5º DOMINGO TC-B

5º DOMINGO COMUM - B

04/02/2024

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


1ª Leitura: Jó 7,1-4.6-7

Salmo 146 (147) R- Louvai a Deus, porque ele é bom e conforta os corações 

2ª leitura:- 1 Coríntios 9,16-19.22-23 

Evangelho de Marcos 1,29-39

Naquele tempo, logo que saíram da sinagoga, foram com Tiago e João para a casa de Simão e André. 30 A sogra de Simão estava de cama, com febre, e logo falaram dela a Jesus. 31    Ele aproximou- se e, tomando-a pela mão, levantou-a; a febre a deixou, e ela se pôs a servi-los. 32   Ao anoitecer, depois do pôr do sol, levavam a Jesus todos os doentes e os que tinham demônios. 33        A cidade inteira se ajuntou à porta da casa. 34  Ele curou muitos que sofriam de diversas enfermidades; expulsou também muitos demônios, e não lhes permitia falar, porque sabiam quem ele era. 35     De madrugada, quando ainda estava bem escuro, Jesus se levantou e saiu rumo a um lugar deserto. Lá, ele orava. 36Simão e os que estavam com ele se puseram a procurá-lo. 37 E quando o encontraram, disseram-lhe: “Todos te procuram”. 38        Jesus respondeu: “Vamos a outros lugares, nas aldeias da redondeza, a fim de que, lá também, eu proclame a Boa Nova. Pois foi para isso que eu saí”. 39   E foi proclamando nas sinagogas por toda a Galiléia, e expulsava os demônios.


DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, ARCEBISPO DE SOROCABA SP


Mc 1,29-39

A perícope evangélica é a descrição da rotina diária de Jesus. Descrevendo como Jesus passou um dia de sua vida terrena, Marcos nos permite imaginar como foram todos os seus dias. O objetivo de Marcos é claro: descrevendo-nos um dia programático de Jesus, revela-nos o programa diário dele; mostra-nos num dia o que é ordinário, se repete e é constante no dia-a-dia de Jesus. Contemplar um dia programático do Senhor significa encontrar a sua vida, as suas escolhas, as suas prioridades, como ele passava o tempo. Como Marcos descreve esse dia programático?

A vida de Jesus consiste na oferta de sua vida por nós: o dom de si mesmo é feito uma vez para sempre na cruz, de maneira definitiva. Mas na sua existência terrena, a oferta de Cristo se desdobra como dom permanente, repetido dia por dia, momento por momento, no transcurso dos dias. A oferta de Cristo se dá na cruz, mas também cada dia e cada momento de sua vida entre os homens.

Essa fidelidade diária de Jesus no dom de si mesmo nos revela que o seu sacrifício não é uma veleidade, uma intenção passageira, um propósito volúvel, mas faz parte do seu cotidiano. Cristo quer se doar e esse desejo não permanece aspiração sem realização, mas faz parte dos seus gestos repetidos, da rotina que constrói a sua vida. Meditando o evangelho de hoje podemos contemplar como Jesus passava os seus dias, quais eram seus horários, quais eram seus compromissos fixos, qual era sua regra de vida.

Jesus, depois de sair da sinagoga, cura os doentes e os endemoninhados. O dia seguinte começa com a oração na solidão, bem de madrugada. Depois de rezar, Jesus comunica sua decisão de partir para outros lugares para pregar, curar e expulsar demônios.

Depois de se manifesta pela pregação e pelas curas, Jesus se esconde para buscar a intimidade com o Pai. De fato, ele nada faz sem o Pai. “Mesmo sendo Filho, aprendeu a obedecer”. Ele aprendeu a obedecer na sua oração perseverante e fiel (exatamente porque estava ocupadíssimo, Jesus dedicava tempo para rezar), na sua pronta obediência à vontade do Pai em ir para outros lugares (o sucesso em Cafarnaum era uma tentação: todos te procuram! Para quê ir embora?). 

Jesus não permaneceu em Cafarnaum para aproveitar o seu sucesso porque ele não veio para se fixar em um lugar. Ele não prega o Evangelho para ter sua recompensa, mas para pregá-lo gratuitamente (é essa a recompensa do evangelizador).

Somos convidados a examinar como nós passamos os nossos dias: quais são as nossas escolhas, as nossas prioridades? O que faz parte de nosso cotidiano? Mas não só: depois disso é preciso confrontar o nosso cotidiano com o de Jesus.


5º DomTComum - Mc 1,29-39 – B - 04-02-2024


No horizonte da cotidianidade inspiradora - Adroaldo Palaoro


“Jesus saiu da sinagoga e foi, com Tiago e João, para a casa de Simão e André” (Mc 1,29).

Neste tempo litúrgico conhecido como “Tempo Comum”, nos convém ter referências que nos ajudem a caminhar sem cair na rotina ou na monotonia. O Evangelho deste domingo nos oferece um texto inspirador que sintetiza o modo com que Jesus organizava sua jornada ou dividia o tempo de sua vida pública.

É significativo o fato de que Ele se instale em Cafarnaum, cidade fronteiriça com os povos pagãos, tanto com Tiro e Sidon, como com as cidades da Decápolis. Com isso, Jesus revela que sua missão é universal, e isso será demonstrado em sua incursão pelas terras do Norte ou fazendo travessia para a outra margem do lago, para o leste; por ambas direções adentrava-se em territórios pagãos.

Embora sua presença pública se dê numa cidade comercial e de tanto movimento de pessoas, o início do evangelho de Marcos indica quatro espaços diferentes no quais Jesus se move; cada um deles se converte em ensinamento e inspiração para todos nós.

Pela manhã, vai à sinagoga; ao meio dia, à casa de Simão; ao entardecer atende os enfermos na rua, e na madrugada, de forma sigilosa, se retira a um lugar solitário para orar.

A oração comunitária, a relação doméstica e familiar, a missão evangelizadora e a oração íntima e pessoal com o Pai se conjugam de modo pleno, para nos indicar como deveria ser nossa jornada, quanto à harmonia e ao exercício das relações essenciais: o trato com nosso Deus Pai, a vida social e laboral solidária, a vida de oração e familiar, e a relação interior. Viver a cotidianidade inspiradora: isso faz a diferença.

Quem sabe, poderíamos nos inspirar no modo de viver diário do Senhor, que deverá ser sempre um referente para o nosso próprio estilo de vida. Do equilíbrio que mantenhamos nas diferentes dimensões dependem o crescimento pessoal, a maturação espiritual e a estabilidade na opção de vida cristã.

Um traço característico de nossa sociedade é o individualismo, o isolamento narcisista que nos centra e nos concentra em nosso eu como lugar referencial de atenção, dedicação, cuidado e investimento de quase todas as nossas energias disponíveis. Temos a sensação de que tudo, a partir de fora, convida a viver fechados e surdos às vozes que vem do nosso eu mais profundo. Muitas demandas externas nos impulsionam a reduzir nossa vida ao tamanho de um “bonsai”, a atrofiar nossos desejos mais nobres até reduzi-los aos pequenos bens acessíveis e a conformar-nos com pequenas doses de prazer egoísta.

Ao nos convidar para percorrer, junto ao Mestre, numa de suas estadias em Cafarnaum, o evangelista Marcos nos apresenta uma cena na qual vemos, como num relance, tudo o que vai ser a existência de Jesus: Ele se dirige à casa de Simão e André; ali encontrava-se acamada a sogra de Pedro.

Uma mulher anônima, que só a conhecemos quando referida a seu genro e possuída pela febre, foi introduzida na festa comunitária do serviço fraterno pela mão libertadora de Jesus.

É o primeiro relato de cura em que o Mestre vai ao encontro de uma enferma. Jesus ouve a conversa dos discípulos sobre a doença da sogra de Pedro, toma a iniciativa, vai até a mulher doente e a toma pela mão. Ao tomá-la pela mão, compartilha a sua força. E assim, revigorada pela sua força, a febre a deixa, ela consegue se levantar e se põe a servir.

Assim soam e ressoam em nosso interior as palavras do evangelista Marcos: “Jesus se aproximou, tomou-a pela mão e a ajudou a levantar-se”. Gestos cheios de carinho, de compaixão, de autoridade interior. Tudo o que faltava à religião oficial, é revelado agora por este galileu diferente, desafiador, que não age movido por leis frias, mas por um coração e uma mente integrados, em sintonia com o Pai.

Vale destacar uma constante no evangelho de Marcos: a casa como lugar preferencial da ação de Jesus e da missão dos seus discípulos. Certamente Jesus ensinava nas sinagogas, mas ali sempre encontrava a resistência e o fechamento daqueles que faziam da Lei o centro da vida; por isso, Jesus, como um inspirado mestre, revela um “novo ensinamento”, não em lugares fechados e controlados, mas em espaços abertos, nos campos, à beira do lago de Genezaré, indo pelos caminhos...; Jesus se dirige aos lugares onde homens e mulheres realizam suas atividades comuns, no simples ambiente do trabalho cotidiano e, de maneira privilegiada, nas casas, começando pela sua própria, em Cafarnaum, onde fora residir.

Jesus, como itinerante, dá início a um “movimento de casas”. É que a casa acaba sendo o espaço alternativo que melhor corresponde à atuação do Mestre, enquanto ponto de partida e de chegada de sua missão itinerante. É a partir das casas que Jesus exerce, à margem do que está estabelecido, sua autoridade em favor da vida, sem depender de instituições e funções previamente normatizadas.

Assim, através de uma rede eficiente, ampliada e centrada no Mestre e com funções complementárias, seus seguidores, a partir das casas, prolongam o ministério de Jesus: “viver em saída”, deslocar-se em direção aos excluídos, revelar a presença do Pai na simplicidade do cotidiano das pessoas, etc.

Neste sentido, a casa cumpre uma função vital para a expansão da causa do Reino de Deus. Em outras palavras, a causa de Jesus (Reino) encontra nas casas seu lugar natural.

É fácil concluir que esta rede de seguidores nas casas acabe se organizando de uma forma concêntrica, ao mesmo tempo que horizontal, favorecendo de modo definitivo e natural o avanço do Reino; tal organização se diferencia das estruturas piramidais e hierárquicas, próprias de toda e qualquer instituição, com os riscos de esclerose que lhe são inerentes. Aqui, revela-se sumamente estimulante re-situar a continuidade da causa de Jesus de Nazaré nos ambientes fraternos e igualitários, onde a casa se revela como espaço próprio da simplicidade e da cotidianidade.

Trata-se, pois, de uma alternativa urgente, frente à persistência petrificada de conservar formas e estruturas anacrônicas que, em função do poder, continuam a predominar em nossos ambientes cristãos, apesar dos apelos insistentes do próprio evangelho.

O Evangelho de Jesus é experiência de casa, de comunhão e palavra para todos, lugar aberto à novidade do Reino. A primitiva comunidade dos seguidores de Jesus não começou formando uma nova religião instituída, nem se preocupou com construções de templos ou com organizações hierarquizadas; ela se apresentou como uma federação de casas abertas, a partir dos pobres e para os pobres, criando redes de comunicação e de vida fraterna, casas-família, impulsionadas pelo testemunho e presença do Espírito do mesmo Jesus.

Ser seguidor(a) é ser chamado(a) a viver no seu dia-a-dia esta mística do amor da maneira como Jesus viveu (na família, no trabalho, no descanso, na luta em favor da vida, nos compromissos sociais...).

O cotidiano é o meio no qual o amor toma densidade e se expressa preferentemente; ele é o lugar privilegiado da vivência da espiritualidade do seguimento, deixando-nos conduzir pelo mesmo Espírito que animou Jesus e o levou a inserir-se na trama da vida humana e a dignificá-la.

Falamos de uma cotidianidade humana, isto é, daquelas atividades de nossa vida diária que, embora irrelevantes em sua aparência, tem uma razão de ser, uma motivação que não se reduz à mera casualidade ou a um impulso instintivo de repetição ou automatismo.

Sabemos que o cotidiano revela um perigo que é a rotina, essa sensação de fazer tudo mecanicamente, inclusive a vivência da fé, e de perder com isso o ardor do novo ou o impacto do extraordinário.

O amor é precisamente o lubrificante que dá sentido à nossa vida cotidiana e nos faz superar as dificuldades inerentes à mesma; o descentramento de nós mesmos, a busca da verdade e do bem comum, a ação comprometida com a vida dos outros... se tornam “normais” quando cultivamos o amor.

Para meditar na oração:

O Espírito nos faz abrir os olhos às realidades novas em nossa vida cotidiana; mas nossos olhos somente se abrirão se formos fiéis à voz do Espírito nos simples atos de nossa vida cotidiana.

- suas atividades diárias fazem parte do seu caminho para Deus? Você tem consciência que cada dia é um “tempo de graça”? Você “apalpa” a presença de Deus nas “rotinas diárias”?



Um coração que vê - José Antonio Pagola


Os evangelhos vão relatando detalhadamente episódios e atuações concretas de Jesus. Mas também oferecem “resumos” ou “sumários” onde se descreve seu estilo de viver: o que ficou mais gravado na lembrança de seus seguidores.


O evangelho de Marcos lembra estes traços: Jesus vive muito atento à dor das pessoas. É incapaz de passar ao largo se vê alguém sofrendo. Seu interesse não é só pregar. Ele deixa tudo, inclusive a oração, para atender às necessidades e sofrimentos das pessoas. Por isso o procuram tanto os enfermos e desvalidos.


Li com alegria o terceiro escrito do papa a toda a Igreja – a encíclica Caritas in veritate – porque, junto com outros acertos, ele soube expor de maneira exata o que ele chama de “programa do cristão”, que deriva do “programa de Jesus”. De acordo com a esplêndida expressão do papa, o cristão deve ser, como Jesus, “um coração que vê onde se precisa de amor e age de acordo”.


O papa olha o mundo com realismo. Reconhece que são muito grandes os progressos no campo da ciência e da técnica. Mas, apesar de tudo, “vemos cada dia o muito que se sofre no mundo por causa de tantas formas de miséria material e espiritual”.


Quem vive com um coração que vê, sabe “captar as necessidades dos outros no mais profundo de seu ser, para fazê-las suas”. Não basta que haja “organizações encarregadas” de prestar ajuda. Se eu aprendo a olhar o outro como Jesus o olhava, descobrirei que “posso oferecer-lhe o olhar de mor de que ele necessita”.


O papa não está pensando em “sentimentos piedosos”. O importante é “não desinteressar-se” daquele que sofre. A caridade cristã “é, antes de tudo, a resposta a uma necessidade imediata numa determinada situação: os famintos precisam ser saciados, os nus vestidos, os doentes atendidos, os prisioneiros visitados”.


É necessária urna atenção profissional bem-organizada. O papa a considera um requisito fundamental, mas “os seres humanos precisam sempre de algo mais que uma atenção tecnicamente correta. Precisam de humanidade. Precisam de atenção cordial”.



Jesus acolhe e cura muitos doentes - Enzo Bianchi

Tradução Moisés Sbardelotto.


No domingo passado, começamos a ler o relato do “dia de Cafarnaum” (cf. Mc 1, 21-34), exemplo concreto de como Jesus vivia, falando do reino de Deus e realizando sinais que o anunciavam. E hoje o relato continua...

Jesus e seus primeiros quatro discípulos, saindo da sinagoga, vão à casa de dois deles, Pedro e André. Assim como havia uma dimensão pública da vida de Jesus, assim também havia uma dimensão privada: a vida vivida com seus discípulos ou com seus amigos, a vida em casa, onde conversavam, se escutavam, comiam juntos e descansavam.

Estas também são dimensões humanas da vida de Jesus, às quais, infeliz e facilmente, não prestamos atenção, mas fazem parte da realidade, do ofício da vida cotidiana...

Assim como nos esquecemos de que Pedro, tendo uma sogra, não era celibatário, mas casado, embora não tenhamos informações mais precisas: tinha filhos? Era viúvo? Certamente, o encontro com Jesus mudou a vida do pescador Simão, que, significativamente, dirá depois a Jesus: “Nós deixamos tudo e te seguimos” (Mc 10,28).

Agora, tendo entrado na casa de Pedro e André, eles se dão conta de que ninguém os acolhe: deveria ser a tarefa da sogra de Pedro, mas uma febre a mantém na cama. A febre é uma indisposição que ocorre com frequência e certamente não é grave ou preocupante. Jesus, informado disso, se aproxima dessa mulher acamada, pega-a pela mão e a faz se levantar.

Ele quer conhecê-la e, assim que se aproxima dela, sem dizer uma palavra, realiza gestos simples, muito humanos, afetuosos: pega na sua mão aquela mão febril, desenvolve uma relação repleta de afeto e, depois, com força, ajuda-a a se levantar.

Esses são os gestos de Jesus que curam: não são gestos de um curandeiro profissional, nem gestos médicos, muito menos gestos mágicos. Se estivermos atentos, compreenderemos que, a exemplo de Jesus, devemos acima de tudo nos aproximar de um doente, fazer-nos próximos, tirá-lo do seu isolamento, pegando a sua mão na nossa, em um contato físico que lhe diga a nossa presença real e, enfim, fazer alguma coisa para que o outro se levante do seu estado de prostração.

Essa ação com que Jesus liberta a mulher da febre pode parecer uma pouca coisa (“um milagre desperdiçado”, escreveu um exegeta!), mas a febre é o sinal mais comum que nos mostra a nossa fragilidade e nos preanuncia a morte da qual toda doença é indício. Sim, Jesus está sempre agindo nos nossos corpos e nas nossas vidas, e sempre discerne, mesmo onde só há febre, que o ser humano adoece para morrer, que qualquer doença é uma contradição da vida plena desejada pelo Senhor para cada um de nós.

Portanto, não nos detenhamos na crônica da ação de Jesus, mas compreendamos como ele, Aquele que vem com o seu Reino, está lutando contra o mal, fazendo-o recuar, até vencer a morte cujo rei é o demônio, aquele que dá a morte e não a vida.

Assim, Jesus aparece como aquele que faz levantar, ressuscita – verbo egheíro, usado para a ressurreição da filha de Jairo (cf. Mc 5,41) e para a própria ressurreição de Jesus (cf. Mc 14,28; 16,6) – cada homem, cada mulher da situação de mal em que se encontra. Ele dá “os sinais” do reino de Deus que vem, onde “nunca mais haverá morte, nem luto, nem grito, nem dor, quando Deus enxugar todas as lágrimas dos nossos olhos” (cf. Ap 21,4; Is 25,8). Quando Jesus cura concretamente, ele narra Deus como Rapha’el, “aquele que cura” (cf. Ex 15,26) e aparece como médico dos corpos e das almas (cf. Mc 2,17).

O que se destaca como fruto desse “fazer levantar” por parte de Jesus é o imediato serviço, a pronta diakonía por parte da sogra de Pedro. Levantados do mal, cabe a nós o serviço aos outros, porque servir ao outro, cuidar do outro é viver o amor por ele: o amor pelo outro é a vontade e a realização do seu bem. No caso presente, essa mulher, já de pé, dá de comer a Jesus e aos seus discípulos, servindo a quem a serviu até a libertar da sua doença.

Chegando a noite, o dia descrito por Marcos como o primeiro em que Jesus atua está quase terminando, mas eis que, de toda a cidade, doentes e endemoninhados são levados até a porta da casa onde ele se encontra. Com ênfase, o evangelista escreve “todos os doentes... a cidade inteira”, porque o afluxo foi considerável.

O que todas aquelas pessoas procuravam? Acima de tudo, a cura, mas certamente também desejavam ver milagres: a medicina era muito cara, muitas vezes sem eficácia, e, além disso, naquele tempo, havia muitos exorcistas, curandeiros, magos aos quais as pessoas iam. Aqueles que foram ao encontro de Jesus, porém, não encontram nem um mago nem um milagreiro. Encontram alguém que cura as pessoas que ele encontra falando, entrando em relação, mas sobretudo despertando nos doentes a fé-confiança: e quando Jesus encontra essa confiança, então pode se manifestar a vida mais forte do que a morte.

Jesus não curava todos, mas – dizem os Evangelhos – curava todos aqueles que ele encontrava, e as suas libertações da doença, do pecado ou do demônio queriam ser sinais, indicações do reino de Deus que ele anunciava e pedia para acolher. Como Mateus interpreta à margem deste trecho, ele se manifesta como o Servo do Senhor que “tomou as nossas enfermidades e carregou as nossas doenças” (Mt 8,17; Is 53,4).

Jesus luta contra as doenças para fazer recuar o poder do mal e do demônio, mas isso ocorre às custas de carregar sobre si mesmo os sofrimentos que ele tenta derrotar! Assim Pedro sintetizará em uma pregação relatada pelos Atos dos Apóstolos: “Jesus de Nazaré passou fazendo o bem e curando todos os que estavam sob o poder do diabo” (At 10,38), porque toda situação de distanciamento de Deus e de domínio da morte se deve à ação do demônio

Vem a noite, mas esta também é feita para agir: antes do amanhecer, Jesus sai de casa, vai a um lugar solitário e lá reza. É a sua oração da manhã, oração que espera o nascer do sol, invocando o Senhor e louvando-o pela luz que vence a noite. Essa ação noturna de Jesus não é secundária, não é um simples apêndice do dia. É a fonte do seu falar e do seu agir, é o início do seu “ritmo” quotidiano, é aquilo que lhe dá a postura para viver todo o dia inteiro na companhia dos homens e mulheres: porque ele é sempre o enviado de Deus, aquele que deve sempre “contá-lo” (cf. Jo 1,18) aos homens e mulheres, e por isso está sempre em comunhão com ele.

A oração de Jesus à noite, em lugares desertos, na solidão, é testemunhada várias vezes pelos Evangelhos, até aquela oração com a qual ele prepara espiritualmente a sua paixão e morte. Oração cheia de confiança, na qual Deus é sempre invocado como “Abbá, papai querido e amado”; oração na qual Jesus discerne a vontade desse Pai que é amor e encontra caminhos para realizá-la; oração na qual o Espírito Santo, companheiro inseparável de Jesus, é para ele força e consolação.

A vigília, a oração noturna que é operação de todo o corpo e não só das faculdades mentais, é decisiva na vida do cristão, que nunca deve esquecer essa “atividade”, verdadeira ação de Jesus.

Mas os primeiros discípulos, a pequena comunidade recém-formada, por iniciativa de Simão, procura Jesus, e nessa “busca de Jesus” há muito mais do que uma busca voltada a saber onde ele está. Na realidade, o quaerere Deum, no Evangelho segundo Marcos, torna-se quaerere Jesum, buscar Jesus. E, quando o encontram com a significativa intenção de rezar, dizem-lhe: “Todos estão te procurando!”.

Quase o perseguem, mas para quê? Aqui se testemunha o desejo de ver, ouvir, encontrar, pedir curas, invocar a libertação do demônio. “Todos estão te procurando!”, dizem os discípulos; de acordo com o quarto Evangelho, até mesmo os pagãos dirão: “Queremos ver Jesus!” (Jo 12,21).

Mas Jesus responde: “Vamos a outros lugares, às aldeias da redondeza! Devo pregar também ali, pois foi para isso que eu saí”. É hora de partir, de continuar a missão juntos em outros vilarejos ainda não alcançados pela boa notícia, pelo Evangelho do Reino. Mas o fundamento de toda essa missão – “Para isso que eu saí” – continua sendo uma expressão ambígua: saído da cidade à noite, ou saído de Deus, do Pai, como entenderíamos se essa expressão fosse atestada pelo quarto Evangelho?

Eis a missão de Jesus: ele foi enviado pelo Pai e saiu ao mundo para fazer o bem e dar a salvação. E assim, de vilarejo em vilarejo, no sábados de sinagoga em sinagoga, Jesus pregava e tirava espaço dos demônios. De Cafarnaum a toda a Galileia...



Marcos 1,29-39 - Carlos Mesters

Na sinagoga de Cafarnaum, Jesus libertou pela manhã um homem possuído por um espírito maligno. Agora ele sai da «sinagoga» e parte para a «casa» de Simão e André. A indicação é importante, pois no evangelho de Marcos o que sucede nessa casa encerra sempre algum ensinamento para as comunidades cristãs.

Jesus passa da sinagoga, lugar oficial da religião judia, à casa, lugar onde se vive a vida quotidiana junto aos seres mais queridos. Nessa casa vai-se formando a nova família de Jesus. Nas comunidades cristãs temos de saber que não é um lugar religioso onde se vive da Lei, mas um lar onde se aprende a viver de forma nova em torno de Jesus.

Ao entrar na casa, os discípulos falam-lhe da sogra de Simão. Não pode sair a acolhê-los, pois está prostrada na cama, com febre. Jesus não necessita de mais. De novo vai quebrar o sábado pela segunda vez no mesmo dia. Para Ele, o importante é a vida sã das pessoas, não as observâncias religiosas. O relato descreve com todo o detalhe os gestos de Jesus com a mulher doente.

*  Jesus restaura a vida para o serviço. Depois de participar da celebração do sábado na sinagoga, Jesus entrou na casa de Pedro e curou a sogra dele. A cura fez com que ela se colocasse de pé e, com a saúde e a dignidade recuperadas, começasse a servir as pessoas. Jesus não só cura a pessoa, mas cura para que a pessoa se coloque a serviço da vida.

*  Jesus acolhe os marginalizados. Ao cair da tarde, terminado o sábado na hora do aparecimento da primeira estrela no céu, Jesus acolhe e cura os doentes e os possessos que o povo tinha trazido. Os doentes e possessos eram as pessoas mais marginalizadas naquela época. Elas não tinham a quem recorrer. Ficavam entregues à caridade pública. Além disso, a religião as considerava impuras. Elas não podiam participar na comunidade. Era como se Deus as rejeitasse e as excluísse. Jesus as acolhe. Assim, aparece em que consiste a Boa Nova de Deus e o que ela quer atingir na vida da gente: acolher os marginalizados e os excluídos, e reintegrá-los na convivência da comunidade.

*  Permanecer unido ao Pai pela oração. Jesus aparece rezando. Ele faz um esforço muito grande para ter o tempo e o ambiente apropriado para rezar. Levantou mais cedo que os outros e foi para um lugar deserto, para poder estar a sós com Deus. Muitas vezes, os evangelhos nos falam da oração de Jesus no silêncio (Mt 14,22-23; Mc 1,35; Lc 5,15-16; 3,21-22). É através da oração que ele mantém viva em si a consciência da sua missão.

*  Manter viva a consciência da missão e não se fechar no resultado já obtido. Jesus se tornou conhecido. Todos iam atrás dele. Esta publicidade agradou aos discípulos. Eles vão em busca de Jesus para levá-lo de volta junto do povo que o procurava, e lhe dizem: Todos te procuram. Pensavam que Jesus fosse atender ao convite. Engano deles! Jesus não atendeu e disse: Vamos para outros lugares. Foi para isto que eu vim!  Eles devem ter estranhado! Jesus não era como eles o imaginavam. Jesus tem uma consciência muito clara da sua missão e quer transmiti-la aos discípulos. Não quer que eles se fechem no resultado já obtido. Não devem olhar para trás. Como Jesus, devem manter bem viva a consciência da sua missão. É a missão recebida do Pai que deve orientá-los na tomada das decisões.

*  Foi para isto que eu vim! Este foi o primeiro mal-entendido entre Jesus e os discípulos. Por ora, é apenas uma pequena divergência. Mais adiante no evangelho de Marcos, este mal-entendido, apesar das muitas advertências de Jesus, vai crescer e chegar a uma quase ruptura entre Jesus e os discípulos (cf. Mc 8,14-21.32-33; 9,32;14,27). Hoje também existem mal-entendidos sobre o rumo do anúncio da Boa Nova. Marcos ajuda a prestar atenção nas divergências, para não permitir que elas cresçam até à ruptura.


Marcos 1,29-39 – Jesus cura da sogra de Pedro - Ildo Bohn Gass


 Ele a tomou pela mão e a fez levantar-se - 

A passagem do evangelho segundo Marcos está claramente dividida em três partes.

1. A cura de uma mulher para a diaconia, o serviço (1,29-31)

No Evangelho segundo Marcos, a primeira cura realizada por Jesus é a expulsão de um espírito impuro de um homem que está sob o domínio de escribas e da sinagoga de Cafarnaum, cidade onde Jesus foi morar, ao iniciar sua missão (Marcos 1,21-28). A lei imposta pelos escribas na sinagoga e no templo, além de ser um peso na vida das pessoas (cf. Mateus 23,1-4; Lucas 13,10-17), impedia que se pensasse e agisse orientado pelo Espírito de Deus. Pois, no dizer de Paulo, “a letra mata, o Espírito é que dá a vida” (2 Coríntios 3,6). Por isso, Jesus salva as pessoas dessa força demoníaca que cria dependência e não liberta.

“Logo que saíram da sinagoga, foram com Tiago e João para a casa de Simão e André” (Marcos 1,29). Convém lembrar que, mais do que frequentar o templo, Jesus prefere as casas, prefere o encontro com povo nos caminhos. Ali, todas as pessoas têm acesso ao encontro com Deus. No templo, só podiam entrar os sacerdotes.

Esta narrativa relata a 2ª cura de Jesus, conforme Marcos. Agora, é a sogra de Simão que está doente (Marcos 1,30). Logo que soube, dirigiu-se à cama em que ela estava. Três coisas chamam a atenção:

1. “Ele aproximou-se” (Marcos 1,31). Mais que procurar quem é o próximo, Jesus se torna próximo.

2. “Tomando-a pela mão”, Jesus faz algo fundamental para quem trabalha com pessoas doentes e com quem está na exclusão. Valorizando o toque, o abraço, Jesus valoriza sobremodo as pessoas debilitadas.

3. Jesus “levantou-a”. Enquanto estava deitada, essa mulher não podia ser sujeito com agir próprio. Dependia de outras pessoas. Colocá-la em pé faz dela uma diácona, uma pessoa livre para servir. “E ela se pôs a servi-los”.

Convém lembrar que, se em Marcos a primeira pessoa curada foi um homem (Marcos 1,21-28), a segunda foi uma mulher. Jesus tratava as mulheres com a mesma dignidade com que se relacionava com os homens. Assim como tinha discípulos, tinha também discípulas. Quando Marcos menciona as mulheres que foram com ele até a cruz, cita Maria Madalena, Maria e Salomé, além de muitas outras mulheres que o seguiam, serviam e subiram com ele para Jerusalém como verdadeiras discípulas (cf. Marcos 15,40-41).

E o que nos resta senão também colocar-nos em pé e, com a força do Espírito de Jesus ressuscitado, tornar-nos pessoas livres para servir?

2. A prática de Jesus liberta de doenças e de possessões (1,32-34)

Naquele dia, depois do pôr do sol e junto à porta da casa de Simão e de André, Jesus ainda curou muitas pessoas enfermas e expulsou demônios, isto é, forças contrárias a Deus e que diminuem a vida de quem está sob seu domínio. As duas curas realizadas anteriormente, a do homem possesso e a da mulher enferma, são símbolos de toda prática libertadora de Jesus. E é prática que não para. Mesmo o sol já posto, Jesus continua libertando pessoas enfermas e endemoninhas.

A proibição de “falar, pois sabiam quem ele era” (Marcos 1,34) faz parte da intenção teológica de Marcos. Ele quer evitar a ideia de Jesus como um messias triunfalista, para reforçar a fé em Jesus como o ungido pelo Espírito de Deus (Marcos 1,10) que vence, aos poucos e de forma humilde como o servo sofredor, as forças contrárias ao espírito do Reino. Por isso, Marcos apresenta Jesus insistindo em que não se divulgue o seu messianismo aos quatro ventos. A proibição se estende aos demônios (Marcos 1,25.34; 3,12), às pessoas curadas (Marcos 1,44; 5,43; 7,36; 8,26) e a seus apóstolos (Marcos 8,30; 9,9), reservando essa revelação somente para o momento da cruz e pela boca de um estrangeiro: “Na verdade, este homem era Filho de Deus” (Marcos 15,39).

Senhor, Deus da vida,

ajuda-nos a acolher a tua graça que cura e liberta das enfermidades,

dos desejos egoístas e do consumismo individualista.

Ó Deus, livra-nos dessas forças que nos seduzem

e arrastam como possessão demoníaca,

forças que nos dominam e impedem de sermos pessoas livres

para, como criaturas novas, colaborar contigo

no serviço ao teu Reino de justiça, a exemplo da mulher que curaste.

3. De onde vem as forças para a nova prática de Jesus? (1,35-39)

Depois de um dia de atividades salvadoras e que vão noite adentro, Jesus descansa para estar com as energias renovadas para mais um dia de serviço à vida. Mas não basta novo vigor físico. Algo mais profundo é necessário.

Por isso, ainda de madrugada, Jesus se retira para um lugar deserto e ali cultiva sua íntima comunhão com o Pai, o Deus libertador do Êxodo. É que vai ao deserto, lugar por onde Deus guiou seu povo para a liberdade e “lá, ele orava” (Marcos 1,35).

A comunhão com o Pai é o segredo da força de Jesus na solidariedade com as pessoas mais desprezadas de sua época, entre elas as doentes e as possessas por todas as forças de alienação e que não permitem que sejam sujeitos de suas vidas. A intimidade com o Pai, essa espiritualidade de comunhão profunda com o sagrado, faz de Jesus uma pessoa radicalmente livre. A oração é a fonte onde Jesus bebe do mais puro Espírito que sustenta sua ação emancipadora junto às pessoas em estado de dependência, seja em relação às enfermidades, seja em relação às forças que nos alienam, impedindo-nos de sermos filhas e filhos livres e com dignidade.

Ó Deus,

concede-nos a graça que permite esvaziar-nos do espírito individualista,

das forças que geram discórdia, exclusão e sofrimento.

Senhor, que teu Espírito libertador do deserto nos transforme e impulsione,

tal como moveu Jesus de Nazaré,

ao ponto de sermos sempre mais semelhantes a ti,

pessoas livres para o serviço da vida,

da cura e de tudo que domina como possessão em nossas mentes e corações.

Amém!



5º Dom TComum – REFLEXÕES – 1° leitura 

Livro de Jó - Thomas Mc Grath

Deus quer a vida e não a morte. A morte de 250.000 não é vontade de deus, não é porque deus quer. Com tanta gente no mundo contaminado e tanta gente morrendo, temos que nos perguntar qual o sentido do sofrimento

Na primeira leitura, Jó comenta, com muita amargura e desilusão, o fato da sua vida estar marcada por um sofrimento terrível e aparentemente Deus está ausente e indiferente diante do seu desespero.  Mas apesar disso, é a Deus que o próprio Jó se dirige, porque ele bem sabe que Deus é a sua única esperança e que fora d'Ele não há possibilidade de salvação.

O livro de Jó antes de ser um livro que fala sobre paciência, é um livro que enfrenta as perguntas mais cruciais da vida. Qual o sentido da vida? Qual a nossa situação diante de Deus, e diante de tanta dor, morte e sofrimento em tempos de pandemia? Qual o papel de Deus na vida neste momento? Qual o sentido do sofrimento? 

Jó, como tanta gente em Manaus, Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso ou Minas Gerais, foi um homem piedoso, bom, generoso e cheio de "temor de Deus", mas mesmo assim sofre. O pensamento predominante para muitas no tempo do Antigo Testamento, como também hoje, é que Deus compensa os bons e castiga os ruins. Deus para eles era previsível, ele faz a contabilidade das ações boas e das ações más e paga o balanço. 

No entanto, no dia a dia nem sempre e assim. Tem os que possuem bens em abundância e vivem vidas longas e aparentemente felizes, e fazem os outros sofrerem. E ao mesmo tempo tem pessoas que enfrentam muito sofrimento por causa da injustiça e da violência e não tem como pagar as contas ou comprar o necessário para a família sobreviver.

O Jó luta contra a ideia que Deus manda o sofrimento. Durante o livro todo ele briga com os seus quatro amigos que defendem essa visão contabilista de Deus. Para ele Deus não é um comerciante que paga conforme a qualidade da mercadoria que recebe. No livro ele sai em busca do verdadeiro rosto de Deus.

Ele reconhece a sua pequenez, e sabe que ele não pode julgar a Deus. Ele sabe que o sofrimento dele não é castigo, ele rejeita a visão que os quatro amigos tem de Deus, mas não rejeita Deus, como os amigos queriam. No livro ele se entrega totalmente nas mãos desse Deus, sem compreender, mas cheio de amor, e confia plenamente na misericórdia do Pai e é por isso que no fim, o Jó recebe os aplausos de Deus. Deus chama os quatro amigos de Jó e disse “vocês não falaram a verdade a meu respeito, como o meu servo Jó falou”. Jó se curvou diante de Deus e disse “Eu não valho nada; que posso responder? Prefiro ficar calado.  Já falei mais do que devia e agora não tenho nada para dizer.” (Jó 40, 4-5).  E de novo no capitulo 42, 5-6 disse a Deus “Antes eu te conhecia só por ouvir falar, mas agora eu te vejo com os meus próprios olhos. Por isso, estou envergonhado de tudo o que disse e me arrependo, sentado aqui no chão, num monte de cinzas. ”

Hoje nós diante de tanta morte e sofrimento da COVID-19 podemos fazer como o Jó: reconhecer a nossa pequenez, e a nossa incapacidade de compreender as coisas; confiar na misericórdia de Deus e repetir nas palavras de Jó “Antes eu te conhecia só por ouvir falar, mas agora eu te vejo com os meus próprios olhos.”



TEXTO DE DOM DAMIAN NANNINI, ARGENTINA.


5º DOMINGO TEMPO COMUM - CICLO “B”

(TRADUZIDO PELO GOOGLE SEM CORREÇÃO)

1º Leitura (Jó 7,1-4.6-7):

O texto começa com uma afirmação categórica sobre a condição humana: “O homem na terra cumpre um serviço, seus dias são os de um diarista (ou assalariado)"(7,1). Esse serviço se referiria aos militares, pois a condição do homem é levar a vida de soldado ou assalariado, o que implica que é uma vida cheia de lutas e angústias, de trabalho e cansaço. Daí o desejo permanente de alívio, de consolo, que se cristaliza na sombra do servo-escravo e no salário do assalariado (7,2).

Em 7,3-4 o autor passa da afirmação genérica para a sua situação particular e descobre que não há consolação na sua vida. Pelo contrário, a dor é tanta que apenas aspira que o tempo passe, sem encontrar nele nenhum alívio. E embora o tempo passe rápido e a vida seja curta ou a morte prematura, isso não significa que haja sentido numa vida submetida ao sofrimento (7,6). Foi assim que a versão LXX interpretou ao traduzir a segunda metade deste versículo: “estão perdidos ou destruídos em vã esperança”(a vpo,lwlen de. e vn kenh/| e vlpi,di). Como aponta L. Alonso Schökel1, se trata de "uma existência sem sentido, o absurdo de ser homem".

Agora, deste “sentimento trágico” de uma vida encurralada pelo sofrimento e percebida sobretudo como algo passageiro e passageiro, como um sopro, Jó eleva a sua oração a Deus, pedindo-lhe que tenha em conta a sua situação. A ligação com Deus, possível através da fé mesmo na dor, é a novidade do livro de Jó: “Este fragmento pode ser lido como um contraponto judaico à filosofia helenística popular, que modulou em variações díspares o tema da expiração da vida e da dor incompreensível que assola a humanidade. O sentimento trágico da vida, típico do mundo grego, está presente também em Jó com toda a sua virulência e eficácia; No entanto, escapa de alguma forma a uma solução fatalista, pois, enquanto falta aos gregos intimidade e diálogo com os seus deuses, Jó pode falar com o seu Deus ou pelo menos invocá-lo, ousando mesmo convocá-lo para julgamento. Elelembrar(v. 7) dirigido a Deus estabelece a verdadeira diferença entre a tragédia grega e a questão do homem bíblico diante do mal"2.

2º. Leitura (1Cor 9,16-19.22-23):

Na primeira parte de 1Cor 9 Paulo explica quais são os direitos legítimos que correspondem aos apóstolos: comida, bebida, a companhia de uma mulher cristã ou, literalmente, “mulher irmã” (a vdelfh.n gunai /to); e não ter que trabalhar para se sustentar.

Agora, Paulo explica que ele abriu mão deste direito legítimo de ser apoiado pelos coríntios para “não atrapalhe o evangelho”(9,12). O propósito desta renúncia é explicado em 9:15-18, afirmando que a pregação do evangelho não é para ele algo empreendido por iniciativa própria que mereça recompensa; mas uma necessidade, uma comissão recebida de Cristo. Assim, ele renunciou a esse direito para que a natureza gratuita do evangelho e a salvação realizada em Cristo possam brilhar mais claramente (v. 18). Mas o facto de Paulo não fazer uso deste direito não significa que não seja apóstolo, como pensavam alguns coríntios e perante os quais se defende nesta apologia. Pelo contrário, ele mostrou que “Ele é verdadeiramente um apóstolo e um apóstolo livre; tão livre que é capaz de abrir mão de seus próprios direitos"3. Na última parte do seu argumento, Paulo testemunha como subordinou a sua liberdade ao bem dos outros. A caridade o levou a renunciar à própria condição para assumir a condição dos outros: dos que estão sob a lei (os judeus), dos que estão sem lei (os gentios), dos fracos (os que não têm conhecimento). para 8,9); com o único propósito de ganhá-los para o evangelho (19-22). O propósito pessoal e a motivação disso é ser um participante do evangelho: "E faço tudo isso para que o Evangelho seja participante dele." (9,23).

1L. Alonso Schökel – JL Sicre Diaz,Trabalho. Comentário teológico e literário(Cristianismo; Madrid 1983) 160.2G. Zevini- P. G. Cabra,Lectio Divina para todos os dias do ano. Vol.14(Palavra Divina; Estella 2004) 38.3J. M. Díaz Rodelas, Primeira carta aos Coríntios, 157.

2

Evangelho (Mc 1,29-39):

O evangelho deste domingo contém três cenas concatenadas. Emprimeiro lugar,a cura da sogra de Pedro;entãoas curas noturnas; e,por último, A retirada de Jesus na solidão para orar.

Depois do que aconteceu na sinagoga de Cafarnaum (evangelho do último domingo) Jesus vai com quatro dos seus discípulos à casa de dois deles: Simão e André. Assim que chegam avisam que a sogra de Pedro está de cama com febre. Embora o tipo de doença não seja especificado, o fato de ela estar acamada sugere certa gravidade. Um único versículo trata de relatar sua cura por Jesus. Temos a história de milagre mais curta da tradição evangélica; mas não menos significativo. Como as outras curas de Jesus,Eles são um sinal de seu poder para derrotar o mal. Ele curou o homem possuído pelo espírito impuro em público apenas com sua palavra; Agora a sogra de Pedro se cura em casa com o simples gesto de pegar sua mão e levantá-la. Estas manifestações de poder são para São Marcos uma manifestação da autoridade divina de Jesus. Esta vitória de Jesus sobre os demônios e as doenças anuncia o estabelecimento do Reino de Deus.

Jesus a cura e ela começa a servi-los. Como era sábado, podemos supor que ele então compartilhou a refeição típica daquele feriado naquela casa com seus discípulos. Então é precisamente indicado que o sol já havia se posto - portanto a obrigação do descanso sabático havia terminado - quando os enfermos e os endemoninhados trouxeram Jesus à porta da casa; e Ele os cura e os liberta.

A última cena descreve Jesus que, antes do amanhecer, se retira para um lugar deserto para orar. Os seus discípulos encontram-no ali para lhe dizer que o povo de Cafarnaum o procura. A resposta de Jesus não é voltar para lá, mas ir às cidades vizinhas para pregar ali, porque esta é a sua missão (“Foi por isso que eu saí"). Esta última expressão não se refere apenas ao passado imediato, mas antes recapitula de certa forma tudo o que veio antes. Isso fica claro se prestarmos atenção ao verbo "sair" (e vxe,rcomai) que além daqui encontramos em 1,29: Jesus “sai” da sinagoga e vai para casa; e em 1:35: ele “sai” de casa e vai para o deserto rezar. No final (1,38) ele diz que “saiu” para pregar o Reino de Deus. Talvez possamos dizer aqui que Jesus abandona o modelo rabínico dos professores do seu tempo, segundo o qual o professor deveria estar vinculado a uma sede fixa, para se tornar um pregador itinerante, mais próximo do modelo dos antigos profetas.4.

Segundo J. Gnilka a intenção do evangelista nesta cena é "destacar o caráter especial da atuação de Jesus. A oração e a missão da pregação constituem uma unidade indissolúvel"5.

Meditação:

Particularmente significativos são os versículos de Marcos 1:21-39, pois descrevem o que foi chamado de “um dia na vida de Jesus”. Esta apresentação responde ao interesse próprio de Marcos que prefere mostrar Jesus agindo com poder e falando com autoridade, mas sem registrar sua pregação. Na perspectiva dos discípulos é importante porque eles podem observar um dia específico da vida de Jesus e conhecê-lo melhor. Na verdade, como diz com razão F. Oñoro6, uma pessoa é conhecida pela sua agenda, pois reflete suas avaliações, ou seja, as pessoas mais apreciadas a quem dedica tempo e atenção; as atividades priorizadas; o tempo que dedica à oração e ao descanso, etc.

Quais são, então, as atividades que “preenchem” um dia na vida de Jesus?

4Cf. G. Zevini - PG Cabra,Lectio divina para cada dia do ano 14(Palavra Divina; Estella 2002) 42.5O Evangelho segundo São Marcos. Vol. eu(Siga-me; Salamanca 1992) 103.

6“Abordagem básica do discipulado a partir do evangelho de Marcos”, emBoletim Informativo da OSLAM, julho a dezembro de 2005, 63.

3

•Ele prega para as pessoas na sinagoga.

•Cura um homem possuído por um espírito impuro.

•Ele se retira para casa com seus discípulos e ali cura a sogra de Pedro.

•Ele cura muitos doentes e possuídos por demônios que o levam para sua casa.

•Ele se retira para orar sozinho bem cedo pela manhã.

Em resumo, podemos dizer que Jesus prega, anuncia a chegada do Reino; Ele sente compaixão pelos doentes e possuídos por demônios, curando-os e libertando-os; Ele partilha a intimidade da casa com os seus discípulos; Ele se retira para a solidão para orar. Portanto, seu tempo é dividido entreatenção do povo, partilha com os seus discípulos e oração solitária. Se seguirmos a ordem cronológica de sua época (não a da história do evangelho), suas prioridades são:

•oração a Deus,

•o cuidado dos necessitados,

•descanso ou abrigo familiar-comunitário.

Alguns comentadores convidam-nos a ir além destasAçõesespecificidades de Jesus para capturar seuatitudescomo evangelizador.  

Emprimeiro lugar,sãoserviço, atitude compassiva,porque está sempre atento às necessidades dos outros e pronto a ajudá-los. Jesus dedica grande parte do seu tempo cuidando das pessoas, ouvindo, curando, libertando. Temos muito a aprender com Jesus em sua dedicação aos mais necessitados. Como diz H. U. von Balthasar7: “O autêntico apóstolo cristão pode tomar como exemplo o zelo incansável de Jesus: embora a tarefa que tem pela frente pareça irrealizável do ponto de vista humano, ele trabalhará tanto quanto as suas forças o permitirem; o resto será completado pelo seu sofrimento ou pelo menos pela sua obediência interior. Mas esta interioridade nunca pode ser desculpa para não fazer tudo o que está ao seu alcance.”.

Entãosãoatitude de comunhãoPor participar da festa do sábado com seus apóstolos, ele reserva tempo para estar com eles “em casa”. Também devemos aprender do Senhor a saber descansar e desfrutar de legítimos momentos de recreação com os outros, de família e de partilha fraterna. Às vezes não é fácil saber parar e abandonar as “atividades úteis” para entrar nesta dimensão da “festa” onde o tempo é vivido sem pressa e com sentido de gratuidade. Isso me lembra uma frase de J. Piper, que soava mais ou menos assim: o difícil não é preparar uma festa, mas encontrar pessoas dignas de participar dela.

E,finalmente, sãoatitude de oração, de contemplação, pois busca a solidão e o silêncio tão necessários para encontrar o Pai. Descobrimos então em Jesus um equilíbrio interessante entre a proximidade dos homens e a proximidade de Deus; entre imanência e transcendência. Com efeito, Jesus aparece próximo dos homens, atento às suas necessidades de cura e de libertação do mal, físico e espiritual. Mas ele não fica aqui, mas sai em busca na oração solitária o encontro com o Pai, com o Absoluto, distanciando-se dos homens... para voltar a eles renovado na sua missão.

A este respeito, o Papa Francisco disse no Angelus de 7 de fevereiro de 2021: “O Filho de Deus manifesta o seu senhorio não “de cima para baixo”, não à distância, mas curvando-se, estendendo a mão; Ele manifesta seu Senhorio em proximidade, ternura e compaixão. Proximidade, ternura, compaixão são o estilo de Deus. Deus se torna próximo e se torna próximo com ternura e compaixão. Quantas vezes no Evangelho lemos, diante de um problema de saúde ou de qualquer problema: “teve compaixão”. A compaixão de Jesus, a proximidade de Deus em Jesus é o estilo de Deus. O Evangelho de hoje recorda-nos também que esta compaixão tem as suas raízes na relação íntima com o Pai. Porque? Antes do amanhecer e depois do anoitecer, Jesus ia embora e ficava sozinho para orar (v. 35). Daí ele tirou forças para cumprir seu ministério, pregando e curando. Que a Virgem Santa nos ajude a deixar-nos curar por Jesus – precisamos sempre disso, todos nós – para que possamos, por nossa vez, ser testemunhas da ternura curativa de Deus..”

7A luz da palavra. Comentário às leituras de domingo(Reunião; Madrid 1998) 137.

4

Tanto as ações como as atitudes de Jesus respondem e refletem concretamente uma orientação geral e unificadora da sua vida, que é a suamissão. Em efeito,Jesus declara que a sua missão é pregar, por isso saiu. Ele saiu do Pai para anunciar a chegada do Reino de Deus. A missão tem a sua origem na mesma Trindade com a geração eterna do Verbo; e a encarnação é a concretização na história e no tempo deste mistério eterno. Precisamente por causa desta “pedagogia divina” da encarnação, Jesus acompanha a sua pregação com diversas curas e exorcismos que são sinais eficazes da presença de Deus.

Vemos também que Jesus no cumprimento da sua missão “não está vinculado ao sucesso”,Mas ele tem sempre como prioridade a vontade do Pai que o enviou para pregar, para percorrer toda a região, por isso continua no seu caminho. Em efeito, "Jesus não sucumbe à tentação do sucesso e da notoriedade como nós, correndo o risco de ser devorado por aqueles que reivindicam uma “proximidade” que se torna uma pretensão de possuir Deus e domesticá-lo. Jesus, pelo contrário, “saiu” para se retirar para orar; Ele não se coloca no centro, mas sim o Pai. Jesus realiza verdadeiramente o seu próprio “êxodo” das expectativas das pessoas, aceitando, em vez disso, a difícil vontade de Deus. A nossa oração deve ser, portanto, uma busca da vontade de Deus pelo exemplo e com a ajuda de Jesus."8.

Os discípulos de ontem e de hoje encontram aqui toda uma escola de vida cristã e uma luz profunda para examinar a nossa obra missionária. Sobre este último diz L. Rivas9:"Observemos se na nossa tarefa permanecemos em meras palavras sem alcançar gestos libertadores, ou se, pelo contrário, nos deixamos absorver pela acção a nível social sem dar lugar ao anúncio do mistério de Deus. Perguntemo-nos se a nossa pregação e a nossa acção se baseiam suficientemente na oração incansável. E, finalmente, examinemos a nossa consciência para saber se nas nossas tarefas apostólicas procuramos a glória de Deus, ou se medimos o sucesso pela notoriedade que adquirimos na comunidade.

Tomando Jesus, o primeiro evangelizador, como modelo, nos tornaremos verdadeiros missionários".

Entre a primeira leitura, do livro de Jó, e o evangelho de hoje encontramos um grande contraste. Jó reclama em geral da vida com suas rotinas repetidas, sem sentido transcendente. E depois a sua vida privada, aprisionada por tanto sofrimento que ela vivencia a passagem do tempo como uma tortura que nunca acaba. O problema é que o sofrimento o levou a fechar-se em si mesmo, a um isolamento que, de certa forma, é um remédio pior do que a sua doença.

Pelo contrário, o Evangelho mostra-nos Jesus cheio de vida e de energia porque sai de si mesmo para se doar aos outros. É uma vida fecunda, cheia de significado e alegria.

Ambos os textos têm em comum o facto de terminarem em oração. Jó finalmente consegue sair um pouco de si para pedir a Deus que se lembre da sua vida infeliz, que o leve em conta porque a sua vida está prestes a “evaporar”. No final do livro vemos que Deus intervém e o restaura para uma vida plena e feliz. Por sua vez, Jesus procura com a sua oração “ancorar” a sua vida no transcendente, no amor do seu Pai, que o liberta das amarras para não perder de vista a sua vocação fundamental e cumprir a sua missão.

Podemos muito bem recordar aqui o que o Papa Francisco disse aos jovens em Cristo Vive: “Esta vocação missionária tem a ver com o nosso serviço aos outros. Porque a nossa vida na terra atinge a sua plenitude quando se torna oferenda. Lembro-me que “a missão no coração da cidade não é uma parte da minha vida, nem um ornamento que possa tirar; Não é um apêndice ou outro momento de existência. É algo que não posso arrancar do meu ser se não quiser me destruir. “Sou uma missão nesta terra e é por isso que estou neste mundo.” Por conseguinte, devemos pensar que: toda pastoral é vocacional, toda formação é vocacional e toda espiritualidade é vocacional (254).

“A tua vocação não consiste apenas nos trabalhos que tens que realizar, embora neles se expresse. É algo mais, é um caminho que guiará muitos esforços e muitas ações na direção do serviço. Portanto, no discernimento de uma vocação é importante verificar se reconhecemos em nós mesmos as capacidades necessárias para esse serviço específico à sociedade (255).

8G. Zevini- P. G. Cabra,Lectio Divina para todos os dias do ano. Vol.14(Palavra Divina; Estella 2004) 43.9Jesus fala ao seu povo. Domingos durante o ciclo B ano(CEA; Buenos Aires 2002) 38.

5

PARA ORAÇÃO (RESSONÂNCIAS DO EVANGELHO EM ORAÇÃO):Pregador

Senhor Jesus

Você é o Pregador, a Palavra Criadora

Conceda-nos a graça do silêncio interior

Estar atento à sua mensagem de Amor.

Dispersos, vagando e atordoados

Vamos seguir o caminho da paixão

Doente, febril, buscando cura.

Longe e alto vemos a montanha sagrada

O local de descanso e encontro…

Na solidão, acompanhado de oração.

Ensina-nos, Mestre, a orar como Tu

Somos difíceis de entender, levados à agitação

Perdido na multidão, inclinado aos vícios.

A notícia nos pega,

Eles nos abstraem do divino

E caímos no chão, alienados, vazios.

A Força prometida nós te imploramos

Envia-nos Pai através de Jesus Cristo, o Senhor

Seu Espírito Santo, verdadeiro socorro, consolador. Amém.