Rodolfo Calligaris

Trabalho e justiça social ante os desígnios de Deus

Rodolfo Calligaris (1913-1975)

Professor de Português, expositor, escritor e benfeitor brasileiro

Diretor da Escola SENAI da Ferrovia - SP

Diretor-Fundador do Lar Espírita Esperidião Prado

Diretor da Casa dos Espíritas

Extraído e adaptado de:

As Leis Morais, de Rodolfo Calligaris

A LEI DO TRABALHO

O trabalho é uma lei da natureza a que ninguém se pode esquivar sem se prejudicar, pois é por meio dele que o homem desenvolve sua inteligência e aperfeiçoa suas faculdades.

O trabalho honesto lhe fortalece o sentimento de dignidade pessoal, fá-lo respeitado pela comunidade em que vive e, quando bem realizado, contribui para lhe dar a sensação de segurança, três coisas fundamentais que todos buscamos.

Para que o homem tenha êxito no trabalho, e como tal deve-se entender não necessariamente o ganho de muito dinheiro, mas uma constante satisfação íntima, faz-se mister que cada qual se dedique a um tipo de atividade de acordo com suas aptidões e preferências, sem se deixar influenciar pela vitória de outrem nesta ou naquela carreira, porquanto cada arte, ofício ou profissão exige determinadas qualidades que nem todos possuem.

Quem não consiga uma ocupação condizente com o que desejaria deve, para não ser infeliz, adaptar-se ao trabalho que lhe tenha sido dado, esforçando-se por fazê-lo cada vez melhor, mesmo que seja extremamente fácil. Isso ajudará a gostar dele. Quando se trate de algo automatizado que não permita qualquer mudança, como acontece em muitas fábricas modernas, o remédio é se compenetrar de que sua função na empresa também é importante, assumindo a atitude daquele modesto operário cujo serviço era quebrar pedras e que, interrogado sobre o que fazia, respondeu com entusiasmo: “Estou ajudando a construir uma catedral”.

Importa, igualmente, que se adquira a convicção de que embora apenas alguns poucos possam ser professores, médicos, engenheiros, advogados ou administradores, todos, indistintamente, desde que desenvolvam um trabalho prestadio, estão dando o melhor de si, concorrendo, assim, para o progresso e o bem-estar social, como lhes compete.

De outro lado, pelo fato de ser uma lei natural, o trabalho deve ser assegurado a todos os homens válidos que o solicitem, para que em contrapartida lhes seja exigido que provejam às necessidades próprias e da família, sem precisarem pedir nem aceitar esmolas.

O desemprego e, consequentemente, a fome, a nudez, o desabrigo, a enfermidade, a prostituição, o crime, etc., constituem provas de que a sociedade se acha mal organizada, carecendo de reformas radicais que melhor atendam à justiça social.

Como acertadamente disse Constâncio C. Vigil,

constitui dolorosa anomalia deixar o ser humano em situação de não poder se defender da miséria, até delinquir ou morrer. O desempregado tem direito à vida. Por conseguinte, o Estado só pode castigá-lo pelo roubo se lhe proporciona meios para assegurar a subsistência através do trabalho.

Sujeitar, portanto, irmãos nossos à condição de párias, enquanto incontáveis hectares de terra permanecem inexplorados, nas mãos do Estado ou de uns poucos ambiciosos que os foram acumulando, como se fossem títulos negociáveis, é um crime de lesa-humanidade.

Os governos devem fazer que as terras devolutas ou mal aproveitadas sejam devidamente cultivadas.

Uma distribuição pura e simples de pequenos lotes a homens desprovidos de conhecimentos e de recursos pecuniários para o seu trato não será, entretanto, suficiente para a colimação desse objetivo. É indispensável lhes prestar, também, assistência técnica e ajuda financeira, de modo que, conjugando-se, capital e trabalho bem orientados, tornem viável a fecundação do solo e a erradicação da indigência que assola tão vastas áreas do mundo.

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Os que supõem que seja o trabalho apenas um “ganha pão”, sem outra finalidade que não a de facultar os meios necessários à existência, laboram em erro. Se o fosse, então todos aqueles que possuíssem tais meios em abundância poderiam se julgar desobrigados de trabalhar.

Em verdade, porém, a lei de trabalho não isenta ninguém da obrigação de ser útil. Ao contrário, quando Deus nos favorece, de maneira que possamos nos alimentar sem verter o suor do próprio rosto, evidentemente não é para que nos entreguemos ao hedonismo, mas para que movimentemos na prática do bem os “talentos” que nos haja confiado.

Isso constitui uma forma de trabalho que engrandece e enobrece nossa alma, tornando-a rica daqueles tesouros que “a ferrugem e a traça não corroem, nem os ladrões podem roubar”.  

—  RODOLFO CALLIGARIS

As leis morais, "A lei do trabalho".