Lições

Não aprendi a colher a flor

sem esfacelar as pétalas.

Falta-me o dedo menino

de quem costura desfiladeiros.

Criança, eu sabia

suspender o tempo,

soterrar abismos

e nomear as estrelas.

Cresci,

perdi pontes,

esqueci sortilégios.

Careço da habilidade da onda,

hei-de aprender a carícia da brisa.

Trémula, a haste

me pede

o adiar da noite.

Em véspera da dádiva,

a faca me recorda, no gume do beijo,

a aresta do adeus.

Não, não aprenderei

nunca a decepar flores.

Quem sabe, um dia,

eu, em mim, colha um jardim?

(Maputo, 2006)

- Mia Couto -