oração e educação dolorosa. Estes aspectos não estão em conflito porque a resposta à oração foi a transformação ou o aperfeiçoamento da humanidade de Cristo, realizado através da paixão, que beneficia então todos os homens. Com efeito, esta morte ou doação sacrificial de Cristo é fecunda porque através dela «Ele se tornou a causa da salvação eterna para todos aqueles que lhe obedecem”(Hb 5:9b).

Evangelho (Jo 12,20-33):

O episódio narrado por este evangelho se situa pouco antes da entrada messiânica de Jesus em Jerusalém, durante uma festa da Páscoa e, portanto, havia em Jerusalém judeus vindos de todas as partes. Com justiça, "Entre os que subiram para adorar durante a festa, havia alguns gregos que se aproximaram de Filipe, de Betsaida da Galileia, e lhe disseram: «Senhor, queremos ver Jesus"

(Jo 12,20-21). Como observa LH Rivas4, visto que foram a Jerusalém para adorar, não podem ser pagãos, mas prosélitos de origem pagã e de língua grega; ou judeus que viviam na diáspora e a sua cultura era grega. Diante do pedido destes gregos que querem ver Jesus, o Senhor faz um discurso que expressa o seu estado de espírito, a sua disposição interior antes da Paixão (12,23-36). Não admira que alguns exegetas considerem este texto como oJoanino Getsêmani, desde cinco dias antes de sua paixão, Jesus anuncia que seuhora e ele fica perturbado internamente (Jo 12,27).

É sobre ohora de passar deste mundo para o Pai, que é ao mesmo tempo ohora de amor extremo (cf. 13,1) e de dor suprema, de dores de parto (cf. 16,21);hora do abandono dos discípulos e da presença permanente do Pai (cf. 16,32). E ao mesmo tempo é ohora da glorificação do Filho pelo Pai(cf. 12,23). L. H. Rivas5explica o significado desta expressão: "Quando Jesus diz que será glorificado pelo Pai, está indicando a mudança que ocorrerá em sua humanidade. Desde toda a eternidade Ele teve glória junto ao Pai, mas assumiu uma condição humana semelhante a qualquer outro ser humano, a ponto de também poder sofrer e morrer. Pouco depois de sua morte, sua condição divina também se manifestará em seu corpo. Jesus Cristo, sendo verdadeiro homem, terá o esplendor que lhe corresponde como Filho de Deus igual ao Pai".

Dependendo do contexto litúrgico, penso que deveríamos prestar atenção a duas frases do Evangelho em particular. Em primeiro lugar, a breve parábola da semente: “Garanto-vos que se o grão de trigo que cai na terra não morre, fica só; mas se morrer, dá muito fruto”(12,24). Sabemos que se o grão apodrece e morre, mais tarde surgirá dele uma planta que produzirá mais grãos. Por outro lado, se não morrer, permanece estéril, não produz planta nem fruto. Então,Jesus recorre ao ciclo de vida da semente para nos ensinar o significado da sua morte como um passo fecundo para a vida, para dar frutos, para glorificar o Pai. A sua morte será um fracasso apenas na aparência, porque graças a ela passará mais tarde para a Glória do Pai. Ao mesmo tempo, ensina-nos que o amor manifestado na sua dedicação é o que dá sentido aos sofrimentos da sua paixão, pois os orienta em favor dos outros, tornando-os redentores. A dor e a morte são transformadas em meios de vida e fertilidade. A semente é o próprio Cristo que, através da sua morte, dará vida aos outros.

Mas ao mesmo tempo, como no texto esta frase é dita aos apóstolos, ela se torna uma lei geral do discipulado, de quem escolhe seguir o caminho de Cristo: “O que é admirável neste texto é que a sua própria dinâmica reflete o itinerário de Jesus e do discípulo”6. Tanto é verdade que Jesus então aplica este princípio à vida de seus seguidores: “Aquele que está apegado à sua vida (alma) vai perdê-lo; e aquele que não está apegado à sua vida (alma) neste mundo, irá preservá-lo para a Vida (Zoé) eterno. Quem quiser me servir deverá me seguir, e onde eu estiver, meu servo também estará. Quem quiser me servir será honrado por meu Pai”(Jo 12,25-26). Esta extensão é muito interessante porque deixa claro que a “morte do grão de trigo” simboliza o esquecimento de si mesmo e a entrega aos outros através do serviço. E a recompensa será ser honrado pelo Pai. Deixa-se de trabalhar para a própria glória para receber a glorificação do Pai, assim como Jesus.

Em segundo lugar, a frase “e quando eu for elevado acima da terra, atrairei todos a mim. Jesus disse isso para indicar como ele iria morrer”(12,32). O tema da “elevação na cruz” do domingo passado é retomado (cf. Jo 3,14), mas acrescentando-lhe uma “força de atração”. É a atração de Cristo crucificado (“Eles vão olhar para aquele que perfuraram” em Jo 19,37) onde se manifesta a grandeza do amor divino que redime o homem. É a atração universal que a própria pessoa de Jesus exercerá, tornando-se centro do olhar e da contemplação na fé.7. Sobre o significado que o verbo “elevar ou elevar” tem no Evangelho de João (ὑψόω em 12,32.34) diz G. Zevini8: “No sentido literal refere-se à elevação externa na cruz; No sentido espiritual refere-se à exaltação à glória com o conseqüente retorno ao Pai. Este modo de pensar típico de João faz-nos compreender como Jesus, elevado e glorificado, é o ponto de referência da salvação da humanidade; e tudo isto, devido à sua morte vivida em obediência radical ao Pai […] Se a cruz deve ser o lugar da salvação universal e a fonte da verdadeira vida dos homens, tudo isto produzirá o efeito de atrair todos para ele”.

Meditação:

A. Nocent apresenta-nos, como resumo das leituras deste domingo, o seguinte:“O 5º Domingo continua detalhando a obra de salvação na qual estamos engajados. O grão morre e dá fruto; Este fruto cultivado na obediência é a salvação eterna, uma nova aliança no esquecimento das faltas passadas. Esta poderia ser a síntese do que é este 5º. Domingo quer fazer as pessoas viverem”9.

Na verdade, no domingo passado fomos convidados paraelevar o olhar para Cristo e prestar atenção à obra de Deus em nós. Esta atitude implicava fé, isto é, confiar e abandonar-se nas mãos do Pai. Este quinto domingo reforça esta orientação geral típico da segunda parte da Quaresma, ao mesmo tempo que nos mergulha um pouco mais no mistério da nossa redenção e nos indica um caminho a seguir.

Nada é mais importante e fundamental na vida cristã do que deixar Deus trabalhar em nós. Toda a Quaresma quer nos educar para isso. As três leituras referem-se aoprocesso ou dinamismo próprio do mistério pascal, ao passo necessário através da destruição, da obediência e da morte, da qual Deus fará surgir novamente a vida.

ComJeremiassomos convidados aesperar uma renovação verdadeira e autêntica do nosso relacionamento ou aliança com Deus.Uma relação onde será possível, finalmente, ser fiéis a Deus, obedecê-lo de coração. Esta graça deobediência cordialSerá o caminho para podermos “desabafar” o nosso amor por Ele, porque sem isso todas as tentativas de fidelidade fracassam. A promessa é verdadeiramente imensa: poder conhecer a vontade de Deus e cumpri-la plenamente. Será em nós o fruto maduro da plena redenção, o fruto desejado da Páscoa de Jesus.

Ocarta aos HebreusEle insiste de forma muito realista em “quanto custou” a Jesus tornar-se a causa da salvação eterna para todos os homens. A sua obediência sacrificial abriu o caminho para que fosse possível a nossa obediência cordial, que deve percorrer também o caminho misterioso dao apelo com gritos e lágrimas para ser ouvido; e obediência doloroso ser frutífero.

 O Evangelho fala-nos da necessária “passagem” de Jesus através do sofrimento e da morte para obter a vida eterna para nós. Ele dá a sua vida pela salvação dos homens e depois a recupera ressuscitado. E desta forma também nos é dito que Deus quer operar em nós a mesma coisa que operou em seu Filho Jesus. É a lei da fecundidade da semente, que se inaugura com Jesus e se torna lei também para os seus discípulos; algo que não é fácil de aceitar. A este respeito, J. Aldazábal comenta: “Todos nós queremos saúde, triunfo, sucesso e honras mais do que renúncia, sacrifício ou fracasso. Cristo nos ensinou que o mundo não é salvo com demonstrações de poder, mas através da cruz, que neste mundo certamente não tem boa publicidade ou popularidade.”10.

Fica claro nas três leituras queDeus toma a iniciativa em nossa redenção; Portanto, devemos deixá-Lo trabalhar, à Sua maneira e no Seu tempo. A este respeito, diz o Card. Vanhoye11: "Jesus nos ensina que quando oramos devemos sempre deixar que Deus escolha a solução para a situação em que nos encontramos. A solução que Deus dá será sempre melhor do que aquela que podemos pensar com as nossas mentes limitadas […] A paixão de Jesus é um acontecimento extraordinário que mudou a situação religiosa dos homens. É um evento de amor. Jesus nos amou a ponto de dar a própria vida por nós. O seu amor é universal, que quer transformar radicalmente as nossas mentes e os nossos corações, concedendo-nos uma união eficaz com Deus e com todos os nossos irmãos.".

Esta mesma dinâmica, levada ao nível pessoal e ao apostolado, nos é ensinada pelo Papa Francisco: “Também hoje muitas pessoas, muitas vezes sem o dizer implicitamente, gostariam de “ver Jesus”, encontrá-lo, conhecê-lo. Isto faz-nos compreender a grande responsabilidade dos cristãos e das nossas comunidades. Também nós devemos responder com o testemunho de uma vida que se entrega no serviço, de uma vida que assume o estilo de Deus – proximidade, compaixão e ternura – e se entrega no serviço. Trata-se de semear o amor não com palavras levadas pelo vento, mas com exemplos concretos, simples e corajosos, não com condenações teóricas, mas com gestos de amor. Então o Senhor, com a sua graça, torna-nos fecundos, mesmo quando o terreno está árido devido a mal-entendidos, dificuldades ou perseguições, ou pretensões de legalismo ou moralismo clerical. Este é um terreno árido. Precisamente então, na provação e na solidão, enquanto a semente morre, é o momento em que a vida brota, para dar frutos maduros no devido tempo. É nesta teia de morte e de vida que podemos experimentar a alegria e a verdadeira fecundidade do amor, que sempre, repito, ocorre ao estilo de Deus: proximidade, compaixão, ternura.”(angelus de 21 de março de 2021).


Um exemplo atual de tudo isso é a vida do beato Charles de Foucauld, sobre quem escreveu São João Paulo II: “Toda a vida do Padre Foucauld pode ser resumida num único grande desejo: ser como o grão de trigo que morre, imitando assim, silenciosamente, com a oferta da própria vida, o Cristo que amou os homens até ao fim para se tornar próximo”. Em efeito, "No momento de sua morte, o irmão Charles era um completo desconhecido. Ele morre ferido por saqueadores em um país distante de sua terra natal. Você nem conseguiu uma conversão. Nenhum discípulo o seguiu, apesar do seu projeto de fundar uma congregação. Nenhuma das milhares de páginas que escreveu “aos pés de Jesus”, antes da Eucaristia, foi publicada. Vinte anos devem se passar até que René Voillaume e Madeleine Hutin, fundadores dos Irmãozinhos e Irmãzinhas de Jesus, compilem seus ensinamentos. Pouco a pouco, como um pequeno grão de mostarda, a espiritualidade de Carlos, “homem do deserto”, crescerá até se tornar uma das fontes espirituais mais fecundas do nosso tempo.”12.

Em suma, a proposta deste domingo é renovar o nosso propósito de seguir Cristo nesta fecunda passagem da morte para a vida de Deus. Ele deu-o primeiro e convida-nos a segui-lo com confiança. Não há outro caminho senão este para chegar a uma Páscoa fecunda.

Para oração (ressonâncias do Evangelho em quem ora):

Eles só querem ver você

Pelas ruas da cidade

Rostos estranhos vagam em busca

Sem dizer palavras, elas não são necessárias

Eles só querem ver você

O lugar onde você mora

Ninguém o conhece, eles não acreditam que ele exista

Apegado à vida que se oferece…

Eles só querem ver você

Sua voz parece estranha para eles

É o som do trovão, de seres alados?

É a multidão hoje, aqui presente,

Eles só querem ver você

Eles não sabem sobre morrer

E se por medo de sofrer, por não saber perder,

Esse é o seu povo penitente

Tenha piedade Senhor, eles só querem ver você

E nós por eles e neles, em você e para você

Nós encorajamos você a entrar no seu barco,

Onde às vezes você dorme,

Onde a fé se torna uma âncora.

Faça-nos descobrir seu caminho

EleDEPOISonde você sempre esperou por nós

Atrás da porta da cruz, finalmente,

Veremos você para sempre. Amém.



1A cristologia sacerdotal da carta aos Hebreus(CEA; Buenos Aires 1997) 75.

2Cf. L. H. Rivas,Carta aos Hebreus(Claretiana; Buenos Aires 2007) 35.

3A cristologia sacerdotal da carta aos Hebreus(CEA; Buenos Aires 1997) 74-77.4O Evangelho de João. Introdução - Teologia - Comentário(Ágape; Buenos Aires 2020) 511.5Jesus fala ao seu povo 4. Ciclo B(CEA; Buenos Aires 2002) 162.

3

6X. León Dufour,Jesus e Paulo enfrentando a morte(Cristianismo, Madrid 1982) 134-136.-7Cf. D. Muñoz León,Pregando o Evangelho de João(Comissão Episcopal do Clero; Madrid 1988) 369.8Evangelho segundo São João(Siga-me; Salamanca 1995) 317-318.

9Celebre Jesus Cristo III. Quaresma(Sal da Terra; Santander 1980) 152.

10Ensine-me seus caminhos 9. Domingos ciclo B(Ágape, Bs. As. 2005) 142. 

11Leituras bíblicas aos domingos e feriados. Ciclo B(Mensageiro; Bilbao 2008) 86.88.-

12Carlos de Foucauld. Legado espiritual(Bom; Buenos Aires 2005) 3-4.