PENTECOSTES-A

DOMINGO DE PENTECOSTES

28/05/2023

LINK AUXILIAR:


Primeira Leitura: Atos 2,1-11 

Salmo Responsorial 103(104)R- Enviai o vosso Espírito, Senhor, / e da terra toda a face renovai.

Segunda Leitura: 1 Coríntios 12,3b-7.12-13 


Evangelho: João 20,19-23 ou João 14,15-16.23b-26

Proclamação do evangelho de Jesus Cristo segundo João (20,19-23) – 19Ao anoitecer daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas, por medo dos judeus, as portas do lugar onde os discípulos se encontravam, Jesus entrou e, pondo-se no meio deles, disse: “A paz esteja convosco”. 20Depois dessas palavras, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os discípulos se alegraram por verem o Senhor. 21Novamente, Jesus disse: “A paz esteja convosco. Como o Pai me enviou, também eu vos envio”. 22E, depois de ter dito isso, soprou sobre eles e disse: “Recebei o Espírito Santo. 23A quem perdoardes os pecados, eles lhes serão perdoados; a quem não os perdoardes, eles lhes serão retidos”. – Palavra da salvação.


DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, ARCEBISPO DE SOROCABA SP


Jo 20,19-23

Jesus Cristo nos revelou o Espírito Santo. Em todo o AT encontramos menções vagas do “Espírito de Deus”. No Gênesis, por exemplo, encontramos a alusão do “espírito de Deus que pairava sobre as águas” (Gn 1,2). Em muitas outras passagens do AT encontramos a presença do Espírito de Deus. Em todas elas, porém, o espírito nunca é mencionado como pessoa, mas sempre como um atributo de Deus. De fato, Deus é espírito.

Jesus, no entanto, sempre falou de si como Filho de Deus, pessoa distinta do Pai e nos revelou o Espírito Santo também como pessoa distinta do Pai e do Filho.

As relações entre Jesus e o Espírito são sempre de distinção e de comunhão. Eles estão sempre unidos e vivem com o Pai a mesma vida de amor: “Ele me glorificará, porque receberá do que é meu, para vo-lo anunciar. Tudo quanto o Pai tem, é meu. Por isso, eu vos digo que o Espírito receberá do que é meu, e vos anunciará” (Jo 16,14-15).

Não há, portanto, cristãos de Jesus e outros do Espírito Santo. Os cristãos são sempre de Jesus e do Espírito Santo, e também do Pai. Quando uma pessoa recebe o Espírito Santo, ao mesmo tempo se torna uma pessoa do Evangelho: é guiado ao conhecimento pleno de Jesus (Jo 16,13: Quando vier o Espírito da Verdade, ele vos guiará a toda a verdade), e se torna anunciador de Cristo em todas as línguas (At 2,4). 

O Espírito Santo age a fim de que seja formado em nós o próprio Jesus. Em Maria encontramos o modelo perfeito dessa ação do Espírito Santo em nós. Maria gerou Jesus por obra do Espírito Santo. Assim também, quando o Espírito age em nós, nos faz renascer como nova criatura, com os sentimentos, os pensamentos e as ações do próprio Jesus. Obra maravilhosa do Espírito em Maria na encarnação! Obra maravilhosa do Espírito em nossa santificação! 

É fascinante tomar consciência de que essa obra do Espírito se realiza também naquelas pessoas de boa vontade que pertencem a outras tradições religiosas. Mesmo que a pessoa não conheça o Cristo, o Espírito pode agir para gerar nela Aquele que nem mesmo sabe nomear.


Pentecostes – Jo 20,19-23 – Ano A – 28-05-23


Santa Ruah: o sopro que gera vida - Pe Adroaldo Paloro


“...soprou sobre eles e disse: ‘Recebei o Espírito Santo’” (Jo 20,22)


Pentecostes é hoje; é sempre! Não foi só naquele distante dia em que um grupo de discípulos e discípulas assustados(as) se sentiram fortes, encorajados(as), movidos(as) por um impulso tal que os levou a romper os espaços fechados e viver o movimento de “saída”. Pentecostes acontece em cada um de nós; não é pomba nem chama ardente e, talvez, não nos lança ao meio da multidão dando gritos. E, no entanto, o Espírito de Deus continua descendo sobre nós, envolvendo-nos em silêncio, seduzindo-nos sem imposições, sussurrando-nos palavras de amor infinito e ensinando-nos a olhar o mundo e a vida com novos olhos.


Somos casa do Espírito!


O relato do evangelho deste domingo nos oferece outra perspectiva do encontro do Ressuscitado com seus discípulos: seus olhos viram as feridas, mas seu coração experimentou que Jesus está vivo. E esta experiência os encheu de alegria. O Espírito os capacitou a ter um novo olhar, muito mais profundo.

O Espírito do Ressuscitado é o gerador de novos equilíbrios, rompedor de todos os medos; por isso, Ele se revela sempre desconcertante, surpreendente, interpelante. Mas é assim que o Espírito Santo nos abre a uma nova sabedoria, a um novo entendimento, a uma nova gestualidade, a uma nova vida.


O Espírito é o sopro que vivifica, anima, restaura e congrega. Somos “filhos(as) do Vento”. O vento impetuoso em Pentecostes faz com que todos nos sintamos cheios de novo alento, de novo sopro de vida. Em outras palavras, sentimo-nos “animados” (= com alma, espírito).

Nosso tempo pede que sejamos homens e mulheres do Vento, que ajudam o mundo a respirar e sentir a vida palpitar; que buscam, na terra, viver o sonho do Reino; que alimentam as chamas da esperança nos corações sonhadores; que se reconhecem humildes ante a misericórdia e o infinito de Deus; que acreditam na força dos pequenos e dos gestos simples; que vibram com as conquistas justas e que se compadecem da miséria do humano; que cuidam de tudo e de todos com ternura e carinho.

O vendaval em Pentecostes varreu o medo e a desconfiança. Todos se encheram de uma força e de um dinamismo jamais experimentado, que fez mover pessoas, corações e mentes. Sentiram-se como que envolvidos pelo Espírito, que os permitiu falar uma linguagem que todos entendiam.

Tal experiência provoca um movimento que rompe fronteiras e barreiras. Assim, o Espírito faz superar o fundamentalismo, a hipocrisia e a apatia. Não há nada de mágico; simplesmente, as pessoas se deixam mover pelo Espírito, que habita o universo e os corações, e se deixam levar pelo sopro divino.

Para captar o sentido profundo da presença e ação do Espírito, em nós e na criação, é preciso retornar à expressão hebraica “Ruah”, muito mais densa de sentido e essência. Foi o que fez o Ressuscitado ao “soprar sua Ruah” sobre os discípulos medrosos e fechados.

Já no relato do Gênesis encontramos o primeiro alento divino que deu vida ao barro inerte.

Com linguagem atual podemos dizer que a Ruah nos faz a “respiração boca a boca”, nos devolve o fôlego quando sentimos que a vida nos escapa, quando estamos desalentados, angustiados...

A “Ruah” é dinamismo, vida, relação, comunhão divina. É alento, vento, água. É unguento, é consolo, é companhia. “Ruah” é invenção, é fonte de criatividade, de autêntica novidade. É fonte de novas possibilidades no mundo, energia inaugural de novas auroras.

É a energia materna de Deus que aquece o coração da Criação, e que tudo sustenta.

Detalhemos as características da “Ruah” do Ressuscitado:

- Ruah é a ação (ou a presença) de Deus que vitaliza o ser do mundo e de uma forma peculiar a história da humanidade.

É a expansão de amor do Deus que, ao atuar sem cessar, faz com que a vida nasça e que os seres humanos entrem no mesmo fluxo desse amor.

- Ruah é a profundidade mesma de vida dos seres humanos no mundo. Ela sustenta o cosmos e a história, e se explicita em cada um de forma constante, ilimitada, sempre forte.

- Ruah é força de esperança, de maneira que ultrapassa as atuais condições da vida. Encontramo-nos em Deus e abertos ao futuro; nossa verdadeira identidade não se apoia naquilo que agora somos, mas, antes, no mistério vitalizante do Espírito divino.

- A Santa Ruah não vem para ditar um catálogo de normas, mas para revelar o sentido profundo da nossa vida. Abundante, generosa, sem cor, sem restrições ou fronteiras, assim é o seu dom.

Portanto, celebrar Pentecostes não consiste só em recordar uma experiência de dois mil anos atrás; é tomar consciência que nossa vida – pessoal e comunitária – pode mudar com a mesma intensidade que mudou a vida daquele grupo de homens e mulheres, que estavam cheios de temor.

Que nos move na celebração de Pentecostes? Olhemos em nosso interior tudo aquilo que é obstáculo para crescer como discípulo(a). Coloquemos nomes: medos, pré-juizos, petrificação, rotina, superficialidade, indiferença, ódio, maldade... Estes obstáculos são como travas que nos impedem caminhar como discípulos(as).

É a Ruah que nos purifica a fundo, estabelecendo o “cosmos” em meio ao nosso “caos” interior; é Ela que deixa a descoberto as vivências não integradas, as experiências não pacificadas, as feridas não cicatrizadas...

Existem partes de nós mesmos, talvez alguns dos nossos membros, que estão fechados ao próprio movimento da vida, que estão fechados ao Sopro do Vivente. Cada um de nós, de modo bem particular e pessoal, tem um espaço de abertura e um espaço de fechamento. Qual deles prevalece?


A missão da “Ruah” não é ajudar a nos “livrar” daquilo que imaginamos que torna sombria nossa existência e nos atemoriza (feridas, rejeições, ressentimentos...), senão que sua ação nos conduz, suavemente, a abraçar tudo e tudo recolher para que não se perca nem um só dos fragmentos da vida e, assim, com imensa gratidão, poder saciar-nos de seus dons.


Sua presença não se limita à exterioridade, mas é como a água que penetra na terra para que ela floresça.


Seu trabalho de transformação nos ensina a fazer amizade com as dimensões não integradas de nossa vida, da realidade, dos outros, das quais nos tínhamos distanciado, das quais nos sentíamos separados. Ela nos leva a descalçar-nos, porque já não temos medo de que a terra que pisamos danifique nossos pés. Sua discreta presença nos move a acolher em nós nosso potencial de ternura, de cuidado e de resistência diante de todas aquelas situações e forças que desintegram a vida.


A “Ruah” é a grande multiplicadora do melhor de cada um, a portadora das “células-tronco” de nossa vida interior. Ela nos faz forte em nossa fraqueza e nos faz amadurecer quanto mais nos humanizamos. Seu modo de nos proteger é abrindo-nos; seu modo de nos defender é desarmando-nos e quebrando nossa rigidez.

Falar da “Ruah” e celebrar Pentecostes é celebrar a festa, a vida. Ela é o Sopro último, o Dinamismo vital que pulsa em todas as expressões de vida que podemos ver e que nelas se manifesta.


Não há nada onde não possamos percebê-la, nada que não nos fale d’Ela.


Ela é o “ambiente vital de realização do ser humano”, porque n’Ela a vida adquire profundidade, consistência..., dando a todos, firmeza à vontade, equilíbrio aos sentimentos e iluminação à mente.

Viver uma “vida segundo a Ruah” é deixar-nos recriar, deixar-nos mover, transformar, alargar. Soltar

as asas nos momentos mais petrificados e pesados de nossa vida é sinal de sua silenciosa Presença.


De imediato, nos sentiremos livres do peso que fomos arrastando durante tanto tempo e, por uns instantes, nos atreveremos a “viver no Vento”.

Para meditar na oração:

“Ruah” evoca o sopro de ar fresco que trazia nuvens e chuva, ou seja, a benção. Somos conscientes, cotidianamente, desta benção? Somos o canal de benção para outras pessoas?


- O que o(a) desalenta diariamente? A sensação de fragilidade e impotência? As notícias sobre a situação mundial? A resistência diante de uma mudança, o medo do futuro? A angústia diante dos conflitos, divisões e ódios que imperam na realidade social?

- Entre no fluxo do alento da “Ruah” de Deus; alargue o espaço interior para que Ela transite com liberdade, levando o “ar renovado” às dimensões mais reprimidas e esquecidas de sua vida.



BARRO ANIMADO PELO ESPÍRITO- José Antonio Pagola

João cuidou muito da cena em que Jesus vai confiar aos Seus discípulos a Sua missão. Quer deixar bem claro o que é o essencial. Jesus está no centro da comunidade, enchendo todos com a Sua paz e alegria. Mas aos discípulos espera-os uma missão. Jesus não os convocou apenas para O apreciar, mas para O tornar presente no mundo.

Jesus «envia-os». Não lhes diz em concreto a quem devem ir, que devem fazer ou como devem agir: «Como o Pai me enviou, assim também vos envio». A sua tarefa é a mesma de Jesus. Não têm outra: a que Jesus recebeu do Pai. Têm de ser no mundo o que Ele foi.

Já viram a quem se aproximou, como tratou os mais desamparados, como levou para a frente o Seu projeto de humanizar a vida, como semeou gestos de libertação e de perdão. As feridas das Suas mãos e do Seu lado recordam-lhes a Sua entrega total. Jesus envia-os agora para que «reproduzam» a Sua presença entre as pessoas.

Mas sabe que os Seus discípulos são frágeis. Mais de uma vez ficou surpreendido pela sua «pouca fé». Necessitam do Seu próprio Espírito para cumprir a sua missão. Por isso se dispõe a fazer com eles um gesto muito especial. Não lhes impõe as mãos, nem os abençoa, como fazia com os doentes e os pequenos: «Exala o seu alento sobre eles e diz: Recebei o Espírito Santo».

O gesto de Jesus tem uma força que nem sempre sabemos captar. Segundo a tradição bíblica, Deus modelou Adão com «barro»; depois soprou sobre ele o Seu «sopro de vida»; e aquele barro converteu-se em «vida». Esse é o ser humano: um pouco de barro alentado pelo Espírito de Deus. E isso será sempre a Igreja: barro alentado pelo Espírito de Jesus.

Crentes frágeis e de fé pequena: cristãos da barro, teólogos da barro, sacerdotes e bispos de barro, comunidades da barro… Somente o Espírito de Jesus nos converte em Igreja viva. As áreas em que o Seu Espírito não é bem-vindo ficam «mortas». Fazem mal a todos nós, pois impedem de atualizar a Sua presença viva entre nós. Muitos não podem capturar em nós a paz, a alegria e a vida renovada por Cristo. Não devemos batizar apenas com água, mas infundir o Espírito de Jesus. Não só devemos falar de amor, mas também amar pessoas como Ele.


Festa de Pentecostes- Marcelo Barros


Depois de celebrar a Ascensão do Senhor a Igreja se reúne neste domingo para fazer memória do acontecimento de Pentecostes. Para compreender melhor o significado desta festa é preciso conhecer sua origem bíblica. Num primeiro momento nasceu como uma festa de ação de graças, no tempo de recolher a colheita. Cinquenta dias depois de recolher os primeiros frutos da colheita, ofereciam-se a Deus as primícias do trabalho.

De agrária converte-se logo numa festa histórica que lembra a promulgação da Lei no Sinai. Celebrava-se o aniversário da Aliança de Deus com Moisés cinquenta dias depois da saída do Egito, do êxodo libertador, e o povo judeu renovava os compromissos da Aliança. Jerusalém se enchia de pessoas vindas para celebrar a festividade de todas as partes.

No livro dos Atos dos Apóstolos narra-se a descida do Espírito Santo no dia de Pentecostes, quando todos os cristãos estavam reunidos num mesmo lugar e “todos ficaram repletos do Espírito Santo, e começaram a falar em outras línguas, conforme o Espírito lhes concedia que falassem”. Descreve-se assim a presença do Espírito Santo nesta data, que os congrega em oração e lhes concede expressar-se de forma diversa para serem entendidos/as nas diferentes culturas.

“Ao anoitecer desse dia estando fechadas as portas do lugar onde se achavam os discípulos por medo das autoridades dos judeus”, assim inicia-se o trecho do evangelho que meditamos hoje. Os discípulos reunidos, com medo, temorosos numa cidade cheia de pessoas, sem saber o que fazer. Eles já receberam a hostilidade dos judeus que culminou com a morte de Jesus! Jerusalém está cheio de crentes que chegam para a festividade.

O medo encerra os/as discípulos/as num espaço reservado, possivelmente procurando que ninguém saiba que esse grupo está reunido nesse espaço. Jesus já não está mais com eles. O Ressuscitado apareceu no meio deles, mas agora estão sozinhos, com uma promessa que ressoa no seu interior e possivelmente com muitas dúvidas, incertezas. A reação é ficar confinados, quase encarcerados pelo medo, como destaca o evangelista. Um medo que se apropria da comunidade e a impede de sair para fazer frente às dificuldades e comunicar assim a Boa Notícia de Jesus Ressuscitado. Um medo que se transforma em fraqueza e até covardia.

Podemos perguntar-nos: temos medo? O medo aparece com diferentes formas e cores, mas hoje há uma enfermidade, até o momento desconhecida, que atinge o mundo inteiro sem distinção de nível social, econômico ou cultural e gera medo. Um temor que permeia a sociedade toda, tanto pela possibilidade de contágio como pelas consequências que isso pode trazer. Neste momento crucial da nossa sociedade o medo pode ser um fator que nos fecha em nós mesmos, na nossa própria segurança, sem importar as pessoas ou os pequenos grupos que estão ao nosso redor.

Ou também pode ser, como descreve Pietro Parolin, um tempo “destinado a ter consequências relevantes em nossas vidas. E continua dizendo: “Somos colocados diante da nossa fragilidade e da nossa vulnerabilidade. Damo-nos conta de que não somos criadores, mas pobres criaturas, que existem porque Alguém lhes dá a vida a cada instante. Não somos seus donos absolutos. Basta uma qualquer coisa, um inimigo misterioso e invisível, para fazer-nos sofrer, para fazer-nos adoecer gravemente, para fazer-nos morrer. Reencontramo-nos pequenos, inseguros, indefesos, necessitados de auxílio.” Texto completo aqui.

E “Jesus entrou. Ficou no meio deles e disse: ‘A paz esteja com vocês’”.

Jesus entra na nossa vida para dar-nos em primeiro lugar sua paz e renovar nossa vida e a vida da nossa sociedade e das nossas comunidades. É preciso que sejamos recriados, renovados desde o mais íntimo e profundo. Não é uma simples mudança de atitude, de costume ou normas que determinam nossa atitude.

“Jesus soprou sobre eles, dizendo: ‘Recebam o Espírito Santo’”.

A presença do Espírito é representada em vários momentos com o símbolo do sopro e também do vento. Por exemplo, quando no livro do Gênese narra-se que depois de ter modelado o homem com a argila do solo, Deus “sopra-lhe nas narinas e o tornou um ser vivente” (Gn 2,7). Esse sopro de Deus gera vida! Em outros momentos aparece como o alento de Deus que “dá vida” (Jo 33,4), também como um louvor ao Deus da vida: “Envias o teu sopro e eles são criados, e assim renovas a face da terra” (Sl 104,30).

No relato do livro dos Atos dos Apóstolos lemos que no dia de Pentecostes os discípulos estão reunidos e, “de repente, veio do céu um barulho como o sopro de um forte vendaval, e encheu a casa onde eles se encontravam”. A presença do Espírito aparece também como um sopro, um forte vendaval que enche a casa e renova a vida das pessoas que estão reunidas.

Jesus sopra sobre os discípulos e os enche da vida do Espírito do Ressuscitado e os chama para realizar uma missão de ser comunicadores de sua paz e do seu amor e misericórdia a todo o mundo. Desta forma Jesus nos doa seu próprio ar que nos impulsiona e nos faz participar e comunicar sua Ressurreição.

O Espírito Santo atua no interior de cada pessoa e comunidade renovando-as e impulsionando a procurar novos caminhos para comunicar a novidade da sua presença no meio de nós. Neste momento que o Pentecostes é celebrado numa situação especial, o Senhor nos convida a reconhecer nossa pequenez diante da grandeza da missão que nos é confiada.

Cientes deste desafio, demo-nos as mãos, entrelacemos esforços, formando uma única rede cristã, para rezar juntos com confiança, como o fizeram Maria e a primeira comunidade, que se faça em nós a vontade de Jesus! Um momento especial para que todas as pessoas do mundo inteiro, deixando de lado as diferenças que provêm de nossas limitações, buscássemos tornar realidade o desejo de nosso Senhor, de que exista um só rebanho e um só Pastor!

E nos é oferecida “a possibilidade de redescobrir o valor da família, da amizade, das relações interpessoais, das frequentações que habitualmente negligenciamos, da solidariedade, da generosidade, da partilha, da proximidade na concretude das pequenas coisas. Precisamos uns dos outros e necessitamos de comunidades e sociedades que nos ajudem a cuidar uns dos outros”.

Lembrem-se também de que neste dia culmina a Semana de Oração pela unidade dos Cristãos promovida pelo CONIC, que nos convidou a meditarmos neste tempo de quarentena sobre o tema: Gentileza gera gentileza.

Fazemos nossas estas palavras de Marcelo Barros: “Esta Semana de oração pela Unidade dos Cristãos nos interpela a sairmos de nosso fechamento eclesiástico. Pede de nós reconhecer os cristãos e cristãs de outras tradições como irmãos e irmãs. Recomenda termos a gentileza como estilo de vida. E nos chama à unidade, mesmo em meio a todas as diferenças. O projeto é que obedeçamos ao mandamento de Jesus de sermos unidos. Que as Igrejas respeitem a autonomia de cada uma, mas construam juntas uma comunhão. Assim, poderão testemunhar ao mundo a gentileza de Deus conosco e trabalharmos pela justiça, paz e defesa da Terra e da natureza criada e habitada pelo Amor Divino”. 

Acolhamos humildemente o Amor do Pai e do Filho, que é o Espírito Santo, para colaborar com a obra de Deus. E nossos povos latino-americanos tenham em Cristo vida em abundância!

Oração

O vento de Deus

Tu que sopras onde queres,

Vento de Deus dando vida,

sopra-me, sopro fecundo!

Sopra-me vida em teu sopro!

Faze-me todo janelas,

olhos abertos e abraço.

Leva-me em boa Notícia

sobre os telhados do medo.

Passa-me em torno das flores,

beijo de graça e ternura.

Joga-me contra a injustiça

em furação de verdade.

Deita-me em cima dos mortos,

boca-profeta a chamá-los.

Dom Pedro Casaldáliga



Solenidade de Pentecostes - Divina Ruah irrompe na história- Tea Frigério.

Atos 2,1-11.


Pentecostes, festa da colheita, festa da Lei, por isso a liturgia hoje nos oferece uma colheita abundante de Palavra, mas vou me permitir comentar somente a porção dos Atos 2,1-11. 

“Tendo-se completado o dia de Pentecostes”.

Percebemos uma teologia diferente na memória da Comunidade dos discípulos e discípulas amadas: o dom do Espírito é doado no mesmo dia da Ressurreição. Na memória das Comunidades de Lucas, o Espírito é doado 50 dias depois: na Festa de Pentecostes.

“De repente veio do céu um ruído como um agitar-se de um vendaval impetuoso”.

Acorda a memória do Êxodo 19 e muitos outros textos onde os fenômenos naturais anunciam uma teofania ou manifestação do Divino, do Transcendente: a manifestação do Espírito Santo, poderíamos dizer da Divina Ruah.

“Apareceram como línguas de fogo”.

O fogo sempre nos fala da presença do Divino e de sua ação prodigiosa.

“E todos ficaram repletos de Espírito Santo e começaram a falar em outras línguas”.

A narração de novo acorda nossa memória: havia um povo que queria chegar até o céu para ter um nome (Gn 11,1-9). Querer chegar até o céu para ter poder sobre Deus e assim dominar os outros povos. Hoje, diríamos a globalização. A ameaça é debelada pela ação de Deus fazendo acontecer variedade e diversidade das línguas. Não é confusão, mas diversidade. 

A Divina Ruah não ama a uniformidade, ama a pluralidade, a variedade, a diversidade. Na continuidade da narração, Lucas nos revela que o dom das línguas não é dado para dominar, mas sim para se colocar a serviço da Boa Nova e tornar testemunhas da Ressurreição.

“Estavam todos reunidos no mesmo lugar... com algumas mulheres e Maria, a Mãe de Jesus... Achavam-se em Jerusalém judeus piedosos, vindos de todas as nações que há debaixo do céu... Como é, pois, que os ouvimos falar, cada um de nós, no próprio idioma em que nascemos?”

Da comunidade reunida de discípulos e discípulas, a narração leva ao horizonte dos confins do mundo: a salvação prometida, a luz para as nações se realiza no dia de Pentecostes. Os povos presentes são recordados seguindo uma ordem: os nativos povos do oriente; os habitantes repartidos nas seguintes regiões: leste a Mesopotâmia, norte a Ásia, sul a Líbia; os estrangeiros romanos que estão em visita a Jerusalém. E a narração insiste: ouvem em seu próprio idioma. O milagre, ou melhor, a maravilha está no escutar em sua própria língua, no seu idioma, ousaríamos dizer em sua própria cultura. Pentecostes é a festa cristã da inculturação. A multiformidade, a pluralidade, a diversidade é o DNA da Igreja nascente. Realidade fortalecida da própria narração, pois ao lermos o Livro dos Atos nos surpreendemos com inúmeras festas de Pentecostes.

O que aconteceu naquele dia? Aliás, o que aconteceu todas as vezes que houve um Pentecostes? 

Lucas tenta narrar o mais fielmente possível os acontecimentos, mas percebemos que ele está em dificuldades. Então, do seu jeito peculiar, usa gêneros literários diferentes que chamam nossa atenção.

Ouvem-se sons misteriosos vindo do alto, tremores, tempestade, vento, estremecimento, fogo parecendo línguas… Às vezes parece que "Ele" se apresenta no momento errado: antecipa-se, parece apressado e por isso entra antes da hora… Querendo afirmar sua presença se atropela… Até parece cair: “Espírito Santo caiu sobre todos os que ouviam a palavra” (At 10,44). É como se dissesse, é vento, mas não é. É fogo, mas não é fogo. É… mas…

Ao escrever deste jeito, Lucas quer nos comunicar algo, quer nos preparar, quer nos fazer entrar no mistério. A palavra mistério em grego quer dizer, literalmente, fechar os olhos e a boca. O mistério estaria, portanto, além de qualquer visão, de qualquer audição, de qualquer explicação. Mistério indescritível: “O vento sopra onde quer e ouves o seu ruído, mas não sabes de onde vem nem para onde vai” (João 3,8).

O vento e o fogo são imagens apocalípticas e teofânicas. As primeiras palavras da Bíblia nos dizem que o vento paira sobre o caos fazendo acontecer a harmonia, a vida (Gn 1,1-2). O fogo que queima sem se extinguir tira Moisés do comodismo (Ex 3,1-6). A Aliança do Sinai é selada no meio do vento e do fogo (Ex 19,16-18).

A palavra espírito em grego e hebraico significa vento, inclusive no hebraico é feminino: Ruah. A Divina Ruah irrompe naquele momento da história, naquelas pessoas reunidas, transforma-as, coloca-as em movimento, torna-as capazes de recriar a história. Irrompe na história como vento impetuoso que desarruma o que parecia arrumado; entra como um tufão que escancara portas e janelas para purificar o ar mofado; entra como furacão, ciclone que abala, desinstala as pessoas, os grupos. O vento entra como terremoto que impele a criar coisas novas.

A Divina Ruah, como misteriosa pessoa, age impulsionando sempre para frente, desafiando a romper barreiras, buscando sempre o novo. É força exuberante que não pode ser contida; na sua força pessoas medrosas, tímidas falam com parrésia, se tornam testemunhas; dom oferecido e acolhido transforma; sobretudo é força vital que conduz os missionários e missionárias.

Esta força de Deus seria o próprio Deus? Este que vem de Deus seria também Deus? Este "quem" o que seria? Seria o Vento de Deus? Seria o Fogo de Deus? Seriam o Vento e o Fogo de Jesus, de Maria misteriosamente presentes na comunidade nascente? Misteriosamente presente através dos discípulos e discípulas nas Igrejas, no Universo?

“Derramarei meu espírito sobre toda carne. Vossos filhos e vossas filhas profetizarão, vossos jovens terão visões e vossos velhos sonharão. Sim, sobre meus servos e minhas servas derramarei do meu Espírito”. 

São palavras do profeta Joel afirmando que o Espírito será derramado sobre os filhos e as filhas, sobre os servos e as servas confirmando: a comunidade é sinal do Reino presente (At 2,1; 1,14; 2,16-18; Joel 3,1-5).

Ouso dizer que a A Divina Ruah é uma agitadora social: não se aquieta enquanto não inquieta. Sua estabilidade pessoal cria instabilidade social: causa celeuma, espanto, coloca tudo de cabeça para baixo, desinstala o grupo de discípulos e discípulas, uma população ordeira e acomodada. Transformar repouso em movimento, a rotina em novidade parece ser o resultado de sua inesperada irrupção. O oráculo de Joel aponta para uma transmutação de papéis sociais que colocam em redemoinho as relações vigentes.

O Vento de Deus que sopra derruba preconceitos e destrói as históricas barreiras da separação entre judeus e gentios, homens e mulheres, jovens e adultos, escravos e livres. As mulheres tornam-se boca de Javé, exercem atividades associadas a um dos principais carismas das comunidades, o carisma profético... A Divina Ruah chega destravando a língua das mulheres, proibidas de falar em público e nas comunidades ganham dignidade em plena e absoluta igualdade.

Dessa maneira, A Divina Ruah ameaça a instituição do patriarcado, potencializando ou criando o conflito dentro e fora da comunidade. Incluindo a mulher no carisma profético, reconhece sua identidade e igualdade, desafia o homem a descobrir a mulher como companheira na proposta da nova criação, da Igreja.

Palavras muito evocativas: a Divina Ruah é como vendaval que subverte os padrões que a sociedade patriarcal afirma como únicos e legítimos. A mulher emudecida no fórum social e eclesial, fala e profetiza.

Os jovens têm visões, enxergam e exercem a sabedoria e o conselho próprio dos anciões, enquanto os velhos sonham. Sonhar, apostar no futuro é dos jovens, o ancião já realizou, não sonha mais. Há inversão de papéis: os anciões sonham, olham para frente, abrem o horizonte do amanhã, o caminho da plenitude; os jovens vencem seu afã, sua pressa em alcançar metas e objetivos e têm visões, conseguem projetar o futuro com discernimento e sabedoria.

Os servos e servas, os escravos e escravas, consideradas ferramentas animadas, falam e são reconhecidos/as como sujeitos da história. A Agitadora social age e provoca uma verdadeira comoção e revolução social: inclui quem era excluído; quem ‘não é’, é protagonista. Quem não contava, quem não era, sobre eles e elas é derramada a Energia vital que faz novas todas as coisas, sinal do tempo novo.

Na Festa de Pentecostes reconhecemos nossa natureza peregrina, sempre a caminho para que a novidade do Evangelho seja testemunhada, bem longe do poder! Igreja de periferia, mais rebelde que integrada, escanteada, frequentemente considerada inútil e descartável, por ser incômoda é semente do Reino.

A Festa de Pentecostes é Festa da diversidade, dos carismas para o crescimento da comunidade, da humanidade. Somos iguais embora diferentes. Compreendemos na diversidade que a harmonia não se alcança com a violência, a intolerância ou intensificando o controle, mas é um caminhar na paciência, na escuta recíproca e na convivência. Instiga a Igreja a ir além de seus confins, em multiforme nomadismo que enriquecerá a história e as comunidades, diversas entre si e sempre a caminho.

Vivo esta Festa de Pentecostes em Amazônia, ‘Casa comum’ que me acolheu e adotou. Agradecendo este dom, invoco a Divina Ruah para Ela cair sobre o Sínodo da Amazônia como Agitadora social, como Agitadora eclesial: Vem e faz novas todas as coisas!



TEXTO EM ESPANHOL de Dom Damián Nannini, Argentina 

SOLEMNIDAD DE PENTECOSTÉS CICLO "A"


Primera lectura (He 2,1-11):


La narración comienza con una referencia al día de Pentecostés. Se trata del quincuagésimo día después de Pascua. Un primer dato importante a retener es que la fiesta de Pentecostés, tanto para la tradición judía como cristiana, está íntimamente unida a la Pascua, es su culminación o coronación. 

El Antiguo Testamento habla de la fiesta de las Semanas o Savuot (cf. Ex 23,16; Lv 23,15-22; Dt 16,9-12), cincuenta días después de la Pascua, y que celebraba la última cosecha del año, la siega del trigo; mientras que en la Pascua se celebraba la primera cosecha del año. Esta fiesta formaba parte de las tres fiestas de peregrinación a Jerusalén junto con la Pascua y las Tiendas (sukkot). Más tarde la liturgia judía unió esta fiesta de Pentecostés o Savuot al recuerdo del don de la Torá o Ley en el Sinaí, llamándola justamente fiesta del "don de la Torá" y durante la misma se leía el relato de la promulgación del decálogo (Ex 19-20) . La referencia al ruido del viento impetuoso y a las lenguas de fuego podría ser una alusión que hace el autor de Hechos de los Apóstoles a la teofanía del Sinaí.

El texto dice que estaban todos reunidos en un mismo lugar. ¿Quiénes son estos "todos" y dónde estaban? La respuesta la tenemos un poco antes en He 1,13-14: "Cuando llegaron a la ciudad, subieron a la sala donde solían reunirse. Eran Pedro, Juan, Santiago, Andrés, Felipe y Tomás, Bartolomé, Mateo, Santiago, hijo de Alfeo, Simón el Zelote y Judas, hijo de Santiago. 14 Todos ellos, íntimamente unidos, se dedicaban a la oración, en compañía de algunas mujeres, de María, la madre de Jesús, y de sus hermanos."

Este "lugar" es el Cenáculo, la "sala grande en el piso superior" (cf. Mc 14, 15) donde Jesús había celebrado con sus discípulos la última Cena y donde se les había aparecido después de su resurrección. Allí se encuentran los once Apóstoles y demás discípulos, incluida María la Madre de Jesús, que conformaban la primera comunidad cristiana.

Ahora bien, lo que sigue del relato de los Hechos, en particular el fenómeno de la comprensión a pesar de la diversidad de lenguas, tiene más bien como trasfondo del mismo la narración de la torre de Babel (Gn 11). En el acontecimiento de Babel la soberbia de los hombres, su amor propio, su búsqueda de fama y gloria llevó a la división de las lenguas con la consiguiente confusión e incomunicación entre hombres y pueblos. Como contrapartida, el acontecimiento de Pentecostés demuestra cómo por obra del Espíritu Santo es posible mantener la unidad respetando la diversidad. En efecto, al decir: "todos los oímos proclamar en nuestras lenguas las maravillas de Dios" (He 2,11) se hace referencia a esa unión superior, en Dios, que es fruto del Espíritu y permite entenderse y comunicarse más allá de las legítimas diferencias.

Como actualización de este texto es interesante lo que dice al respecto R. Cantalamessa : "Se comprende así en qué consiste la radical transformación que se realiza en Pentecostés, con la venida del Espíritu Santo. En el corazón de los apóstoles Dios ha tomado el lugar del yo, ha destruido la vanagloria de sus obras y de sus proyectos y los empuja a gloriarse sólo en él, no en uno mismo. Así lo ha interpretado San Agustín cuando dice que Babel es la ciudad construida sobre el amor propio, mientras Jerusalén, esto es, la Iglesia, o la ciudad de Dios, es la ciudad construida sobre el amor de Dios […] El paso de Babel a Pentecostés, acontecido históricamente de una vez para siempre y narrado en He 2, debe realizarse espiritualmente, cada día, en nuestra vida. Hay que pasar continuamente de Babel a Pentecostés, del mismo modo que es necesario pasar continuamente del hombre viejo al hombre nuevo".


En el marco de todo el libro de los Hechos hay que recordar que, si bien el primer gran evento que abre la misión pública de la Iglesia es Pentecostés (2,1-4), la experiencia del Espíritu no se limita a esta primera manifestación, sino que se renueva continuamente en la vida de los discípulos: en el momento de las primeras dificultades (4,31), en ocasión de la conversión de los primeros paganos (10,44-47), en la vivencia de algunos grupos que se integraban plenamente a la Iglesia (19,8). Para Lucas la historia de la Iglesia está marcada por esta renovada y continúa manifestación del Espíritu. Es gracias a su energía que la comunidad de los creyentes lleva adelante eficazmente la obra de Jesús en la historia. 


Segunda Lectura: 1Cor 12, 3b-7.12-13


San Pablo comienza esta sección con una clara afirmación: toda confesión de fe en el Señor Jesús es fruto de la acción del Espíritu. Mediante esta afirmación demuestra que la acción del Espíritu Santo causa la unidad en la fe de los creyentes. En lo que sigue busca -manteniendo esta unidad en el origen - tener en cuenta la diversidad a nivel de los carismas. Para confirmar esta coexistencia de la unidad con la diversidad cita dos ejemplos: los múltiples servicios o ministerios en relación al único Señor (v. 5) y las actividades diversas con un único Dios, “que realiza todo en todos” (v. 6). Así, en primer lugar, precisa que son los dones visibles o manifiestos los que se dan a cada cristiano en particular (hay dones interiores del Espíritu como la fe y la caridad que se dan a todos). Luego dice que su finalidad es la utilidad común, por lo que los mismos carismas tienden entonces a la unidad: “A cada uno le es dada la manifestación (phanerosis) del Espíritu para la utilidad común (pros to sympheron)” (12,7). 

Para ejemplificar esta enseñanza acerca de la unidad y la diversidad recurre a la comparación del cuerpo y sus miembros. Esta referencia a la imagen del cuerpo para explicar la unidad y la diversidad entre los miembros de una sociedad estaba difundida ampliamente en el helenismo y, por ello, se piensa que de allí la tomó San Pablo para aplicarla a la Iglesia. Esta comparación es válida en lo referente al funcionamiento de la Iglesia en cuanto cuerpo social, visible. Pero en lo que sigue Pablo deja en claro que la razón de la unidad en la Iglesia se debe a Cristo y al Espíritu Santo. En efecto, al final del versículo12 dice: "así sucede con Cristo", a quien aplica entonces la comparación del cuerpo. Como dice L. Rivas : "En este punto se pone de relieve una sorprendente enseñanza de san Pablo: los cristianos no forman una unidad solamente porque están unidos entre ellos formando una sociedad, una comunidad a la que se le da el nombre de Iglesia (ekklesía). Los cristianos constituyen un cuerpo porque están unidos a una persona viviente, que es el Cristo glorificado". Luego en 12,13 explicita que todos los cristianos han sido bautizados (literalmente "sumergidos") en un solo Espíritu para formar un solo cuerpo. Deja en claro que el bautismo tiene una característica connotación eclesial: es el sacramento que nos une en un solo cuerpo. No se trata de una experiencia exclusivamente individual del cristiano, ya que por el bautismo se establece una vinculación especial entre todos los cristianos que forman un solo cuerpo. 

En síntesis, la unidad, respetando la diversidad de carismas y servicios, se mantiene en la Iglesia gracias a una doble referencia teológica: su origen en el mismo Espíritu Santo y su finalidad u orientación al bien común del único cuerpo de Cristo.


Evangelio: Jn 20,19-23


En su primera aparición Jesús Resucitado saluda a los discípulos diciéndoles: “¡Paz a ustedes!”. Se trata del don de la paz como don escatológico tal como lo había indicado el mismo Jesús en su discurso de despedida: “Es la paz, la mía la que les doy; no se las doy a la manera del mundo” (Jn 14, 27). Este augurio de paz, según el trasfondo del Antiguo Testamento, incluye todos los bienes necesarios para la vida presente y la plenitud de bienes en la vida futura.

Luego Jesús les muestra sus heridas para probarles que es el Crucificado que ha Resucitado; que es él mismo, pero en un estado diferente.

La visión de Jesús Resucitado provoca en los discípulos una plenitud de alegría y, de este modo, Jesús cumple lo que les había anunciado de darles una alegría completa (cf. Jn 15,11; 16,22).

A continuación, pronuncia las palabras de envío y realiza el gesto de soplar sobre ellos. Algunos estudiosos ven en este gesto de Jesús una referencia al gesto primordial de Dios en la creación del hombre (cf. Gen 2,7) . Entonces el soplo de Jesús es el signo de la nueva creación: Jesús glorificado comunica el Espíritu que hace renacer al hombre (Cf. Jn 3, 3-8), dándole a compartir la comunión divina. El Hijo que “tiene la vida en sí mismo” dispone de ella a favor de los suyos (Cf. Jn 5, 21.26); su soplo es el de la vida eterna. Con esta donación del Espíritu Santo a los Apóstoles se les comunica también el poder perdonar o retener los pecados y, de este modo, son ellos ahora transmisores de la vida nueva. 


Algunas reflexiones:

A veces nos preguntamos qué es lo más decisivo o importante en nuestra vida, lo que sucede dentro nuestro o fuera de nosotros. Es innegable que el hombre es un ser social y comunitario; y vive en un ambiente concreto con el cual se vincula necesariamente. Y es sano que nos vinculemos con la realidad que nos rodea; y cuanto más, mejor. Pero el motor de nuestra vida está en nuestro interior; lo esencial de nuestra vida pasa por nuestro corazón; incluyendo el modo cómo nos vinculamos con la realidad exterior. Pensemos en la imagen de una fuente de donde brota el agua llenando adentro y desbordando hacia afuera. Y esto es fundamental porque muchas veces no podremos cambiar la realidad exterior; pero sí podemos cambiar nuestra actitud interior ante esta realidad. Y muchas veces éste es el primer paso para empezar a cambiar o transformar la realidad.

Y este es camino que Dios ha elegido para nuestra vida personal y eclesial, pues el gran don de la Pascua de Jesús es el Espíritu Santo. La referencia cronológica de la primera lectura al día quincuagésimo después de Pascua, según vimos, nos confirma esta estrecha relación con la Pascua. Lo mismo podemos decir del evangelio de Juan de este domingo donde nos presenta la indisoluble unidad entre la Resurrección de Jesús y la donación del Espíritu Santo a los apóstoles. Al respecto dice el Directorio Homilético n° 56: “Pascua es Pentecostés. Pascua ya es el don del Espíritu Santo. Pentecostés, no obstante, es la convincente manifestación de la Pascua a todas las gentes, ya que reúne muchas lenguas en el único lenguaje nuevo que comprende las «grandezas de Dios» manifestadas y reveladas en la Muerte y Resurrección de Jesús. En la Celebración Eucarística, la Iglesia reza: «Te pedimos, Señor, que, según la promesa de tu Hijo, el Espíritu Santo nos haga comprender la realidad misteriosa de este sacrificio y nos lleve al conocimiento pleno de toda la verdad revelada» (oración sobre las ofrendas). Para los fieles, la participación en la Sagrada Comunión en este día, se convierte en el acontecimiento de su Pentecostés. Estos versículos encuentran su cumplimiento en los fieles que reciben la Eucaristía. La Eucaristía es Pentecostés”.

Y en el evangelio se nos presenta al Espíritu Santo como un manantial de agua viva que brota del interior del creyente (cf. Jn 7,37-39); como principio de vida nueva, de vida interior; como el Maestro Interior que vendrá a habitar en nosotros (cf. Jn 14,23); nos conducirá a la verdad completa (cf. Jn 16,13); y nos enseñará y recordará todo lo que Jesús dijo (cf. Jn 14,26). 

El Espíritu Santo es el "dulce huésped del alma" que puede transformar nuestra vida entera. Pero lo hace a su modo y a su tiempo; "a oscuras y en seguras", secretamente. Aquí también toda la vida del cristiano, en síntesis, se reduce a secundar las mociones interiores del Espíritu Santo, que es necesario discernir. Él es el artífice de nuestra vida cristiana.

Ahora bien, para poder obrar el Espíritu Santo necesita que le abramos nuestro corazón por el deseo; pero existe el riesgo real de que se lo cerremos por el miedo. Como dice R. Cantalamessa: "La primera condición para recibir el Espíritu Santo no son los méritos ni las virtudes, sino el deseo, la necesidad vital, la sed. El problema práctico, acerca del Espíritu Santo, está precisamente aquí: ¿tenemos nosotros sed del Espíritu Santo, o tenemos, por el contrario, miedo de él? Nosotros intuimos que, si viene el Espíritu Santo, no puede dejarlo todo como lo encuentra en nuestra existencia". Ante esto recordemos que el Espíritu Santo vence el miedo, sustituye el temor por el amor que nos hace testigos.

Y A partir de la transformación interior que obra en nosotros el Espíritu Santo es como los cristianos se vuelven comunidad misionera. En este sentido es el alma de la Iglesia en donde obra distribuyendo los diversos carismas y servicios y manteniendo su unidad al orientarlos a la búsqueda del bien común.

Y en Pentecostés la Iglesia emprende su marcha misional, movida por el Espíritu Santo que sigue obrando hoy: “En todos los bautizados, desde el primero hasta el último, actúa la fuerza santificadora del Espíritu que impulsa a evangelizar”, dice el Papa Francisco en Evangelii Gaudium (119). Y allí mismo nos invita a ser “Evangelizadores con Espíritu” donde “evangelizadores con Espíritu quiere decir evangelizadores que se abren sin temor a la acción del Espíritu Santo. En Pentecostés, el Espíritu hace salir de sí mismos a los Apóstoles y los transforma en anunciadores de las grandezas de Dios, que cada uno comienza a entender en su propia lengua. El Espíritu Santo, además, infunde la fuerza para anunciar la novedad del Evangelio con audacia, en voz alta y en todo tiempo y lugar, incluso a contracorriente. Invoquémoslo hoy, bien apoyados en la oración, sin la cual toda acción corre el riesgo de quedarse vacía y el anuncio finalmente carece de alma. Jesús quiere evangelizadores que anuncien la Buena Noticia no sólo con palabras sino sobre todo con una vida que se ha transfigurado en la presencia de Dios” (EG 259).

La Iglesia, para ser tal, necesita del Espíritu Santo como el cuerpo necesita del alma para poder vivir. Es su principio vital. Por eso a Él debemos permanecer unidos, a Él debemos permitirle que penetre, habite y transforme nuestros corazones; nuestras comunidades; nuestras estructuras eclesiales. Y lo hará de modo "semejante a una fuerte ráfaga de viento" que lo llena todo. Por eso a veces nos da un poco de miedo abrirnos a la presencia y la acción del Espíritu Santo. Sobre todo, porque para que obre el Espíritu Santo primero tiene que morir nuestro yo, nuestra testaruda pretensión de manejarlo todo, de controlarlo todo a nuestro modo. La evangelización es, ante todo, obra Suya más que nuestra. Si lo tomamos como algo exclusivamente nuestro, los frutos nos mostrarán nuestro error: se genera división, no comunión. Si, en cambio, nos preocupamos por secundar la acción del Espíritu Santo puede que no tengamos un éxito inmediato (ni mediático), pero su fruto, la comunión con Dios y entre los hombres, permanece.

Al respecto decía el Papa Francisco en el Regina Coeli del 31 de mayo de 2020: “Al perdonar y reunir a los discípulos en torno a Sí mismo, Jesús hace de ellos una Iglesia, su Iglesia, que es una comunidad reconciliada y lista para la misión. Reconciliados y listos para la misión. Cuando una comunidad no está reconciliada, no está lista para la misión: está lista para discutir dentro de sí misma, está lista para las [discusiones] internas. El encuentro con el Señor Resucitado transforma la existencia de los Apóstoles y los convierte en valientes testigos. De hecho, inmediatamente después dice: «Como el Padre me envió, también yo os envío» (v. 21). Estas palabras dejan claro que los Apóstoles son enviados a prolongar la misma misión que el Padre ha confiado a Jesús. «Os envío»: no es tiempo de encerrarse, ni de lamentarse: de lamentarse recordando los “buenos tiempos”, el tiempo pasado con el Maestro. La alegría de la Resurrección es grande, pero es una alegría expansiva, que no debe guardarse para sí mismo, es para darla […] Y precisamente para animar la misión, Jesús da a los Apóstoles su Espíritu. El Evangelio dice: «Sopló sobre ellos y les dijo: “Recibid el Espíritu Santo”» (v. 22). El Espíritu Santo es fuego que quema los pecados y crea hombres y mujeres nuevos; es fuego de amor con el que los discípulos pueden “incendiar el mundo”, ese amor tierno que prefiere a los pequeños, a los pobres, a los excluidos... En los sacramentos del Bautismo y de la Confirmación hemos recibido el Espíritu Santo con sus dones: sabiduría, inteligencia, consejo, fortaleza, ciencia, piedad, temor de Dios. Este último don —el temor de Dios— es precisamente lo contrario del miedo que antes paralizaba a los discípulos: es el amor al Señor, es la certeza de su misericordia y bondad, es la confianza de que podemos avanzar en la dirección indicada por Él, sin perder nunca su presencia y su apoyo. La fiesta de Pentecostés renueva la conciencia de que la presencia vivificante del Espíritu Santo habita en nosotros. También nos da el coraje de salir de las cuatro paredes protectoras de nuestros “cenáculos”, de los grupos pequeños, sin acomodarnos en una vida tranquila o encerrarnos en hábitos estériles”.


PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):


El primero de la semana…


Señor,

Enséñanos a empezar contigo cada semana

Experimentar verdaderamente tu Presencia deseada

Esperarte… con el alma enamorada


 Sentirte cerca, entre nosotros, 

Alegrarnos de tal manera, imaginar tu sonrisa fresca

Las puertas estarán abiertas


Tus manos, tus pies, tu costado…

¡Ay si pudiéramos de esas heridas admirarnos

Reconocerte en silencio… reconciliados!


Sopla tu aliento de Vida, te rogamos

¡Dios todopoderoso, amigo y tan humano!

Sin mirar nuestros pecados nos envías a perdonarlos.


Ven Ayudador, ven Espíritu de Dios

Ven a habitarnos, a poseernos, a transformarnos

¡Ven Espíritu de nuestro Señor, Ven Espíritu Santo! Amén