4º DOM.TC-A

AS BEM-AVENTURANÇAS

4º DOMINGO COMUM-A

 

29/01/2023

LINKS AUXILIARES:

ÁUDIO DO COMENTÁRIO DESTA PÁGINA

AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO

TODOS OS VÍDEOS DE DOM JÚLIO


 

1ª Leitura: Sofonias 2,3;3,12-13

 

Salmo 145 (146) R- Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus!

 

2ª leitura:- 1 Coríntios 1, 26-31

 

Evangelho de Mateus 5,1-12a

 

Proclamação do evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus – Naquele tempo, 1vendo Jesus as multidões, subiu ao monte e sentou-se. Os discípulos aproximaram-se, 2e Jesus começou a ensiná-los: 3“Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o reino dos céus. 4Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados. 5Bem-aventurados os mansos, porque possuirão a terra. 6Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados. 7Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. 8Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus. 9Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus. 10Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. 11Bem-aventurados sois vós quando vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo tipo de mal contra vós por causa de mim. 12Alegrai-vos e exultai, porque será grande a vossa recompensa nos céus”. – Palavra da salvação


Dom Júlio Endi Akamine - Arcebispo de Sorocaba SP


Mt 5,1-10: As Bem-aventuranças


Todos nós desejamos a felicidade e nesta busca da felicidade podemos seguir vários caminhos. Alguns podem seguir os caminhos do mundo, procurando a felicidade na força e na riqueza. Não demora muito, esses descobrem que se trata de um beco sem saída: a felicidade tão desejada se distancia cada vez mais.

Jesus proclamou as bem-aventuranças como um programa de uma felicidade que se expande de maneira poderosa. Trata-se de um programa de existência feliz.

Devemos notar que este programa não é pura teoria, pois o próprio Jesus viveu as bem-aventuranças de modo perfeito. Por isso, se quisermos entender bem as bem-aventuranças, é preciso olhar para Jesus.

Mais. Os cristãos, que escutaram o grande anúncio da felicidade, são também os pregoeiros e as testemunhas da felicidade. Esta é a norma de vida da igreja.

Bem-aventurados os pobres de espírito porque deles é o reino dos Céus (5,3)

Os pobres são os que padecem miséria no mundo, são os pobres materiais, os perdidos da terra, os famintos, os que padecem, no mundo da opressão, o desamparo, a impotência. O Reino de Deus é graça.

Todavia Mateus explicitou esta palavra quando diz os pobres em espírito. Ao acrescentar “de espírito” quis referir-se aos que assumem voluntariamente a pobreza dentro da Igreja; poderiam realizar-se como ricos, cultivar seu próprio bem, buscando suas vantagens; contudo à luz do Evangelho preferiram a pobreza. São pobres por seu espírito, isto é, por decisão consciente, programada.

A riqueza deste mundo é destruidora, pois divide as pessoas e os leva a se dominarem uns aos outros. Por isso são felizes os pobres materiais, aqueles que são marginalizados e explorados da vida: Deus está do lado deles. Mas também são bem-aventurados os que optaram pelo caminho da pobreza.

Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados (5,4)

A maior parte das pessoas quer se libertar, eliminando o sofrimento; por isso o evitamos, esquecendo os males que nos cercam, caminhando como cegos, como surdos, no meio de uma terra em que milhões de pessoas choram. Ficamos presos em nossa gaiola de ouro de nossa autossuficiência. Drogamo-nos e nos alienamos.

Pois bem, o Evangelho sabe que não existe felicidade verdadeira no esquecimento e na indiferença. Temos que assumir nosso próprio sofrimento, como um tipo de pobreza radical, com simplicidade e coragem e aceitando o dom do Reino como nosso consolo. São felizes aqueles que assumem interiormente o sofrimento com maturidade e alegria.

Também aqui poderíamos falar de pessoas que choram “em espírito”, isto é, assumem a dor dos outros para solidarizar-se, para acompanhar e ajudar os aflitos.

Bem-aventurados os mansos, porque eles possuirão a terra (5,5)

Mansos são aqueles que não impõem um jugo dominante aos outros; acolhem e ajudam os outros sem colocar fardos sobre seus ombros (vinde a mim todos vós que estais cansados e sobrecarregados e eu vos aliviarei, porque sou manso e humilde de coração e o meu jugo é suave e meu peso leve).

Os mansos herdarão a terra. Não a herdam os que tentam conquistá-la com exército e riqueza, com astúcia e com guerra. Em vez de libertá-la, eles a destroem. Contra eles, Jesus pronuncia sua bem-aventurança: quem pretende receber a herança da terra tem que vir de forma humilde, mansamente, sem violência.

O manso não é um fraco. Pelo contrário é criativo e tenaz. Está empenhado em libertar a terra e vive em gesto de confiança para com os outros. Escolhe a pobreza, assume o sofrimento.

Este é o paradoxo que Jesus veio trazer à terra: os que tentam impor sua força dominando os outros destroem a vida das pessoas e aniquilam a terra; só os que buscam mansamente e colaboram com os outros, cheios de esperança, constróem a cidade de amor para os homens.

Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão saciados (5,6)

Os mansos não são indiferentes. Estão cheios de zelo pela casa de Deus e por isso têm fome e sede de justiça.

Fome e sede indicam um desejo originário da vida: são a força que mantém os homens em ação e os leva à busca e conquista dos bens materiais. Pois bem, o Evangelho quer que despertemos uma forma diferente de inquietação e de desejo: fome e sede de justiça.

Justiça significa a plenitude do Evangelho, o dom de Deus aberto aos pobres, aos perdidos e humilhados da terra. Não é justiça a atitude daquele que pretende respeitar a ordem existente, de modo que cada um se feche no que lhe é próprio. Segundo a tradição bíblica, justiça significa amor que age: é compaixão, ajuda aos pobres, solidariedade comprometida.

A justiça tende a fartura, a injustiça é divisão, carestia, opressão. 

Bem-aventurados os misericordiosos, porque eles alcançarão misericórdia (5,7)

Alcançarão misericórdia de quem? De Deus. Os misericordiosos serão tratados misericordiosamente por Deus. Quem é misericordioso terá misericórdia de Deus.

Conforme os princípios deste mundo, a gente só adquire aquilo que é capaz de conquistar por meio da violência; devo negar ou escravizar os outros a fim de realizar minha vida.

Pois bem, o Evangelho inverte o princípio dizendo: “Dai e vos será dado” (Lc 6,38). A vida é graça e só ali onde se exprime gratuitamente surge a felicidade verdadeira. Tenho o que ofereço, conservo o que dou. Dessa forma, sou misericordioso: entro na lógica de Deus que oferece a vida a todos os viventes.

Bem-aventurados os puros de coração porque eles verão a Deus (5,8)

Os doutores da Lei procuravam ter mãos limpas, ou seja, estavam somente preocupados em seguir as leis e suas tradições. A pureza deles era pureza de sangue, de raça, de costumes sócio-religiosos, de conhecimentos e de normas. É a pureza de um grupinho separado do conjunto dos outros. Cristo pelo contrário busca a limpeza de coração.

Bem-aventurados os que promovem a paz, porque eles serão chamados filhos de Deus (5,9)

Paz não é resultado da força, não se consegue com violência. A paz é sempre graça. Só aparece ali onde as pessoas quebram a lógica do interesse, do domínio de uns sobre os outros.

Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus (5,10)

Não podemos ser cristãos sem riscos e perigos. Os bem-aventurados de Jesus não buscam abrigo de um lugar seguro, não fogem para o intimismo. Eles apresentam o programa de vida e de alegria de Jesus nas praças e nas ruas onde estão as pessoas. Sua mensagem é de inversão dos valores e princípios deste mundo.

Esta mensagem não se impõe pela violência e nisto reside o risco. Este risco pertence ao núcleo radical do Evangelho.



Bem-aventuranças - José Antonio Pagola


Ao formular as bem-aventuranças, Mateus, diferentemente de Lucas, preocupa-se em traçar as linhas que devem caracterizar os seguidores de Jesus. Daí a importância que têm para nós nestes tempos em que a Igreja deve ir encontrando o seu próprio estilo de vida no meio de uma sociedade secularizada.

Não é possível propor a Boa Nova de Jesus de qualquer forma. O Evangelho se difunde somente a partir de atitudes evangélicas. As bem-aventuranças nos indicam o espírito que há de inspirar a atuação da Igreja enquanto peregrina a caminho do Pai. Temos de escutá-las em atitude de conversão pessoal e comunitária. Somente assim poderemos caminhar para o futuro.

Feliz a Igreja “pobre de espírito” e de coração simples, que atua sem prepotência nem arrogância, sem riquezas nem esplendor, sustentada pela autoridade humilde de Jesus. Dela é o reino de Deus.

Feliz a Igreja que chora com os que choram e sofrem, ao ser despojada de privilégios e poder, pois poderá partilhar melhor a sorte dos perdedores e também o destino de Jesus. Um dia será consolada por Deus.

Feliz a Igreja que renuncia a impor-se pela força, pela coação ou pela submissão, praticando sempre a mansidão do seu Mestre e Senhor. Herdará um dia a terra prometida.

Feliz a Igreja que tem fome e sede de justiça dentro de si mesma e para o mundo inteiro, pois procurará a sua própria conversão e trabalhará por uma vida mais justa e digna para todos, começando pelos últimos. A sua ânsia será saciada por Deus.

Feliz a Igreja compassiva que renuncia ao rigorismo e prefere a misericórdia antes que os sacrifícios, pois acolherá os pecadores e não lhes ocultará a Boa Nova de Jesus. Ela obterá de Deus a misericórdia.

Feliz a Igreja de coração limpo e conduta transparente, que não encobre os seus pecados nem promove o secretismo ou a ambiguidade, pois caminhará na verdade de Jesus. Um dia verá Deus.

Feliz a Igreja que trabalha pela paz e luta contra as guerras, que junta os corações e semeia a concórdia, pois contagiará a paz de Jesus que o mundo não pode dar. Ela será filha de Deus.

Feliz a Igreja que sofre hostilidade e perseguição por causa da justiça sem evitar o martírio, pois saberá chorar com as vítimas e conhecerá a cruz de Jesus. Dela é o reino de Deus.

A sociedade atual necessita conhecer comunidades cristãs marcadas por este espírito das bem-aventuranças. Somente uma Igreja evangélica tem autoridade e credibilidade para mostrar o rosto de Jesus aos homens e mulheres de hoje.

Cada um de nós deve decidir como quer viver e como quer morrer. Cada um deve escutar a sua própria verdade. Para mim, não é o mesmo acreditar em Deus que não acreditar nele. Para mim, faz bem realizar o caminho por este mundo sentindo-me acolhido, fortalecido, perdoado e salvo pelo Deus revelado em Jesus.


Um caminho diferente - Ana Maria Casarotti


Hoje lemos as bem-aventuranças, muito conhecidas, mas não sempre entendidas na sua riqueza e variedade. Para entender melhor seu sentido tentemos imaginar a cena descrita no texto evangélico.

No domingo passado aprofundamos e Jesus que percorre Galilea anunciando a boa nova. Hoje vemos Jesus subindo um monte acompanhado de uma multidão que com desejo de segui-lo, escutar suas palavras, receber seu consolo.

Quem são essas pessoas?

Nos versículos precedem o Sermão da Montanha Mateus no-lo diz:"doentes atingidos por diversos males e tormentos: endemoninhados, epilépticos e paralíticos, numerosas multidões da Galileia, da Decápole, de Jerusalém da Judéia e do outro lado do rio Jordão começaram a seguir Jesus" (Mt 4, 24-25).

Pessoas que ficaram impressionadas com suas atitudes no meio do povo e sua pessoa os atrai, desejam escutá-lo, e possivelmente receber algum milagre, alguma curação. A procissão de todos os que sofrem, dos marginalizados em busca de cura de suas mais diversas enfermidades...

Imaginemo-nos essa cena e cada um e cada uma de nós faz parte de esse grupo dos que seguem Jesus. É um caminho que oferece dificuldades. Não sabemos até onde deseja ir mas confiamos nele, mais ainda, necessitamos dele.

Gente, por conseguinte, sem importância, sem poder, sem reconhecimento social... A procissão de todos os que sofrem, dos marginalizados em busca de cura de suas mais diversas enfermidades...

Jesus os cura a todos. Mas tem algo a mais a oferecer-lhes: a possibilidade de formarem um novo Povo de Deus, um povo que se esforce por construir um mundo melhor!

A cena se passa num monte que, na Bíblia, significa lugar da revelação divina: lembremo-nos do Sinai, onde Javé, por meio de Moisés, revelou-se ao povo de Israel.

Jesus senta-se para falar, assumindo, assim, a posição típica do mestre na cultura hebraica. Moisés sinala um limite até onde o povo, que peregrinava no deserto procurando a Terra Prometida, podia aproximar-se dele. Jesus apresenta muita proximidade com todos e todas os que estão ali. Não há limite, qualquer pessoa pode estar perto dele. Nesse gesto, Jesus apresenta-nos que suas palavras são para todos e todas, sem distinção nenhuma.

Acomoda-se um grupo de pessoas: são seus discípulos e discípulas que, sentados a seus pés, escutam-no com as multidões.

Que revelação nos quer fazer Jesus neste sermão? Quer anunciar-nos e apresentar-nos, a nós, seus seguidores e seguidoras, o caminho que leva à felicidade e à santidade.

Todo ser humano quer e busca ser feliz e tem, como vocação pessoal a santidade. Essas duas realidades: alegria e santidade - parecem, não raro, opostas.

Jesus apresenta-las intimamente ligadas. Por isso, baseado na sua experiência o apóstolo Paulo escreve aos Corintios:"Irmãos, fiquem alegres. Procurem a perfeição e animem-se. Tenham os mesmos sentimentos, vivam na paz e o Deus do amor e da paz estará com vocês."(2Cor 13, 11)

Que visão tenho eu dos cristãos? Rosto compungido, corpo arcado pelo peso de penitências, vida marcada por tristeza, depressão, solidão... ou alegria animada, solidária e contagiante?

Como ser santo e alegre nos dias atuais, tão angustiosos e trágicos, eivados de problemas?

Acreditou-se – e ainda se acredita – que a santidade é algo que só se adquire à custa de um imenso esforço; que sua chave se encontra em cansativa força de vontade; que ela é sinônimo de perfeição plena, ausência de erros e de fragilidades, privilégio, portanto, de poucas pessoas que a ela são chamadas.

Jesus, nesse discurso das Bem-Aventuranças, aponta-nos o caminho de acolhida da alegria, generosidade, liberdade, capacidade interior que ele nos oferece para fazer parte do seu povo e viver assim a Lei do Amor. Por isso disse o Papa Francisco:“As bem-aventuranças são a carteira de identidade do cristão, que o identifica como seguidor de Jesus. Somos chamados a ser bem-aventurados, seguidores de Jesus, enfrentando os sofrimentos e angústias do nosso tempo com o espírito e o amor de Jesus” 

Aceitar, permanecer, crescer e perseverar na construção deste Reino no mundo: eis o caminho a percorrer na rota da santidade!

À primeira vista, as atitudes de vida, propostas por Jesus não foram, em seu tempo, nem são, ainda hoje, valorizadas: como podem ser felizes os pobres, os sofredores, os perseguidos?

A resposta se encontra na segunda parte de cada uma das oito sentenças enunciadas por Mateus que confluem, todas elas, para o mesmo ponto: a participação no Reino de Deus já agora, em germe e em esperança e, plena e perfeita, na eternidade, vivendo de sua Vida, usufruindo de seu Amor e gozando de sua Paz perpétua!

A concretização desses valores se expressa de muitas maneiras. Atestam-no, ao longo da história, homens e mulheres que os viveram até as últimas conseqüências. O texto mostra esta pluralidade de expressões. Todas elas apresentam uma marca comum: a prática do mandamento único do amor.

Jesus nos convida a participar desta multidão, entrar no Reino de Deus, e abraçar a proposta do Evangelho como um caminho que nos leva a vivir neste terra com um espirito diferente. Responder assim aos apelos do Reino de Deus, e fazer parte da construção do povo de Deus.

Como escreve o cardeal Gianfranco Ravasi: "O cristão "bem-aventurado", portanto, é aquele que eleva o olhar para o alto, para o eterno e o infinito, e escuta uma mensagem contra a corrente, desconcertante e até provocatória." (Texto completo: "As Bem-aventuranças, caminhos de montanha ou de planície que levam ao céus. Artigo de Gianfranco Ravasi)

Deixo ecoar no meu interior aquela bem-aventurança que sinto-me chamado especialmente abraçar.


As bem-aventuranças - Eu sou feliz é na comunidade!

Carlos Mesters, Francisco Orofino e Mercedes Lopes.

Olhar a prática da nossa comunidade

O evangelho deste domingo nos convida a meditar sobre o começo do “Sermão da Montanha”. Certa vez, vendo aquela multidão imensa de gente que o seguia, Jesus subiu um pequeno morro para que todos pudessem vê-lo e ouvi-lo. Sentado lá no alto e olhando o povo, ele disse: “Felizes os pobres de espírito”. Estas palavras de Jesus fazem a gente pensar e se perguntar: “O que é mesmo a felicidade? Quem é realmente feliz?”.

Situando

Aqui, no capítulo 5, Jesus aparece como o novo legislador. Sendo Filho, ele conhece o Pai e o objetivo que ele tinha em mente quando, séculos atrás, deu a Lei ao povo pela mão de Moisés. Por isso, Jesus pode nos oferecer uma nova versão da lei de Deus. O solene anúncio da Nova Lei começa aqui no Sermão da Montanha.

No Antigo Testamento, a Lei de Moisés é apresentada em cinco livros: Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio. Imitando o modelo antigo, Mateus apresenta a Nova Lei que revela o sentido desta Lei, dividindo o evangelho em cinco livrinhos. As partes narrativas dos cinco livrinhos, intercaladas com cinco Sermões, descrevem a prática de Jesus e têm como objetivo mostrar como Jesus observava a Lei e a encarnava em sua vida.

Comentando

Mateus 5,1: O solene anúncio da Nova Lei

Havia apenas quatro discípulos com Jesus. Pouca gente. Mas uma multidão imensa estava à sua procura. No AT, Moisés subiu o Monte Sinai para receber a Lei de Deus. Como Moisés, Jesus sobe a Montanha e, olhando o povo, proclama a Nova Lei.

Mateus 5,3-10: As oito portas de entrada do Reino

São oito categorias de pessoas, oito portas de entrada para o Reino, para a Comunidade que é chamada a viver as relações do Reino. 

Não há outras entradas! 

Quem quiser entrar terá que identificar-se com uma dessas oito categorias

 A primeira e a última categoria recebem a mesma promessa: o Reino dos Céus. E a recebem desde agora, pois Jesus diz “deles é o Reino dos Céus”.

Como mostra o esquema acima, entre estas duas categorias, há três duplas às quais é feita uma promessa no futuro:

2 e 3: mansos e aflitos: dizem respeito ao relacionamento com os bens materiais, terra e consolo;

4 e 5: Fome e sede de justiça e misericordiosos: dizem respeito ao relacionamento com as pessoas na comunidade: justiça e solidariedade;

6 e 7: Coração limpo e promotores da paz: dizem respeito ao relacionamento com Deus: ver a Deus e ser chamado filho de Deus.

Em outras palavras, o Projeto do Reino, apresentado por Jesus nas bem-aventuranças, quer reconstruir a vida na sua totalidade: no seu relacionamento com os bens materiais, com as pessoas entre si e com Deus. No tempo de Mateus, este projeto estava sendo assumido pelos pobres e, por causa disso, estavam sendo perseguidos.

Alargando

A comunidade que recebe as bem-aventuranças

Mateus tem oito bem-aventuranças. Lucas tem quatro bem-aventuranças e quatro maldições (Lucas 6,20-26). As quatro da Lucas são: “vocês pobres, vocês que passam fome, vocês que choram, vocês que são odiados e perseguidos” (Lucas 6,20-23). Lucas escreve para comunidades de pagãos convertidos, que vivem no contexto social hostil do Império Romano. Mateus escreve para as comunidades de judeus convertidos, que vivem num contexto de ruptura com a sinagoga. Antes da ruptura, elas tinham certa condição e aceitação social. Mas, depois da ruptura, essas comunidades entraram em crise. Nelas, aparecem grupos de várias tendências brigando entre si. Alguns da linha farisaica querem manter rigor na observância da Lei a que estavam acostumados desde antes da conversão a Jesus. Mas fazendo assim, excluem os pequenos, as pessoas pobres.

A nova lei trazida por Jesus pede que todos possam ser acolhidos na comunidade como irmãos e irmãs. Por isso, o solene início da Nova Lei traz oito bem-aventuranças que definem as categorias de pessoas que devem ser acolhidos na comunidade: os pobres em espírito, os mansos, os aflitos, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os de coração limpo, os que promovem a paz e os que são perseguidos.

O que é ser pobre em espírito?

Jesus reconhecia a riqueza e o valor dos pobres. Definiu a sua missão como envio do Espírito do Senhor para “anunciar a Boa Nova aos pobres” (cf. Lucas 4,18-19). Ele mesmo vivia como pobre. Não possuía nada para si, nem mesmo uma pedra para reclinar a cabeça. E, a quem queria segui-lo, ele mandava escolher: ou Deus ou o dinheiro. Então, o Pobre em Espírito quem é? É o pobre que tem este mesmo Espírito de Jesus. Não é o rico. Nem é o pobre com cabeça de rico. Mas é o pobre que diz:

“Eu acredito que o mundo será melhor quando o menor que padece acreditar no menor!”



Quem se importa com os mais pobres?- Mônica Baptista Campos


O Evangelho de São Mateus (Mt 5,1-12a) explicita a nova lógica para a vida dos cristãos – o Sermão da Montanha. Jesus apresenta um programa ético para os seus seguidores e seguidoras que não anuncia proibições, não exprime preceitos ou leis fundamentais. Quando Jesus anuncia “bem-aventurados”, “ditosos”, “felizes” (conforme as traduções), ele está propondo uma nova lógica para a ética cristã: a passagem de uma ética das obrigações e deveres para uma ética da felicidade e ventura. "


Leituras do dia


As leituras deste atentam para o carinho e o cuidado que Deus tem para com os mais pobres e humildes e o compromisso que o povo de Deus deve ter para com estes, que são os mais fragilizados socialmente.


A primeira leitura (Sf 2,3;3,12-13), que atuou na época do rei Josias, entre os anos de 639 e 609 a.C. em Judá. Época difícil, em que o Reino de Judá estava submetido ao poder da Assíria. A sociedade estava completamente corrompida: os juízes eram corruptos, os comerciantes tiravam vantagem dos mais humildes e daqueles que viviam em situações precárias, a elite cometia inúmeras arbitrariedades, entre outras situações opressoras aos mais pobres. Sofonias pede conversão ao povo para que haja justiça nas relações sociais e políticas.


Também o salmo deste domingo (145/146) atenta para este fato: o Senhor faz justiça aos oprimidos, dá pão aos famintos, protege o estrangeiro, sustenta o órfão e a viúva. Ou seja, tudo o que o povo de Judá não estava fazendo na época de Sofonias.

Neste sentido, Sofonias pede a conversão de uma mentalidade que despreza os mais desfavorecidos economicamente gerando indiferença e desprezo aos pobres - hoje nós denominamos esta atitude/mentalidade de aporofobia (aporos (do grego, pobre) -aversão/repulsa ao pobre). Para a literatura profética, a pobreza é fruto da opressão e da injustiça, não do acaso, da sorte ou da vontade divina.


O texto da segunda leitura (1Cor 1,26-31) prepara a reflexão que o Evangelho de São Mateus traz. São Paulo nos apresenta uma outra lógica, a1Cor 1,26-31, que 1Cor 1,26-31 da forma mais inesperada às pessoas mais improváveis - pessoas insignificantes, desprezadas e classificadas como “nada” perante o mundo. São Paulo nos diz que não há um sistema filosófico, nem um código de leis que comunique a salvação; a sabedoria do Evangelho é loucura para os sábios, filósofos e escribas. Deus se revela aos pequeninos, àqueles que o mundo vê com desdém e menosprezo, não aos prestigiosos, eruditos, ricos ou poderosos. Mais uma vez, as leituras deste domingo atentam para o zelo de Deus aos mais pobres e necessitados.


O Evangelho de São Mateus (Mt 5,1-12a) explicita a nova lógica para a vida dos cristãos - o Sermão da Montanha. Jesus apresenta um programa ético para os seus seguidores e seguidoras que não anuncia proibições, não exprime preceitos ou leis fundamentais. Quando Jesus anuncia “bem-aventurados”, “ditosos”, “felizes” (conforme as traduções), ele está propondo uma nova lógica para a ética cristã: a passagem de uma ética das obrigações e deveres para uma ética da felicidade e ventura. O Reinado de Deus, preconizado por Jesus com sua ética referente ao Sermão da Montanha, tem como foco e centro a felicidade do ser humano e não o cumprimento de obrigações e leis.

Jesus inicia o sermão dizendo “Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus”. A expressão “pobres de espírito” – diferente do texto de São Lucas, que se refere somente ao termo “pobres” - elimina a possibilidade de uma interpretação errônea segundo a qual a carência de bens materiais, por si só, possa proporcionar a felicidade ou ser um valor perante Deus. A tradição considera “os pobres de espírito” como aqueles que, despojados do orgulho, da prepotência, da autossuficiência sustentam a sua vida na graça e na misericórdia de Deus. Humildade é a característica daqueles que reconhecem a sua miséria espiritual e sabem que são dependentes do amor, da misericórdia e da compaixão divina.

Também podemos pensar em “pobres de espírito” como pessoas que estão em situações de carência/pobreza existencial - fracasso, frustração, sensação de exclusão ou de indiferença que podem ser tão dolorosas quanto a pobreza material. O Papa Francisco faz referências às “periferias existenciais”, onde pessoas experienciam profundas feridas internas, suportando a solidão, a depressão e a tristeza.

São 8 bem-aventuranças e nelas, Jesus tira o véu dos fatos e aponta como o começo do Reino já está acontecendo na prática dos pobres como dom e graça de Deus. Não há bem-aventurança para os fariseus, nem para os escribas, nem para os ricos e poderosos. A prática dessas pessoas não revela o Reinado de Deus.

Além dos pobres no espírito, Jesus apontou mais 7 categorias de pessoas:

• Os mansos (1) e aflitos (2): dizem respeito ao relacionamento com os bens materiais, terra e consolo.

• Fome e sede de justiça (3) e misericordiosos (4): dizem respeito ao relacionamento com as pessoas na comunidade: justiça e solidariedade.

• Coração limpo/puro (5) e promotores da paz (6): dizem respeito ao relacionamento com Deus: ver a Deus e ser chamado filho de Deus.

• Os perseguidos por causa da justiça e do evangelho (7): é quase uma consequência das bem-aventuranças anteriores. Já que a lógica do mundo é indubitavelmente diferente da lógica divina, é possível e até provável que haja conflitos quando o cristão se posiciona política e publicamente. Mas, mesmo sendo perseguido, sua vida tem sentido: será sal da terra (5,13) e luz do mundo (5,14- 16).

O projeto do Reinado de Deus contido nas bem-aventuranças visa reconstruir a vida humana na totalidade das suas relações, seja com os bens materiais, seja com as pessoas e a comunidade, seja na relação com Deus. É um projeto para a comunidade, por isso as bem-aventuranças estão no plural, porque ninguém pode ser feliz sozinho. A felicidade é relativa à comunidade, ao grupo, à sociedade; não é algo privado, não é uma questão meramente individual, mas é essencialmente social e comunitária. Jesus indica que a felicidade de cada um está condicionada à felicidade dos outros com quem cada um convive. Ele não fala a indivíduos solitários, mas para pessoas com vínculos sociais, em um sistema de convivência que, para o bem ou para o mal, condiciona a todos.

O programa ético das bem-aventuranças busca refazer as relações familiares, as relações de trabalho, as relações entre o governo e o povo, de modo que possa haver justiça para os pobres, os mais frágeis socialmente, que foram e ainda são alvos da mensagem do Sermão da Montanha.




Os “pobres no espírito”- Johan Konings, SJ


A insistente pregação de Jesus e da Igreja em favor dos pobres incomoda certas pessoas. Nas Bem-aventuranças segundo Mt (evangelho), Jesus felicita os “pobres no espírito”. Por que “no espírito”? Talvez não sejam os materialmente pobres? É possível ser pobre no espírito e rico materialmente?

Já no Antigo Testamento (1ª leitura), Deus mostra que seu favor não depende de poder e riqueza. Ele prefere os que praticam a justiça, ainda que pobres: os “pobres do Senhor”. Isso era difícil entender para os antigos israelitas, que – como muita gente hoje – viam na riqueza uma prova do favor de Deus.

Jesus, no evangelho, anuncia o Reino de Deus, como dom e missão, aos que têm esse espírito dos “pobres de Deus”: os que não pretendem dominar os outros pelo poder e a riqueza, mas se dispõem a colaborar na construção do reino de amor, justiça e paz, tornando-se pobres, colocando-se do lado dos pobres e confiando antes de tudo no poder de Deus e no valor de sua “justiça”, que é a sua vontade, seu plano de salvação. Os “pobres de Deus” assumem atitudes inspiradas por Deus e seu reino: pobreza (não apenas forçosa, mas no espírito e no coração), paciência (com firmeza), justiça (com garra), paz (na sinceridade) etc. Aos que vivem assim, Jesus anuncia a felicidade (“bem-aventurança”) do reino. Esses são os cidadãos do reino, os herdeiros da terra prometida. E, de fato, o “manso”, o não-violento tem bem mais condições de usar a terra que o grileiro. Os pobres solidários constroem uma sociedade melhor que os ricos egoístas. Há quem diga que as Bem-aventuranças não visam os pobres materialmente, porque esses não podem ser os “promotores da paz” aos quais se refere a sétima bem-aventurança (Mt 5,9). Mas será que a verdadeira paz, fruto da justiça, não é promovida pelos pobres e os que em solidariedade com eles lutam pelo direito de todos?

O apóstolo Paulo ensina que Deus escolheu os pobres e os simples para envergonhar os que se acham importantes (2ª leitura). Deus é quem tem a última palavra. Demonstrou isso em Jesus, morto e ressuscitado. Demonstrou isso também em Paulo, que abandonou seu status de judeu e fariseu, para se tornar desprezado, seguidor de Jesus. Não pela posição e pelo poder, mas pelo; despojamento radical é que Paulo se tornou participante da obra de Cristo.

Devemos optar, na vida, pelos valores do Reino e não pelo poder baseado na opressão, na exploração…. Devemos optar pelos pobres e não pelos que os empobrecem! Para isso precisamos de desprendimento, pobreza até no nosso íntimo (“no espírito”). A bem-aventurança não vale para pobre com mania de rico! Os pobres no espírito são os que não apenas “queriam”, mas efetivamente querem e optam por formar “povo de Deus” com os oprimidos e empobrecidos, porque têm fome e sede do Reino de Deus e sua justiça.

Do livro “Liturgia Dominical”, de Johan Konings, SJ, Editora Vozes


TEXTO EM ESPANHOL - DOM DAMIÁN NANNINI, ARGENTINA


CUARTO DOMINGO DURANTE EL AÑO CICLO "A"


Primera lectura (Sof 2,3; 3,12-13)


El profeta Sofonías predicó en el reino del Sur (Judea) durante el reinado de Josías (640-609) y su mensaje se ajusta a la realidad de aquel tiempo. Por entonces Judá llevaba ya un siglo sometida a Asiria y el pueblo se dejó invadir poco a poco por las costumbres extranjeras y las prácticas paganas, favorecidas por la nefasta política del cruel monarca judío Manasés (698-643, cf. 2Re 21,3-9.16). En este contexto el profeta hace al pueblo de Judá una invitación para no dejar pasar la última posibilidad de salvación buscando de verdad al Señor: “Buscad al Señor, todos ustedes, pobres del país (anáwím), que cumplís sus órdenes, buscad la justicia (zedeq), buscad la humildad (anáwáh)” (Sof. 2,3).

La salvación está en confiar en la Palabra de Dios y en reconocerse pequeños e indigentes ante Él. Es la actitud de “los pobres o humildes de la tierra” que buscan a Dios (2,3) y, por esto, serán salvados por El y constituidos en “el resto de Israel” (3,12-13a). El profeta presenta la restauración que Dios obrará en beneficio de Judá donde la intervención divina eliminará todo pecado y toda infidelidad en un grupo denominado “resto de Israel”, un pueblo humilde y pobre (3,11-13). La idea del “resto de Israel” es común con otros profetas; pero en Sof 3,11-13 es la primera vez en la Biblia que se identifica este resto fiel con los pobres y humildes (los anáwím).



Evangelio (Mt 4,25-5,12)


En el evangelio de hoy podemos distinguir la introducción narrativa (4,25-5,2), que vale para todo el Sermón de la Montaña (SM cf. Mt 5-7), y las bienaventuranzas (5,3-12) que son el prólogo o exordio del Sermón reflejando el gozo por la llegada del Reino.

La introducción del Sermón de la Montaña nos presenta el auditorio y el lugar del discurso. En un primer momento pareciera dirigido sólo a sus discípulos, pero en realidad se incluye a la gran multitud que lo seguía (cf. 4,25). Para pronunciar su discurso Jesús “subió a la montaña”. Esta descripción no tiene sólo un sentido funcional sino teológico. La montaña remite al Sinaí (Ex 19-20) y al Horeb (Dt 5) donde Dios ha establecido su alianza con Israel y revelado allí su voluntad. 

Se le acercan sus discípulos, los que han hecho ya su opción por Jesús y tienen derecho a entrar en la esfera divina; están con Jesús en ella. Entonces Jesús toma la palabra y proclama las bienaventuranzas, que son ocho y tienen una estructura común donde distinguimos tres elementos:


1) Un adjetivo en posición predicativa; se presupone el verbo ser: “Felices son...”.

2) Un sujeto con artículo que se refiere a personas caracterizadas por una situación penosa desde el punto de vista humano (los pobres, los pacientes, los que lloran; los perseguidos) o una actitud positiva desde el punto de vista divino (los misericordiosos, los que obran la paz, los puros de corazón, los que tienen hambre y sed de justicia).

3) Una acción divina introducida por un o[ti (porque) causal que da el motivo de la felicidad. Describe la forma cómo los hombres son alcanzados por la acción de Dios (pasivos teológicos). 


En cuanto al tiempo, en 1) y 2) no viene indicado, y se presupone una situación presente; mientras que en 3) se refiere al futuro escatológico (5,4-9.12); salvo 5,3.10 que están en presente.


Concatenación lógica: 1) es la consecuencia o resultado; 2) la condición; 3) la causa o motivo.

Es decir, la causa o motivo de la felicidad es lo que aparece al final de cada bienaventuranza, que es la acción de Dios a favor de las personas: darles el Reino, consolarlos, saciarlos, recibir misericordia, etc. El segundo miembro de cada oración describe la condición o la situación de las personas que se verán favorecidas por la acción de Dios y, por ello, son Felices, con una felicidad plena, tal el sentido de maka,rioi: se trata de la declaración de un estado actual de felicidad plena. Se trata de una felicidad que viene a nosotros, no de una felicidad producida por nosotros.

Vale decir que Jesús declara felices a cierto grupo de personas porque reciben el Reino de Dios. Este es el motivo o causa de la felicidad, la llegada del Reino. Y esta felicidad puede convivir con situaciones penosas (aflicción, insultos y persecución) y es la recompensa de los que se esfuerzan por sintonizar con los valores del Reino (alma de pobres; paciencia; hambre y sed de justicia, misericordiosos, corazón puro; trabajan por la paz). 


Los pobres en el espíritu son aquellos que tienen su espíritu caracterizado por la pobreza, por un estado de dependencia de los demás para poder vivir y, por tanto, no autosuficiente ni autárquico. Ser pobre en el espíritu es darse cuenta y ser consciente de la propia pobreza o necesidad delante de Dios ante quien se recurre como dador de todo Bien. La opinión de la mayoría de los Padres que la entendieron en el sentido de humildad es del todo correcta.

En cuanto al motivo de la felicidad, hay un marcado contraste pues el Reino de los cielos es el mayor bien posible y los pobres en espíritu lo poseen. Esta afirmación se repite en 5,10 creando una inclusión en el cuerpo de las bienaventuranzas y, por tanto, parece ser la más fundamental. Así, las promesas referidas a las seis bienaventuranzas intermedias en cierto modo explicitarán y concretizarán los efectos de la posesión del Reino de los cielos. Todavía en 5,3.10 hay una diferencia en relación al resto pues el verbo está en presente y no en futuro. A la luz de Mt 25,34 ("Entonces dirá el Rey a los de su derecha: "Vengan, benditos de mi Padre, reciban la herencia del Reino preparado para ustedes desde la creación del mundo”) podemos distinguir dos tiempos: el Reino ha sido preparado para ellos desde siempre, ellos son los herederos al presente, pero la posesión efectiva se dará con la venida del Hijo del hombre en la gloria. Por tanto, ya son los herederos-propietarios, pero la posesión-disfrute plena será en el futuro.


La segunda bienaventuranza es la más paradójica pues declara felices justamente a los afligidos. La causa o motivo de este cambio de situación es la acción de Dios quien, mediante su presencia y el don de la comunión personal, abolirá todas las penas. Al llamar consolación a esta acción escatológica de Dios se subraya su carácter personal y amoroso. 


En cuanto a la tercera notemos que en la Biblia la mansedumbre o paciencia viene descrita como un comportamiento caracterizado por un dominio de las propias emociones, tendencias y deseos; y por el pleno respeto por la persona del otro en contraposición a todo lo que sea ira, contienda y atropello. La actitud interior de los mansos es muy semejante a la de los pobres en el espíritu y, por ello, también podría incluirse en nuestro concepto de humildad. La nota distintiva sería que lo propio del humilde es no irritarse ante las contradicciones de la vida y saber tener paciencia a la espera de verse colmado por Dios. El manso, por su parte, es aquel que acepta el tiempo y la manera de obrar de Dios.

En cuanto a la promesa de heredar la tierra es útil notar que el verbo "heredar" aparece sólo 3 veces en Mateo siendo la herencia o recompensa en los otros dos casos "la vida eterna" (19,29) y "el Reino preparado por el Padre" (25,34). Por tanto, la herencia del Padre es tener parte en el Reino escatológico.


El hambre y la sed tienen aquí un claro sentido figurado (su objeto es la justicia); e indican más que un deseo pues se trata de una necesidad natural, elemental y fuerte que procede del interior del hombre. Su contrario sería la falta de interés, la indiferencia. La justicia cristiana incluye todo lo que los hombres hacen o deben hacer para agradar al Padre.

El verbo saciar está puesto en futuro pasivo, por tanto, se trata de una acción de Dios escatológica. La cuestión es si los saciará de justicia, es decir, les dará la posibilidad de ser justos; o se trata más bien de algo genérico. El hecho que el verbo no tenga objeto nos inclina por algo general. Por tanto, el hambre y sed de la justicia comprende el querer profundo y vital de hacer todo según la Voluntad de Dios; y el ser saciado se refiere a toda la plenitud -ser llenado- de Vida. 


La bienaventuranza de los misericordiosos tiene la característica de mostrarnos una reciprocidad entre el obrar humano y el Divino pues en ambos casos se trata de la misericordia. Los misericordiosos son los que compadeciéndose socorren al necesitado y perdonan al deudor; y esta actitud garantiza la felicidad al ser alcanzados a su vez por la Misericordia de Dios, o sea, ser socorridos y perdonados por Él.


Cuando en la Biblia se habla de un corazón puro se trata de un corazón recto e inocente, que obra según Dios y, por tanto, puede acercarse a Él.

Aunque esta vez no tenemos un pasivo teológico, es sabido que el ver a Dios escapa a las posibilidades humanas (cf. Jn 1,18; 6,46; 1Jn 4,12); por lo que sólo puede ser un don divino

Esta bienaventuranza complementa la anterior en cuanto el empeño por cumplir la voluntad de Dios abarca también lo profundo del hombre, el corazón como la sede de sus decisiones, pensamientos y emociones. Por primera vez se nombra explícitamente a Dios como promesa-premio y, de este modo, resume y asume las promesas anteriores. El motivo o causa de la felicidad es ser admitido en la presencia de Dios, estar en comunión con El.


El término eivrhnopoioi, (los que trabajan por la paz) aparece en los escritos rabínicos para referirse a los que se esfuerzan por reconciliar a las personas en conflicto. Designa, por tanto, algo activo y no la mera disposición a la paz. En Mt 5,9 se referiría, entonces, a aquellos que se empeñan por la paz, en primer lugar, evitando lo que daña la convivencia con los demás y, luego, promoviendo y restableciendo la paz donde falte. El considerar a los hombres como hijos de Dios aparece explícitamente aquí y en 5,45. El pasivo teológico significa que Dios mismo los llamará sus hijos, los reconocerá públicamente como tales, y los aceptará en su misma vida de Padre que vive con el Hijo y el Espíritu Santo (28,19).


La causa de la persecución en 5,10 es la “justicia” en el sentido ya visto de obrar según Dios; luego se precisa que es la vinculación personal con Jesús (5,11) y la aceptación de su palabra (13,21). No se trata de buscar la persecución, sino que esta sobreviene como consecuencia de la fidelidad en el seguimiento de Jesús entendido como puesta en práctica de sus enseñanzas que nos transmiten la voluntad del Padre. A su vez, la persecución aparece como signo de esta fidelidad. 

La promesa es la misma de la primera bienaventuranza haciendo inclusión del bloque de las ocho. Un hermoso comentario a esta bienaventuranza lo tenemos en 1Pe 4,12-19.


En síntesis, como lo revela la estructura de las bienaventuranzas, debemos reconocer la primacía del obrar de Dios. Es el reinado de Dios que se acerca (4,18) el motivo de la felicidad y la motivación del obrar humano que se dispone así a recibirlo, a entrar en comunión con Él. Las exigencias están motivadas por la promesa del don escatológico del Reino, que es la causa última de la felicidad o bienaventuranza proclamada. Estos dos aspectos, presentes como 2° y 3° miembro respectivamente de cada bienaventuranza, no pueden separarse. 

El orden de las bienaventuranzas tiene también un significado. Las cuatro primeras remiten a la relación del discípulo con Dios, ponderando la apertura humilde y confiada en Él; el compromiso por vivir la voluntad del Padre y la aflicción por no poder hacerlo o no verlo en los demás. Las tres siguientes tratan de la relación con los demás, exaltando la misericordia, la honestidad o integridad y la búsqueda de la paz. La última describe la consecuencia que puede provocar en los demás -persecución - la fidelidad en el cumplimiento de la voluntad de Dios. De este ordenamiento podemos deducir que la justa relación con los demás sigue a una justa relación con Dios.

Nos queda señalar, en una mirada global, la relación de las bienaventuranzas con la ética cristiana. En su comentario al Sermón del Monte L. Sánchez Navarro ha escrito : "La moral propuesta por la EM (Enseñanza de la Montaña) es una auténtica "ciencia de la felicidad". En ella, la primacía pertenece al don, a la gracia; pero eso no excluye, sino que implica necesariamente, la adquisición de virtudes sólidas". Y A. Rodríguez Carmona, por su parte, dice: "El Discurso Evangélico presupone la presencia de la salvación de Dios, que ya comienza a reinar. A este presupuesto quiere remitir el sumario anterior, y está implícito en las Bienaventuranzas con las que comienza. Dios primero perdona, hace al hombre hijo suyo y hermano de sus hijos, invita a tomar conciencia de esta realidad con alegría y después nos indica cómo tenemos que actuar. Este presupuesto es básico para no convertir en pura ética o en pura Ley el contenido del discurso, quitándolo así su carácter de "Evangelio" .

También es interesante la opinión de M. Grilli : “Las bienaventuranzas de Mateo son ante todo la aclamación gozosa de una «presencia» en medio a categorías humanas que no pertenecen al orden constituido ni a los poderes de este mundo. La alegría, por tanto, consiste en constatar que Dios todavía una vez más es fiel a su nombre y – en el Mesías Jesús – trastoca los criterios humanos de pensar y hacer”. 



Algunas reflexiones:


El domingo pasado vimos como el anuncio de la llegada del Reino es la buena noticia y el contenido de la buena noticia es el Reino de Dios que llega. 

Este domingo Jesús comienza a anunciar la consecuencia de la irrupción del Reino de Dios entre los hombres y de su aceptación por parte de los mismos: la posibilidad de ser felices, de tener una vida plena. Y es muy indicativo que Jesús inicie su primer gran discurso anunciando la felicidad que provocará la llegada del Reino de Dios. Sería el equivalente al evangelio como buena noticia de Mc 1,14 y al simbolismo del vino en el primer signo obrado por Jesús en Caná según Jn 2,1-11. Se trata de una felicidad que viene a nosotros, no de una felicidad producida por nosotros.

Jesús comienza entonces el sermón del Monte hablando de la felicidad: “bienaventurados, felices”. De este modo el evangelio se conecta con uno de los deseos más profundos y universales del hombre, porque todos queremos ser felices. Claro, ya sabemos que a la hora de precisar en qué consiste la felicidad y cuál es el camino para alcanzarla aparecen una infinidad de definiciones y caminos. Pues bien, Jesús nos enseña hoy en qué consiste la felicidad para Dios y cuál es el camino para recibirla. Y este camino es al mismo tiempo el de la santidad, el de la plenitud de la vida cristina. Al respecto dice el Papa Francisco: “Jesús explicó con toda sencillez qué es ser santos, y lo hizo cuando nos dejó las bienaventuranzas (cf. Mt 5,3-12; Lc 6,20-23). Son como el carnet de identidad del cristiano.  Así, si alguno de nosotros se plantea la pregunta: «¿Cómo se hace para llegar a ser un buen cristiano?», la respuesta es sencilla: es necesario hacer, cada uno a su modo, lo que dice Jesús en el sermón de las bienaventuranzas. En ellas se dibuja el rostro del Maestro, que estamos llamados a transparentar en lo cotidiano de nuestras vidas. La palabra «feliz» o «bienaventurado», pasa a ser sinónimo de «santo», porque expresa que la persona que es fiel a Dios y vive su Palabra alcanza, en la entrega de sí, la verdadera dicha” (G. E. 63-64).


Para decirlo de modo breve y claro: para Jesús la felicidad y la santidad consisten en recibir el Reino de Dios, en dejarse tocar por la acción de Dios en nuestra vida, más allá de las circunstancias, buenas o malas, que estemos pasando. Esta felicidad o plenitud de vida no se conquista, se recibe con don, como gracia. Sí hace falta convertirnos y creer en el evangelio, creer en que Dios quiere y puede llenarme de alegría y felicidad. En efecto: “La alegría del Evangelio llena el corazón y la vida entera de los que se encuentran con Jesús. Quienes se dejan salvar por Él son liberados del pecado, de la tristeza, del vacío interior, del aislamiento. Con Jesucristo siempre nace y renace la alegría” (Papa Francisco, El gozo del evangelio, 1). Bien podemos citar aquí una frase del siervo de Dios Guillermo Muzzio, joven seminarista que falleció de leucemia antes de poder ordenarse sacerdote: “hacer la voluntad de Dios y ser feliz es lo mismo, gracias Jesús porque todo es tan simple”.

Jesús fue quien primero vivió las bienaventuranzas en su vida y, por eso, nos las propuso no como nuevas exigencias éticas sino como un camino de confianza y abandono en Dios. Para entender y vivir las bienaventuranzas hay que mirarlo a Él y seguirlo. Como bien nota S. Decloux : “Jesús nos dirige, de hecho, un discurso de revelación. En lugar de decirnos: si quieres ser feliz, debes hacerte un alma de pobres, Jesús nos dice: mira donde se encuentra la felicidad; la descubrirás fijando los ojos en mí y descubriendo en mí ese alma de pobre, ligada a la experiencia de la verdadera felicidad. Y después de haber fijado tu mirada en mí, ¿no puedes descubrir ya que, en la medida en que entres en la verdadera experiencia de pobreza, tocarás también algo de la verdadera felicidad?”.

Insistimos en la necesidad de la fe y confianza en Jesús, porque el camino de las bienaventuranzas va claramente a contracorriente de por dónde nos lleva el mundo. El Papa Francisco nos lo dice con claridad: “Aunque las palabras de Jesús puedan parecernos poéticas, sin embargo van muy a contracorriente con respecto a lo que es costumbre, a lo que se hace en la sociedad; y, si bien este mensaje de Jesús nos atrae, en realidad el mundo nos lleva hacia otro estilo de vida. Las bienaventuranzas de ninguna manera son algo liviano o superficial; al contrario, ya que solo podemos vivirlas si el Espíritu Santo nos invade con toda su potencia y nos libera de la debilidad del egoísmo, de la comodidad, del orgullo” (G.E. 65).


También es necesario preguntarse por la posibilidad real de ser feliz en esta vida. El filósofo Julián Marías, desde una óptica solamente humana, consideraba a la felicidad como "lo necesario pero imposible". Vale decir que es una necesidad, algo a lo que tendemos espontáneamente y que permanentemente buscamos; pero imposible de obtenerla a la medida de nuestra búsqueda durante nuestra vida en este mundo. Ahora bien, desde la fe y la esperanza, se nos presenta como posible, futura, pero real. Es muy cierto que Jesús promete esta felicidad como un don escatológico, es decir, a realizarse plenamente en la vida eterna. Así como estamos "salvados en esperanza", también somos llamados a ser felices “en la esperanza”.

El Papa Benedicto XVI explica en su encíclica Spe Salvi lo difícil que resulta al hombre imaginarse esta vida eternamente feliz. Igualmente nos sugiere una posibilidad: "Podemos solamente tratar de salir con nuestro pensamiento de la temporalidad a la que estamos sujetos y augurar de algún modo que la eternidad no sea un continuo sucederse de días del calendario, sino como el momento pleno de satisfacción, en el cual la totalidad nos abraza y nosotros abrazamos la totalidad. Sería el momento del sumergirse en el océano del amor infinito, en el cual el tiempo –el antes y el después– ya no existe. Podemos únicamente tratar de pensar que este momento es la vida en sentido pleno, sumergirse siempre de nuevo en la inmensidad del ser, a la vez que estamos desbordados simplemente por la alegría" (nº 12).

Ahora bien, si bien la felicidad plena en Dios la gozaremos en la vida eterna, ya en este mundo, por la fe, podemos tener un anticipo de la misma: "La fe no es solamente un tender de la persona hacia lo que ha de venir, y que está todavía totalmente ausente; la fe nos da algo. Nos da ya ahora algo de la realidad esperada, y esta realidad presente constituye para nosotros una «prueba» de lo que aún no se ve. Ésta atrae al futuro dentro del presente, de modo que el futuro ya no es el puro «todavía-no». El hecho de que este futuro exista cambia el presente; el presente está marcado por la realidad futura, y así las realidades futuras repercuten en las presentes y las presentes en las futuras" (Spe Salvi nº 7).

Las bienaventuranzas son un claro ejemplo de cómo las realidades futuras repercuten en las presentes. La venida del Reino de Dios con su promesa futura de felicidad provoca una valoración nueva y diferente del mundo de las realidades humanas. Desde aquí hay que considerar las situaciones y actitudes humanas que Jesús considera felices porque hacen presente para ellos el Reino de Dios. Al presentarlas, Jesús nos muestra también el camino hacia el Reino, hacia la felicidad: pobreza de espíritu (humildad), paciencia, mansedumbre, misericordia, hambre y sed de justicia, pureza de corazón, trabajador a favor de la paz, persecución. 

En conclusión, “Las Bienaventuranzas son el camino que Dios indica como respuesta al deseo de felicidad ínsito en el hombre, y perfeccionan los mandamientos de la Antigua Alianza. […] En estas palabras está toda la novedad traída por Cristo, y toda la novedad de Cristo está en estas palabras. En efecto, las Bienaventuranzas son el retrato de Jesús, su forma de vida; y son el camino de la verdadera felicidad, que también nosotros podemos recorrer con la gracia que nos da Jesús” (Papa Francisco, Catequesis del 6 de agosto de 2014). 

PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):



Señor,

Te doy gracias por la Felicidad

La que enseñaste aquel día cuando te sentaste a mirar

A tantos hombres, mujeres, niños…

Siguiendo tus pasos sin dudar.

 

Como aquellos, entonces,

Ahora también te pedimos: aprender de ti mismo

Lo que debemos hacer y esperar

Único camino seguro a la eternidad.

 

Empezar desde ahora:

Entender la Pobreza, la Paciencia, la Aflicción, la Justicia

La Pureza, la Misericordia, la Persecución y la Paz

Por causa de la Verdad.

 

Y esperar el regocijo,

Y la alegría de la recompensa prometida:

Eterna casa donde solo tú habitas

Donde no se añora esta vida.

 

Somos peregrinos, como pasajeros…

En una barca de firme timón que en las tormentas se agita

Hacia tus brazos navegamos

Tuyo es el tiempo, Señor, nuestra es la prisa.

 

Sopla sobre nosotros tu suave brisa

empuja este derrotero hacia la tierra prometida

une a tus hijos dispersos por el mundo

hacia la interminable dicha. Amén