JÁ NÃO VIVO, SÓ PENSO

Já não vivo, só penso. E o pensamento

é uma teia confusa, complicada,

uma renda subtil feita de nada:

de nuvens, de crepúsculos, de vento.

Tudo é silêncio. O arco-íris é cinzento,

e eu cada vez mais vaga, mais alheada.

Percorro o céu e a terra aqui sentada,

sem uma voz, um olhar, um movimento.

Terei morrido já sem o saber?

Seria bom mas não, não pode ser,

ainda me sinto presa por mil laços,

ainda sinto na pele o sol e a lua,

ouço a chuva cair na minha rua,

e a vida ainda me aperta nos seus braços.

Fernanda de Castro, in "E Eu, Saudosa, Saudosa"