EPIFANIA DO SENHOR

EPIFANIA DO SENHOR

07/01/2024 

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


1ªLeitura: Isaías 60,1-6

Salmo 71(72)R- As nações de toda a terra hão de adorar-vos, ó Senhor!

2ª leitura: Efésios 3,2-3ª.5-6

Evangelho de Mateus 2,1-12 (Visita dos Magos).

Tendo nascido Jesus na cidade de Belém, na Judéia, no tempo do rei Herodes, eis que alguns magos do Oriente chegaram a Jerusalém, 2perguntando: 'Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer? Nós vimos a sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo.' 3Ao saber disso, o rei Herodes ficou perturbado assim como toda a cidade de Jerusalém. 4Reunindo todos os sumos sacerdotes e os mestres da Lei, perguntava-lhes onde o Messias deveria nascer. 5Eles responderam: 'Em Belém, na Judéia, pois assim foi escrito pelo profeta: 6E tu, Belém, terra de Judá, de modo algum és a menor entre as principais cidades de Judá, porque de ti sairá um chefe que vai ser o pastor de Israel, o meu povo.' 7Então Herodes chamou em segredo os magos e procurou saber deles cuidadosamente quando a estrela tinha aparecido. 8Depois os enviou a Belém, dizendo: 'Ide e procurai obter informações exatas sobre o menino. E, quando o encontrardes, avisai-me, para que também eu vá adorá-lo.' 9Depois que ouviram o rei, eles partiram. E a estrela, que tinham visto no Oriente, ia adiante deles, até parar sobre o lugar onde estava o menino. 10Ao verem de novo a estrela, os magos sentiram uma alegria muito grande. 11Quando entraram na casa, viram o menino com Maria, sua mãe. Ajoelharam-se diante dele, e o adoraram. Depois abriram seus cofres e lhe ofereceram presentes: ouro, incenso e mirra. 12Avisados em sonho para não voltarem a Herodes, retornaram para a sua terra, seguindo outro caminho. Palavra da Salvação


DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, ARCEBISPO DE SOROCABA SP


Mt 2,1-12

A narrativa de Mateus é uma história encantadora. Os magos vêm de longe em busca de Cristo, atraídos pela estrela.  Eles são trazidos de longe e, por meio de muitas vicissitudes da vida, encontram e adoram a Cristo.

Deus pôs um sinal nos céus para guiar aqueles astrônomos/astrólogos do oriente que procuravam encontrar Deus. O sinal da estrela é a manifestação da misericórdia de Deus que quer ser encontrado pelos homens. Expressa a necessidade de ter que olhar para fora deste mundo para descobrir os segredos de Deus.

O sinal levou os magos a começar uma longa e difícil viagem: quando nos damos conta do valor do encontro com Cristo, lançamo-nos em uma longa jornada rumo a Deus.

As estrelas vistas daqui de baixo parecem distantes e frias; as informações que elas nos dão parecem distantes e difíceis, mas por meio delas, mais particularmente pelo Cristo, somos atraídos para uma viagem que será bem-sucedida, pois é o próprio Deus que quer ser encontrado.

A viagem dos magos passa por uma crise. Vão perguntar a Herodes: “Onde está o rei dos judeus, que acaba de nascer?” A história de Herodes é uma história de violência e de assassinatos provocados pela sua suspeita doentia e sua crueldade impiedosa, inclusive contra sua própria família. Sua ambição de poder o levou a eliminar possíveis pretendentes ao trono.

O assassinato dos meninos de Belém está de acordo com a violência do reinado de Herodes, especialmente em seus últimos anos, quando sua segurança no trono estava ameaçada.

Depois de ter se informado cuidadosamente com os sacerdotes e mestres da Lei sobre o lugar de nascimento do Messias, chama em segredo os magos para saber com exatidão sobre o tempo do aparecimento da estrela. Lugar e tempo: falta somente saber quem é esse menino. Com astúcia maligna pede que os magos o mantenham a par das buscas para poder também ele ir adorá-lo. A astúcia de Herodes, no entanto, é vencida pelo milagre da estrela, que reaparece somente depois que os magos deixam a corte, e pela fidelidade dos visitantes, que obedecem ao sonho de não voltarem a Herodes.

É impressionante o fato que Herodes, com a ajuda dos doutores da Lei, tenha interpretado corretamente a profecia (Mq 5,1), mas não tenha crido (aceitado, aderido) em Cristo. De que adianta conhecer, se esse conhecimento nos leva a buscar a morte de Cristo?

A visita a um soberano era sempre acompanhada de dádivas. Ouro indica a realeza; incenso, a divindade; mirra, os sofrimentos e a morte. São presentes caríssimos, demonstrando grande afeto por Cristo.

O Senhor deseja ser encontrado. Ele mesmo nos atrai e nos guia pela sua estrela. Ele não nos dá somente a luz da fé, mas o seu corpo e o seu sangue para nos transformar em Cristo Jesus. 


Solenidade da Epifania do Senhor– Mt 2,1-12 - Ano B – 07-01-24


Celebramos hoje a Epifania ou Manifestação do Senhor a todos os povos. São Mateus é o único dos evangelistas que faz a narrativa da visita dos “magos”. Magos (do grego) significa grande, ilustre. Esta solenidade nos comunica que a salvação é para todos. Os magos vinham do Oriente à procura do Rei dos Judeus, indicado pela estrela. A estrela os conduz e eles encontram o menino com Maria, sua Mãe. Diz o texto que eles ficaram muito alegres! Oferecem de presente ao menino ouro, incenso e mirra. O ouro simboliza a realeza de Jesus, o incenso, a sua divindade, e a mirra, a sua humanidade.


Epifania: não perca a estrela de sua vida - Adroaldo Palaoro


Epifania significa “manifestação”. No sentido original significa a primeira luz que aparece no horizonte, antes de sair o sol. Essa luz foi tomada como símbolo da iluminação espiritual em muitas religiões; por isso, a luz vem sempre do Oriente. Toda manifestação de Deus tem a marca da universalidade. Na relação com Deus estão excluídos os privilégios e exclusivismos. “Fora da Igreja há salvação!”

Na Epifania, não estamos celebrando a data de um acontecimento, mas a realidade de quem é Deus e a imensa alegria de poder descobri-Lo presente em tudo e em todos.

Se o Senhor não se manifestasse, sua Encarnação não teria chegado à toda a humanidade. Pois bem, a manifestação de Deus em Jesus tem um alcance universal, está destinada a toda humanidade.

É interessante que a tradição tenha interpretado que os Três Magos procediam dos três continentes até então conhecidos: África, Ásia e Europa. O mago negro aparece sempre. No Reino de Jesus Cristo não há distinção de raça ou de origem, não há diferenças nacionais, nem sociais, nem raciais. Todos somos filhos do mesmo Pai. Jesus Cristo une todos os povos e todas as pessoas, sem perder a riqueza de sua diversidade.

A tradição também relacionou os três reis com as três idades da vida do ser humano: a juventude, a idade madura e a velhice. Deste modo, todos podemos nos ver representados nos três magos que vão ao encontro do menino-Deus.

Mateus começa e termina seu evangelho dando a Jesus o título de “rei dos judeus”. Trata-se de um rei que nasce e morre rompendo todos os esquemas das realezas mundanas: nasce em uma gruta que acolhia animais e morre numa cruz. Em seu nascimento, os Magos vão em busca do “rei dos judeus”. Se estamos falando de um rei, compreende-se que eles o buscassem na cidade dos grandes palácios, ou seja, em Jerusalém. Equivocaram-se de caminho e de lugar, porque o rei que tinha nascido era tão diferente e tão novo que só podia nascer entre os pobres. O evangelista Mateus não se refere a nenhuma realeza que não seja a de Jesus. São as tradições populares posteriores que, usando muita imaginação, consideraram os Magos como “reis”. O evangelista só reconhece um rei, que é Jesus. Por isso os magos se prostram diante dele e o adoram.

Os Magos representam todos aqueles que vem dos confins da terra ao encontro do Menino, os estranhos ao povo judeu, os que não são da raça do recém-nascido, os afastados. Também para eles nasceu o filho de Maria. E também a eles deve chegar a boa notícia do Evangelho.

Os Magos representam também a humanidade inteira em busca de paz, verdade e justiça. Representam o desejo profundo do espírito humano, a marcha das religiões, da ciência e da razão humana ao encontro d’Aquele que se “humanizou” plenamente.

À luz do relato de Mateus podemos afirmar: o Reino de Deus não se limita aos contornos de uma religião. O amor, a entrega, a capacidade de sair de si e ir ao encontro do outro, a compaixão... são os melhores recursos e possibilidades presentes no interior de todo ser humano. O que celebramos hoje é a revelação de Deus a todos os homens e mulheres, não a submissão de todos à doutrina ou disciplina de uma determinada religião. Onde se encontra uma pessoa que cresce em humanidade, amando os outros, ali está se manifestando Deus; onde a compaixão, o cuidado e o serviço se revelam como atitudes gratuitas, ali Deus está revelando seu rosto. Não podemos entender a abertura aos pagãos como proposta para que se convertam à religião cristã. O importante é potencializar o que há de mais nobre e humano em cada pessoa, mesmo que não conheça Jesus.

Os Magos, discernindo os sinais da natureza, se depararam com o forte esplendor de uma “estrela”, e puseram-se a caminho. Talvez o relato dos Magos e a estrela tenha suas raízes na bonita tradição judaica que diz: quando uma criança nasce, “acende-se” uma estrela no céu. Por isso no céu há tantas estrelas. Quando nasce uma criança, acende-se uma luz, um mundo de possibilidades, um universo pessoal no espaço da comunidade humana.

Jesus Cristo como “estrela”, é guia da humanidade e por isso desce à terra. De fato, a estrela se deteve no presépio, onde estava Jesus. A estrela, portanto, é Jesus presente no cosmos; logo, o cosmos fala implicitamente de Cristo, embora sua linguagem não seja totalmente decifrável para o ser humano.

A Criação deixa transparecer os atributos do Criador: bondade, compaixão, verdade, justiça... Desperta também a expectativa, mais ainda, a esperança de que um dia este Deus se manifestará plenamente.

A partir de então, as verdadeiras estrelas da humanidade são as pessoas que nos mostram o novo caminho para o Deus encarnado.

Também hoje continuamos necessitados de estrelas que iluminem nossos caminhos e guiem nossos corações, porque a noite é escura, as certezas se debilitam ou se petrificam, os abusos de poder violentam, destroem e marginalizam, a esperança continua sendo um desafio para quem consentiu acreditar.

Essas estrelas são pessoas, gestos, conversações que iluminam nossa vida cotidiana e nos recordam a verdade salvadora que se encarna em Jesus. Mas também são acontecimentos, sinais dos tempos, mudanças que ajudam a crescer e a melhorar, porque guiam para esses lugares que nos fazem mais humanos, que nos ajudam a compreender que nem tudo está dito e nos recordam que Deus continua sendo surpresa e impulso, que sua salvação não é algo do passado ou de um futuro distante e enigmático, mas presente e atuante em cada geração e em cada pessoa.

Como Igreja e como cristãos temos de repensar muitas coisas, mas não a partir do poder (Herodes e Jerusalém), mas a partir da Luz. A revelação, a estrela, estão no fluxo da história da Igreja e da humanidade; precisamos procurar fazer nossa essa luz para que ilumine cada situação humana e eclesial.

A Boa Notícia de Jesus nos levanta, nos convida a caminhar com a certeza de que sempre haverá estrelas que alimentem nossa esperança, orientem nossos projetos, nos sustentem nos momentos vulneráveis, nos abram na obscuridade. Nem sempre é fácil pôr-se de pé, fugir das seguranças do poder e do êxito, começar de novo... Mas, aí está uma multidão de estrelas que continuarão comprometidas em acompanhar-nos em todos os nossos esforços.

Mais uma vez somos convidados(as) a ser “magos/as”, caminhantes e buscadores que sabem seguir a estrela sem medo a que nos leve a lugares desconhecidos, surpreendentes ou inesperados. Magos/as que presenteiem perdão, bondade e solidariedade sem esperar outra coisa em troca a não ser fraternidade e empatia. Magos(as), em definitiva, que coloquem a confiança naquilo que constrói e liberta, e abandonem tudo aquilo que é imposto, violento ou interesseiro. Não é um caminho fácil. Não basta escutar o chamado do coração; é preciso pôr-se em marcha, expor-se, correr riscos.

O gesto final dos magos é sublime. Não matam o menino, mas o adoram. Inclinam-se respeitosamente diante de sua dignidade; descobrem o divi-no no humano. Esta é a mensagem de sua adoração ao Filho de Deus encarnado no menino de Belém.

Para meditar na oração:

Como cristãos, devemos nos sentir capazes de acolher todas as expressões religiosas e culturais de todos os povos. Só nesse sentido se pode falar de “epifania”. Não se trata só de ir e levar aos outros o que temos. Trata-se de receber aquilo que os grandes “magos” dos povos também nos oferecem. Epifania não combina com preconceito, fundamentalismo, proselitismo...

- “Fazer memória” das pessoas que foram “estrelas” inspiradoras em sua vida.


Cativados por uma estrela - Ana Maria Casarotti


Continuamos celebrando o nascimento do Filho de Deus na pequena cidade de Belém.

Jesus não nasce em Jerusalém, centro de poder político e religioso, senão na periferia, num lugar pobre, cujo único orgulho possível era ser a terra natal de Davi, algo que se perdia no tempo e jazia quase esquecido.

Dela o profeta Miqueias já falava: “Mas você Belém de Éfrata, tão pequena entre as principais cidades de Judá. É de você que sairá para mim aquele que há de ser o chefe de Israel”  (5,1-2).

É sem dúvida questionador que Deus tenha escolhido para nascer entre os pobres, que a irrupção de Deus na história da humanidade tenha acontecido no silêncio e solidão de uma gruta, sendo testemunhas o céu e os pequenos da terra.

Por que o Deus escondido, que quis se dar a conhecer em Jesus, o faz de forma tão humilde, tão despercebida, tão humana? (Rom 16, 26).

Deseja que o busquemos, que saiamos ao seu encontro... Ele não impõe a sua Presença, só se apresenta de diferentes maneiras; a mais humilde, plena e terna é em seu Filho Jesus.

Deus nos criou para Si, toda pessoa humana leva dentro de si o desejo de Deus, de conhecê-lo, de se encontrar com Ele, de uma vida em plenitude, de um amor infinito. Todo ser humano leva a marca da eternidade que o impulsiona a sair de si em busca dela.

Essa sede de eternidade, essa busca, muitas vezes sem saber, de Deus, é a estrela que cada um de nós leva dentro. É a presença do Espírito que nos movimenta, que nos põe em caminho a Deus, como aqueles magos do Oriente que hoje Mateus cita no seu evangelho.

O importante não é saber se eles existiram ou não, e sim descobrir a riqueza de mensagens que este episódio quer transmitir.

Deus nos ama, vem ao nosso encontro na pessoa de Jesus e infunde seu Espírito em nós para que, iluminados pela sua presença, possamos livremente sair na sua busca e viver a alegria de ser encontrados por Ele!

Podemos perguntar-nos: como é possível reconhecer a presença do Espírito?

Uma das maneiras mais simples é através dos presentes que ele nos dá, e um deles é a alegria (Gl 5,22). Por isso é que o evangelho nos diz que “ao verem de novo a estrela, os magos ficaram radiantes de alegria”.

Reconhecemos a presença do Espírito em nós? Em que momentos? Façamos agora uma singela oração ao Espírito que nos habita, agradecendo a sua Presença e pedindo-Lhe que sejamos dóceis à sua condução!

É importante reconhecer a ação do Espírito, para poder colaborar com ele, se aderir a ele. Jesus mesmo, no evangelho de João, nos diz que o Espírito nos conduzirá à verdade plena (Jo 16,13), que é Ele! (Jo 14,6).

Ou seja, Deus atua em nós, mas requer nossa disponibilidade, cada um de nós pode optar entre seguir a voz do Espírito de liberdade ou seguir outras vozes que nos levam à escravidão do poder, do medo, do egoísmo, da infidelidade...

Os magos são fiéis ao caminho que sinaliza a estrela e descem de Jerusalém a Belém. Finalmente a estrela parou e eles são envolvidos no mistério de Deus que se fez presente numa criança: “viram o menino com Maria, sua mãe”.

Reconhecem nele o Messias esperado de todos os tempos, o Salvador de toda a humanidade. Ao vê-Lo, se ajoelham, o adoram, o amam!

Depois, não voltam para Jerusalém, senão que partem para suas terras para comunicar que tinham visto, encontrado o Salvador.

Junto com os magos tenhamos uma atitude de adoração e acolhida do mistério de Deus que se nos comunica na gruta de Belém, e assim “cheios” do Espírito Santo possamos exclamar olhando para o menino: É o Senhor! (1Cor 12,3).

O encontro com Jesus nos leva a partir para uma nova vida, no lugar onde cada um e cada uma vive, trabalha, estuda... ali ser comunicadores da ternura e do Amor de Deus que se faz presente na fragilidade de uma criança!

 

Oração

Lógica de Deus

Onde acaba a cidade

e começa o medo,

onde terminam os caminhos

e começam as perguntas,

perto dos pastores

e longe dos senhores,

no calor de Maria

e no frio do inverno,

vindo da eternidade

e gestando-se no tempo,

salvação poderosa para todos

atado a um edito do império,

rebaixado em um presépio de animais

aquele que a todos nos eleva até os céus,

nasceu o Filho do Pai,

Jesus, o filho de Maria.

Só abaixo está o senhor do mundo

que nós sonhamos no alto.

Aqui se vê a grandeza de Deus

contemplando a humildade deste pequenino

Aqui está a lógica de Deus,

rompendo o discurso dos sábios.

Aqui já está toda a salvação de Deus

que plenificará todos os povos e os séculos.

Benjamin González Buelta SJ

Salmos para sentir e saborear as coisas internamente

  

Epifania do Senhor -  Jose Antonio Pagola 


Segundo o grande teólogo Paul Tillich, a grande tragédia do homem moderno é ter perdido a dimensão de profundidade. Já não é capaz de perguntar de onde vem e para onde vai. Não sabe interrogar-se pelo que faz ou deve fazer de si mesmo neste breve lapso de tempo entre o seu nascimento e a sua morte.

Estas perguntas não encontram já resposta alguma em muitos homens e mulheres de hoje. Mais ainda, nem sequer são colocadas quando se perdeu essa «dimensão de profundidade». As gerações atuais não têm já a coragem de se colocarem estas questões com a seriedade e a profundidade com que o fizeram as gerações passadas. Preferem continuar a caminhar nas trevas.

Por isso, nestes tempos temos de voltar a recordar que ser crente é, antes de qualquer coisa, perguntar apaixonadamente pelo sentido da nossa vida e estar abertos a uma resposta, mesmo quando não a vejamos de forma clara e precisa.

O relato dos magos foi visto pelos Padres da Igreja como exemplo de alguns homens que, ainda vivendo nas trevas do paganismo, foram capazes de responder fielmente à luz que os chamava à fé. São homens que, com a sua atuação, nos convidam a escutar toda a chamada que nos urge a caminhar de maneira fiel para Cristo.

A nossa vida decorre com frequência na crosta da existência. Trabalhos, contatos, problemas, encontros, ocupações diversas, levam-nos e trazem-nos, e a vida passa-nos enchendo cada instante com algo que temos de fazer, dizer, ver ou planejar.

Corremos assim o risco de perder a nossa própria identidade, converter-nos numa coisa mais entre outras e viver sem saber já em que direção caminhar. Há uma luz capaz de orientar a nossa existência? Há uma resposta aos nossos anseios e aspirações mais profundas? Desde a fé cristã, essa resposta existe. Essa luz brilha já nesse Menino nascido em Belém.

O importante é tomar consciência de que vivemos nas trevas, de que perdemos o sentido fundamental da vida. Quem reconhece isto não se encontra longe de iniciar a busca do caminho acertado.

Oxalá no meio do nosso viver diário não se perca nunca a capacidade de permanecer aberto a toda a luz que possa iluminar a nossa existência, a toda a chamada que possa dar profundidade à nossa vida.

  

“Ajoelharam-se diante dele e lhe prestaram homenagem” - Pe. Tomaz Hughes SVD]

Hoje celebramos uma das grandes festas do Ciclo de Natal - a Manifestação do Senhor (“Epifania” em grego), onde comemoramos o fato de que Jesus foi manifestado não somente ao seu próprio povo, mas a todos os povos, representados pelos Magos do Oriente. Mais importante do que a sua grande popularidade folclórica, a festa celebra uma grande verdade da fé - que a salvação em Jesus é destinada a todos os povos, sem distinção de raça, cor ou religião. Retomando a grande intuição do profeta Terceiro-Isaías, celebramos hoje a salvação universal em Jesus.


O texto de hoje é altamente simbólico - usa uma técnica da literatura judaica chamada “midrash”, ou seja, uma releitura de passagens bíblicas, com o intuito de atualizá-las. Assim, Mateus quer ensinar algo sobre Jesus, usando figuras e símbolos tirados de diversos textos do Antigo Testamento. Por exemplo:


Vêm os magos (nem três, nem reis, segundo o texto!) buscando o Rei dos Judeus. Esses magos nos lembram os magos que enfrentavam e foram derrotados por Moisés (Êx 7, 11.22; 8, 3.14-15; 9,11) e acabaram reconhecendo o poder de Deus nas maravilhas feitas por Ele.


A estrela é sinal da vinda do Messias, prevista na profecia de Balaão (Nm 24, 17).


O menino nasce em Belém, segundo a profecia de Miquéias (Mq 5, 1).


Os presentes lembram as profecias de Segundo-Isaías sobre os estrangeiros que viriam a Jerusalém trazendo presentes para Deus (Is 49, 23; 60,5; também Sl 72, 10-11).


Herodes é o novo Faraó, que também massacra os filhos do povo de Deus (Êx 1, 8.16).

O texto chama a atenção pelas reações diferentes diante do acontecido. Os que deveriam reconhecer o Messias - pois são versados nas escrituras - ficam alarmados, pois para eles, opressores do povo através do abuso da religião e da política, Jesus e a sua mensagem constituem uma ameaça. Outros, pagãos do oriente, buscando sem ter certeza, arriscam muito para descobrir o verdadeiro Deus, e entregam-lhe presentes, sinais da partilha que será característica do Reino que Jesus veio pregar.


Hoje em dia verificam-se as mesmas reações diante de Jesus e do seu Evangelho. Podemos pensar nas críticas ao estilo de vida e mensagem do Papa Francisco da parte de setores ultraconservadores da Igreja, pois a sua mensagem e vivência ameaçam o poder desses grupos.  Também a reação de crítica de defensores do capitalismo selvagem, diante da análise feita pelo Papa do sofrimento de tanta gente, por exemplo nas suas homilias e na sua Exortação Apostólica “Evangelii Gaudium”.  Os nossos canais de televisão e rádio estão infestados com “pregadores do Evangelho” que frequentemente distorcem a Boa Nova para se enriquecerem, explorando a ingenuidade de tanta gente através d a sua oratória demagógica e manipulante.


Muitos querem reduzir os eventos religiosos a algo folclórico com shows e cantos, mas que de forma alguma devem questionar a nossa sociedade e os seus valores. Para outros, o menino na estrebaria é um sinal do novo projeto de Deus, o mundo fraterno, onde todas as pessoas de boa vontade têm que se unir, seja qual for a sua raça, nação, gênero ou religião, para construir a fraternidade que Deus quer.


Jesus não precisa de presentes, mas sim do nosso esforço na vivência do seu Reino. Não paremos em uma explicação sentimental dos eventos das narrativas da Infância de Jesus, mas procuremos penetrar no seu sentido mais profundo. Pois, na prática, temos que optar, ou pela a vivência religiosa vazia, como a de Herodes e dos Sumos Sacerdotes, ou pela mensagem libertadora do Menino de Belém, que convoca a todos, representados pelos magos, para a construção do mundo de paz, fraternidade e justiça, pois Jesus veio para que “todos tenham a vida e a tenham plenamente.” (Jo 10, 10).


A festa de hoje é altamente missionária, pois é a manifestação de Jesus às nações. É uma boa oportunidade para retomarmos os apelos do Documento de Aparecida, que conclama a uma missão renovada, onde todos os cristãos saem dos limites das suas comunidades de fé, para levar o Evangelho especialmente aos mais afastados. Temos muito a caminhar ainda, mas o início foi feito, para que cheguemos a um Brasil não somente de batizados, mas de discípulos-missionários.

 

Epifania do Senhor - Dehonianos

AMBIENTE

Na Solenidade da Epifania do Senhor, a liturgia apresenta-nos a visita dos Magos ao menino de Belém. Trata-se de um episódio que, ao longo dos séculos, tem provocado um impacto considerável nos sonhos e nas fantasias dos cristãos … No entanto, não estamos diante de uma reportagem jornalística que faz a cobertura da visita oficial de três chefes de Estado a outro país; estamos diante de uma catequese sobre Jesus, destinada a apresentar Jesus como o salvador/libertador de todos os homens.

MENSAGEM

Os numerosos detalhes do relato demonstram, claramente, que o propósito de Mateus não é de tipo histórico, mas catequético.

Notemos, em primeiro lugar, a insistência de Mateus no facto de Jesus ter nascido em Belém de Judá (cf. Mt 2,1.5.6.7). Para entender esta insistência temos de recordar que Belém era a terra natal do rei David. Afirmar que Jesus nasceu em Belém é ligá-lo a esses anúncios proféticos que falavam do Messias como o descendente de David que havia de nascer em Belém (cf. Miq 5,1.3; 2Sam 5,2) e restaurar o reino ideal de seu pai. Com esta nota, Mateus quer aquietar aqueles que pensavam que Jesus tinha nascido em Nazaré e que viam nisso um obstáculo para O reconhecerem como Messias. 

Notemos, em segundo lugar, a referência a uma estrela “especial” que apareceu no céu por esta altura e que conduziu os “Magos” para Belém. A interpretação desta referência como indicação histórica levou alguém a cálculos astronómicos complicados para concluir que, no ano 6 a.C., uma conjunção de planetas explicaria o fenómeno luminoso da estrela refulgente mencionada por Mateus; outros andaram à procura do cometa que, por esta época, devia ter sulcado os céus do Médio Oriente … Na realidade, não podemos entender esta referência como histórica, mas antes como catequese sobre Jesus. Segundo a crença popular, o nascimento de uma personagem importante era acompanhado da aparição de uma nova estrela. Também a tradição judaica anunciava o Messias como a estrela que surge de Jacob (cf. Nm 24,17). É com estes elementos que a imaginação de Mateus, posta ao serviço da catequese, vai inventar a “estreia”. Mateus está, sobretudo, interessado em fornecer aos cristãos da sua comunidade argumentos seguros para rebater aqueles que negavam que Jesus era o Messias esperado.

Temos, ainda, as figuras dos “Magos”. A palavra grega “magos”, usada por Mateus, abarca um vasto leque de significados e é aplicada a personagens muito diversas: mágicos, feiticeiros, charlatães, sacerdotes persas, propagandistas religiosos … Aqui, poderia designar astrólogos mesopotâmios, entrados em contato com o messianismo judaico. Seja como for, esses “Magos” representam, na catequese de Mateus, esses povos estrangeiros de que falava a primeira leitura (cf. Is 60,1-6), que se põem a caminho de Jerusalém com as suas riquezas (ouro e incenso) para encontrar a luz salvadora de Deus que brilha sobre a cidade. Jesus é, na opinião de Mateus e da catequese da Igreja primitiva, essa luz.

Além de uma catequese sobre Jesus, este relato recolhe, de forma paradigmática, duas atitudes que se vão repetir ao longo de todo o Evangelho: o povo de Israel rejeita Jesus, enquanto que os “Magos” do oriente (que são pagãos) O adoram; Herodes e Jerusalém “ficam perturbados” diante da notícia do nascimento de Jesus e planeiam a sua morte, enquanto que os pagãos sentem uma grande alegria e reconhecem-no como o seu Senhor.

Mateus anuncia, aqui, que Jesus vai ser rejeitado pelo seu povo; mas vai ser acolhido pelos pagãos, que entrarão a formar parte do novo Povo de Deus. O itinerário seguido pelos “Magos” reflete o processo que os pagãos seguiram para encontrar Jesus: estão atentos aos sinais (estrela), percebem que Jesus traz a salvação, põem-se decididamente a caminho para O encontrar, perguntam aos judeus – que conhecem as Escrituras – o que fazer, encontram Jesus e adoram-no. É muito possível que um grande número de pagano-cristãos da comunidade de Mateus descobrisse neste relato as etapas do seu próprio caminho em direção a Jesus.

ATUALIZAÇÃO

Considerar as seguintes questões:

* Em primeiro lugar, meditemos nas atitudes das várias personagens que Mateus nos apresenta em confronto com Jesus: os “Magos”, Herodes, os príncipes dos sacerdotes e os escribas do povo … Diante de Jesus, eles assumem atitudes diversas que vão desde a adoração (os “Magos”) até à rejeição total (Herodes), passando pela indiferença (os sacerdotes e os escribas: nenhum deles se preocupou em ir ao encontro desse Messias que eles conheciam bem das Escrituras). Identificamo-nos com algum destes grupos? Não é fácil “conhecer as Escrituras”, como profissionais da religião e, depois, deixar que as propostas e os valores de Jesus nos passem ao lado?

* Os “Magos” são apresentados como os “homens dos sinais”, que sabem ver na “estrela” o sinal da chegada da libertação. Somos pessoas atentas aos “sinais” – isto é, somos capazes de ler os acontecimentos da nossa vida e da história do mundo à luz de Deus? Procuramos perceber nos “sinais” a vontade de Deus?

* Impressiona também, no relato de Mateus, a “desinstalação” dos “Magos”: viram a “estreia”, deixaram tudo, arriscaram tudo e vieram procurar Jesus. Somos capazes da mesma atitude de desinstalação, ou estamos demasiado agarrados ao nosso sofá, ao nosso colchão, à nossa televisão, à nossa aparelhagem, à nossa internet? Somos capazes de deixar tudo para responder aos apelos que Jesus faz através dos irmãos?

* Os “Magos” representam os homens de todo o mundo que vão ao encontro de Cristo e que se prostram diante d’Ele. É a imagem da Igreja, essa família de irmãos, constituída por gente de muitas cores e raças, que aderem a Jesus e que O reconhecem como “o Senhor”. 


O TEXTO DE HOJE DE DOM DAMIÁN É A DE AMANHÃ, FESTA DO BATISMO DO SENHOR

(A tradução é direta do Google, de modo que pode haver uma ou outra falha). 

FESTA DO BATISMO DO SENHOR - CICLO B - DOM DAMIÁN NANNINI, ARGENTINA


Primeira leitura (Is 55,1-11)

O capítulo 55 de Isaías encerra a segunda parte de sua profecia conhecida como Deuteroisaias. É um oráculo de restauração que anuncia o regresso dos deportados a Jerusalém. Em primeiro lugar (55,1-5) convida os exilados a prepararem-se para possuir e usufruir gratuitamente dos bens da terra. Mas imediatamente a exortação passa ao nível “espiritual” ou “simbólico”, na medida em que nos convida a deixar de lado tudo o que não vem do Senhor para nos concentrarmos na escuta da Palavra de Deus e na vivência da Aliança com Ele. Com efeito, «o Segundo Isaías expõe a sua reflexão com a imagem do banquete, lugar de felicidade e de satisfação de todos os desejos humanos. A única condição para participar nele é a escuta da Palavra de Deus, verdadeira fonte de vida e de vida divina. sabedoria: “Presta atenção, vem a mim, ouve-me e viverás” (v. 3)”. Portanto, há uma clara transposição da comida e da bebida para o plano espiritual; Em outras palavras: Deus convida você a ficar satisfeito com Ele e com Sua salvação.

Por sua vez, a unidade literária de Is 55,6-11 começa com um convite do profeta a procurar a Deus, a voltar-se para Ele, pois Ele é compassivo e “grande” em perdoar quem se converte (55,6-7). . Seguem-se então duas fortes afirmações teológicas que, aparentemente, procuram responder às objeções ou resistências internas dos exilados israelitas: “Porque os teus pensamentos não são os meus, nem os teus caminhos são os meus caminhos – oráculo do Senhor -. acima da terra, assim os meus caminhos e os meus pensamentos superam os vossos caminhos e pensamentos" (55:8-9). Para compreender melhor estas expressões devemos ter em conta que depois de tantos anos de exílio a fé dos israelitas tinha arrefecido e agora relutavam em aceitar a novidade do perdão divino e até pediam sinais para acreditar (cf. Is 40,27; 45,11; 49,14-16). A isto devemos acrescentar que Ciro, o rei persa, é apresentado como o ungido do Senhor (messias) e seu instrumento para libertar o seu povo (cf. 41,2; 44,28; 45,1-4; 48,12-quinze). ). É bem possível que este anúncio de libertação por um gentio, um pagão como Ciro, tenha gerado resistência entre os exilados. Em última análise, esta resistência significa querer impor limites à obra de Deus, rejeitando tudo o que não se enquadra nos próprios esquemas mentais. É por isso que o Senhor, através do profeta, recorda-lhes o abismo que separa a nossa pobre compreensão da realidade dos desígnios e dos seus caminhos do Senhor. Ou seja, o plano de Deus, os seus caminhos, são misteriosos para nós, movem-se com outra lógica, a lógica divina do amor. 

O oráculo seguinte (55.10-11) responderia à resistência do povo em acreditar no poder de Deus para agir. E faz isso comparando a eficácia da Palavra de Deus com a chuva que é sempre fecunda. O oráculo insiste nos efeitos da chuva sobre a terra (embebe-a, fecunda-a, faz-a germinar), que servem para exprimir os efeitos da Palavra de Deus na história dos homens (realiza a vontade de Deus, cumpre sua missão). Esta palavra eficaz de Deus refere-se ao anúncio da libertação dos exilados com a promessa de regresso à sua terra, como confirmam os versículos que se seguem (cf. Is 55, 12-13).

Estes textos são como uma síntese da profecia de Deuteroisaias, que teve a missão de convencer um povo decepcionado de que Deus pode trabalhar além das suas possibilidades e méritos. Em suma, a Palavra de Deus, muitas vezes através de formas desconcertantes, realiza o plano do Senhor porque é sempre eficaz.


Segunda lectura (1Jn 5,1-9)


“A primeira carta de João parece conhecer apenas duas virtudes: a fé e o amor. Uma observação complementar deve ser feita para os vícios: dir-se-ia que só existem dois, que são precisamente o oposto destas duas virtudes: a incredulidade (que para João é o pecado fundamental, quase o único: é a iniquidade, o "pecado do mundo"); e o ódio aos irmãos (quem odeia mostra que verdadeiramente caminha nas trevas: nele também se encontra a ausência da verdade, cf. 1Jo 2, 4-9). Portanto, não seria excessivo afirmar que toda a moral joanina se resume em duas palavras: “na verdade e no amor” (2Jo 4). Poderíamos dizer também: “na fé e na caridade”. Uma confirmação nos vem do fato de que toda a Primeira Carta de João se baseia no desenvolvimento progressivo destas duas virtudes, concluindo com o grito de triunfo: “Esta é a vitória que venceu o mundo, a nossa fé...” (1Jo 5,4). Aqui também se vê que o amor vem apenas depois da fé; É, por assim dizer, o seu fruto maduro” (I. De la Poterie).

Ora, este triunfo significa para o crente uma luta constante com resistências internas e externas. Mas para alcançar a vitória conta com o testemunho e a ajuda de Jesus Cristo que atua no cristão através da água (Batismo), do sangue (Eucaristia) e do Espírito (Graça). 


Evangelho (Mc 1,7-11):


O texto do evangelho que a liturgia da Palavra nos oferece tem duas partes: a pregação de João Batista (1,7-8) e o Batismo de Jesus (1,9-11).

O conteúdo da pregação do Batista é claramente orientado para Jesus, apresentado como o mais forte e que tem o batismo do Espírito, em oposição ao da água. Desta forma ele prepara a próxima cena onde este anúncio terá o seu cumprimento.

Por sua vez, nos versículos 9-11 há duas cenas consecutivas. O batismo, mais brevemente (v. 9), e a cena principal que é a teofania ou manifestação divina (vv. 10-11). 


v. 9: E aconteceu naqueles dias que Jesus veio de Nazaré da Galiléia,

Marcos usa uma expressão solene (“E aconteceu naqueles dias”) porque quer apresentar um fato importante: pela primeira vez Jesus entra em cena no seu evangelho.

A menção da Galiléia é importante porque esta região geográfica de Israel tem valor e significado teológico para Marcos. É o lugar do início desta “aventura” de Jesus para anunciar e estabelecer o Reino de Deus, para o qual convoca os discípulos que mais tarde se tornarão os doze apóstolos. Pois bem, no final do evangelho Jesus ordena aos seus apóstolos que voltem para a Galileia e lá o verão (cf. Marcos 16,7). 


e foi batizado por João no Jordão

É a primeira e única vez que Jesus e João Batista se encontram cara a cara. A descrição do batismo de Jesus é muito breve, o que indica que este evento não é o mais importante para Marcos, mas a teofania que o segue. Além disso, Marcos evita qualquer alusão à confissão de pecados que as pessoas faziam quando eram batizadas por João (cf. 1,5), porque em Jesus o batismo tem um significado muito diferente, pois é orientado para a teofania. A dificuldade ou escândalo que este fato do batismo de Jesus pode ter causado fica evidente no texto paralelo de Mt 3,14-15, que acrescenta um diálogo onde João resiste em batizar Jesus.


v. 10: E imediatamente, ao sair da água, viu que os céus se abriram e que o Espírito desceu sobre ele como uma pomba; 

A teofania consiste primeiro numa visão (v. 10) e depois numa audiência (v.11). 

A respeito da visão, Marcos destaca que assim que Jesus saiu da água viu duas coisas: que os céus se abriram e foram dilacerados; e que o Espírito desceu sobre Ele como uma pomba.Há um conjunto significativo de verbos: subir e descer. Assim que Jesus se levanta (ἀναβαίνω) da água ele vê o Espírito como uma pomba descendo (καταβαίνω) em direção a Ele. A abertura ou rasgamento dos céus poderia ser uma referência a Is 63:19: “Desejaria que rasgasses o céu e desça”; dado que no contexto desta súplica Deus é chamado Pai (cf. Is 63,16; 64,7) e o Espírito é mencionado três vezes (cf. Is 63,10.11.14). Assim, este apelo do profeta para que Deus rompa o seu silêncio e se manifeste encontra o seu cumprimento em Jesus. Vemos aqui também o cumprimento da unção espiritual do profeta anunciada por Isaías 61:1: “O espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu”. A unção profética de Jesus e sua missão messiânica são evidentes aqui.

O Espírito de Deus é claramente invisível; mas aqui é “corporatizado” com a figura de uma pomba porque é uma visão. Não é fácil precisar o porquê da imagem de uma “pomba”, mas é certamente frequente nas Escrituras (cf. Gn 1,2; 8,8; Is 38,14; Os 7,11; Salmo 55,7) e A união destes textos terá criado o seu valor simbólico para se referir ao Espírito. Entre todas as possibilidades, parece-nos importante a referência a Gn 1,2, onde diz que o Espírito de Deus “vibrou”. Daí surgiria a relação simbólica do Espírito com um pássaro.


v. 11: E veio uma voz do céu, dizendo: Tu és meu Filho amado, em ti me comprazo.

A voz do céu não pode ser outra senão a voz de Deus, do Pai. Também pudemos ver uma relação entre esta “voz” sobre as águas e a frase do Salmo: “A voz do Senhor sobre as águas, trovejou o Deus da glória, o Senhor sobre as águas poderosas” (Sl 29: 3). E a voz do Pai dirige-se diretamente a Jesus, que Ele reconhece como seu Filho amado. Alusões ao Sl 2,7 como investidura real e messiânica (“Vou proclamar o decreto do Senhor: Ele me disse: “Tu és meu filho, hoje te gerei”); e ao Servo são também geralmente reconhecido nesta voz celestial o sofrimento como amado e objeto de prazer de Is 42,1 (“Este é o meu Servo, a quem sustento, o meu escolhido, em quem a minha alma se compraz. Coloquei sobre ele o meu espírito para trazer justiça às nações." "), com a qual a figura de Jesus se funde com a do servo. 

O título filho de Deus é um título messiânico segundo o oráculo de Natã (cf. 2Sm 7,14; Sl 2,7; 89,27-28). Mas a voz do céu, mais do que conferir uma missão como no Sal 2,7, revela-nos a relação estável que une Jesus a Deus. O amado na LXX é uma alusão ao filho único, Isaque (cf. Gn 22,2.12.16), com o qual a filiação divina é colocada em relação ao sacrifício. Esta obediência sacrificial de Jesus foi o que levou o centurião a reconhecê-lo como filho de Deus na cruz (cf. Marcos 15,39). O título Filho de Deus aplicado a Jesus aparece em Marcos no início (1,1.11), no meio (9,7) e no final (15,39) do seu evangelho, implicando assim que é o preferido do evangelista. 

Em suma, o batismo de Jesus é a ocasião oportuna para o Pai nos revelar a identidade de Jesus como Messias e Filho de Deus. Desta forma, o Pai – a voz celeste – confirma o que Marcos nos disse sobre Jesus no início do seu Evangelho (cf. 1,1).


Algumas reflexões:


A festa do Batismo do Senhor encerra o tempo do Natal e, por isso, deve ser entendida e celebrada em continuidade com a solenidade do nascimento de Jesus. É precisamente no sacramento do Baptismo onde se realiza a “troca admirável” celebrada no Natal: o Verbo de Deus, que se manifestou na realidade da nossa carne, tornando-se semelhante a nós por fora, transforma-nos interiormente – diz o segundo oração. coleção de festa. Quando Jesus entrou na água, quis lavar os pecados do mundo – diz a oração sobre as ofertas – e fomos feitos filhos adotivos pela água e pelo Espírito Santo; Este novo batismo no Jordão foi “marcado” com sinais admiráveis ​​– expressão do prefácio.  

A continuidade com o Natal deve referir-se também à mensagem da Palavra de Deus. Na Missa do dia de Natal ouvimos o testemunho do Evangelho de João: “O Verbo se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,18). O Verbo Eterno do Pai assumiu a condição humana e veio habitar o nosso mundo. Com esta obra de amor infinito Deus cumpriu e superou o que havia anunciado ao seu povo Israel: Jesus é a Palavra pessoal do Pai, é o Filho de Deus. Isto é solenemente declarado pelo Pai que, através da sua voz celestial, nos dá testemunho da identidade de Jesus: ele é o seu Filho amado. Aqui ele supera tudo o que Israel esperava porque não é um homem simples a quem Deus considera seu filho pelo amor que tem por ele, como seria o caso de Davi e seus descendentes. Ele é o Filho eterno do Pai feito homem. A este respeito, o Papa Francisco disse no Angelus de 10 de janeiro de 2021: “Este é o gesto que Jesus faz e desce ao rio para mergulhar na nossa mesma condição. O batismo, de fato, significa precisamente “imersão”. No primeiro dia do seu ministério, Jesus oferece-nos assim o seu “manifesto programático”. Ele nos diz que não nos salva do alto, com uma decisão soberana ou com um ato de força, um decreto, não: Ele nos salva vindo ao nosso encontro e levando consigo os nossos pecados. É assim que Deus vence o mal do mundo: caindo, assumindo o comando. É também a maneira pela qual podemos elevar os outros: não julgando, não sugerindo o que fazer, mas tornando-nos próximos, compassivos, partilhando o amor de Deus. A proximidade é o estilo de Deus conosco”.

Do ponto de vista litúrgico assinala-se também a importância de unir esta festa com a Epifania: “O Batismo do Senhor é uma festa de Epifania, isto é, de manifestação. No Oriente o ícone do Batismo do Senhor, que é um dos ícones culturais bem definidos, é o ícone da Grande Teofania, pois no Batismo se proclama a divindade de Cristo e, portanto, se testemunha a Trindade. Na Natividade, Cristo manifesta-se no ambiente humilde de Belém. A Epifania é a manifestação aos gentios. O batismo é a manifestação da unção de Cristo, a manifestação absoluta da divindade de Cristo na Trindade.

João Batista havia anunciado que AQUELE QUE vier DEPOIS DELE batizará com o Espírito, portanto é alguém que será cheio – ungido – do Espírito porque o Espírito desce sobre Ele e o conduz em sua missão. Precisamente o prefácio desta festa assim a proclama: «Queres exprimir, com sinais admiráveis ​​no rio Jordão, o mistério do novo baptismo, para que, pela tua voz celeste, se manifeste que a tua Palavra habitou entre os homens. , e, portanto, “o Espírito, que desceu em forma de pomba, reconheceu que Cristo, seu servo, havia sido ungido com o óleo da alegria e enviado para evangelizar os pobres”.

A teofania do Batismo liga-nos, de certa forma, ao mesmo Mistério da Santíssima Trindade: o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Os Três tornam-se presentes no Jordão, visíveis ou audíveis para Jesus. A relação da pessoa de Jesus como Filho com o Pai e o Espírito é eterna, mas desde a Encarnação entrou no tempo e se manifesta no tempo agora incluindo a humanidade de Jesus. No Natal, juntamente com o Menino Jesus, vimos a sua Mãe e São José, a sua família humana. Hoje nos é revelada a sua Família Trinitária, o Pai e o Espírito em comunhão com o Filho feito homem em Jesus.

Agora, no evangelho de Marcos, o batismo e a teofania acontecem pouco antes do início do ministério público de Jesus; e tem que nos dizer algo sobre isso. Na verdade, no evangelho de Marcos a primeira coisa que Jesus “faz” é aparecer diante de João Batista para ser batizado por ele. Aqui ele recebe o Espírito Santo e a “declaração de amor” de seu Pai. Este é o princípio e o fundamento da vida de Jesus Bom Pastor: saber que é amado pelo Pai, saber que é aprovado pelo Pai que se compraz Nele. Aqui está o segredo da liberdade interior e emocional de Jesus. . Ele não implora por amor porque já o tem. Ele não implora pela aprovação dos homens porque já tem a aprovação do Pai. Jesus recebe o Amor pessoal de Deus: o Espírito Santo. Ele é ungido pelo Espírito. É por isso que em sua vida ele terá a liberdade que o Espírito Santo dá àqueles que se deixam guiar por Ele. Marcos nos diz a seguir: “Imediatamente o Espírito o exortou a ir para o deserto”. (1.12).

Também nós devemos descobrir neste “sentir-se amados e aprovados pelo Pai” o início e o fundamento da nossa vida e a fonte da nossa liberdade interior e emocional. A este respeito, H. Nouwen escreve: “A tua verdadeira identidade é ser filho de Deus. Esta é a identidade que deves aceitar. muita alegria e também muita dor. Você pode receber elogios ou calúnias que chegam até você como uma ocasião para fortalecer sua identidade fundamental, porque a identidade que o liberta estabeleceu sua âncora além de todo elogio humano e de toda calúnia humana. pertence a Deus e, como Filho de Deus, você foi enviado ao mundo”.

O dia do Batismo do Senhor, que encerra o tempo do Natal, recorda não só o batismo de Jesus, mas também o batismo do cristão. Um batismo poderia ser celebrado dentro da missa; Em qualquer caso, lembre-se do batismo borrifando-o com água benta no início da missa ou após o credo, à maneira da Vigília Pascal.

Assim como sublinhamos a importância de reviver em nós mesmos o nascimento do Senhor como parte essencial do mistério do Natal celebrado na liturgia; por isso somos convidados também a reviver o nosso próprio batismo na festa do Batismo do Senhor. 

Nós, ao sermos batizados, recebemos a filiação adotiva pela qual o Pai nos ama como seus filhos em seu Filho Jesus e tem prazer em nós como nele. Esta é a vida dos Filhos de Deus que "nos foi transmitida no dia do Batismo". , quando "participando na morte e ressurreição de Cristo" começou para nós "a alegre e emocionante aventura do discípulo" (Bento XVI, Homilia na festa do Batismo do Senhor, 10 de janeiro de 2010). 

E no nosso batismo recebemos também o Espírito Santo que nos ungiu como apóstolos e testemunhas de Jesus, como seus discípulos e missionários. Esta unção e consagração batismal há que ser notada, manifestada: somos a epifania do Senhor.


PARA ORAÇÃO (RESSONÂNCIAS DO EVANGELHO EM ORAÇÃO):


Da sua cidade


Quando o céu se abriu 

uma estrela deixou seu brilho 

no olhar de Deus.

Ninguém sabia se o momento era importante

apenas uma voz de trovão gritou.

E o mundo seguiu em frente

com suas tristezas e alegrias

porque você sabia

quando o céu se fechou.


E agora na sua empresa

a humanidade estava submersa.

A água não é mais a mesma

ela ficou abençoada,

seu corpo divino a transformou.

Ele te acariciou como uma mãe

e muitos de nós esperamos.

O batismo foi selado para sempre

seus filhos e irmãos, 


Juan de repente entendeu

o mistério que pacientemente esperou,

o deserto e a fome o prepararam…

Isso é o que eu gostaria de fazer.

Vejo você vindo da sua cidade

declarar sem medo

que você é o Messias,

e eu, o mensageiro indigno

a quem o Espírito Santo falou. Amém