22º DOM TC-A

22º DOMINGO COMUM-ANO A 

03/09/2023

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AS LEITURAS DESTA PÁGINA E DO MÊS TODO


1ª Leitura: Jeremias 20,7-9

Salmo Responsorial 62(63) R-A minh'alma tem sede de vós como a terra sedenta, ó meu Deus!

2ª Leitura: Romanos 12, 1-2

Evangelho de Mateus 16,21-27

 Naquele tempo, Jesus começou a mostrar aos discípulos que era necessário ele ir a Jerusalém, sofrer muito da parte dos anciãos, sumos sacerdotes e escribas, ser morto e, no terceiro dia, ressuscitar. 22    Então Pedro o chamou de lado e começou a censurá-lo: “Deus não permita tal coisa, Senhor! Que isto nunca te aconteça!” 23 Jesus, porém, voltou-se para Pedro e disse: “Vai para trás de mim, satanás! Tu estás sendo para mim uma pedra de tropeço, pois não tens em mente as coisas de Deus, e sim, as dos homens!” 24    Então Jesus disse aos discípulos: “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e siga-me. 25Pois quem quiser salvar sua vida a perderá; e quem perder sua vida por causa de mim a encontrará. 26        De fato, que adianta a alguém ganhar o mundo inteiro, se perde a própria vida? Ou que poderá alguém dar em troca da própria vida? 27  Pois o Filho do Homem virá na glória do seu Pai, com os seus anjos, e então retribuirá a cada um de acordo com a sua conduta.


DOM JÚLIO ENDI AKAMINE, ARCEBISPO DE SOROCABA-SP


Mt 16,21-27

Os discípulos são os que seguem o Mestre.

Para o cristão, ser discípulo significa tomar a cruz, pois ele segue alguém que morreu na cruz. O discípulo não pode ser mais do que o Mestre, por isso deve estar disposto a seguir o caminho da cruz para a ressurreição.

Jesus, uma vez, falou de si mesmo e do mistério de sua morte e ressurreição com uma comparação muito simples e profunda. Ele é o grão de trigo que, para dar fruto, tem que cair na terra e morrer para assim germinar. A glorificação de Jesus acontece através da paixão. Como o grão morre e deve ser enterrado para germinar, assim Jesus é sepultado para do sepulcro ressuscitar e produzir nova vida.

E isso é válido não somente para Jesus, mas também para os discípulos de Jesus. 

Por isso Jesus fala em paradoxo: quem se apega à sua vida, vai perder a vida. Quem despreza a própria vida vai ter a vida eterna. Paradoxo é uma contradição aparente. É um recurso de linguagem que Jesus usa para explicar que a lei do grão de trigo vale também para o discípulo de Jesus. 

A nossa vida é mortal, ou seja, ela termina. Nós não somos imortais: por mais que tentemos esticar o tempo de nossa vida, ela irá terminar. Por isso é insensatez tentar conservar a vida a todo o custo. Isso destrói o próprio sentido da vida. 

Quem dá para esta vida mortal um valor absoluto, acaba por perder o sentido de viver. Se queremos uma vida nova, uma vida plena, uma vida eterna, é preciso saber perder a vida mortal por algo que valha a pena. Perder a vida, ou seja, gastar a vida, consumir a vida por Jesus é morrer como o grão de trigo: a vida mortal dará muito fruto. 

Seguimos Jesus para onde Ele vai, ou seja, para a cruz e para a glória. Com ele, morremos para, com ele, ressuscitar. O exemplo de Jesus define as condições para alguém ser discípulo de Jesus. Como Jesus renunciou a si mesmo para nos salvar e para salvar o mundo, como Jesus não se apegou à sua dignidade divina para nos reconciliar com o Pai, assim também o discípulo deve aprender a renunciar a si mesmo, deve aprender a vencer o egoísmo para seguir Jesus. 

É preciso perder a vida por algo que valha mais do que a própria vida terrena.

O discípulo de Jesus não pertence mais a si mesmo. Ele renunciou a si mesmo para se entregar ao Senhor. Assim a vida mortal que entregamos a Jesus adquire nEle um valor eterno. 

O discípulo aprendeu do Mestre Jesus que só se possui aquilo que se entrega: porque entrega a vida, ele tem a vida. Jesus entregou toda a vida, por isso Ele possui a Vida; Ele é a Vida.




Quando a cruz deixa de ser peso morto-Pe Adroaldo Palaoro


22º Domingo do Tempo Comum – Mt 16,21-27 – A – 03-09-23


“Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga” (Mt 16,24)


A paixão-morte de Jesus foi, para os primeiros cristãos, o ponto mais impactante de suas vidas. Seguramente, o primeiro núcleo dos evangelhos foi constituído pelo relato da paixão-morte de Jesus. Não nos deve estranhar que, ao relatar o restante de sua vida, se faça a partir dessa perspectiva.

Por isso, até quatro vezes Jesus anuncia sua paixão e morte no evangelho de Mateus. Não era preciso ser profeta para dar-se conta de que a vida d’Ele corria sério perigo. O que Ele dizia e o que fazia ia contra à religião oficial, e os encarregados de sua custódia tinham o poder suficiente para eliminar uma pessoa tão perigosa para seus interesses. Até seus familiares mais próximos quiseram impedi-lo, forçando-o a levá-lo para sua casa, porque havia escolhido um caminho de loucos.

Pedro se rebela só de imaginar Jesus Crucificado. Não quer vê-Lo fracassado; só quer seguir a Jesus vitorioso e triunfante. Também nossa sociedade, marcada pelo imediatismo, competitividade, busca de resultados e rejeição a todo tipo de fracasso, a presença da Cruz é um escândalo inaceitável.

De fato, nela mesma, a Cruz não tem sentido. Se a Cruz é de tal modo exaltada, fazendo com que a vida e a ação de Jesus fiquem reduzidas a ela, então acontece que ela se torna angustiante e aflitiva, incapaz de motivar ao seguimento ou de acender a esperança.

Jesus não morre na cruz para buscar o sofrimento, mas por ser consequente até o fim com sua mensagem: o amor incondicional do Deus da vida. Ele não fugiu, não contemporizou, não deixou de anunciar e testemunhar, embora isso o levasse a ser crucificado.

Nesse sentido, a Cruz de Jesus não permanece confinada em si mesma; ela se insere no interior da paixão dolorosa do mundo e seu sentido mais profundo reside em sua solidariedade para com todos os crucificados da história.

Com a Cruz “descemos” com Jesus até à cruz da humanidade.

A solidariedade com os pobres, a fidelidade à vida evangélica, nos fazem descer aos porões das contradições sociais e políticas, às realidades inóspitas, aos terrenos contaminados e difíceis, às periferias insalubres das quais todos fogem e onde os excluídos deste mundo lutam por sobreviver. Ali nos encontramos com o Crucificado, identificado com os crucificados da história.

Como diz Jon Sobrino, não podemos crer no Crucificado de um modo coerente se não estamos dispostos a fazer descer da Cruz aqueles que estão dependurados nela.

A cruz e a morte só são dignas quando são consequência da luta contra a “cruz” e a “morte” impostas às pessoas e quando expressam solidariedade com os crucificados.

Aqui há espaço de transformação.

A cruz se ilumina quando requer o abraço de uma situação inevitável. Se a enfermidade não tem cura, se a morte de um ser querido nos arrebata, se uma catástrofe natural nos deixa impotentes, se a denúncia profética de uma injustiça acarreta perseguições etc., crescemos quando abraçamos essa cruz e a superamos espiritualmente.

A Cruz liberta quando não termina nela mesma, mas na ressurreição. Enquanto a carregamos é leve se ela aponta para um horizonte de esperança. “Vinde a mim, vós todos que estais cansados sob o peso do vosso fardo e eu vos darei descanso... Porque meu jugo é suave e meu fardo é leve” (Mt 11-28-30).

Mas, para carregar a Cruz como Jesus, é preciso passar por um processo de esvaziamento de nosso “falso eu” que, continuamente, busca seus interesses, alimenta vaidades, quer ser o centro das atenções, sem nenhuma sensibilidade solidária com os sofredores e vítimas de uma sociedade que violenta e exclui.

O chamado de Jesus a “renunciar a si mesmo” é um convite ao descentramento, a não viver girando obsessivamente sobre o próprio eu. Os místicos falam com frequência da “morte do próprio eu”, e da felicidade que brota do interior quando a pessoa se deixa possuir pelo amor de Deus.

Há uma forma de viver agarrada ao próprio eu, que é fonte permanente de sofrimento. Muitas vezes, o que mais sofrimento gera na pessoa é precisamente esse modo de viver apegado a ela mesma, buscando cegamente e acima de tudo o próprio êxito, a boa imagem, a aprovação e a estima dos demais. Esse cultivo equivocado do ego inflado se converte em fonte de preocupação e sofrimento.

Inconscientemente, a pessoa pode alimentar falsamente seu “ego” e inclusive agigantando-o de forma desproporcional, organizando todo seu entorno a partir dele: minha pátria, meu partido, minha igreja, minha ideologia; o ego vai então ficando cada vez mais seduzido e mais exposto a toda sorte de problemas.

A atitude mais saudável está em tomar consciência de que a origem de tanto sofrimento inútil está no indivíduo mesmo, nesse coração cheio de egoísmo, de apegos, de invejas, de falsas ilusões, de sede de poder, de ressentimento, de vazio interior... Da mesma forma que a dor física é um sinal de alerta que avisa que algo funciona mal no organismo, existe todo um conjunto de sofrimentos que revelam modos equivocados de viver: apegos, servidões, contradições e incoerências que impedem um desenvolvimento sadio da pessoa.

Este sofrimento não é uma cruz que devemos carregar, mas uma carga que devemos “soltar”, se quisermos viver com o espírito de entrega de Jesus.

No que se refere à experiência específica de seguimento, deveríamos retomar o sentido da mensagem de Jesus referente ao “negar-se a si mesmo” para poder viver. “A negação de si” enquanto negação daquilo que nega a vida. “Negar-se a si mesmo” é deixar de identificar-nos com a tirania das mensagens de nossos pequenos “eus”, que se refletem em nossa própria linguagem.

“Negar-se a si mesmo” é um conselho sábio: significa negar o que na realidade “não somos”, despertar da ilusão e do engano, deixar de girar em torno de um suposto “eu” que não existe, para viver a unidade de todos e de tudo em Deus e agir assim de um modo coerente na vida.

Não somos um pequeno “ego” que cremos ser. Precisamos despertar dessa ilusão e entrar em contato com nosso verdadeiro Eu, nosso Ser e, a partir dele, olhar a vida, olhar nossa atividade e olhar os outros, a fim de viver em conformidade com quem somos em profundidade. É esse o modo de “ganhar a vida”.

Precisamos perceber que aquilo que para nosso ego é “perda” e perigo, para nosso Eu verdadeiro é ganho profundo e libertação. Ganhamos mais vida quando ela se esvazia de “ego” e se deixa conduzir pelo amor oblativo que procede d’Aquele que é pura fonte de Amor.


Para meditar na oração

Todos nós somos habitados por um conjunto de “eus”, alguns conscientes, outros inconscientes. São os “pequenos amores” ocultos (um eu orgulhoso, irado, triste, prepotente, avarento, luxurioso...) que habitam reprimidos nosso interior. São elementos de nossa própria sombra, aos quais deveremos prestar atenção se quisermos avançar rumo a uma plenitude humana e espiritual. Uma experiência espiritual profunda consiste em estar cada vez mais lúcidos com relação a eles e identificando-nos prazerosamente com nosso Eu verdadeiro.


- Quais são seus “amores” (afetos desordenados que exigem alto investimento) que fragilizam e atrofiam o seguimento de Jesus?


- Diante da presença inspiradora da Graça, dê “nomes” aos seus “falsos eus” para não se deixar determinar por eles. Ao mesmo tempo “dê nomes” às expressões do seu “eu” original, que plenificam e dão sentido à sua vida.


 APRENDER A PERDER-José Antonio Pagola


A expressão está referida em todos os evangelhos e repete-se até seis vezes: “Se alguém quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, mas quem a perder por mim, encontrá-la-á”. Jesus não está a falar de um tema religioso. Está a expor aos Seus discípulos qual é o verdadeiro valor da vida.

A expressão está referida de forma paradoxal e provocadora. Há duas formas muito diferentes de orientar a vida: uma conduz à salvação, a outra à perdição. Jesus convida todos a seguir o caminho que parece mais duro e menos atrativo, pois conduz o ser humano à salvação definitiva.

O primeiro caminho consiste em aferrar-se à vida, vivendo exclusivamente para o próprio: fazer do próprio “eu” a razão última e o objetivo supremo da existência. Este modo de viver, procurando sempre a própria ganância ou vantagem, conduz o ser humano à perdição.

O segundo caminho consiste em saber perder, vivendo como Jesus, abertos ao objetivo último do projeto humanizador do Pai: saber renunciar à própria segurança ou lucro, procurando não só o próprio bem mas também o bem de todos. Este modo generoso de viver conduz o ser humano à sua salvação.

Jesus fala da fé num Deus Salvador, mas as Suas palavras são uma grave advertência para todos. Que futuro espera a uma Humanidade dividida e fragmentada, onde os poderes económicos procuram o seu próprio benefício; os países, o seu próprio bem-estar; os indivíduos, o seu próprio interesse?

A lógica que dirige nestes momentos a marcha do mundo é irracional. Os povos e os indivíduos, estamos a cair pouco a pouco na escravidão do “ter sempre mais”. Tudo é pouco para nos sentirmos satisfeitos. Para viver bem, necessitamos sempre mais produtividade, mais consumo, mais bem-estar material, mais poder sobre os outros.

Procuramos insaciavelmente o bem-estar, mas não nos estamos a desumanizar sempre um pouco mais? Queremos “progredir” cada vez mais, mas, que progresso é este que nos leva a abandonar milhões de seres humanos na miséria, a fome e a desnutrição? Quantos anos poderemos disfrutar do nosso bem-estar, fechando as nossas fronteiras aos esfomeados?

Se os países privilegiados só procuram “salvar” o nosso nível de bem-estar, se não queremos perder o nosso potencial económico, jamais daremos passos para uma solidariedade a nível mundial. Mas não nos enganemos. O mundo será cada vez mais inseguro e mais inabitável para todos, também para nós. Para salvar a vida humana no mundo, temos de aprender a perder. 


“Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me!”- Mesters, Orofino e Lopes

Este texto é uma continuação do Evangelho proclamado na Festa Litúrgica de São Pedro e São Paulo e, para que entendamos o texto mateano na sua integridade, torna-se necessário completar a leitura do Evangelho da festa com a passagem de hoje. Pois, ele mostra que, embora Pedro tivesse usado os termos certos para descrever quem era Jesus, ele os entendia de modo errado. Para Jesus, ser o Cristo (ou Messias)  significava assumir a missão do Servo de Javé, descrita pelo profeta Segundo-Isaías, nos Cantos do Servo de Javé (Is 42, 1-9; 49, 1-9ª; 50, 4-11; 52, 13-53). Jesus deixa claro que ser o Cristo não significava triunfo nos termos desse mundo, mas o contrário: “O Filho do Homem deve sofrer muito ser rejeitado pelos anciãos, pelos chefes dos sacerdotes e doutores da Lei, deve ser morto, e ressuscitar no terceiro dia”.

Essa visão que Jesus tinha da missão do Messias, não era comum – em geral o povo esperava um messias triunfante e glorioso. Mateus nos mostra que Pedro partilhava essa visão errada, a ponto de tentar corrigir Jesus, e de ganhar de Jesus uma correção dura: “Fique longe de mim, Satanás! Você não pensa as coisas de Deus, mas as coisas dos homens” (Mc 8, 33).

Não basta usar os termos certos – temos que ter a compreensão certa do que eles significam. A Bíblia nos conta que Deus criou o homem e a mulher na sua imagem e semelhança, mas na verdade muitas vezes nós criamos Deus na nossa imagem e semelhança, para que Ele não nos incomode. A nossa tendência é de seguir um messias triunfante e não o Servo Sofredor. Mas, para Jesus, não há meio-termo. O discípulo tem que andar nas pegadas do seu mestre: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e me siga” (Lc 9, 23).

 O seguimento de Jesus leva à cruz, pois a vivência das atitudes e opções d’Ele vai nos colocar em conflito com os poderes contrários ao Evangelho. Carregar a cruz, não é aguentar qualquer sofrimento passivamente. Se fosse assim, a religião seria masoquismo! Carregar a cruz é viver as consequências de uma vida coerente com o projeto do Pai, manifestado em Jesus. Segui-Lo não é tanto fazer o que Jesus fazia, mas o que Ele faria se estivesse aqui hoje. Como Ele foi morto, não pelo povo, mas por grupos de interesse bem definidos “os anciãos, os chefes dos sacerdotes e os doutores da Lei” (a elite dominante em termos econômicos, religiosos e ideológicos), os seus seguidores entrarão em conflito com os grupos que hoje representam os mesmos interesses. Por isso, sempre haverá a tentação de criarmos um Jesus “light”, sem grandes exigências, limitado a religião à uma religião intimista e individualista, sem consequências sociais, políticas, econômicas ou ideológicas.

A nossa resposta à pergunta “E você, quem diz que eu sou?” se dá, não tanto com os lábios, mas com as mãos e os pés. Respondemos quem é Jesus para nós, pela nossa maneira de viver, pelas nossas opções concretas, pela nossa maneira de ler os acontecimentos da vida e da história. Tenhamos cuidado com qualquer Jesus não exigente, que não traz consequências sociais, que não nos engaja na luta por uma sociedade mais justa. Pois o Jesus real, o Jesus de Nazaré, o Jesus do Evangelho, não foi assim, e deixou claro: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e me siga. Pois, quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la; mas, quem perder a sua vida por causa de mim, esse a salvará” (Lc 9, 24).



Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo-Tomaz Hughes


“Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me”

Este texto é uma continuação do Evangelho em que Pedro, embora tivesse usado os termos certos para descrever quem era Jesus, os entendia de modo errado (Mt 16,16-20). Para Jesus, ser o Cristo (ou Messias) significava assumir a missão do Servo de Javé, descrita pelo profeta Segundo-Isaías, nos Cantos do Servo de Javé (Is 42,1-9; 49,1-9a; 50,4-11; 52,13-53,12). Jesus deixa claro que ser o Cristo não significava triunfo nos termos desse mundo, mas o contrário:

“O filho humano deve sofrer muito, ser rejeitado pelos anciãos, pelos chefes dos sacerdotes e doutores da Lei, deve ser morto, e ressuscitar no terceiro dia”.

Essa visão que Jesus tinha da missão do Messias, não era comum. Em geral, o povo esperava um messias triunfante e glorioso. Mateus mostra-nos que Pedro partilhava essa visão equivocada, a ponto de tentar corrigir Jesus. Por isso, ganha de Jesus uma correção dura:

“Fique longe de mim, Satanás! Você não pensa as coisas de Deus, mas as coisas dos homens” (Mc 8,33).

Não basta usar os termos certos. Porém, é preciso ter a compreensão certa do que eles significam. A Bíblia conta-nos que Deus criou homens e mulheres à sua imagem e semelhança. Na verdade, porém, muitas vezes nós criamos Deus à nossa imagem e semelhança, para que Ele não nos incomode. A nossa tendência é de seguir um messias triunfante e não o Servo Sofredor. Mas, para Jesus, não há meio termo. O discípulo tem que andar nas pegadas do seu mestre:

“Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome cada dia a sua cruz, e siga-me” (Lc 9,23).

O seguimento de Jesus leva à cruz, pois a vivência das atitudes e opções d’Ele vai colocar-nos em conflito com os poderes contrários ao Evangelho. Carregar a cruz não é aguentar qualquer sofrimento passivamente. Se fosse assim, a religião seria masoquismo. Carregar a cruz é viver as consequências de uma vida coerente com o projeto do Pai, manifestado em Jesus.

Segui-lo não é tanto fazer o que Jesus fazia no seu tempo, mas o que Ele faria se estivesse aqui hoje.Como Ele foi morto, não pelo povo, mas por grupos de interesse bem definidos: os romanos, os anciãos, os chefes dos sacerdotes e os doutores da Lei (a elite dominante em termos políticos, econômicos, religiosos e ideológicos), os seus seguidores serão perseguidos pelos grupos que hoje representam os mesmos interesses. Por isso, sempre haverá a tentação de criarmos um Jesus “light”, sem grandes exigências, limitando a religião a uma prática intimista e individualista, sem consequências sociais, políticas, econômicas ou ideológicas.

A nossa resposta à pergunta “E você, quem diz que eu sou?” se dá, não tanto com os lábios, mas com as mãos e os pés. Respondemos quem é Jesus para nós na nossa maneira de viver, nas nossas opções concretas, na nossa maneira de ler os acontecimentos da vida e da história. Tenhamos cuidado com qualquer Jesus não exigente, que não traz consequências sociais, que não nos engaja na luta por uma sociedade mais justa. Pois o Jesus real, o Jesus de Nazaré, o Jesus do Evangelho, não foi assim.

E deixou claro:

“Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome cada dia a sua cruz e siga-me. Pois, quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la. Mas, quem perder a sua vida por causa de mim, esse a salvará” (Lc 9, 24).


Existem discípulos e discipulas? Um olhar diante do espelho da fé-Robson Luis Neu

O Evangelho de Mateus surgiu possivelmente por volta dos anos 80-95 d.C., depois de mais de 50 anos de tradição oral sobre o movimento de Jesus de Nazaré, que se mantinha viva nas comunidades cristãs da Galileia, Síria e Antioquia.

Com o decorrer dos anos, a tradição eclesial deu ênfase a uma sentença de Jesus a Pedro: “Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja.” (Mt 16,18) Esta sentença surge depois de uma bela confissão de fé de Pedro: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16,16). Essa é uma das mais precisas definições e confissões teológicas a respeito de Jesus, conservada na memória das comunidades através do Evangelho. A partir da sentença de Jesus, parece-nos que a proposta para o discipulado passa pela hierarquia. Contudo, outros textos mostram que não.

Os versículos 21 a 28 justamente mostram uma comunidade igualitária, em que discípulos e discípulas estão no mesmo nível, inclusive Pedro.

Assim são chamados a servir, sem uma estrutura hierárquica, sem opressores e oprimidos.

Dentro do processo de preparação ao discipulado, Jesus enfatiza sobre sua morte. Nas palavras do teólogo Werner Wiese, “Por trás de seu ministério está a necessidade de Deus para salvar a humanidade do círculo vicioso do maligno e da violência.” Pedro, que há pouco havia feito uma bela confissão de fé a respeito de quem era Jesus, agora mostra que de “boas intenções o inferno está cheio”. Para ele, Deus haverá de ser gracioso para com Jesus; morte não combina com triunfo, vitória, enfim, com o Reino de Deus.

Para Pedro, glória e morte não combinam.

Se, diante da primeira resposta de Pedro, Jesus o havia elogiado, agora a realidade é outra. Pedro precisa aprender a ser seguidor não só com palavras. O seguimento se dá com todo o corpo. Jesus o recoloca na condição de seguidor, e não o deixa mais na condição de condutor do discipulado. Pedro agora é pedra de tropeço, age como se estivesse representando o mal. Diante do projeto de Deus, anunciado e vivido por Jesus, não basta ter boa vontade e belas palavras, é preciso estar disposto a viver os sinais do Reino. Pedro é lembrado desta realidade duramente.

O seguimento a Jesus difere da lógica da vantagem. As condições impostas por Jesus para o discipulado exigem muito mais do que anunciam status. “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me. Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á” (Mt 16,24-25). Este é o núcleo do seguimento. Por isto mesmo, muitos e muitas são chamados e chamadas, mas poucos e poucas são escolhidos e escolhidas. Será por isso que muitas denominações religiosas cristãs têm falta de sacerdotes e sacerdotisas? Fazer memória destas palavras certamente mantinha as comunidades primitivas com os pés no chão. Diante das perseguições e das demais dificuldades, as comunidades viviam entre bonitas confissões de fé no culto e a realidade do dia-a-dia, com enormes tensões.

Parece-me que essa é a realidade conflituosa ainda hoje em nossas comunidades de fé. De um lado, ouvimos diariamente bonitas mensagens, com verdadeiras confissões de fé. De outro lado, os embates da vida, com suas decepções, seus sofrimentos, problemas existenciais, podem tornar-se pedra de tropeço. Assim como Pedro, somos tentados a negar o sofrimento como consequência de uma vida de fé. Mais fácil é deixar Deus e suas orientações para o domingo e, de preferência, limitá-lo às paredes do templo. 

Uma das tentações que pessoas de fé vivem em suas comunidades e também individualmente passa pelas intenções. Refiro-me à tentação de procurar com que Deus satisfaça as vontades pessoais e/ou grupais. Neste sentido, já não é mais Deus quem determina a vida. O teólogo Werner Wiese lembra:

“Somos tentados a usar a fé cristã para colocar Deus diante da carruagem de nossas imaginações, piedosas ou não.”

Jesus não seria mais o Mestre, mas o nosso discípulo, pois deve satisfazer as nossas vontades. As coisas do dia-a-dia são decididas e encaminhadas como se nada tivessem a ver com o ser cristão. Assim, cada vez mais vemos pessoas e denominações religiosas fazendo da fé negócio lucrativo. De semelhante modo, também já nos acostumamos com a fé como sinal de status, fortalecido pela hierarquia eclesiástica. Diante de tais casos, faz-se necessário ouvir novamente a sentença de Jesus:

“Vai para trás de mim, Satanás; tu és escândalo para mim, porque não pensas nas coisas de Deus, e sim nas coisas dos seres humanos” (Mt 16,23).

A memória dessas palavras de Jesus de Nazaré nos traz a certeza de que o seguimento de fé difere da lógica da vantagem. Ao mesmo tempo, questiona nossa própria fé quando nos faz pensar sobre “o preço a que estamos prontos a pagar” para viver a partir do Evangelho que rompe o círculo vicioso do mal e da violência.

A partir do modelo de discipulado apresentado por Jesus, parece estar implícita uma estrutura de comunidade que não depende do desenvolvimento de ordens e hierarquias eclesiásticas, tão comuns em nossos dias. Na figura de Pedro, somos confrontados com nosso próprio espelho de fé. A exemplo dele, enquanto discípulos e discípulas hoje, nós também confessamos nossa fé em Deus e em seu Filho Jesus, mas ao mesmo tempo, frequentemente e tão rapidamente, afastamo-nos daquilo que confessamos. E esta é uma luta que travamos diariamente, especialmente quando levamos a sério o Evangelho e a proposta do Reino de Deus como sinal de vida pessoal, comunitária e social.

Penso que, para toda pessoa cristã, as palavras de Jesus tornam-se não uma obrigação, mas uma necessidade diária. Mais necessárias ainda são para quem está no papel de liderança, orientador, orientadora, e carrega a tarefa de conduzir a comunidade nos caminhos de fé. Que as duras palavras de Jesus de Nazaré, o Cristo, nos incomodem e nos provoquem, assim como certamente desafiaram os seguidores e as seguidoras de Jesus nas comunidades das origens cristãs. Amém!


TEXTO EM ESPANHOL DE DOM DAMIÁN NANNINI, ARGENTINA

DOMINGO 22 DURANTE EL AÑO CICLO "A"

Damian Nannini

Primera lectura (Jer 20,7-9)

Estos versículos forman parte de unos textos agrupados bajo la denominación de "confesiones de Jeremías", que tienen en común el uso de la primera persona en la que el profeta presenta al Señor su queja. En cierto sentido, los mismos representan auténticas crisis vocacionales del profeta. 

En particular el texto de hoy forma parte de la quinta confesión (cf. Jer 20,7-18) que, comparada con las anteriores, es la más fuerte y trágica. En efecto, la vocación del profeta, dramática en la segunda confesión (cf. Jer 15,10-21), se ha vuelto ahora trágica. 

El Card. Martini, sin negar la dureza de las palabras de Jeremías que pueden sonar a blasfemia, las interpreta en su correcto contexto propio, que es la vida y vocación del profeta: "Dios se ha comportado con Jeremías como un hombre que seduce a una mujer y la atrae para luego apoderarse de ella y poseerla: me sedujiste, te aprovechaste de mí y ahora te acuso. No quería profetizar y tú me engañaste haciéndome creer una cosa por otra; me obligaste a seguirte sin decirme qué me esperaba y yo me fié de ti, pero Tú me pusiste en una situación enormemente difícil. Las consecuencias de este engaño son dramáticas: me he arrepentido de seguirlo, ya no le haré caso, no puedo más. Debemos observar a pesar de todo que la lamentación se expresa como oración, por consiguiente con espíritu de fe […] si reflexionamos atentamente en el texto, nos damos cuenta de que son palabras de amor, de un amor apasionado e irritado justamente porque el profeta no consigue olvidar al que ama" .

De cara al evangelio de hoy, la experiencia del profeta nos enseña que el seguimiento del Señor no es un camino triunfal; ni es lo que pensábamos; al contrario, muchas veces sus caminos nos desconciertan o enojan, como en este momento de la vida de Jeremías.


 Evangelio (Mt 16, 21-27)


Muchos estudiosos señalan que con este primer anuncio de la pasión comienza una nueva sección del evangelio de Mateo (16,21-20,15), donde Jesús va a ir mostrando abiertamente (verbo δεικνύειν en 16,21: “mostrar”, “llamar la atención sobre algo”) que su mesianismo se va a realizar por el camino de la pasión; o sea que se presenta como un Mesías sufriente. Su misión la llevará a cabo a través de la humillación, del sufrimiento y de la muerte. Esto explica la insistencia en los anuncios de su pasión a lo largo del camino hacia Jerusalén (16,21; 17,12.22), anuncios que los discípulos no logran comprender. La pasión indica un fracaso real aunque no definitivo: el rechazo por parte de su propio pueblo Israel que terminará en la crucifixión. Pero este camino de la cruz terminará bien porque, luego de la muerte, vendrá la resurrección que es también anunciada aquí, aunque tampoco es comprendida. En breve, el camino al triunfo, la gloria, pasa por la cruz.

Este anuncio de la pasión viene introducido en griego por la partícula dei (dei/) que se traduce por "debía" o, mejor aún, "es necesario" (como en Lc 24,7.44). En Mateo esta palabra se utiliza siempre para referirse a algo que tiene que suceder así porque está previsto por Dios, es Su plan. Como bien nota U. Luz: "dei/ expresa la ineludibilidad de la pasión y muerte de Jesús decretada por Dios; a pesar de ello, la pasión y la muerte es maquinada por los dirigentes judíos en libre decisión de la propia maldad responsable. El plan de Dios y la responsabilidad de los hombres no se excluyen en Mateo, como tampoco en el resto del Nuevo Testamente y en el judaísmo" . 

Siguen cuatro verbos en infinitivo que describen lo que “tiene que pasar”: ir (a Jerusalén) – sufrir – ser matado – ser resucitado. Los dos primeros verbos están en voz “activa”, son acciones que Jesús realizará; los otros dos en voz “pasiva”, Jesús las padecerá.

Inmediatamente después de este anuncio Pedro lleva aparte a Jesús "y lo reprende". Se trata de algo fuerte pues este mismo verbo ἐπιτιμάω se traduce como “increpar” o “reprender” en Mt 8,17; 17,18; 19,13 y 20,21; y como “ordenar severamente” en Mt 12,16. Ahora bien, la frase de Pedro, difícil de traducir literalmente, expresa la intención de que Dios le sea favorable a Jesús no permitiendo que suceda esto (ἵλεώς σοι, κύριε· οὐ μὴ ἔσται σοι τοῦτο). Por tanto, podemos suponer que no se trata de una protesta de Pedro contra la pasión, sino más bien contra el sufrimiento del Señor y sus discípulos. Pedro sería aquí también portavoz de la comunidad de discípulos al igual que en 16,16 con su confesión de fe .

La reacción de Jesús es también inmediata y con una frase muy fuerte pues lo llama “satanás”; y le manda volver a ubicarse detrás de Él. En efecto, tal sería el sentido exacto de la expresión: "vete detrás de mí, satanás" (ὕπαγε ὀπίσω μου, σατανᾶ·), que nos recuerda la invitación al seguimiento que Jesús ya le había hecho a Pedro y a Andrés en Mt 4,19: "venid detrás de mí" (deu/te ovpi,sw mou); y la que hará a todos los que quieran seguirlo a continuación (Mt 16,24: qe,lei ovpi,sw mou evlqei/n). Pero también nos recuerda la frase de Jesús a satanás al final de la tercera tentación en el desierto en Mt 4,10: "retírate Satanás" ({Upage( Satana). 

Las palabras y la actitud de Pedro son para Jesús un "escándalo" (σκάνδαλον). Esta expresión significa “inducir a pecado”, ser "piedra de tropiezo". Teniendo en cuenta este sentido de la palabra "escándalo" algunos autores ven una clara contraposición con Mt 16,18 donde Jesús llamó a Pedro "roca" sobre la que edificará su Iglesia. Aquí Pedro, en vez de la piedra firme para edificar se ha vuelto "piedra de tropiezo" que hace caer. Pienso que vale la comparación por cuanto mientras en su confesión de fe Pedro habló movido "no por la carne ni la sangre sino por revelación del Padre", aquí Pedro siente, piensa y habla como hombre, no según Dios: "tus pensamientos no son los de Dios sino los de los hombres" (Mt 16,23). 

El camino de Jesús es también el camino de la Iglesia, de sus discípulos. Por eso Jesús, acto seguido, presenta a sus discípulos el camino de la cruz como paso obligado para "el que quiera seguirlo". Como bien nota U. Luz , "la pasión de Jesús y el seguimiento de los discípulos se implican". Son tres las acciones que Jesús pide a los que quieren “ir detrás de Él”: “negarse a sí mismo” (este verbo se usa para las negaciones de Pedro en Mt 26,34.35.75); “tomar o levantar su cruz” (la misma expresión describe la acción de Simón de Cirene en Mt 27,32) y “seguirlo”. 

“Negarse a sí mismo” literalmente significa “decir que no”, “rehusarse”; pero en el contexto se entiende como un olvidarse de sí mismo, no mirar por sí mismo ni por sus propios intereses a la hora de decidir, sino por los de Jesús como exclusivos.

El tomar “tomar la cruz y seguirlo” ya se los había pedido Jesús a sus discípulos al final del discurso apostólico (cf. Mt 10,38). Allí veíamos que la expresión “tomar la cruz” implica el estar dispuesto a dar la vida, a perderla por Jesús. Al respecto dice U. Luz que “la expresión «tomar la cruz» conecta directamente con la costumbre romana de que el condenado llevara su propia cruz al lugar del suplicio. El dicho se refiere entonces a la pena capital que amenazaba a los seguidores, y significa literalmente: el seguidor debe hacerse a la idea de morir ajusticiado. Así, la disposición a la muerte se establece como la condición para ser discípulo” . De la misma opinión es L. H. Rivas , aunque amplia el sentido de la cruz abarcando deshonra, acusaciones, azotes, burlas…

Le sigue un “porque” (γάρ) que dan razón de las renuncias y abre el horizonte a la vida verdadera. Negarse a sí mismo y tomar la cruz implican estar dispuesto a perder la vida, pero para salvarla; implica perderla por Cristo, pero para encontrarla. Luego, con tono sapiencial, invita a reflexionar sobre el valor superior de la vida cuyo único garante es Dios.

Al final, así como el anuncio de la pasión terminaba haciendo referencia a la resurrección al tercer día; así también el camino de la cruz del discípulo termina con la promesa de la recompensa por parte del "hijo del hombre" en el juicio final. 

Algunas reflexiones:


Pienso que es inevitable sentir cierta "incomodidad" ante el evangelio de hoy y es importante no evadirse ante estos sentimientos ni cargarse de sentimiento de culpa pues el misterio de la cruz es una realidad difícil de asimilar, de "digerir". Por eso nuestra identificación con Pedro es aquí clara y total, por cuanto reacciona ante la cruz como "hombre", tiene los sentimientos, los pensamientos y la valoración propia de un hombre ante la cruz. Pero de un hombre de Iglesia, llamado a ser guía de sus hermanos en la fe. 

Al respecto comenta H. U. von Balthasar : “Cuando Jesús presenta en el evangelio el programa decisivo de su misión, no es solamente el mundo el que se escandaliza de la cruz, sino también y en primer lugar la Iglesia. Esta Iglesia se compone de hombres, todos los cuales querrían huir lo más lejos posible y durante el mayor tiempo posible del sufrimiento”.

Por su parte, decía el Papa Francisco en el ángelus del 30 de agosto de 2020: “Para Pedro y los otros discípulos —¡pero también para nosotros!— la cruz es algo incómodo, la cruz es un “escándalo”, mientras que Jesús considera “escándalo” el huir de la cruz, que sería como eludir la voluntad del Padre, a la misión que Él le ha encomendado para nuestra salvación”. 

Comentando el sentido del término scandalon en Mt 16,23 dice J. Ratzinger: "El que por don de Dios puede ser sólida roca, es por sí mismo una piedra en el camino, que puede hacer tropezar. La tensión entre el don que viene del Señor y la propia capacidad resulta tan evidente que produce escalofríos; aquí, de algún modo, se anticipa todo el drama de la historia del papado, en el curso de la cual nos encontramos siempre con los dos elementos: aquel por el que el papado, gracias a una fuerza que no procede de él mismo, constituye el fundamento de la Iglesia, y el otro, por el que al mismo tiempo los papas particulares, por las características típicas de su humanidad, son constantemente escándalo, por querer preceder a Cristo en lugar de seguirlo; pues creen ellos, con su lógica humana, que deben prepararle el camino que, por el contrario, sólo él puede determinar: "Tus sentimientos no son los de Dios, sino los de los hombres" (16,23)" .

Supuesta esta dificultad o resistencia “ontológica” al anuncio de la cruz, podemos valernos de un ejemplo simple para comprender el evangelio de hoy. Supongamos que vamos en grupo a hacer una excursión por las montañas, hacia un lugar realmente hermoso. El líder del grupo decide el camino que tenemos que seguir y nos aclara que tiene partes difíciles, con subidas empinadas y peligrosas; que exigirá mucho esfuerzo, pero a través del cual se llegará con seguridad y antes del anochecer.

Ahora bien, a mí no me gusta el sacrificio ni el esfuerzo y prefiero ir por otro camino cuyo terreno sea llano y despejado, pero con gran probabilidad de perderme y no llegar. Tengo dos opciones. Elegir confiar y seguir al líder, si quiero llegar seguro. O seguir mi propio camino con riesgo de perderme.

Jesús es nuestro guía hacia el Padre, hacia una vida plena de hijos de Dios. Nos invita a seguirlo hasta allí y nos avisa que para esto tendremos que renunciar a nuestros planes, a seguir nuestro propio camino. Nos dice también que tenemos que estar dispuestos a renunciar a cosas que nos atraen pero nos apartan del camino y nos hacen mal. Que tendremos que continuar siempre detrás de Él aceptando y asumiendo todo el mal que nos suceda, las cruces de la vida; y tener la disponibilidad de entregar nuestra vida por los demás para poder tenerla.

Ante esta propuesta, tan sincera de parte del Señor, es muy posible que nuestra primera reacción sea como la de Pedro: ¡No Señor, por ese camino no conviene ir! Busquemos algo más cómodo y fácil. Entonces el Señor nos explica que los caminos de Dios no son como los nuestros, ni tampoco sus tiempos. Que la fe en Jesús implica confiar en Él que tiene el “pensamiento de Dios” y nos llevará hacia el Padre. Es, sin duda, un momento de prueba y decisión; y la invitación a seguirlo es siempre actual.

También a nosotros, como a Pedro, nos molesta ese "es necesario" (dei-) mediante el cual se presenta la cruz como plan de Dios. Igualmente podemos identificarnos con el lamento de Jeremías, primera lectura de hoy, cuando el rechazo y el oprobio son la recompensa que recibimos de aquellos a los que llevamos la Palabra de Dios. 

La aceptación del camino de la cruz como camino de salvación supera los intentos de mera comprensión intelectual del mismo. Hay que remitirse, necesariamente, al amor del Padre que se esconde detrás del misterio de la pasión del Hijo: “Sí, Dios amó tanto al mundo, que entregó a su Hijo único para que todo el que cree en él no muera, sino que tenga Vida eterna” (Jn 3,16). 

Sólo desde esta aceptación-comprensión de la cruz de Cristo podemos iluminar nuestro propio camino de la cruz, también "necesario" para ser discípulos. Nos encontramos, entonces, con el desafío pedagógico de asumir y ayudar a asumir la verdad de la cruz, como nos enseña A. Cencini : "En un ámbito más personal y subjetivo, la centralidad de la cruz significa el descubrimiento "positivo" – por así decirlo – de la cruz de Cristo como momento de la verdad, de lo que más que cualquier otra cosa o evento o palabra o prodigio dice la verdad de Dios y de su proyecto de salvación, así como del hombre y de su historia […] la cruz es la verdad de la vida y de la muerte, porque revela el nexo indisoluble que une la vida a la muerte, nexo que está constituido por el amor, por el don de sí. La vida, tal como la explica la cruz, nace del "amor-que-se-dona", y tiende al mismo "amor-que-se-dona". Se vive y se muere por el mismo motivo, porque el amor recibido tiende, por su propia naturaleza, a volverse amor donado. Y todo esto es dicho por la cruz de Jesús, que es la máxima expresión del amor más grande, aquel que viene de Dios, y es al mismo tiempo el más fuerte y expresivo símbolo del misterio de la vida y de la muerte del hombre".

También aquí la aceptación del camino de la cruz como negación de sí mismo y como exigencia ascética está precedida, motivada y encauzada por el amor a Dios. En efecto, “negarse se refiere al vencer la tentación primera, aquella que tuvo Adán en el paraíso cuando quiso afirmarse a sí mismo haciéndose como Dios (Gn 3,2ss) y que sigue afectando de tantas formas a todo hombre mediante el egoísmo. «Tomar la cruz» no es tener un extraño e inhumano amor al sufrimiento, más bien es aceptar la propuesta divina de apertura y donación por sobre la propia tendencia al egoísmo (ver v. 24) […] La propuesta de Cristo es en síntesis, cambiar de mentalidad (como lo aclara a Pedro, quien aún piensa como los hombres); el resto viene a ser la conclusión lógica en el camino del seguimiento, y es la configuración con Él…” .


El camino de la cruz tiene también una dimensión "pastoral", muy poco tenida en cuenta, aunque en LG nº 8 leemos: "Como Cristo efectuó la obra de la redención en pobreza y persecución, de igual modo la Iglesia está llamada a recorrer el mismo camino a fin de comunicar los frutos de la salvación a los hombres". Al respecto Gerardo Cardaropoli  señala que "Cristo salva al mundo por medio de la Iglesia, con la condición de que esta se adecue a su misterio pascual, en el que la gloria de la resurrección no se alcanza sino a través del paso de la cruz. Aquí está la profunda renovación de la pastoral. La "teología de la cruz" ha de llegar a ser "metodología de la cruz" para toda la obra salvífica".

Por su parte, A. Rodríguez Carmona nota que toda esta nueva sección del evangelio de Mateo (16,21-20,15) está claramente estructurada por los tres anuncios de la pasión que van seguidos por enseñanzas sobre la edificación de la Iglesia. Esto conlleva un profundo sentido, por cuanto "para Mateo, la vivencia de estas enseñanzas (opción total por Jesús, compartir, servicio, hacerse niño, etc.) tiene carácter de muerte y resurrección, y es la manera concreta de colaborar en la construcción de la Iglesia. La ética cristiana tiene un carácter pascual y eclesial; ahora bien, esto sólo lo entiende el que comprende la muerte y resurrección de Jesús" .

Este dinamismo “pascual” es propio de la misión, tal como nos enseña el Papa Francisco al decirnos que “cuando la Iglesia convoca a la tarea evangelizadora, no hace más que indicar a los cristianos el verdadero dinamismo de la realización personal: «Aquí descubrimos otra ley profunda de la realidad: que la vida se alcanza y madura a medida que se la entrega para dar vida a los otros. Eso es en definitiva la misión». (EG n° 10).

Y también nos advierte del peligro de caer en una “acedia egoísta por no saber esperar y querer dominar el ritmo de la vida. El inmediatismo ansioso de estos tiempos hace que los agentes pastorales no toleren fácilmente lo que signifique alguna contradicción, un aparente fracaso, una crítica, una cruz” (EG n 82).

PARA LA ORACIÓN (RESONANCIAS DEL EVANGELIO EN UNA ORANTE):


Desde aquel día


Desde aquel día, la incertidumbre y la zozobra

Todo lo invadía

La sensación del abandono desconocido

El olvido y la indiferencia

Se hacían parte de la vida


Nos defendíamos pensando historias

En las tardes vacías

Haciendo memoria

De tanta aventura vivida

Y allí estabas Tú, incomprendido


La ignorancia es para Satanás

El caldo de cultivo

Y nos aferrábamos a lo vivido

Un imaginado trono rodeado de pajes

Falsos personajes


¡Era tan sencillo! ¿Por qué entonces?

Perder la vida, 

Dejar los sueños del triunfo y la gloria

El sabor del poder y la política

¡Hay Señor, haznos comprender…!


La esperanza no sea cosa perdida

Haznos pacientes hasta tu Venida

La obra siempre comienza

Que las manos estén curtidas

¡Te rogamos!


Envíanos Señor tu Espíritu

Para entregarte las renuncias, 

La pobreza recogida

El amor sembrado con tu fuerza

La misión cumplida. Amén