2º QUARESMA-A

2°.DOMINGO DA QUARESMA ANO A

05/03/2023


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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


1ª Leitura: Gênesis 12,1-4a

Salmo 32(33)-R- Sobre nós venha, Senhor, a vossa graça, venha a vossa salvação!

2ª Leitura: 2 Timóteo 1,8b-10

Evangelho de Mateus 17,1-9

Naquele tempo: 1Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. 2E foi transfigurado diante deles; o seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz. 3Nisto apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus. 4Então Pedro tomou a palavra e disse: 'Senhor, é bom ficarmos aqui. Se queres, vou fazer aqui três tendas: uma para ti, outra para Moisés, e outra para Elias.' 5Pedro ainda estava falando, quando uma nuvem luminosa os cobriu com sua sombra. E da nuvem uma voz dizia: 'Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo meu agrado. Escutai-o!' 6Quando ouviram isto, os discípulos ficaram muito assustados e caíram com o rosto em terra. 7Jesus se aproximou, tocou neles e disse: 'Levantai-vos, e não tenhais medo.' 8Os discípulos ergueram os olhos e não viram mais ninguém, a não ser somente Jesus. 9Quando desciam da montanha, Jesus ordenou-lhes: 'Não conteis a ninguém esta visão até que o Filho do Homem tenha ressuscitado dos mortos.' Palavra da Salvação.


DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, Arcebispo de Sorocaba sp


Mt 17,1-9

Celebramos hoje o dia em que Jesus se transfigurou no monte diante dos discípulos Pedro, Tiago e João. A liturgia da palavra nos fala do significado deste acontecimento.

O acontecimento da transfiguração de Jesus é descrito não apenas por S. Mateus, mas está presente também nos evangelhos de Lucas e de Marcos. Isto já nos mostra como este acontecimento é importante para a fé cristã.

1. O que a transfiguração significa em si mesma? Qual é a sua importância para a fé cristã?

A transfiguração revela para nós quem é Jesus Cristo. Ela possui um valor em si mesma como um fato miraculoso pelo qual se nos revela quem é finalmente Jesus. Neste momento o véu que encobria o mistério de sua pessoa é retirado. Por detrás de suas origens humildes, de sua pobreza, da insignificância de seus meios se esconde, verdadeiramente, a glória do Filho eterno do Pai.

Os discípulos não ficaram imunes ao conflito que se armara ao redor de Jesus. Quase todas as pessoas e as instituições daquele tempo se voltaram contra Ele. Jesus foi acusado de falso profeta, de herege, de possesso, de charlatão. Os sacerdotes acusaram Jesus de tudo isto. As pessoas piedosas e religiosas confirmaram estas acusações. Os políticos fizeram coro a esta interpretação. Ora, diante de tudo isso se levanta a pergunta: com quem está a verdade? Com a minoria - Jesus e os discípulos - ou com a maioria da sociedade e da religião daquela época?

A transfiguração desfaz todas as ambigüidades. É o próprio Deus do céu que se pronuncia em favor de Jesus: "Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo, ouvi-o sempre!".

Diante deste homem fraco e contestado nos encontramos diante do próprio Filho de Deus que visitou o seu povo para o libertar. A fé dos apóstolos e a nossa sai fortalecida porque o escândalo da insignificância histórica de Jesus é superado: vemos a glória de Deus, a Lei e os Profetas que dão testemunho dEle.

2. Qual o significado da Transfiguração para Jesus?

A transfiguração também tem um sentido para o próprio Jesus. Este acontecimento pode ser considerado dentro do contexto da vida de Jesus. O que estava acontecendo na vida de Jesus quando se deu a transfiguração? Jesus estava vivendo um momento de crise provocado pela sua própria pregação, pelas suas atitudes e pela sua vida.

A primeira fase do ministério público de Jesus tinha se caracterizado pelo entusiasmo, pela reação positiva do povo e dos apóstolos. Na medida, porém, que ia ficando claro o que Jesus queria com o anúncio do Reino uma crise começou a se armar. Por quê? Jesus pregava um Reino que era a transformação total do homem e do mundo mediante a conversão radical, de um novo tipo de relacionamento para com Deus, Pai de infinita bondade e para com todos os irmãos. E não era isso que o povo esperava: ansiava por um Messias libertador que iria instaurar um novo poder terrestre. Ora, Jesus não aceitou este tipo de messianismo. Por isso ele foi ficando cada vez mais só.

Jesus não só provocou a crise, mas também entrou na crise. Jesus se torna mais sério em sua linguagem, começa a entrever sua morte. Como é possível que Jesus entre em crise? É só lermos Hb: “embora fosse Filho, teve que se assemelhar em tudo a seus irmãos. Padeceu sendo tentado. Em sua vida mortal ofereceu a Deus preces e súplicas àquele que o podia salvar e foi escutado”.

Jesus se coloca em oração. É um momento importante, decisivo na vida de Jesus. É assim que neste clima de crise e tentação, mas também de oração que o Pai se manifesta ao Filho.

Jesus jamais quebrou a fidelidade ao seu Pai. Sofreu, mas assume aquilo que se revelou como vontade concreta de Deus: seguir fiel, mesmo tendo de morrer rejeitado na cruz.

A transfiguração significou para Jesus a certeza de que Deus não o havia abandonado. Todos podiam tê-lo rejeitado, os discípulos podiam ter compreendido mal suas palavras, Deus, entretanto, confirmou a justeza das decisões de Jesus.

A voz do Pai é clara: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo, ouvi-o sempre!”. Não somente os apóstolos, mas também Jesus sai fortalecido em sua fidelidade e obediência ao Pai.

3. Qual o sentido da transfiguração para os apóstolos?

Os apóstolos guardaram viva a lembrança deste acontecimento e os evangelistas nos transmitiram isto não apenas com a intenção de nos revelar o mistério da pessoa de Jesus, o Filho de Deus encarnado, nem somente para mostrar o apoio do Pai no meio das tentações de Jesus, mas também para nos comunicar uma lição.

Qual lição? O seguimento de Jesus implica comungar de sua vida e também de seu destino. Seguir Jesus significa abraçar o Reino de Deus e rejeitar o reino deste mundo, o pecado. Este seguimento inclui conversão, sacrifícios, rupturas. Mas o sentido de todo este empenho nos é revelado pela transfiguração: na cruz de Cristo há ressurreição, em todo o sacrifício vigora uma redenção e na morte por amor triunfa uma vida. Seguir Jesus não é só carregar a cruz, mas também ser glorificado, ser transfigurado nEle. Eis a grande lição que se tira da transfiguração de Jesus.

Nesta CF somos convidados a reconhecer no rosto desfigurado dos que morrem de fome o rosto de Jesus. Que nosso compromisso cristão possa fazer resplandecer no rosto desfigurado dos nossos irmãos a glória de filhos de Deus.

Os direitos à alimentação e à água revestem um papel importante para a consecução de outros direitos, a começar pelo direito primário à vida. Por isso, é necessária a maturação duma consciência solidária que considere a alimentação e o acesso à água como direitos universais de todos os seres humanos, sem distinções nem discriminações.


APANHADO GERAL DAS LEITURAS DE HOJE


Gn 12,1-4a; Sl 33; 2Tm 1,8b-10; Mt 17,1-9

No segundo Domingo da Quaresma, a Palavra de Deus define o caminho que o verdadeiro discípulo deve seguir: é o caminho da escuta atenta de Deus e dos seus projetos, da obediência total e radical aos planos do Pai.

O Evangelho relata a transfiguração de Jesus. Recorrendo a elementos simbólicos do Antigo Testamento, o autor apresenta-nos uma catequese sobre Jesus, o Filho amado de Deus, que vai concretizar o seu projeto libertador em favor dos homens através do dom da vida. Aos discípulos, desanimados e assustados, Jesus diz: o caminho do dom da vida não conduz ao fracasso, mas à vida plena e definitiva. Segui-o, vós também.

Na primeira leitura apresenta-se a figura de Abraão. Abraão é o homem de fé, que vive numa constante escuta de Deus, que sabe ler os seus sinais, que aceita os apelos de Deus e que lhes responde com a obediência total e com a entrega confiada. Nesta perspectiva, ele é o modelo do crente que percebe o projeto de Deus e o segue de todo o coração.

Na segunda leitura, há um apelo aos seguidores de Jesus, no sentido de que sejam, de forma verdadeira, empenhada e coerente, as testemunhas do projeto de Deus no mundo. Nada – muito menos o medo, o comodismo e a instalação – pode distrair o discípulo dessa responsabilidade.


Transfiguração: ser presença iluminante - Pe Adroaldo Paloro


“O seu rosto brilhou como o sol e as suas roupas ficaram brancas como a luz...” (Mt 17,2)


O evangelho deste segundo domingo da Quaresma nos apresenta um acontecimento muito profundo e transcendente da vida de Jesus, na presença de seus discípulos. O contexto desta passagem é a subida de Jesus a Jerusalém, antes de sua morte. O Mestre leva consigo três discípulos com os quais já tivera dificuldades devido à falta de compreensão deles com relação à sua missão. Pedro tentara desviar Jesus de seu caminho de Cruz e os outros dois, João e Tiago, disputavam os primeiros lugares no Reino. Jesus deseja revelar a eles, e a nós, que há uma dimensão muito mais profunda neste seguimento e que o impulso egoico deve se esvaziar diante da transcendência de uma vida que se faz entrega.

Ali, no Monte Tabor, também aparecem dois personagens que são referenciais na tradição judaica: Elias e Moisés. Elias é aquele que lhes revela que a Divindade é uma presença única como brisa suave e que se comunica como sussurro interior no mais profundo do ser humano, algo inesgotável. Moisés, em outra dimensão, revela que a Divindade atua na história como ação libertadora de toda opressão.

Na transfiguração, Jesus vai além destes dois personagens e revela que não é um profeta eleito para nos ensinar quem é e como é Deus; Ele mesmo deixa transparecer sua divindade  ele mesmo deixa transparecer sua divindade e revela que toda a humanidade é chamada a visibilizar a presença divina em cada um. Deus é Luz que envolve a realidade humana na pessoa de Jesus, e é Palavra dirigida agora aos discípulos para lhes comunicar que Ele é o Filho Amado.

Já vimos no Batismo que essa voz foi dirigida somente a Jesus; mas a revelação continua avançando e essa Voz agora é dirigida aos discípulos e a cada um de nós. Na verdade, todos(as) somos “filhos e filhas amados(as)”; todos somos um pequeno “sol”, conectados com o Grande Sol que tudo ilumina. Somos criaturas profundamente amadas, para além de nossos medos e inseguranças, para além das imagens que temos ou que outros têm de nós. A nossa condição humana se “transfigura” na “filiação divina”: aqui está a nobreza e a grandeza de cada um de nós.

A Transfiguração de Jesus nos mobiliza a ultrapassar a superficialidade da realidade e nos impulsiona a ir além das aparências: é a profundidade de um rosto, de um acontecimento ou de um ato que pode chegar a transfigurar nossas vidas. É questão de ativar um novo olhar que vai se aprofundando, um olhar contemplativo que que vai além do imediato e faz captar o sentido de tudo e de todos; um olhar que nos revela nossa verdade mais profunda; um olhar que percebe a luz escondida em meio às sombras da vida.

É o olhar de um amor não condicionado que transfigura nossa vida e irrompe em nosso corpo e em nossos olhos em forma de uma luz suave e intensa que nos impacta.

Esse é o olhar verdadeiro sobre nossas vidas, aquele que desperta as fontes de amor adormecidas em nós.

Esse é o olhar que nos pacífica, elimina toda inquietação e nos faz dizer com Pedro: “Senhor, é bom estarmos aqui”.

A Transfiguração de Jesus põe em evidência nossa condição humana; de um lado, ela deixa transparecer que, como humanos, somos frágeis e vulneráveis, carentes de necessidades, e que buscamos nos apegar àquilo que nos promete segurança; no entanto, de outro lado, ela manifesta que, na nossa essência, somos partícipes da Luz divina, plenitude de presença, em profunda unidade com tudo e com todos.

O “relato das tentações” de domingo passado nos situou frente à nossa condição de vulnerabilidade e carências (busca de poder, prestígio, riqueza...); o “relato da transfiguração” deste domingo desvela (tira o véu) a luminosidade que somos. Ambos os relatos revelam nossa natureza contraditória: somos Plenitude que se expressa na vulnerabilidade, somos luzes e sombras, seres enraizados, mas abertos ao horizonte, carregados de “bem-aventuranças” e de “mal aventuranças”, vida que se expande e vida que se retrai...

A sabedoria cristã integra estes dois polos de nossa vida: o absoluto e o temporal, o oculto e o manifesto, a identidade e o ego inflado, interioridade e exterioridade... É do encontro dos polos contrários que brota a energia, a criatividade, o espírito de busca...

O tempo quaresmal, inspirado pela pessoa de Jesus Cristo, nos faz “descer” ao chão de nossa vida e nos colocar diante da nossa realidade contraditória: justa e injusta, pacífica e violenta, amorosa e odiosa, sincera e falsa, fiel e infiel... É preciso ser sábio o bastante para crescer na consciência da nossa identidade profunda e não ficarmos presos e fechados na ignorância sobre aquilo que “somos”. Na essência, somos “luz” e, no entanto, vivemos perdidos nas sombras da culpa, preocupação, competição, ativismo, perfeccionismo...

É preciso avançar na compreensão e na consciência do que pensamos, do que sentimos, do que fazemos, do que vemos e ouvimos... a partir do nosso ser profundo. E isso é luminosidade, transparência, transfiguração, plenitude de presença. Na realidade, isso que somos não tem, e nem pode ter, um nome adequado, porque escapa e vai além do sentido das palavras. Dizia José Saramago que “em nós há algo que não tem nome. Esse algo é o que somos”. Isso que somos só pode ser percebido quando calamos nossa mente, nossas concepções estreitas, nossas visões atrofiadas... O monte da transfiguração nos desafia a contemplar nossa interioridade sem o filtro dos pré-conceitos, ideias, percepções...

Celebrar a “transfiguração de Jesus” é despertar nosso ser, nossa essência, nossa originalidade... No encontro com o Jesus transfigurado, também nos transfiguramos. Já somos “seres transfigurados” e não sabíamos disso. A transfiguração não é algo externo, uma mudança de disfarces como no carnaval, mas significa uma abertura à realidade cotidiana e tomar consciência de que a vida e a história estão cheias de sentido. A realidade torna-se “diáfana” (transparência) e nos impulsiona a ir além da pura materialidade.

A transfiguração é mistério de mão dupla: por um lado, nos “diviniza” ao revelar que somos “filhos(as) amados(as); por outro, nos “humaniza”, pois nada do que é humano é descartado; todas as dimensões que compõem nosso ser (corpo, razão, afetividade, coração, memória, vontade, relações...) são perpassadas pela realidade divina que nos habita. Somos seres de transcendência e de enraizamento.

Assim, a transfiguração não é um evento que acontece num determinado momento especial, mas um “modo de ser e de viver” na realidade cotidiana; só quem tem sensibilidade contemplativa pode perceber e entrar no fluxo da transformação, sendo presença transfigurada e iluminante.

Um entardecer, um encontro com alguém, uma ação oblativa, uma oração... podem transfigurar nosso ser, nossa existência para a verdade, a bondade e a beleza.

Há pessoas petrificadas por dentro que tudo o que tocam, ou o ambiente em que vivem, se transforma em sombra pesada: a vida familiar, comunitária, política, trabalho, ambiente eclesial... Outras, pelo contrário, transfiguram a vida e os problemas, desafios, cuja presença proporcionam um clima de paz; há quem transforma a vida, a enfermidade, os desafios em paz e serenidade. Há quem transfigura a guerra em paz, o ódio em respeito e amor, a enfermidade em fonte de aceitação da própria finitude, o desespero em esperança... Há pessoas que bloqueiam a ação da luz presente em seu interior; há outras que, tal como um vitral, deixam a luz divina atravessar sua vida e transmitem a luz da bondade, da proximidade, da compaixão...

Enfim, viver é transfigurar a existência, iluminá-la, transcendê-la...

Para meditar na oração

Quem crê se torna luz, reflexo da Luz de Jesus transfigurado.

A vida inspirada pela fé é um “caminhar na Luz”. Somos portadores da “luz nova”; não extinguir essa luz que queima dentro. Abafar essa luz é menosprezar a vida da Graça, o tesouro que nos foi confiado no batismo.

Devemos guardá-la ciosamente, velar por ela, valorizá-la pela nossa colaboração, estimá-la e protegê-la, como a chama olímpica que nos levará à vitória.

- Sou pessoa que transfigura a realidade da vida? Deixo transparecer a luz da bondade, do amor, da compaixão que habita em mim? Sou presença “radiante” que tudo desvela, ilumina...?



Transfiguração do Senhor - Frei Carlos Mesters, O. Carm.

É meu Filho querido, me dá muita alegria. Escutem o que ele diz Mt 17, 1-9 


Frei Carlos Mesters


A gente tende a esquecer que além de serem um resumo dos momentos mais marcantes da vida de Jesus os quatro Evangelhos eram para as comunidades doa anos 70 depois de Jesus, e para nós mais de 2000 anos mais tarde, uma fonte de consolo para o sofrimento do momento presente (ser seguidor exige passar pela Cruz?), uma nova maneira de entender o passado (ser seguidor tem que ser tão radical) e uma prática que abria o caminho para o futuro com Deus (como não ter medo, e como ouvir o que Ele tem a nos dizer. 

O relato da Transfiguração, da Leitura Orante deste domingo é um exemplo disso. A Transfiguração acontece depois do primeiro anúncio da Morte de Jesus. “Daí em diante, Jesus começou a dizer claramente aos discípulos: Eu preciso ir para Jerusalém, e ali os líderes judeus, os chefes dos sacerdotes e os mestres da Lei farão com que eu sofra muito. Eu serei morto e, no terceiro dia, serei ressuscitado (Mt 16,21). 

Este anúncio mexeu com a cabeça dos discípulos, sobretudo de Pedro (Mt 16,22-23). Eles tinham os pés no meio dos pobres, mas a cabeça estava perdida no jeito de pensar da classe rica e dominante da época. Eles esperavam, e queriam, um messias glorioso. A cruz era um impedimento para crer em Jesus. 

Lembrar a Transfiguração de Jesus, um momento glorioso no alto da montanha, era uma ajuda para eles poderem superar o trauma da Cruz e descobrir em Jesus o verdadeiro Messias. Muitos anos depois, quando a Boa Nova já estava sendo anunciada naquela região, a Cruz continuava sendo um grande impedimento para os judeus e para os pagãos aceitarem Jesus como Messias. “A cruz é uma loucura e um escândalo!”, assim diziam (1Cor 1,23). 

Um dos maiores esforços dos primeiros cristãos consistia em tentar ajudar as pessoas a perceberem que a cruz não era escândalo nem loucura, mas sim a expressão mais bonita e mais forte do poder e da sabedoria de Deus (1Cor 1,22-31). A leitura de hoje mostra que a Cruz era, e é hoje, o caminho para a Glória. Não há outro caminho.

Vamos meditar a leitura

Jesus muda de aspecto – vs1-3

Jesus sobe a uma montanha alta. Lucas acrescenta que ele subiu para rezar (Lc 9,28). Lá em cima, Jesus aparece na glória diante de Pedro, Tiago e João. Junto com Jesus aparecem Moisés e Elias. 

A montanha alta lembra o Monte Sinai, onde, no passado, Deus tinha manifestado sua vontade ao povo, entregando as tábuas da lei. As vestes brancas lembram Moisés que ficava intensamente brilhante quando conversava com Deus e dele recebia as tabuas da lei (Ex 34,29-35). Elias e Moisés (as duas maiores autoridades do Antigo Testamento) conversam com Jesus. Moisés representa a Lei, Elias, a profecia. Lucas descreve a cena com mais detalhes “Eles falavam com Jesus a respeito da morte que, de acordo com a vontade de Deus, ele ia sofrer em Jerusalém” (Lc 9,31). O Antigo Testamento, Lei (Moises) e Profetas (Elias), já ensinava que, para o Messias, o caminho da glória tinha de passar pela cruz.

Pedro gostou, mas não entendeu – v 4

Pedro gostou e quis segurar o momento agradável na Montanha. Ele se oferece para construir três tendas. Marcos (Mc 9,6), diz que Pedro estava com medo, sem saber o que estava dizendo. Lucas acrescenta que os discípulos estavam com sono (Lc 9,32). Eles são como nós: têm dificuldade para entender a Cruz!

A voz do céu esclarece os fatos- v 5-8 

Enquanto Jesus é envolvido pela glória, uma voz do céu diz: "Este é o meu Filho amado, que muito me agrada. Escutem o que ele diz". A expressão “Filho amado” faz lembrar a figura do Servo, do profeta Isaías – “aqui está o meu servo, o meu escolhido, que dá muita alegria ao meu coração” (Is 42,1). A expressão “Escutem o que ele diz” evoca a profecia, “do meio de vocês Deus escolherá para vocês um profeta que será parecido comigo, e vocês vão lhe obedecer” (Dt 18,15). 

Em Jesus, as profecias do AT estão se realizando. Os discípulos já não podem duvidar. Jesus é realmente o Messias glorioso e o caminho para a glória passa pela cruz, conforme tinha sido anunciado na profecia do Messias Servo (Is 53,3-9). A glória deste momento é prova disso. Moisés e Elias o confirmam. O Pai o garante. Jesus o aceita.

Diante de tudo que estava acontecendo os discípulos ficam com muito medo e caíram com o rosto por terra. Jesus se aproxima, toca neles e diz: "Levantem-se, e não tenham medo." Os discípulos levantam os olhos e veem só Jesus e ninguém mais. Daqui para a frente, Jesus é a única revelação de Deus, tanto para eles como para nós! Jesus, e só ele, é a chave para podermos entender a Escritura e a Vida.

Saber guardar o silêncio – v 9

Jesus pedia aos discípulos para não dizer nada a ninguém até que ele tivesse ressuscitado dos mortos. Segundo São Marcos eles não compreenderam o que significava ressurreição dos mortos (Mc 9,10). De fato, quem não liga o sofrimento com a ressurreição não entende o significado da Cruz. A Cruz de Jesus é a prova de que a vida é mais forte que a morte. A gente obtém a compreensão do seguimento de Jesus somente pelo compromisso prático, caminhando com ele no caminho do servir.

 Para um confronto pessoal

  1-Você já teve algum momento de transfiguração e de alegria intensa de Deus? De que jeito essa experiência serve como força na hora das dificuldades?

  2- Nós temos 33 milhões de conterrâneos passando fome. Como transfigurar, hoje, essa situação? Jesus disse “Dai-lhes, vós mesmos de comer”



Escutar Jesus - José Antonio Pagola


O centro desse relato complexo, chamado tradicionalmente a «transfiguração de Jesus», é ocupado por uma voz que vem de uma estranha «nuvem luminosa», símbolo que se utiliza na Bíblia para falar da presença sempre misteriosa de Deus, que se nos manifesta e, ao mesmo tempo, se nos oculta.

A voz diz estas palavras: «Este é o Meu Filho, em quem coloquei o meu agrado. Escutai-O». Os discípulos não devem confundir Jesus com ninguém, nem sequer com Moisés ou Elias, representantes e testemunhas do Antigo Testamento. Só Jesus é o Filho querido de Deus, o que tem o Seu rosto «resplandecente como o sol».

Mas a voz acrescenta algo mais: «Escutai-O». Noutros tempos, Deus tinha revelado a Sua vontade por meio dos «dez mandamentos» da Lei. Agora a vontade de Deus resume-se e concretiza-se num só mandato: «Escutai Jesus». O escutar estabelece a verdadeira relação entre os seguidores e Jesus.

Ao ouvir isto, os discípulos caem pelo chão «aterrados de medo». Estão atemorizados por aquela experiência tão próxima de Deus, mas também assustados pelo que ouviram: poderão viver escutando apenas Jesus, reconhecendo só nele a presença misteriosa de Deus?

Então Jesus «aproxima-se, toca-lhe e diz: “Levantai-vos. Não tenhais medo”». Sabe que necessitam experimentar a Sua proximidade humana: o contato da Sua mão, não apenas o resplendor divino do Seu rosto. Sempre que escutamos Jesus no silêncio do nosso ser, as suas primeiras palavras dizem-nos: «Levanta-te, não tenhais medo».

Muitas pessoas só conhecem Jesus de ouvir falar. O Seu nome resulta-lhes familiar, mas o que sabem Dele não vai mais longe do que algumas recordações e impressões de infância. Inclusive, apesar de se chamarem cristãos, vivem sem escutar no seu interior Jesus. E sem essa experiência não é possível conhecer a Sua paz inconfundível nem a Sua força alentar e sustentar a vida.

Quando um crente se detém para escutar em silêncio Jesus, no interior da Sua consciência escuta sempre algo como isto:

«Não tenhas medo. Abandona-te com toda a simplicidade no mistério de Deus. A tua pouca fé basta. Não te inquietes. Se me escutas, descobrirás que o amor de Deus consiste em estar sempre a perdoar-te. E, se acreditas nisto, a tua vida mudará. Conhecerás a paz do coração».

No livro do Apocalipse pode-se ler assim: «Olha, estou à porta e chamo; se alguém ouve a minha voz e me abre a porta, entrarei em sua casa». Jesus chama à porta de cristãos e não cristãos. Podemos abrir-lhe a porta ou rejeitá-lo. Mas não é o mesmo viver com Jesus que sem Ele.


Uma experiência que anima e gera esperança - Ana Maria Casarotti 


(Missionária de Cristo Ressuscitado)

Uma experiência que anima e gera esperança

O texto que hoje a Igreja é convidada a ler e meditar inicia-se com a breve frase “seis dias depois”. Mas, que aconteceu anteriormente? No final do capítulo 16 lemos que Jesus anuncia a Paixão e a Ressurreição e as dificuldades dos discípulos de aceitar esse tipo de Messianismo. Pedro aparece como opositor a essa imagem do Messias, ele não pode aceitar que seu Mestre seja morto dessa forma, e por isso reage provocando ao mesmo tempo o rechaço de Jesus às suas palavras que procuram afastá-lo da Vontade do Pai.

Todos os/as discípulos/as devem ter a mesma sorte que Jesus, por isso a necessidade de carregar com a cruz e dar a vida como seu Mestre. É a cruz sofrida por tantas e tantas pessoas: a cruz da injustiça, da miséria, dos excluídos, a cruz que gera intolerância, exclusão e miséria.

Seis dias depois Jesus escolhe três discípulos e os leva a um monte alto. Jesus terá uma nova manifestação que fortalecerá a fé e a esperança dos discípulos nele.

O Evangelista recolhe um acontecimento recebido pela tradição (oral e escrita) e preocupa-se também com os discípulos que recebem seu texto. No meio de perseguições é necessário fortalecer sua fé e alentar seu ânimo.

Para entender melhor sua mensagem, deixemos que as palavras nos comuniquem sua riqueza.

Lembremos que no evangelho de Mateus o monte aparece em várias oportunidades: como lemos no domingo passado, Jesus é levado pelo diabo “para um monte muito alto” (4,8-10). Num monte ele pronuncia seu primeiro discurso: “Jesus viu as multidões, subiu à montanha e sentou-se”. ”Os discípulos se aproximaram, e Jesus começou a ensiná-los”.

Depois da multiplicação dos pães e de “despedir as multidões, Jesus subiu sozinho ao monte, para rezar” (14, 23). Depois da ressurreição, quando ele se despede dos discípulos, convida-os para ir a um monte: “Os onze discípulos foram para a Galileia, ao monte que Jesus lhes tinha indicado (28,16).”

Hoje Jesus escolhe Pedro, Tiago e João e os leva a “uma montanha alta”. Ao longo de toda sua vida Jesus sobe a Jerusalém para ser conduzido, levando uma cruz e suportando os insultos de todas as pessoas que estão ao seu redor. Aí ele deve carregar uma cruz onde será crucificado e morto: no Calvário.

No monte alto “Jesus se transfigurou diante deles: o seu rosto brilhou como o sol, e as suas roupas ficaram brancas como a luz”. E apareceram duas pessoas conversando com Jesus: Moisés e Elias.

Moisés é uma figura muito importante, representa a Lei. Elias simboliza os Profetas. Jesus é o novo Moisés e o novo Elias, a Ele é a quem devem escutar.

Este encontro de Jesus com eles nesse momento particular remete a diferentes momentos de sua vida, onde se escuta a voz de Deus que lhes encomenda uma missão.

O monte é também para eles um espaço de encontro com Deus. Moisés é chamado na montanha de Deus (Ex 19,3) e mais adiante recebe os mandamentos na montanha: Javé disse a Moisés: «Suba até junto de mim na montanha, pois eu estarei aí para lhe dar as tábuas de pedra com a lei e os mandamentos que escrevi, para você os instruir». Moisés se levantou com seu ajudante Josué. E subiram à montanha de Deus. (Ex 24, 12-14). Elias num monte tem seu encontro pessoal com Deus que “passa como uma brisa suave” (1Rs 19,13) e encomenda-lhe uma missão.

Os discípulos experimentam o agrado de ser introduzidos no mistério de Jesus, na luz de sua presença. Uma profunda alegria os inunda. Pedro expressa o desejo de toda pessoa quando experimenta um momento de profunda paz e alegria interior: Se queres, vou fazer aqui três tendas: uma para ti, outra para Moisés, e outra para Elias.

Mas essa experiência não é para ficar assim eternamente. Pedro ainda estava falando, quando uma nuvem luminosa os cobriu com sua sombra, e da nuvem saiu uma voz que dizia: «Este é o meu Filho amado, que muito me agrada. Escutem o que ele diz.»

Eles recebem uma missão, que é escutar o Filho amado do Pai! Possivelmente esta experiência lhes é oferecida para sustentar sua fé, aqueles que estavam junto a Jesus e também para as comunidades a quem está dirigido o Evangelho. É uma palavra de coragem no meio de diferentes situações difíceis que acontecerão a toda pessoa que siga Jesus: perseguições, dúvidas e desesperança no interno das comunidades, como também acontecem hoje. Podemos ler o texto: “Cristãos em terra do Islã. Bem-aventurados os perseguidos”.

Jesus manifesta-se desde a Vitória sobre a morte, para fortalecer sua fé e confiança nele. Faze-lhes participar de seu alento e a paz que vem de Deus.

Jesus conhece a debilidade de seus amigos, e procura fortalecê-los. Por isso suas primeiras palavras são: não tenham medo. Eles ficaram com um medo sagrado diante da presença de Deus, mas uma vez mais, Jesus apresenta-se como um Deus amigo, que está ao seu lado. Não devemos ter medo. Ele está aí, conhece nossa debilidade e fraqueza e sempre está disposto a fortalecê-la. O texto revela-nos a possibilidade dessa intimidade com Deus, com seu Amor que envolve os discípulos.

Neste domingo de Quaresma somos convidados a deixar-nos iluminar pela presença de Jesus que nos comunica a misericórdia do Pai, como lembra Francisco no seu livro-entrevista: “O nome de Deus é Misericórdia”.

É um tempo de renúncia a nós mesmos para dar espaço ao Amor de Deus que liberta e purifica nossas obscuridades, se as abrimos a serem iluminadas pela sua graça. Dessa forma participaremos mais profundamente na ressurreição de Jesus, deixando-nos transfigurar pela sua Vida.

É um convite pessoal e para contribuir com nossa luz na vida daqueles que nos rodeiam. Assim tinha dito Jesus “Vocês são a luz do mundo. Não pode ficar escondida uma cidade construída sobre um monte porque uma luz acima de um monte não pode ser ocultada” (Mt 5, 14).


Evitar o isolamento- Dom Paulo Peixoto


Ninguém pode ser considerado como uma ilha, porque não faz bem para uma vida saudável. Cada uma das pessoas humanas é capacitada para construir relacionamentos, para bem conviver e também a formar comunidade fraterna, com marcas de unidade. O diálogo é uma peça fundamental neste contexto, porque ele ajuda a criar calor humano e vida comunitária.

Existe hoje o desafio do isolamento, da criação de um mundo virtual totalmente desconectado com os compromissos de fraternidade. A tecnologia da “comunicação” pode provocar uma realidade intimista, levando o indivíduo a olhar apenas para si mesmo e não conseguir enxergar as pessoas que estão ao seu redor. É fatal o isolamento e a perda do sentido da vida.

Para a pessoa poder sair do isolamento, de uma vida desgastada com a mesmice, ela tem que fazer algumas rupturas, como por exemplo, com o comodismo, com a zona de conforto, com coisas que impedem o seu crescimento. Não é fácil passar por um processo de desacomodação, mas muito necessário para a construção de caminhos verdadeiramente novos.

É difícil caminhar totalmente sozinhos. Todas as pessoas dependem de apoio umas das outras durante a peregrinação, mas sempre com a esperança ao lançar-se para o desconhecido e novo, que pode ser cheio de riscos e desafios. Nisso está muito presente a possibilidade de encontrar realidades novas e também diferentes horizontes como caminho para construir o bem.

Numa dimensão espiritual podemos dizer que Deus nos ensina a construir um projeto social coletivo, um espaço onde todos devem ser responsáveis pelo que fazem. Isso não acontece quando cada um se fecha no seu próprio mundo, no isolamento e na adoração de seu próprio eu. O egoísmo mata a vida e impede a bonita prática da partilha e da responsabilidade comunitária. 

A Quaresma quer tirar as pessoas de um possível e real isolamento. É tempo de conversão, de mudança de vida através das atitudes concretas. Superar o barulho, interno e externo, da vida para saber ouvir a voz de Deus que ressoa nos corações trancados. Os frutos da Quaresma para o cristão vão depender muito de sua saída do egoísmo e da alienação.

Dom Paulo Mendes Peixoto

Arcebispo de Uberaba


TEXTO EM ESPANHOL DE Dom Damián Nannini, Argentina

SEGUNDO DOMINGO: LA TRANSFIGURACIÓN, UN ANTICIPO DE LA PASCUA



1a. Lectura (Gn 12,1-4): 


En Gn 12,1-4 irrumpe de improviso Dios para darle a Abrám una orden de partida (imperativo presente: ¡ahora, ya!) y varias promesas (futuro, ¡más adelante!) que luego se repetirán. 

Es llamativo que no fue Abraham quien buscó a Dios sino Dios quien buscó a Abrám. La Palabra de Dios entra en diálogo con Abrám y realiza con él la historia de la salvación.

Dios, en primer lugar, exige a Abrám la ruptura con todas las vinculaciones naturales que están nombradas como estrechando un cerco: la patria, la parentela y la familia (casa paterna). Abrám tiene que dejarlo todo - pura y simplemente - y confiarse a la guía de Dios, a la Palabra de Dios. A cambio de lo que deja Dios ofrece a Abrám una serie de promesas. En estas promesas de Dios la idea clave es la bendición pues esta palabra aparece 5 veces en Gn 12,2-3 y estaría en contraposición a las 5 veces que aparece la palabra maldición en Gn 1-11 (3,14.17; 4,11; 5,29; 9,25). En el AT el contenido fundamental que encierra toda bendición divina es una larga vida y el ser fecundo, o sea, una gran descendencia (Cf. Gn 1,22.28). Se añade a la promesa el ‘engrandeceré tu nombre’, o sea el darle gloria. 

El v. 3 nos hace ver que los alcances de la bendición van más allá de la persona singular de Abrám pues la situación de los hombres dependerá de la actitud que asuman ante esta intervención histórica de Dios: al que bendice, bendición, y al que maldice, maldición. 

Abrám permanece mudo y obedece con prontitud a pesar de lo terrible del mandato de desarraigarse. Como bien comenta J. Loew: "De Abraham no tenemos, por así decir, palabras: su vida misma es respuesta" . La respuesta de Abrám es ponerse en marcha en obediencia a la palabra de Dios (12,4). Esta obediencia a la Palabra de Dios supone ya un acto de fe (cf. Gn 15,6; Rom 4,3.9.16-22). Podríamos decir de forma esquemática que esta fe es un itinerario y un descubrimiento. La aventura de Abrám es la de una marcha hacia lo desconocido con la única garantía de una promesa divina. 

El mensaje de este texto en el contexto del Génesis es que Dios interviene en la historia humana para devolverle su sentido positivo. El pecado del hombre introdujo la maldición; ahora Dios vuelve a introducir la bendición por medio de Abrám. La maldición entró al mundo por la desconfianza y la desobediencia; la bendición va a entrar por la fe o confianza y la obediencia. Por ello Abrám cree y obedece . No se trata de un regreso a Gn 1-2 dónde todo era bendición. En el curso de la historia habrá bendición y maldición, y la presencia de una u otra dependerá de la respuesta de los hombres al don de Dios.

La fe de Abrám no es un salto al vacío, sino un abandono confiado en la Promesa de Dios. En fin, la fe de Abrám está sostenida por estas palabras de consuelo, por esta promesa que será el secreto motor de toda su vida.



2a. Lectura (2Tim 1,8-10): 


Esta lectura se encuentra en continuidad con los temas de las otras dos. El apóstol busca animar a su discípulo Timoteo para que acepte lo que es necesario padecer por el evangelio. Para ello, en primer lugar, le recuerda la iniciativa de Dios que nos salva y nos elige; y luego pone ante sus ojos el fruto y fin de la vocación que es la vida incorruptible. De este modo lo orienta al sentido de lo eterno que encierra el evangelio.



Evangelio (Mt 17,1-9):


El relato de la transfiguración viene colocado en los tres sinópticos a continuación del primer anuncio de la pasión y de la exigencia de renuncia total para seguir a Jesús. En Mateo esta vinculación se hace explícita con la referencia cronológica con que se inicia el relato: “Seis días después”. Con esto se remite también al final del anuncio de Jesús (Mt 16,28: "Les aseguro que algunos de los que están aquí presentes no morirán antes de ver al Hijo del hombre, cuando venga en su Reino") que tendría su cumplimiento en la transfiguración.

Relacionando, por tanto, la transfiguración con el primer anuncio de la pasión podemos decir que se hacía necesario que, al menos algunos de sus discípulos (Pedro, Santiago y Juan, los considerados como columnas en Gal 2,9), tuvieran una experiencia que disipara el temor y la angustia generados por tal anuncio y, para ello, se les concede una visión anticipada de la gloria prometida después de padecer.

En Mateo estos tres discípulos son los más cercanos a Jesús y aparecen junto a él en dos momentos claves: la transfiguración y el huerto de los Olivos (cf. Mt 26, 37). Por tanto, Pedro, Santiago y Juan están asociados tanto a la agonía como a la gloria de Jesús. Esta asociación de los tres discípulos al misterio pascual es paradigmática para todos los discípulos de Jesús.

Jesús lleva a Pedro, Santiago y Juan a un monte alto. La presencia de Moisés y Elías más adelante nos permiten convalidar como trasfondo de la transfiguración lo sucedido en el monte Sinaí (Ex 19-34) u Horeb (Dt 5) donde Dios estableció su alianza con Israel y reveló su voluntad por medio de Moisés. Y tal vez más concretamente a la escena narrada en Ex 24 donde Moisés sube acompañado de tres hombres (Aarón, Nadad y Abihú) y allí la nube los envuelve y escuchan la voz de Dios. Por su parte Mateo lo vincula también con el "monte alto" donde el demonio lleva a Jesús para someterlo a la tercera tentación (cf. Mt 4,8) y donde Jesús no acepta reconocer al demonio como Señor del mundo y mantiene oculta su divinidad, su ser Hijo de Dios. En cambio, en la transfiguración Jesús revelará a los suyos su divinidad para que superen la tentación del desaliento que provoca su ocultamiento y la cruz.


Una vez en el monte, Jesús se transfigura delante de los tres apóstoles. El término griego que utiliza el evangelio para describir la transfiguración (metamorfo,omai) supone una transformación o cambio de forma, imagen o figura. Referido a Cristo los Padres lo han entendido como una manifestación de su Divinidad que hasta entonces permanecía oculta bajo el velo de su humanidad. Esta transformación viene expresada con dos efectos visibles externos: el rostro brillante como el sol y los vestidos blancos como la luz. Estás imágenes luminosas recuerdan la forma de manifestarse la gloria de Dios en el Antiguo Testamento y también nos remiten a la figura gloriosa de Cristo resucitado. R. Cantalamessa dice acerca de lo que sucedió a Cristo en su transfiguración: "Jesús, aquel día, en su humanidad ¡entró en éxtasis! Esta es quizás la categoría menos inadecuada que poseemos para describir lo que entonces sucedió en Jesús […] Él estaba feliz. La Transfiguración es un misterio de felicidad divina. Todo el torrente de alegría que fluye entre el Padre y el Hijo, que es el mismo Espíritu Santo, en esa ocasión "desbordó" el jarrón de la humanidad de Cristo" .

En la escena, junto a Jesús, aparecen Moisés y Elías. Es interesante porque además de representar la Ley y los Profetas, son dos hombres de oración que ayunaron durante 40 días y subieron al monte Sinaí para encontrarse cara a cara con Dios, para ver su rostro (Ex 33,8; 1Re 19,17). De algún modo puede decirse que alcanzaron la meta de su camino ‘cuaresmal’. 

Ante esta escena Pedro reacciona con una auténtica exclamación: "Señor, que hermoso (kalós) es estarnos aquí". La transfiguración es un misterio de belleza divina, de esplendor de la verdad y del bien de Dios mismo. Pedro se siente "atrapado" por esta visión y quiere hacer tres carpas para quedarse allí. Según San Agustín, Pedro ha gustado el gozo de la contemplación y no quiere ya volver a las preocupaciones y fatigas de la vida cotidiana. Por eso quiere, en cierto modo, "eternizar" ese momento.

Mientras Pedro decía esto una nube luminosa, signo de la presencia de Dios y del Espíritu Santo, los cubre con su sombra. Desde allí sale una voz: no hay dudas de que se trata de la voz del Padre. Para Mateo, a diferencia de los otros sinópticos, el centro del relato lo forma la voz de Dios (v. 5) y, por tanto, lo más importante es la audición y no la visión del transfigurado. La Voz de Dios revela quién es Jesús, su Hijo amado y predilecto, y lo que sus discípulos tienen que hacer: escuchar a Jesús, es decir, obedecerle, seguirle. Es la misma voz del Padre que se escuchó al salir Jesús del Jordán luego de ser bautizado (cf. Mt 3,17). En ambos casos Dios acredita a Jesús como Hijo con la misma autoridad que Él tiene. Lo nuevo aquí es el mandato de escucharlo, por lo cual la palabra del Hijo es ahora la palabra de Dios que hay que escuchar.

El efecto de esta voz sobre los discípulos – caen rostro en tierra y se llenan de miedo – confirma claramente que se trata de una manifestación de Dios, de una teofanía.

Luego, cuando el Señor les pide que se levanten y que no teman, ven a Jesús sólo, desaparecieron las otras voces de Dios, Moisés y Elías, la Ley y los Profetas; ahora tenemos la Palabra del Hijo como única expresión plena y definitiva de la voluntad del Padre.

El final del relato es muy importante, sobre todo para Mateo . Los discípulos son invitados por “Jesús solo” a levantarse y a no tener miedo. Sigue luego la referencia a la resurrección que le da a toda la narración el carácter de una gloria pascual anticipada, pero pasajera. Hay que bajar del monte y seguir el camino del abajamiento propio del hijo del hombre.



Algunas reflexiones:


La primera lectura de este domingo resalta la iniciativa de Dios quien interviene llamando gratuitamente a Abrám para formar de su descendencia el pueblo de la Alianza. En el contexto litúrgico esta primera lectura es una invitación hecha al discípulo que se inicia en el camino de la fe cristiana para que abandone su vida anterior y se ponga en marcha sin otra "mochila" que la confianza en Dios que lo llamó. Hay que dejar lo pasado y ponerse en camino hacia el país de la promesa que se manifestará en el evangelio de hoy. De este modo se introduce en una primera dimensión el tema de la conversión cuaresmal en el sentido de dejar el pecado y volverse a Dios por la fe.

También puede ayudarnos a recordar la iniciativa del amor de Dios que nos llamó en el momento de nuestro bautismo "cuando «al participar de la muerte y resurrección de Cristo» comenzó para nosotros «la aventura gozosa y entusiasmante del discípulo»" (Benedicto XVI, Mensaje cuaresma 2011, nº 1).


Por su parte, el evangelio de hoy se vincula con el relato de las tentaciones del domingo pasado por cuanto nos revela el alcance de la victoria de Cristo: toca a la misma naturaleza en su dimensión corporal. En Cristo la humanidad está llamada a ser transfigurada por la Gracia Pascual.

Notemos también que el verbo "transfigurarse", además de en las narraciones de la transfiguración, es utilizado dos veces por San Pablo aplicándolo a los cristianos:


Rom 12,2: "No tomen como modelo a este mundo. Por el contrario, transfórmense interiormente renovando su mentalidad, a fin de que puedan discernir cuál es la voluntad de Dios: lo que es bueno, lo que le agrada, lo perfecto".


2Cor 3,18: "Nosotros, en cambio, con el rostro descubierto, reflejamos, como en un espejo, la gloria del Señor, y somos transfigurados a su propia imagen con un esplendor cada vez más glorioso, por la acción del Señor, que es Espíritu."

Por tanto, la transfiguración, como todos los misterios de la vida de Cristo, no lo afectan sólo a Él sino también a los cristianos como parte de Su Cuerpo. 

En el evangelio de hoy Jesús invita a tres de sus discípulos a subir al monte elevado y se transfigura delante de ellos y les permite tener una experiencia de gran gozo y consolación. También nosotros, en nuestro camino cuaresmal, somos invitados a subir un poco para ponernos por encima de todo el trajinar cotidiano y encontrarnos con el Señor transfigurado en la oración. Porque la oración es un medio necesario, es como la ventana abierta a esa realidad definitiva que anhelamos: nuestra transformación en Dios. 

En nuestra oración estamos llamados a revivir la experiencia de la transfiguración de Jesús que vivieron los discípulos; a encontrarnos con Cristo glorioso y resplandeciente que llenará de luz nuestra inteligencia y de calor nuestro corazón al punto que, como Pedro, querremos permanecer allí. 

Al respecto, nos dice el Papa Francisco: “No hemos estado en el Monte Tabor, no hemos visto con nuestros propios ojos el rostro de Jesús brillando como el sol. Sin embargo, a nosotros también se nos ha dado la Palabra de salvación, se nos ha dado fe y hemos experimentado la alegría de encontrarnos con Jesús de diferentes maneras. Jesús también nos dice: «Levantaos, no tengáis miedo» (Mateo 17, 7). En este mundo, marcado por el egoísmo y la codicia, la luz de Dios se oscurece por las preocupaciones de la vida cotidiana. A menudo decimos: no tengo tiempo para rezar, no puedo hacer un servicio en la parroquia, responder a las peticiones de los demás... Pero no debemos olvidar que el Bautismo que recibimos nos hizo testigos, no por nuestra capacidad, sino por el don del Espíritu”, (ángelus 8 de marzo de 2020).

La oración del cristiano tiene como punto necesario de partida la escucha de la Palabra de Dios, de Jesús. Justamente esta es la invitación del Padre: "escuchar a Jesús el Hijo amado". La Palabra definitiva de Dios ya no nos llega por la Ley y los Profetas (Moisés y Elías) sino mediante Jesucristo, el Hijo. Vivir en Alianza es vivir en la Escucha de su Palabra. Esta es la exigencia que supone el rechazo de tantas otras voces o solicitaciones que nos invaden. 

Por su parte esta experiencia de Jesús transfigurado tiene para nosotros un valor pedagógico excepcional al igual que lo tuvo para los tres discípulos. Como bien nota el Papa Francisco en su mensaje de cuaresma para este año: “Al final de la subida, mientras estaban en lo alto del monte con Jesús, a los tres discípulos se les concedió la gracia de verle en su gloria, resplandeciente de luz sobrenatural. Una luz que no procedía del exterior, sino que se irradiaba de Él mismo. La belleza divina de esta visión fue incomparablemente mayor que cualquier esfuerzo que los discípulos hubieran podido hacer para subir al Tabor. Como en cualquier excursión exigente de montaña, a medida que se asciende es necesario mantener la mirada fija en el sendero; pero el maravilloso panorama que se revela al final, sorprende y hace que valga la pena […] La luz que Jesús muestra a los discípulos es un adelanto de la gloria pascual y hacia ella debemos ir, siguiéndolo “a Él solo”. La Cuaresma está orientada a la Pascua. El “retiro” no es un fin en sí mismo, sino que nos prepara para vivir la pasión y la cruz con fe, esperanza y amor, para llegar a la resurrección”.   

Luego habrá también que estar dispuestos a bajar del monte, a volver otra vez a lo mismo, a lo cotidiano. Pero nosotros ya no seremos los mismos. Al respecto es muy interesante como San Agustín completa su explicación de la frase dicha por Pedro con esta recomendación: "Desciende Pedro, deseabas descansar en el monte: desciende, predica la palabra de Dios, reprocha, exhorta, anima haciendo uso de toda tu paciencia y capacidad de enseñanza. Trabaja, cánsate mucho, acepta también el sufrimiento y suplicios. En el canto de la caridad se dice que ésta "no busca su propio interés". Cristo te reserva esta felicidad para después de la muerte, ¡oh Pedro! Ahora, sin embargo, Él mismo te dice: desciende a cansarte en la tierra, a servir en la tierra, a ser despreciado, a ser crucificado en la tierra".


Por tanto, los textos de hoy nos ayudan a entender que la pasión es un paso o camino hacia la gloria. La vida cristiana implica seguir a Cristo por el mismo camino por donde él transitó, que es el camino de la renuncia y de la cruz. Las tentaciones son los intentos de apartarnos de ese camino. Hoy las lecturas nos recuerdan a dónde nos conduce el camino: a ser transfigurados con Cristo, a participar de su Gloria. De este modo, todavía en los inicios del camino cuaresmal, se encenderá nuestra esperanza y nos animaremos a caminar más firmemente por el mismo. 


En síntesis: “La liturgia de hoy nos pide caminar por un sendero estrecho y áspero. Es el camino de la fe obediente que exigió a Abrahán unas rupturas concretas y dirigirse a metas desconocidas. Es el camino de la difícil perseverancia que exige a Timoteo vencer el desaliento y una generosidad renovada del don de sí. Es el camino del sufrimiento y de la muerte que Jesús recorre plenamente consciente, preparando a sus discípulos para que también lo afronten con fortaleza. Sin embargo, es el único camino que conduce a la verdadera vida, a la gloria auténtica, a la luz sin ocaso. Ya desde ahora se nos concede pregustar un poco aquel esplendor para proseguir con nuevo impulso caminando” .



PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):



Qué bien se está aquí…

 

Aquí Señor, te dijo Pedro

Elevado por ti en el monte.

Pues no sería en este suelo

El mejor lugar para el consuelo.

 

Será más allá del horizonte

En un espacio amplio y bello

Donde no imaginamos el color

El olor, la música, el esplendor…

 

En esa vida duradera

Está la esperanza que no nos quiebra,

Nos sostiene en el andar

Por los caminos de esta tierra.

 

Subir al Padre es preciso

¡Sin esperar, la voluntad no se tuerza!

Transfigúranos contigo, Señor

Si tu Rostro nos enseñas.

 

En la carpa del encuentro

Moisés te hablaba, sin temor

La Trinidad sea ahora nuestra tienda

Donde nos cobije con su Amor. Amén