3º QUARESMA-A

3º DOMINGO DA QUARESMA-ano A

12/03/2023

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


1ª Leitura: Êxodo 17,3-7

Salmo 94(95)-R- Hoje não fecheis o vosso coração, mas ouvi a voz do Senhor!

2ª Leitura: Romanos 5,1-2.5-8

Evangelho de João 4,5-42


Naquele tempo: 5Jesus chegou a uma cidade da Samaria, chamada Sicar, perto do terreno que Jacó tinha dado ao seu filho José. 6Era aí que ficava o poço de Jacó. Cansado da viagem, Jesus sentou-se junto ao poço. Era por volta do meio-dia. 7Chegou uma mulher da Samaria para tirar água. Jesus lhe disse: 'Dá-me de beber'. 8Os discípulos tinham ido à cidade para comprar alimentos. 9A mulher samaritana disse então a Jesus: 'Como é que tu, sendo judeu, pedes de beber a mim, que sou uma mulher samaritana?' De fato, os judeus não se dão com os samaritanos. 10Respondeu-lhe Jesus: 'Se tu conhecesses o dom de Deus e quem é que te pede: 'Dá-me de beber`, tu mesma lhe pedirias a ele, e ele te daria água viva.' 11A mulher disse a Jesus: 'Senhor, nem sequer tens balde e o poço é fundo. De onde vais tirar a água viva? 12Por acaso, és maior que nosso pai Jacó, que nos deu o poço e que dele bebeu, como também seus filhos e seus animais?' 13Respondeu Jesus: 'Todo aquele que bebe desta água terá sede de novo. 14Mas quem beber da água que eu lhe darei, esse nunca mais terá sede. E a água que eu lhe der se tornará nele uma fonte de água que jorra para a vida eterna.' 15A mulher disse a Jesus: 'Senhor, dá-me dessa água, para que eu não tenha mais sede e nem tenha de vir aqui para tirá-la.' 16Disse-lhe Jesus: 'Vai chamar teu marido e volta aqui'. 17A mulher respondeu: 'Eu não tenho marido'. Jesus disse: 'Disseste bem, que não tens marido, 18pois tiveste cinco maridos, e o que tens agora não é o teu marido. Nisso falaste a verdade.' 19A mulher disse a Jesus: 'Senhor, vejo que és um profeta! 20Os nossos pais adoraram neste monte mas vós dizeis que em Jerusalém é que se deve adorar'. 21Disse-lhe Jesus: 'Acredita-me, mulher: está chegando a hora em que nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai. 22Vós adorais o que não conheceis. Nós adoramos o que conhecemos, pois a salvação vem dos judeus. 23Mas está chegando a hora, e é agora, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade. De fato, estes são os adoradores que o Pai procura. 24Deus é espírito e aqueles que o adoram devem adorá-lo em espírito e verdade.' 25A mulher disse a Jesus: 'Sei que o Messias (que se chama Cristo) vai chegar. Quando ele vier, vai nos fazer conhecer todas as coisas'. 26Disse-lhe Jesus: 'Sou eu, que estou falando contigo'. 27Nesse momento, chegaram os discípulos e ficaram admirados de ver Jesus falando com a mulher. Mas ninguém perguntou: 'Que desejas?' ou: 'Por que falas com ela?' 28Então a mulher deixou o seu cântaro e foi à cidade, dizendo ao povo: 29'Vinde ver um homem que me disse tudo o que eu fiz. Será que ele não é o Cristo?' 30O povo saiu da cidade e foi ao encontro de Jesus. 31Enquanto isso, os discípulos insistiam com Jesus, dizendo: 'Mestre, come'. 32Jesus, porém disse-lhes: 'Eu tenho um alimento para comer que vós não conheceis'. 33Os discípulos comentavam entre si: 'Será que alguém trouxe alguma coisa para ele comer?' 34Disse-lhes Jesus: 'O meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra. 35Não dizeis vós: `Ainda quatro meses, e aí vem a colheita!` Pois eu vos digo: Levantai os olhos e vede os campos: eles estão dourados para a colheita! 36O ceifeiro já está recebendo o salário, e recolhe fruto para a vida eterna. Assim, o que semeia se alegra junto com o que colhe. 37Pois é verdade o provérbio que diz: `Um é o que semeia e outro o que colhe`. 38Eu vos enviei para colher aquilo que não trabalhastes. Outros trabalharam e vós entrastes no trabalho deles.' 39Muitos samaritanos daquela cidade abraçaram a fé em Jesus, por causa da palavra da mulher que testemunhava: `Ele me disse tudo o que eu fiz.` 40Por isso, os samaritanos vieram ao encontro de Jesus e pediram que permanecesse com eles. Jesus permaneceu aí dois dias. 41E muitos outros creram por causa da sua palavra. 42E disseram à mulher: 'Já não cremos por causa das tuas palavras, pois nós mesmos ouvimos e sabemos, que este é verdadeiramente o salvador do mundo.' Palavra da Salvação.


DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, Arcebispo de Sorocaba SP


Jo 4,5-42

A partir deste Domingo a liturgia da palavra privilegia os textos do Evangelho de S. João, porque eles são muito aptos para uma catequese batismal. Batismo é dom da água viva (Jo 4); é dom da luz (cura do cego de nascença Jo 9,41); é dom da Vida (ressurreição de Lázaro Jo 11).

vv 5-6: O encontro de Jesus com a Samaritana é imprevisto. Jesus senta-se junto ao poço, ao meio dia, enquanto os discípulos estão pela cidade procurando alimento. Jesus está só e de repente aparece a samaritana para tirar água do poço. É uma hora muito estranha para vir ao poço. Por que ela vem a essa hora? Ela tem suas razões como vai ficar claro depois no meio da conversa (ela teve cinco maridos e o atual também não é seu marido). 

vv 7-14: Jesus inicia uma conversa que vai ser muito difícil e proveitosa. Difícil porque a mulher vai mostrar muita dificuldade em entender o que Jesus fala e proveitosa porque, apesar dos mal-entendidos Jesus fará a samaritana percorrer um caminho que termina no dom da água viva, da fé.

Ele tem sede e pede que a mulher lhe dê água. A samaritana se espanta com este pedido incomum: os judeus não conversam com samaritanos, os homens não dirigem a palavra às mulheres, os puros não se misturam com os impuros. Ela recorda a Jesus o que ele, como judeus, deveria saber.

Jesus aproveita o momento para fazer a dar um primeiro passo na superação do nível meramente material. "Se ela conhecesse o dom de Deus e quem está falando com ela". Jesus inverte os papeis: não é mais ele que pede água, mas ele agora oferece água viva. A mulher mostra sua limitação em entender a promessa de Jesus. Como ele pode oferecer água se nem tem balde para tirar água. Mais uma vez Jesus insiste dizendo que quem beber da água que ele der não terá mais sede.

vv. 15-26: Parece impossível que a conversa dê algum resultado: diante da oferta de Jesus a mulher pensa que ele tem uma água mágica. Está somente interessada em não ter mais o trabalho de vir todos os dias ao poço. Jesus toma uma atitude surpreendente: pede para chamar o seu marido. Trata-se de um tratamento de choque que visa ajudar a mulher a sair do nível meramente material e carnal. Perguntado sobre o marido, Jesus faz a mulher tomar consciência de sua vida e que está diante de um profeta.  É ainda uma fé imperfeita, mas é ao menos uma fé inicial. No início da conversa Jesus era somente um judeu, agora ela reconhece nele um profeta.

O tratamento de choque deu certo. Por isso ela pergunta a Jesus sobre qual é o lugar de culto: no monte Garizim ou no templo de Jerusalém. Jesus mostra que esta pergunta é própria de quem não sabe que Deus é Espírito, ou seja, não pode ser limitado a um lugar e que se deve adorá-lo em espírito e verdade. O culto no espírito é o culto como Deus quer e não como nós queremos. O culto conforme a vontade de Deus não significa adorar Deus em um lugar. Nenhum templo pode conter Deus. À samaritana Jesus revela que o verdadeiro lugar onde Deus está é Jesus Cristo. Nele o culto atinge a perfeição definitiva.

Com estas palavras Jesus consegue levar a mulher a se abrir à revelação que o Messias fará quando ele vier. Jesus faz com que a mulher exprima sua sede: ela deseja receber o ensinamento do Messias. Assim o Senhor desperta nela uma outra sede diferente e superior àquela meramente fisiológica.

Diante desta abertura Jesus lhe revela: Eu sou.

vv 27-30: A mulher é transformada. Ela abandona o cântaro: nem se lembra mais do veio fazer no poço. Ela veio tirar água, mas agora descobriu um outro dom mais precioso: a água viva. Veio buscar a água do poço e volta com outra mais preciosa. Por isso ela vai anunciar aos samaritanos tudo o que Jesus fez para ela. 

vv 31-38: Jesus conversa com os discípulos. Também aqui Jesus fala-lhes uma coisa e os discípulos entendem outra. Os discípulos oferecem alimento e Jesus lhes declara que tem outro alimento para comer, ou seja, o cumprimento da vontade de Deus. Os discípulos pensam na comida material, mas Jesus lhes fala da vontade do Pai. Ora a vontade do Pai é a missão de Jesus de levar as pessoas a fé. É por isso que Jesus introduz uma outra imagem: a da colheita. Agora é a hora da colheita em que os frutos estão maduros. E são os samaritanos a colheita: eles estão chegando. 

vv 39-42: Os samaritanos chegam à verdadeira fé. No início eles se interessam por Jesus por causa da mulher, mas depois eles acreditam por causa da palavra do próprio Jesus. A fé só é possível no encontro pessoal.


A samaritana encontra Jesus: Em busca da fonte de água viva - Carlos MESTERS, Mercedes LOPES e Francisco OROFINO


1. Situando

1. Divisão do capítulo 4:

Jo 4,1-42: Encontro de Jesus com a samaritana

Jo 4,42-45: Jesus volta para a Galileia

Jo 4,46-54: Segundo sinal de Jesus: a cura do filho do funcionário real


2. Os samaritanos eram desprezados pelos judeus. Este desprezo vinha de longe, desde o século VIII antes de Cristo (2Rs 17,24-41), e transparece em alguns livros do Antigo Testamento. O livro do Eclesiástico, por exemplo, fala de um “povo estúpido que mora em Siquém, que nem sequer é nação” (Eclo 50,25-26). Muitos judeus da Galileia, quando viajavam para Jerusalém, não passavam pela Samaria. O Evangelho de João mostra Jesus fazendo o contrário, passando pela Samaria e acolhendo os samaritanos. Por causa disso, era criticado pelos judeus, que o xingavam de “samaritano, possesso de demônio” (Jo 8,48). Depois da ressurreição, os seguidores e as seguidoras de Jesus, seguindo o exemplo de Jesus, superaram seus preconceitos e anunciaram a Boa-nova aos samaritanos (At 8,4-8). Nas comunidades do Discípulo Amado, havia muitos samaritanos.

2. Comentando

1. João 4,1-6:

O palco onde se realiza o diálogo entre Jesus e a samaritana

Quando Jesus percebe que os fariseus poderiam irritar-se com a sua atividade batismal, ele sai da Judeia e volta para a Galileia. Desse modo, evita uma briga religiosa (Jo 4,1-3). Voltando para a Galileia, Jesus passa pela Samaria. Por volta do meio-dia, ele chega junto do poço de Jacó. Cansado da viagem, senta perto do poço, onde a samaritana o encontra. O poço era o lugar tradicional de encontros e de conversas. Hoje, seria a praça, o bar, a rodoviária, o shopping ... É perto do poço que começa a longa e difícil conversa que foi de muito proveito para ambos.

2. João 4,7-15: 

Primeira parte do diálogo: a conversa sobre a água ou o trabalho

Água, corda, balde e poço eram os elementos que marcavam o mundo do trabalho da samaritana. É Jesus que toma a iniciativa do diálogo. Ele parte da necessidade bem concreta da sua própria sede e diz: “Dá-me de beber?” Pela pergunta a samaritana descobre que Jesus precisa dela para ele poder resolver o problema da sua sede. Assim, Jesus desperta nela o gosto de ajudar e de servir. Desde o começo da conversa, Jesus usa a palavra água nos dois sentidos. No sentido normal: água que mata a sede; e no sentido simbólico: água como fonte de vida e como dom do Espírito Santo, prometido no Antigo Testamento (Zc 14,8; Ez 47,1-12). Desde o começo da conversa, a samaritana entende a palavra água no seu sentido normal de água que mata a sede do corpo. Existe uma tensão entre os dois. Jesus tenta ajudar a samaritana a passar para um outro nível de entendimento. A samaritana, por sua vez, procura levar Jesus a entender as coisas conforme o sentido que elas têm no dia a dia. Por isso, por esta porta da água ou do trabalho, Jesus não consegue comunicar-se com ela e a conversa não avança.

3. João 4,16-18:

Segunda parte do diálogo: a conversa sobre o marido ou a família

Jesus tenta estabelecer contato por uma outra porta. Ele diz: “Vá buscar seu marido!” É a porta da família. Mas também aqui ele encontra a porta fechada. A samaritana responde secamente: “Não tenho marido!” Jesus diz: “Você falou bem. Você teve cinco maridos e o que tem agora não é o seu marido!” Os cinco maridos evocam simbolicamente os cinco ídolos do povo samaritano (2 Rs 17,29-30). Aquele com quem ela convive agora, ou seja, o sexto a que Jesus alude, talvez seja João Batista, venerado como messias, ou a fé diferente dos samaritanos em Javé. O Quarto Evangelho sugere discretamente que o sétimo é o próprio Jesus, o messias, o esposo que o povo estava esperando.

4. João 4,19-24: 

Terceira parte do diálogo: a conversa sobre o lugar da adoração

Finalmente, por causa da resposta recebida, a samaritana identifica Jesus e diz: “Vejo que o senhor é um profeta”. Neste momento, ela se situa na conversa e começa a tomar a iniciativa. Muda o rumo da conversa e puxa o assunto para a religião: Onde adorar Deus? Lá em Jerusalém ou aqui no Monte Garizim? Os samaritanos tinham construído um templo no Monte Garizim que ficava perto do poço onde eles conversam. Jesus entra pela porta que a mulher abriu. Primeiro, ele relativiza o lugar do culto: nem aqui nem lá! Neste ponto, os judeus não têm nenhum privilégio. Em seguida, esclarece que tanto judeu como samaritano, ambos adoram Deus. A diferença é que os judeus adoram o que conhecem. Os samaritanos adoram o que (ainda) não conhecem, “porque a salvação vem dos judeus”,  mas não se restringe a eles. E Jesus termina dizendo que chegará o tempo em que se poderá adorar Deus em qualquer lugar, contanto que seja “ em espírito e verdade”.

5. João 4,25-26:

A revelação: “O Messias sou eu que estou conversando contigo!”

A samaritana muda novamente o rumo da conversa e puxa o assunto para a esperança messiânica do seu povo: “Sei que vem um Messias. Quando ele vier, nos vai mostrar todas essas coisas!” Novamente, Jesus aceita a mudança do rumo da conversa, entra pela porta que a samaritana abriu e se apresenta: o Messias “sou eu que estou conversando contigo!” A esta mulher, excluída e herética para os judeus da época, Jesus revelou, por primeiro, a sua condição de Messias. Enquanto ele mesmo tomava a iniciativa, a conversa não avançava. Ela só avançou e atingiu o seu objetivo a partir do momento em que a samaritana se situou e começou a tomar a iniciativa. Será que nós temos a mesma coragem de deixar ao outro a iniciativa do rumo da conversa?

6. João 4,27-30: 

A transformação que o diálogo realiza na samaritana

Os discípulos tinham ido ao povoado comprar alimento (Jo 4,8). Retornando, vida eterna (Jo 4,14). Chegando no povoado, ela anuncia Jesus: “Venham ver um homem que me disse tudo o que eu fiz! Será que ele é o Messias?” O resultado deste difícil diálogo parece muito reduzido. Jesus só conseguiu provocar uma pergunta na mulher: “Será que ele é o Messias?” Talvez seja este o resultado mais positivo que se possa imaginar. Jesus não dá respostas. Ele levanta perguntas que levam a pessoa a refletir sobre o sentido da vida.

7. João 4,31-38:

A transformação que o diálogo realiza em Jesus

Mesmo correndo o risco de não obter nenhum resultado, Jesus não se impõe nem condena a mulher, mas respeita-a profundamente. Durante a conversa, ele não se fecha dentro da sua religião nem dentro da sua raça, mas se orienta por aquilo que ele mesmo aprendia da própria samaritana. No fim, esqueceu até a comida que os discípulos tinham trazido, pois presta atenção ao que o Pai lhe diz por meio da conversa com a samaritana: “Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e completar a sua obra!” (Jo 4,34). Jesus lê os fatos com outros olhos. Para os judeus, os samaritanos são um povo a ser desprezado. Para Jesus, eles são um campo fértil, pronto para a colheita (Jo 4,35). Ele descobre que, na vida da samaritana, pessoa não judia e não praticante, existe o “dom de Deus” (Jo 4,10). A Boa-nova de Deus existe na vida de todas as pessoas. Os discípulos e as discípulas não são os donos da Boa-nova. Devem ser servidores, instrumentos. Sua missão é ajudar as pessoas a descobrir o dom de Deus dentro das suas vidas.

8. João 4,39-42:

 O resultado da missão de Jesus na Samaria

Aqui temos o mesmo processo que já vimos na formação da primeira comunidade: encontrar, experimentar, partilhar, testemunhar, conduzir até Jesus. A samaritana encontrou, experimentou, partilhou, testemunhou e conduziu o seu povo até Jesus. Os samaritanos, por sua vez, escutaram a partilha que ela fez e, por isso, convidaram Jesus a ficar com eles. Durante a convivência de dois dias, eles mesmos experimentaram a Boa-nova e começaram a partilhar e a testemunhar a sua experiência com a samaritana: “Nós próprios ouvimos e sabemos que este é verdadeiramente o Salvador do mundo!” Resumindo: nesta longa conversa, Jesus transgrediu várias normas religiosas e culturais da época: Passou pela Samaria, o que não era costume dos judeus. Sendo judeu, conversou com uma samaritana, o que era proibido.

Sendo homem, conversou com uma mulher e pediu bebida a uma pessoa proibida, sem preocupar-se com as normas severas da pureza. Conviveu dois dias com os samaritanos. Conviver, comer e beber juntos era sinal de grande intimidade. A comunhão de mesa era permitida só com os da mesma religião.

3. Alargando

As mulheres no Evangelho de João

O papel das mulheres nas comunidades do Discípulo Amado era muito importante. Logo no início, o primeiro milagre-sinal de Jesus foi realizado por intervenção de Maria, a mãe de Jesus (Jo 2,1-11). E no fim, ao pé da cruz, é novamente ela, a mãe de Jesus, que se torna mãe da comunidade do Discípulo Amado (Jo 19,25-27). Nos capítulos 2, 3 e 4 aparece claramente uma evolução na fé que vai desde a desconfiança de Jesus a respeito dos judeus (Jo 2,23-25), passando pela incapacidade de Nicodemos para entender a novidade do Espírito (Jo 3,1-12), até chegar à mulher samaritana. Ela não somente acreditou, mas levou muitos samaritanos a aceitar Jesus como o Messias (Jo 4,39-42). No centro da confrontação entre Jesus e os judeus aparece uma outra mulher, aquela que deve ser apedrejada por adultério. A simples presença daquela mulher já é uma denúncia e uma crítica para eles (Jo 8,1-11).


No centro do Evangelho, está a confissão de fé de Marta (Jo 11,27), igual à confissão de Pedro no Evangelho de Mateus (Mt 16,16). Se Pedro faz esta confissão de fé e por isso recebe as chaves do Reino como sinal da sua autoridade, a confissão de Marta indica que, nas comunidades do Discípulo Amado, é uma mulher que assume este serviço. Cabe a Marta a responsabilidade de levar a fé em Jesus ao seu pleno amadurecimento. No final do ministério público de Jesus, está uma outra mulher, Maria de Betânia. Com um gesto profético, ela unge os pés de Jesus (Jo 12,1-11). O seu gesto é repetido pelo próprio Jesus na última ceia (Jo 13,1-16) para expressar o serviço amoroso como identidade do verdadeiro discípulo e discípula. Há ainda um grupo de discípulas de Jesus que estão junto com Maria, sua mãe, na hora da sua crucifixão. São elas a mãe de Jesus, a irmã de sua mãe, Maria de Cléofas, e Maria Madalena (Jo 19,25). 


Surpreendente é o papel de Maria Madalena. Ela é a mulher da busca incansável. É ela quem vê primeiro o túmulo vazio e vai correndo anunciá-lo aos discípulos. Sua persistência na busca leva-a à experiência do encontro com Jesus ressuscitado. Jesus aparece primeiro a ela e envia-a com uma mensagem para os Onze (Jo 20,11-18). A credencial para ser apóstolo é ter visto o Senhor ressuscitado e ter sido enviado a anunciá-lo (1Cor 9,1-2;15,8-11; Gl 1,11-16). Por isso, desde o começo da tradição apostólica, Maria Madalena recebeu o título de apóstola dos apóstolos.


 Este uso do Antigo Testamento mostra que, em Jesus, chegou um novo critério para entender o sentido pleno da Bíblia e da história do povo. O desafio que fica para nós é este: reler hoje o nosso passado e a nossa história, tanto escrita como oral, de tal maneira que também nós possamos descobrir nela a ação do Espírito de  Deus que orienta o nosso povo e a nossa cultura em direção à vida plena em Cristo.


Comparando as duas conversas

Tanto a conversa de Jesus com Nicodemos (Jo 3,1-12) como a conversa com a só samaritana, ambas existem no Evangelho de João. Comparando as duas conversas, percebemos que o evangelista quer acentuar algumas diferenças e, assim, transmitir uma mensagem. Diferenças não tanto de conteúdo, mas principalmente entre as duas personagens. De um lado, temos Nicodemos (Jo 3,1-21). É um homem, um judeu importante, de idade avançada. Dele sabemos o nome. No entanto, ele procura Jesus durante a noite, atraído pelos sinais que Jesus fazia, mas com dificuldades para crer. Ele está num processo pessoal de busca e parece não entender bem a proposta de Jesus, a quem chama apenas de Mestre. Do outro lado, temos a samaritana (Jo 4,1-30). É uma mulher, uma samaritana sem nenhuma importância social, desprezada e marginalizada. Dela não sabemos o nome. Ela não procura Jesus diretamente, mas é uma mulher com sede de vida, disposta a ter uma água que não seja a água parada do poço. Sente-se atraída pela proposta de Jesus, crendo, aceitando e reconhecendo nele o Messias. A conversa com a samaritana acontece em plena luz do dia. Ela não tem medo de ninguém e proclama para todos as suas descobertas. Ao fazer um paralelo entre estas duas atitudes, o Evangelho de João nos mostra que o caminho feito pela samaritana é muito mais agradável a Jesus do que a busca medrosa feita por Nicodemos. Afinal, Jesus “não precisa de informações a respeito de ninguém porque ele conhecia o homem por dentro” (Jo 2,25)



A Samaritana, de que temos medo - Pe Adroaldo Palaoro


“E a água que eu lhe der se tornará nele uma fonte de água que jorra para a vida eterna” (Jo 4,14)


Nestes próximos três domingos da Quaresma, a liturgia nos apresenta três grandes relatos do Evangelho de João: a samaritana, o cego de nascimento e a revivificação de Lázaro.

A expressão “Eu sou”, característico do quarto evangelho, se encontra nestas três cenas: “eu sou a Água viva”, “eu sou a Luz”, “eu sou a Vida”. São imagens-símbolo que desvelam e nos ajudam a compreender a verdadeira identidade de Jesus; ao mesmo tempo, são imagens que também revelam nossa identidade. É no encontro destas duas identidades que se fundamenta o sentido profundo do seguimento de Jesus.

A Quaresma se apresenta como momento oportuno para enraizar nossa vida n’Aquele que “morreu de tanto viver”; afinal, somos seguidores de uma Pessoa e não de uma religião, de uma doutrina... Seguir Jesus implica tornar visível em nossa vida o modo de ser e viver d’Aquele que foi o “biófilo”: amigo da vida.

O relato deste domingo – encontro de Jesus com a samaritana – é uma verdadeira catequese, que nos convida ao seguimento d’Aquele que é a Fonte da Vida. Nem no templo, nem em Jerusalém, nem em nenhum outro lugar se pode viver o verdadeiro culto, que se revela como encontro e identificação com Jesus.


Muitas vezes, o que entendemos por prestar culto é apenas idolatria: a tentativa de domesticar e manipular Deus segundo os nossos interesses.

Uma mulher da Samaria chega a um poço para tirar água, alheia a tudo o que ali a espera e distraída na trivialidade de sua vida cotidiana que não se abre ao imprevisível: vai só buscar água com o cântaro vazio para retornar à sua casa com ele cheio. Não há mais expectativas, nem mais planos, nem mais desejos.


Mas o imprevisível está lhe esperando na pessoa daquele galileu sentado na beira do poço e que inicia uma conversação com ela sobre coisas banais, talvez para não a assustar: falam de água e de sede, de poços e de velhas rixas entre os povos vizinhos, coisas de todos os dias. Repentinamente, irrompe a linguagem “das coisas do alto”, o dom, uma água que se converte em manancial vivo, a promessa de uma sede pacificada para sempre, um Deus em busca do ser humano, fora dos espaços estreitos de templos e santuários.


E, no final da cena, o cântaro que era símbolo da pequena capacidade que está disposta a oferecer, fica esquecido junto ao poço, agora já inútil pois não pode conter uma água viva.

A sede da samaritana – e a de Jesus – é a mesma sede de todo ser humano: é insatisfação radical que não pode ser saciada por nada humano. A sede representa as necessidades e aspirações fundamentais do ser humano: sede de sentido e de plenitude, sede de comunhão e de encontro, sede de vida...

Somos pessoas-sede!


A sede é uma água que nos habita e nos dá vida. A sede é fundamental, essencial. O nosso coração é um «interminável reservatório de sede. Sede de amor. Sede de verdade. Sede de reconhecimento. Sede de razões de viver. Sede de um refúgio. Sede de novas palavras e de novas formas. Sede de justiça. Sede de humanidade autêntica.

Sede de infinito (José Tolentino Mendonça, Elogio da Sede).


Como um bom pedagogo, Jesus acompanha a samaritana a descobrir o desejo de água fresca, a saudade humana de amor e felicidade.


Em termos orantes, o ser humano, todos nós, temos “sede do Deus vivo” (Sl 42,3), que brota de nossa terra ressequida, rachada, sem água: suspiramos como a corça suspira pelas torrentes de água, por Deus. Só o Senhor nos conduz para as fontes tranquilas (Sl 22).

Neste precioso e profundo relato do evangelho de João são tantos os temas que o autor vai alinhavando, a partir de diferentes níveis (histórico, simbólico, espiritual), que se torna impossível aprofundá-los em um breve comentário. A imagem da sede remete à nossa aspiração profunda, incapaz de ser saciada por nenhum objeto. A imagem da água, por sua vez, nos remete à nossa identidade original, que está brotando constantemente em nosso interior. 


Jesus aparece como o mestre que nos liberta de enganos e de falsas identificações, para que possamos entrar em contato com a “água viva” que Ele mesmo já saboreia, a única que torna possível “nunca mais ter sede”.

Essa água não é “algo” – algum objeto que possa nos preencher – nem se encontra longe de nós. Constitui nosso núcleo mais profundo. O que normalmente acontece é que – como a samaritana – estamos longe dela. Ao viver “fora” de nós, desconectados da fonte, nos acontece aquilo que S. Agostinho lamentava:


“Tarde te amei, beleza sempre antiga e sempre nova, tarde te amei! No entanto, Tu estavas dentro de mim e era eu quem estava fora”.


O importante é saber que a “beleza sempre antiga e sempre nova” não é “algo” (ou “alguém”) separado de nós, embora possamos nos dirigir a ela em chave relacional, nomeando-a como um “Tu”.


É outro nome da “água” de que falava Jesus, e constitui nossa identidade última, aquela na qual nos reconhecemos quando nossa mente se silencia; aquela que saboreamos quando, simplesmente, nos deixamos ser; aquela que está sempre a salvo e que, para além das aparências mentais, partilhamos com todos os seres.


O encontro com Jesus move a samaritana e, nos convida também, a descobrir o manancial de água viva que flui em nossas entranhas em lugar de continuar sendo buscadores de “poços no deserto”.


Jesus espera a samaritana, como espera cada um de nós, ali onde está a trama de nossa vida. Ele inicia sempre o encontro pedindo-nos daquilo que já recebemos, do que já temos... Junto a Sicar ou ao lado de nossos próprios poços... Não é preciso percorrer um caminho diferente, não pede a ela, nem a nós, ir a nenhum templo, nem lugar sagrado; nossa própria vida, com as circunstâncias nas quais vivemos, é o lugar em que Jesus se faz presente. Às vezes o escutamos e outras nem sequer o vemos.

Ali nos pede, como à samaritana, que entremos no mais íntimo de nós mesmos, que desçamos ao nosso próprio centro, à nossa realidade profunda, que estejamos atentos à nossa própria fonte e à fonte dos outros. O encontro com Jesus não acontece na superfície de nossa vida, no banal ou impessoal, nas aparências ou falsas imagens que tantas vezes alimentamos. A presença d’Ele desvela (tira o véu) nosso manancial, muitas vezes bloqueado por uma cultura da exterioridade que nos resseca e torna estéril nossa vida.


Em nosso percurso existencial encontramos, muitas vezes, pessoas que são verdadeiras nascentes. São límpidas e transparentes, inspiradoras e mobilizadora, habitualmente delicadas. Estar na presença delas é saciar nossa sede, saímos renovados. São pessoas-fonte que despertam em nós o desejo de acessar nosso manancial interior de desejos, criatividade e busca... É ali, na fonte interior, que a vida se renova.


Outras vezes nos encontramos com pessoas que são verdadeiros lençóis de água. Subterrâneas, circulam debaixo da terra, discretas, silenciosas, mas surpreendentemente criativas. Trabalham no silêncio e fazem mover a engrenagem do mundo com seus gestos escondidos, simples, mas eficazes; suas presenças fazem a diferença. Sem elas não seria possível a vida.


É certo que também há as pessoas pântano, pessoas charco, pessoas “águas paradas” ou águas poluídas, pessoas “enxurrada” que tudo destroem. Claramente, nem todas as águas são boas!


Bebemos de muitas águas e partilhamos muitas fontes. Talvez em nós convivam agora, e em diversas fases da vida, muitas destas águas. A água é dinâmica, viva. Como nós.


Não somos estáticos, mas vamos nos expandindo ao longo da vida, regando ambientes secos e áridos. Às vezes pensamos que só quando estivermos saciados poderemos saciar, ou só quando formos água boa poderemos matar sedes. No entanto, em nós convivem miséria e grandeza, força e fragilidade, estagnação e movimento, água boa e água pior.


Simultaneamente, somos água e somos sede. E o encontro destas duas realidades constitui nossa verdadeira identidade.


Tentar só guardar a nossa água ou permanecer fechados na nossa sede faz-nos definhar e morrer. Sondar as nossas águas e oferecer as nossas sedes é caminho comum de vida e redenção.

Afinal, Jesus fez-se sede para nos redimir.

Para meditar na oração

Somos seres insaciáveis, insatisfeitos; vivemos eternamente buscando, sem saber quê. Em contato com o “poço infinito” (nosso interior), sentimos a necessidade de preenchê-lo a qualquer preço; na maioria das vezes, preenchemo-lo com “coisas”: busca de poder, posses, prestígio... e sentimo-nos frustrados, porque nada nos satisfaz. Precisamos ativar outras “sedes”.

- Dê nomes às suas “sedes existenciais” que o(a) mantém criativo(a), buscador(a)...

- Escave seu interior e verifique a “qualidade” da água que brota do seu manancial?


Jesus diz à Samaritana “Mulher dá-me de beber”Jo 4, 5-42)- Padre Jose Beozzo


Está no centro deste evangelho, u’a mulher samaritana e seu diálogo com Jesus, ao lado do poço de Jacó em Sicar, para estranhamento dos discípulos que veem Jesus conversando em público com uma mulher e, ainda mais, mulher samaritana”: “Os judeus não se dão com os samaritanos”, avisa o evangelista João, para não dizer que chegavam a se odiar mutuamente. À samaritana, promete Jesus “água viva”. Esta apressa-se a pedir-lhe: “Dá-me dessa água, para eu não sinta mais sede, nem tenha que vir aqui buscar água”. Jesus pede que vá chamar seu marido. Ela responde que não tem marido. Jesus reconhece que nisto, ela fala a verdade: “De fato tiveste cinco e aquele que agora tens, não é teu marido”. Longe de todo falso moralismo, Jesus não a reprova ou condena e deixa a porta aberta para continuar o diálogo.

“Vejo que eres um profeta” exclama a mulher e de pronto interpela Jesus sobre velha controvérsia religiosa: “Nossos pais adoraram a Deus neste monte (Garizim) e vós dizeis que é em Jerusalém o lugar onde se deve adorar”. Responde-lhe Jesus: “Mulher acredita em mim, vem a hora que nem neste monte e nem em Jerusalém adorareis o Pai”. Arremata ainda: “… mas vem a hora e já chegou em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade”. 

Quando ela lhe confessa sua esperança messiânica “Eu sei que o Messias que é o Cristo está por vir”, Jesus se desnuda inteiramente perante essa mulher estrangeira, de religião samaritana condenada pelos judeus, considerada de má vida na sua aldeia: “Sou eu, aquele, que fala contigo” (Jo 4, 26) 

E ela sai correndo para anunciar, a surpreendente boa nova: “Não será ele o Messias?”. Não são da fé de Jesus, homens se julgam superiores, que discriminam, condenam, agridem e assassinam mulheres por serem mulheres. Não são da religião de Jesus, os que invocam sua fé religiosa, para discriminar, insultar e disseminar discursos de ódio contra pessoas por serem estrangeiras, de outra raça ou cor, por seguirem esta ou aquela religião, por assumirem determinada orientação sexual, contrariando o Deus de Jesus Cristo, Pai que acolhe a todas as pessoas como filhas e filhos e faz nascer, a cada manhã, o sol sobre bons e maus. Não são da religião de Jesus, os que xingam e agridem outros irmãos e irmãs, tratando-os de “hereges”, por pertencerem a outra Igreja cristã, diferente da nossa. 

Que o diálogo de Jesus com a samaritana aqueça nossos corações e abra nossas mentes para compreendermos que nesse encontro de diferentes e até mesmo de inimigos cultural e religiosamente revela-se o Messias e seu Deus que é Pai de todos nós, que formamos uma única e mesma humanidade saída de suas mãos e do seu coração.



À VONTADE COM DEUS - José Antonio Pagola


A cena é cativante. Cansado do caminho, Jesus senta-se junto ao manancial de Jacob. De imediato chega uma mulher para tirar água. Pertence a uma povoação semipagão, desprezado pelos judeus. Com toda a espontaneidade, Jesus inicia o diálogo com ela. Não sabe olhar para ninguém com desprezo, mas sim com grande ternura. «Mulher, dá-me de beber» .

A mulher fica surpreendida. Como se atreve a entrar em contato com uma samaritana? Como se rebaixa a falar com uma mulher desconhecida? As palavras de Jesus surpreendem-na todavia mais: «Se conhecesses o dom de Deus e quem é aquele que te pede de beber, sem dúvida tu mesma me pedirias a mim, e Eu te daria água viva» .

São muitas as pessoas que, ao longo destes anos, se têm afastado de Deus sem dar atenção ao que realmente estava a ocorrer no seu interior. Hoje Deus é-lhes um «ser estranho». Tudo o que está relacionado com Ele parece-lhes vazio e sem sentido: um mundo infantil cada vez mais longínquo.

Entendo-os. Sei o que podem sentir. Também eu,  fui afastando pouco a pouco daquele «Deus da minha infância» que despertava dentro de mim medos, desgosto e mal-estar. Provavelmente, sem Jesus nunca me teria encontrado com o Deus que hoje é para mim um Mistério de bondade: uma presença amigável e acolhedora em quem posso confiar sempre.

Nunca me atraiu a tarefa de verificar a minha fé com provas científicas: creio que é um erro tratar o mistério de Deus como se fosse um objeto de laboratório. Tampouco os dogmas religiosos me ajudaram a encontrar-me com Deus. Com simplicidade deixei-me conduzir por uma confiança em Jesus que foi crescendo com os anos.

Não saberia dizer exatamente como se sustenta a minha fé no meio de uma crise religiosa que me sacode também a mim como a todos. Apenas diria que Jesus me trouxe a viver a fé em Deus de forma simples desde o fundo do meu ser. Se eu escuto, Deus não se cala. Se eu me abro, Ele não se fecha. Se eu me confio, Ele me acolhe. Se eu me entrego, Ele me sustenta. Se eu me afundo, Ele me levanta.

Creio que a experiência primeira e mais importante é nos encontrarmos bem com Deus porque o percebemos como uma «presença salvadora». Quando uma pessoa sabe o que é viver bem com Deus, porque, apesar da nossa mediocridade, os nossos erros e egoísmos, Ele nos acolhe tal como somos, e nos impulsiona a enfrentarmos a vida com paz, dificilmente abandonará a fé. Muitas pessoas estão hoje abandonando Deus antes de o ter conhecido. Se conhecessem a experiencia de Deus que Jesus contagia, iriam procura-Lo. Se, acolhendo na sua vida Jesus, conheceriam o dom de Deus, não o abandonariam. Iriam sentir-se bem com Ele. Fonte: Ihu


À beira do poço do bem viver (Jo 4,1-42)-  [Edmilson Schinelo]

Em tempos de crescimento de fundamentalismo e intolerância, de aumento de casos de homofobia e de xenofobia, o texto do encontro entre a Samaritana e Jesus se constitui numa boa oportunidade de conversa. Não existe Bem Viver sem respeito às diferenças.

Mais do que isso, para que o Bem Viver aconteça, faz-se necessário ir ao encontro, mergulhar na outra pessoa e na outra cultura. A sociedade atual é cada vez mais plural e isso é possibilidade de enriquecimento. Sentemos à beira do poço para uma conversa em torno desse assunto.

Nossa tendência em ler o texto a partir de uma perspectiva unicamente cristocêntrica nos faz esquecer aspectos importantes: o encontro se dá na terra da mulher, a Samaria. O estrangeiro e diferente na história é Jesus. É ele que, exausto, no calor do meio-dia, sente fome e sede (Jo 4,6). Ele sequer tem um balde e, por causa da profundidade do poço (Jo 4,11), necessita da ajuda da mulher: Dá-me de beber (Jo 4,7). A arrogância e prepotência de correntes de um judaísmo excludente são colocadas em cheque: todo mundo precisa de ajuda!

A rivalidade entre pessoas judias e samaritanas era antiga. Remanescentes de um processo de colonização promovido pela dominação assíria, que trazia pessoas de outras regiões e as misturava com os habitantes locais, os samaritanos conseguiram, inclusive, preservar maior pluralidade de cultos (2Rs 17,24-41). Mas tal miscigenação gerou reações de desprezo e rivalidades entre aquelas pessoas que se consideram “legítimos filhos de Israel” e aquelas que são “misturadas” (Esd 4,1-5).

Alguns séculos depois, os samaritanos construíram para si um templo no Monte Garizim, o mesmo citado pela Samaritana (Jo 4,20). Alguns judeus, liderados por João Hircano, destruíram o templo samaritano, alegando que o único lugar de adoração era Jerusalém. O livro do Eclesiástico (Sirácida) se refere aos samaritanos como um “povo estúpido que mora em Siquém, que nem sequer é nação” (Eclo 50,25-26). Lideranças judaicas, quando quiseram acusar Jesus, fizeram uso de seu preconceito: Não dizíamos com razão que és samaritano e que tens um demônio? (Jo 8,48).

Não é assim que ainda pensam muitos cristãos, católicos e evangélicos, ao se referirem, por exemplo, a pessoas adeptas aos cultos de matriz africana? Não é também essa postura da grande mídia (dominada por pessoas que se dizem cristãs), quando fala dos muçulmanos, automaticamente rotulados de terroristas? E quantas vezes, católicos e evangélicos continuam se tratando dessa forma! Com certeza, não se constrói o Bem Viver com tanta discriminação e preconceito.

O fato de Jesus passar pela Samaria já diz muito. Muitos judeus faziam outro caminho para não pôr os pés na terra desta gente. A iniciativa de entrar em espaço estrangeiro, de se tornar estrangeiro, mostra uma tentativa de abertura, de superação do preconceito: desejo de aprender com o diferente. Nota-se esta postura tanto em Jesus como na Samaritana, cujo nome, infelizmente não nos foi preservado. De qualquer forma, ela matou a sede de Jesus. Ambos tinham desejos de matar também outras sedes.

O texto poderia ter nos contado que, antes de seguirem conversa, a mulher lhe ofereceu água fresca e reconfortante. Agora refeito, Jesus pode seguir no diálogo, tenso em vários momentos. Mas é tentativa de acerto, de compreensão recíproca, de acolhida do diferente.


IMPORTÂNCIA DA PROXIMIDADE


Não faz bem viver totalmente isolado, enclausurado e sem comunicação com quem transita nos arredores. A prática de Jesus era bem diferente, porque Ele ia ao encontro das pessoas, principalmente de quem estava na condição de marginalizado por causa de suas deficiências. O diálogo sadio pode construir realidades novas e abrir caminhos para a superação desse tipo de sofrimento.

O isolamento maior, e muito pior, é quando a pessoa, marcada por uma aridez de atitudes, fica distante da presença divina. Deus está sempre ao seu lado, mas supõe abertura da mente e do coração para acolhê-Lo no trajeto normal da vida. Muitos alimentam uma ansiedade sem limites e nunca se satisfazem com o que são e nem com o que têm, porque falta um diálogo filial com Deus.

A realidade familiar dos dias de hoje expressa claramente uma crise de proximidade, porque não adiante estar morando debaixo de um mesmo teto, ou viver numa mesma comunidade, se as pessoas não conseguem criar espaços para uma fraterna convivência e diálogo. Essa proximidade só consegue acontecer quando houver esforço e renúncia de cada um de seus membros.

Sabemos pela Sagrada Escritura que Jesus, além de ir ao encontro das pessoas e criar diálogo com elas, como fez com aquela samaritana no poço de Jacó (Jo 4,6ss), Ele está sempre na espera de ser procurado por quem vive com a vida vazia, sem sentido e desanimado, para preencher as suas necessidades. Muitos se deixam engolir pelas tribulações, pela dor e por tragédias, sem esperança.

Na prática estamos vendo uma sociedade cada vez mais polarizada, de um lado formada por pessoas ricas e poderosas, e de outro, os mais fragilizados, com muita dificuldade para dialogar e criar proximidade. Falta o essencial para que exista uma realidade mais humanizada, onde a vida tem verdadeiro sentido. Mas isso é quase impossível sem abertura a um diálogo transversal com Cristo.

A Campanha da Fraternidade deste ano reflete o tema “Fraternidade e vida, dom e compromisso”. No lema fala das atitudes de proximidade, porque mostra a prática do bom samaritano, que chega, vê a pessoa machucada caída na estrada, tem compaixão, aproxima-se, cura suas feridas e cuida dela. Ele se fez próximo de quem estava totalmente abandonado e caído pelo chão.

Dom Paulo Mendes Peixoto

Arcebispo de Uberaba.


TEXTO EM ESPANHOL- Dom Damián Nannini, Argentina. 


TERCER DOMINGO DE CUARESMA CICLO "A": LA SED DEL ESPÍRITU

La intención de las dos primeras semanas de cuaresma fue: 

Al introducirnos en la sequedad del desierto, despertar una profunda sed del Agua Viva;

Al enfrentarnos con la oscuridad de nuestro pecado, hacer surgir una inmensa ansia de Luz Divina; 

Al hacernos tomar conciencia de nuestro límite, la muerte, reavivar nuestro deseo de la Vida eterna.

Los tres domingos siguientes de cuaresma están ordenados como jalones de un itinerario bautismal mediante el recurso a tres elementos con una gran carga simbólica: el agua, la luz y la vida. 

El gran desafío de estos domingos es lograr vincular los polos antropológico y cristológico de estos símbolos. Es decir, ayudar a descubrir el deseo profundo de estos elementos que anida en el corazón del hombre y orientarlo a su realización plena en Cristo.

Por tanto, a partir de este domingo la liturgia nos invita a dejarnos atraer, conquistar por el misterio pascual de Jesús que tenemos como meta celebrativa. En este tercer domingo, en particular, se busca anunciar a los catecúmenos-discípulos, sedientos de Dios, cómo su sed va a ser saciada con Cristo, agua viva para quien cree en Él. Además, "nada es más importante para un tiempo de penitencia y ayuno que la idea de que la gracia de Dios precede a toda nuestra acción, la ha precedido siempre, siendo nosotros todavía pecadores. Todos los textos de la liturgia hablan hoy de esto" .


1a. Lectura (Ex 17,1-7):  


Importa recordar que este texto sigue a la gran epopeya de Israel que sale de Egipto de modo victorioso gracias a la "mano firme" de Dios. Ahora bien, a la salida de Egipto (éxodo) sigue el camino por el desierto hacia la tierra prometida y, después de unos días de este caminar, surge una primera crisis por la falta de agua, lo que lleva al pueblo a rebelarse contra Moisés y contra Dios. Aparece entonces la tentación del desaliento, de querer volverse atrás. Por eso, más allá de la necesidad vital del agua, la crisis pone de manifiesto la falta de confianza en Dios puesto que se cuestiona la buena intención de Moisés y de Dios al rescatarlos de Egipto (“¿para qué nos hiciste salir de Egipto? ¿Sólo para hacernos morir de sed...?”). En el fondo dudaban de que Dios esté realmente con Moisés y con ellos: “¿El Señor está realmente entre nosotros, o no?”. 

Entonces el Señor manda a Moisés que tome el mismo bastón con que golpeó las aguas del Nilo y se transformaron en sangre (cf. Ex 7,15-20). Con esto se indica que el mismo Dios que obró prodigios por medio de Moisés en Egipto es quien sigue obrando ahora a favor de su pueblo sediento. Y con este bastón Moisés golpea la roca del Horeb y brotó agua para que el pueblo beba.

La tradición judía dice que los hebreos llevaron esta roca durante toda su travesía por el desierto y del agua que brotaba de ella siguieron bebiendo. Y cuando llegaron a la tierra prometida la dejaron caer a tierra en Galilea y brotó tanta agua que se formó el lago de Tiberíades . Por su parte San Pablo, al referirse a la travesía de los israelitas por el desierto y basándose en esta tradición, dice que "bebían el agua de una roca espiritual que los acompañaba, y esa roca era Cristo" (1Cor 10,4) confiriéndole así a este pasaje del Antiguo Testamento un sentido bautismal.


2a. lectura (Rom 5,1-2.5-8): 


En el capítulo 5 de la carta a los Romanos Pablo explica los efectos de la justificación y la relaciona estrechamente con la reconciliación. En primer lugar, dice que mediante la justificación “estamos en paz con Dios” (5,1). Luego equipara la justificación con la reconciliación con Dios, su principal efecto (Rom 5,10-11). La etimología de la palabra griega reconciliar (katallasso, synallasso) remite a la idea de cambio: una situación o una persona “se vuelve otra”. Es el cambio que supera la discordia, la enemistad, la separación (por ejemplo, aplicado a la reconciliación de los esposos en 1Cor 7,11). Es muy importante porque si la justificación podía llegar a entenderse como una simple declaración divina de no imputación del mal, algo sólo exterior; la reconciliación acentúa más bien la dimensión de cambio interior, de vuelta a la relación con Dios que el pecado había roto.

Luego precisa que esta reconciliación la obró Dios por medio de la muerte de Jesucristo que nos liberó del pecado. En esta referencia hay dos elementos: un acontecimiento - padeció, murió - y la motivación de este hecho - por nosotros, por nuestros pecados, por los impíos -. Y este acontecimiento es también la fuente de la esperanza de la salvación para los que han sido justificados y reconciliados.

La realidad de haber sido justificados, de estar en paz con Dios, debe animarnos a esperar la redención definitiva, la participación en la gloria de Dios. De este modo San Pablo nos da “razón de la Esperanza” de la gloria de Dios y esta “esperanza no quedará defraudada porque el amor de Dios ha sido derramado en nuestros corazones por el Espíritu Santo que nos ha sido dado”. El Espíritu Santo debe convencernos del amor de Dios manifestado en Cristo, "murió por nosotros cuando todavía éramos pecadores".



Evangelio (Jn 4,5-42): 


                Al leer el evangelio de la Samaritana en el contexto de la liturgia de este domingo hay que poner el acento en el tema del agua y su valor simbólico; aun dejando en la sombra otros aspectos importantes del texto. 

Claramente el evangelio de Juan juega con un doble nivel de significación en relación a la sed y al agua, pasando de lo natural a lo sobrenatural o divino. Justamente a través del diálogo busca Jesús que la samaritana haga este salto a lo más profundo; que se despierte en ella la sed del agua viva. Y para ello aparece Él mismo junto al pozo “fatigado del camino”, teniendo sed y pidiéndole que le de beber. El curso de la narración nos llevará a comprender que Jesús tiene sed de comunicarse, de darse, de que todos conozcan el “don de Dios”, que beban del agua vida; tiene sed de salvar a la humanidad (cf. Jn 7,37-39; 19,34). 

Toda la escena tiene lugar en torno al pozo de Jacob situado en Samaría. Nos informa L. Rivas que en la tradición judía el pozo de los patriarcas se identificaba con la roca de la cual Moisés hizo brotar agua (1ª. lectura); y el agua de este pozo con los mayores dones que Dios ha hecho a Israel: la Ley y la Sabiduría . Por su parte X. León Dufour  dice que “según la interpretación targúmica, el donante del pozo en el desierto era Dios mismo, y el agua de ese pozo era un agua que subía. Estos dos aspectos, don y fuente, dan perfectamente cuenta de la temática del relato de Jn: Jesús le dirá a la samaritana: «Si conocieras el don de Dios» (4,10) y hablará de «fuente que brota» (4,14)”.

Mientras el diálogo con Nicodemo tiene lugar de noche (cf. Jn 3,2), aquí se señala que “era la hora sexta”; esto es, mediodía. Se interpreta como la hora propia de la revelación, hora de mayor luz donde todo queda a la vista.

En el diálogo entre Jesús y la samaritana pueden distinguirse dos momentos, ambos centrados en la revelación de Cristo: primero de Jesús como dador del agua viva (4,7-15) y luego Jesús como Profeta y Mesías (4,16-26). Nos concentraremos en la primera parte.

Jesús le habla a la Samaritana para que se despierte en ella su deseo profundo del agua viva y lo manifieste con una oración de petición (“Señor, dame de esa agua para que no tenga más sed”). Luego es necesario que conozca el Don de Dios y quién es el Dador del mismo. Entonces Jesús mismo pasa a establecer una comparación entre dos tipos de agua llevando el simbolismo al nivel espiritual.

Si atendemos más a la tradición bíblica y al evangelio de Juan en particular el "agua viva" tiene dos sentidos fundamentales. En primer lugar, es la revelación que ofrece Jesús, su palabra, el evangelio, que nos permite conocer y adorar al verdadero Dios, al Padre. 

En segundo lugar, el agua viva es fruto de la acción del Espíritu de Jesús en los creyentes. Lo dice expresamente Jn 7,37-39: "El que tenga sed, venga a mí; y beba el que cree en mí". Como dice la Escritura: "De su seno brotarán manantiales de agua viva". Él se refería al Espíritu que debían recibir los que creyeran en él" .

Más allá de estas precisiones, es verdad que en el lenguaje de los símbolos el referente (lo simbolizado o representado) nunca es exclusivo o exacto, por ello es necesario mantener siempre cierta apertura mental. Esto vale también para el símbolo del agua en la Biblia donde “es una realidad fuertemente ambivalente, fuente de vida, medio de purificación, bebida y fuente de muerte. De ahí que de por sí sea un símbolo indeterminado que se aclara por el contexto. Pero en cualquier caso está relacionado con la vida, en algunos momentos se une con el símbolo del Espíritu y es en general símbolo del don salvífico [...] En Jn 4,1-4 el don del agua viva que Cristo promete simboliza el Espíritu, la revelación, la misma persona de Cristo como don salvífico y la gracia” .

Según I. de la Potterie  “asistimos en Juan a una notable profundización de la metáfora del agua viva. Al comienzo del diálogo con la mujer de Samaría, esta agua misteriosa, en conformidad con el significado que revestía en la tradición precristiana, simboliza simplemente la palabra de Jesús: su verdad. Pero esta palabra, esta verdad, no puede permanecer externa al hombre: como sabiduría, el agua viva tiene que ser ‘bebida’ por el creyente (4, 14ª; 7,37); sólo con esta condición se convertirá en él (4,14b) en un manantial del que surge la vida eterna. Esto significa, sin metáfora, que la palabra, la revelación de Jesús, tiene que ser interiorizada en el corazón del discípulo (5,38). En esto consistirá la acción del Espíritu de verdad (14,26)”.

A partir de aquí el texto recorre los pasos de una cristología ascendente: Jesús como profeta, como Mesías y como Salvador del mundo. Al mismo tiempo, y esta es la vertiente antropológica, se trata de un proceso de conversión, del "encuentro de Cristo con su criatura en el pecado" . Además, se describe el paso de la preocupación por la satisfacción de una necesidad humana, a la confesión de fe en Jesucristo como Salvador del mundo. Según E. Leclerc esta conversión de la samaritana aparece como trasfondo en la segunda parte del diálogo con Jesús: “«Me ha dicho todo lo que he hecho», dirá más tarde la mujer a la gente. Al dejar al aire su vida tormentosa, Jesús no ha querido humillarla, sino más bien hacer sentir que, más allá de la superficialidad de su existencia, existía, en lo más profundo de ella misma, una sed ardiente, un deseo insatisfecho de felicidad, de amor verdadero y de adoración. Una sed de absoluto que ninguna relación humana había podido sofocar hasta ese día. Una sed de agua viva”.

En conclusión, la revelación de Jesús el Salvador, o más aún, su propia donación salvadora es el agua viva que calma toda sed. Ya no hay que buscar otra revelación ni otra agua. Según G. Zevini “la samaritana abandona a los pies de Jesús el cántaro, símbolo de su pasado y vínculo tradicional con el pozo, en el que había pretendido apagar su sed y de donde había recibido su identidad en el pasado”. También nosotros podemos abandonar el cántaro al lado del pozo del viejo Jacob , pues hemos encontrado la salvación definitiva. 



Algunas reflexiones:

Debemos recordar que el domingo pasado, con la vocación de Abraham, se nos invitaba a salir, a dejar atrás lo pasado, lo pecaminoso de nuestra vida. Nos hemos puesto en camino, hemos entrado en el desierto al igual que Israel al salir de Egipto. Recordemos que para los autores bíblicos el período del desierto es un lugar simbólico, es una metáfora de la vida, un cuadro de la existencia y de los problemas del pueblo de Israel, y también de los nuestros.

En este contexto del desierto cuaresmal la primera lectura nos advierte sobre la tentación del desaliento que busca hacernos detener nuestra marcha y volver atrás. La falta de agua es una carencia real y una real amenaza de muerte. Ante esto es normal que la naturaleza se rebele, cuestione y dude. Entonces Dios manifiesta su presencia y nos reprocha la falta de fe, de confianza en su Amor Providente. Más aún, como hermosamente comenta G. Ravasi  "Dios espera ansiosamente este recodo en la pista del desierto, cuando el hombre, arrastrando sus pasos, se le acerca y golpea su roca santa. Dios aguarda ese momento para saciar la sed y transformar a su criatura haciéndola revivir. Porque como dice San Gregorio Nacianceno: «Dios tiene sed de que tengamos sed de Él»". Una idea parecida, y muy bella, encontramos en el prefacio propio de este domingo: "Él mismo, cuando pedía a la Samaritana que le diera de beber, ya había infundido en ella el don de la fe; y si quiso tener sed de la fe de esa mujer fue para encender en ella el fuego de su amor divino".


El evangelio nos descubre en la persona de Jesús al agua viva de la cual todos tenemos sed. Jesús, y sólo Jesús, pude revelarnos al Padre, comunicarnos el conocimiento del verdadero Dios; puede darnos el Espíritu Santo que nos lleva a la comunión con Dios. Y habiendo encontrado la fuente y habiendo apagado nuestra sed, nos volvemos apóstoles del “agua viva”. Al respecto decía el Papa Francisco en su homilía del 15 de marzo de 2020: “Este don es también la fuente del testimonio. Como la samaritana, quien encuentra a Jesús vivo siente la necesidad de decírselo a los demás, para que todos lleguen a confesar que Jesús «es verdaderamente el salvador del mundo» (Juan 4, 42), como dijeron más tarde los paisanos de esa mujer. También nosotros, engendrados a una nueva vida a través del Bautismo, estamos llamados a dar testimonio de la vida y la esperanza que hay en nosotros. Si nuestra búsqueda y nuestra sed encuentran en Cristo la satisfacción plena, manifestaremos que la salvación no está en las “cosas” de este mundo, que al final llevan a la sequía, sino en Aquél que nos ha amado y nos ama siempre: Jesús nuestro Salvador, en el agua viva que Él nos ofrece”.


Asumiendo la dinámica del evangelio, podemos afirmar que tenemos sed de agua, sí; pero también tenemos sed de Dios, de su Presencia. En particular en los momentos difíciles, de pérdida o de renuncia a valores humanos, buscamos desesperadamente su Presencia y no siempre la sentimos. Es la crisis de la Esperanza, del que camina sin ver aún la meta, del ya pero todavía no. Tenemos que aceptar esto como algo propio de nuestra condición cristiana, inevitable para el que camina en la fe, y de lo cual la cuaresma nos debe ayudar a tomar más conciencia. En efecto, "la sed sirve para sacarnos de nuestra inmovilidad conformista y lanzarnos al camino en búsqueda de la fuente. Luis Rosales lo reflejó acertadamente en este hermoso verso: “De noche iremos, de noche, / sin luna iremos, sin luna, / que para encontrar la fuente, / sólo la sed nos alumbra”. Nuestra insatisfacción radical ante todo lo caduco y pasajero golpea con fuerza, como el cayado de Moisés, en la roca de nuestra vida hasta hacer brotar esa corriente de agua viva que es la presencia de Dios" . 

Pero como bien nota J. Tolentino Mendonça  “no es fácil reconocer que se tiene sed, porque la sed es un dolor que descubrimos poco a poco dentro de nosotros, detrás de nuestros acostumbrados relatos defensivos, asépticos o idealizados; es un dolor antiguo que, sin saber exactamente cómo, encontramos reavivado y tememos que nos debilite; son heridas que nos cuesta afrontar, y más aún aceptar confiadamente… Contactar con nuestra propia sed no es una operación fácil pero sin ella la vida espiritual pierde adherencia a nuestra realidad. Tenemos necesidad de ese acto de reconocimiento para anclar el recorrido espiritual en nuestro horizonte concreto, biográfico e histórico”. 

Si bien no es fácil reconocer nuestra sed, es posible y hasta necesario porque nada de lo humano puede garantizarnos la vida indefinida ni darnos la esperanza de lo eterno. El mismo J. Tolentino Mendonça  nos señala el camino para aceptar y orientar las muchas clases de sed que llevamos dentro de nosotros: “No huyamos de ellas como si no tuvieran nada que revelarnos de Dios. Al contrario: empleemos tiempo en orarlas. La sed es un patrimonio biográfico que estamos llamados a reconocer y agradecer. Viene con nosotros desde la infancia, nos acompaña a lo largo de nuestros años de formación, irrumpe de diversas formas en la vida adulta, madura al mismo tiempo que nosotros, envejece, cambia de nombre y se sentido… y persiste. La sed es el torno del alfarero donde Dios nos da forma; es el interior de las manos amorosas de Dios que buscan esperanzadamente formas nuevas de expresar la vida; es la piel de Dios tocando el vaso que somos cada uno de nosotros. Tal vez no hayamos conseguido aún agradecer a Dios nuestra sed, o bien el camino y las fuentes que a través de ella ha hecho Dios llegar a nuestras vidas. Pongamos en Dios nuestra sed”.

 En síntesis, la primera invitación de este domingo es, entonces, a despertar el deseo profundo, la sed de Dios; y a volver a la fuente, a Jesús, para saciarnos con su agua vida.


La segunda lectura nos propone la motivación fundamental para seguir esperando y confiando en el amor de Dios: cuando éramos pecadores Cristo murió por nosotros. Hemos sido justificados gratuitamente y, por ello, estamos en paz con Dios. Ante esta actitud favorable de Dios Padre para con nosotros en el pasado, sólo nos queda confiar en la Gracia del tiempo presente y esperar la Gloria del tiempo futuro.

Desde la época patrística hasta nuestros días el evangelio de la de misa de hoy ha sido leído en clave sacramental, como una catequesis de la iniciación cristiana. La fe, nacida de la palabra y del testimonio, culmina en el bautismo, regeneración por el agua y el Espíritu. Pero no olvidemos la iniciativa del Señor, quien tiene sed de nosotros, cómo bien explica J. Tolentino Mendonça : “Es el Señor quien toma la iniciativa de venir a nuestro encuentro: es él quien llega antes al pozo. Cuando nosotros llegamos, él ya estaba allí esperándonos. Cuando la mujer samaritana entra en escena, Jesús ya está sentado. Por eso es muy cierto que, por muy grande que sea nuestro deseo, mayor aún es el deseo de Dios”. Y también por eso le oímos decir: «Si conocieras el don de Dios y quién es el que te dice: “dame de beber”, tú le habrías pedido a él, y él te habría dado agua viva» (Jn 4,10). El encuentro con Jesús no es ningún ajuste de cuentas, ni el viene a revelarnos a un Dios justiciero”.


En conclusión: la Misa de este domingo, tanto en sus lecturas y como en sus oraciones, está centrada sobre los catecúmenos que hoy deben realizar su primer escrutinio. Se considera al catecúmeno como un sediento de Dios que está en camino, en búsqueda. Ellos han sentido ya el deseo de gozar de Su compañía, de su Presencia más plena en sus vidas. A ellos se les presenta hoy el don del amor de Jesús que apaga la sed de Dios. Lo mismo vale para el discípulo ya bautizado. La liturgia le pide que reavive su sed de Dios y que la sacie del manantial que brota del corazón traspasado de Cristo.  “Que María Santísima nos ayude a cultivar el deseo de Cristo, la fuente de agua viva, la única que puede saciar la sed de vida y de amor que llevamos en nuestros corazones” (Francisco).


PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):


 Dame de beber

 

Señor, siembra con nosotros

Riega estos terrenos que atesoran la Semilla

Y recoge los frutos de la cosecha eterna

 

Tú sabes de estos campos

El agua acumulada en lo profundo

Y los tiempos de sequía que no dan frutos

 

Hemos dejado a tus pies nuestros cántaros

Son corazones sedientos de tu ternura, 

De tu paz y tus milagros

 

Por eso venimos a ti sedientos,

Las manos extendidas y la fe decidida a conocerte

A dejar todo atrás para quererte

 

Necesitamos del testimonio de tantos

Para recuperar la esperanza, la fe

Y el amor enamorado

 

Ven a abrir en estos pozos secos, una grieta

Y brote de allí el manantial prometido

Que dará de beber a los hombres. Amén