Tomás de Aquino

As cinco vias para a existência de Deus

Ver Exposição moderna das provas da existência de Deus (com vídeos) – Orlando Fedeli 

Tomás de Aquino (1225-1274)

Extraído de:

Suma Teológica, part. I, q. 2, a. 3, de Tomás de Aquino


DEUS EXISTE?

                       Objeções pelas quais parece que Deus não existe.

1. De dois contrários, se um é infinito, o outro fica totalmente anulado. Mas é isso que se entende com o nome Deus, isto é, que se trata de um bem infinito. Assim, se Deus existisse, nenhum mal encontraríamos. Ora, encontra-se o mal no mundo. Logo, Deus não existe.

2. Ademais. O que pode ser realizado por poucos princípios, não se realiza por muitos. Ora, parece que tudo que é observado no mundo pode ser realizado por meio de outros princípios, suposto que Deus não exista. Porque o que é natural encontra seu princípio na natureza, e o que é livre, na razão humana ou na vontade. Então, não é necessário afirmar que Deus existe.

Ao contrário, está o que é dito em Êxodo 3:14 sobre a pessoa de Deus: “Eu Sou Aquele que É”.

Solução. Pode-se provar a existência de Deus por cinco vias. 1) A primeira e mais manifesta via parte do movimento. É certo, e nossos sentidos constatam, que algumas coisas se movem neste mundo. Ora, tudo que se move é movido por outro. Nada é movido que não esteja em potência em relação ao fim de seu movimento; ao contrário, o que move o faz enquanto está em ato. Portanto, mover nada mais é do que levar algo da potência ao ato. Nada pode ser levado da potência ao ato, a não ser por um ente em ato. Algo quente em ato, como o fogo, torna a madeira, que é quente em potência, quente em ato, e assim a move e altera. Não é possível que o mesmo ser, sob o mesmo aspecto, esteja simultaneamente em ato e potência, a não ser sob aspectos diversos: por exemplo, o que é quente em ato não pode ser simultaneamente quente em potência, mas é frio em potência. É impossível que, sob o mesmo aspecto e do mesmo modo, algo seja motor e movido, ou que mova a si mesmo. É preciso que o que se move seja movido por outro. Se o que move também é movido, necessariamente é movido por outro; e este, ainda por outro. Aqui, porém, não se pode proceder até o infinito: pois assim não haveria um primeiro motor; e, por conseguinte, tampouco outros motores, pois os motores segundos não se movem, a não ser pelo movimento do primeiro motor; como uma bengala não se move, a menos que seja movida pela mão. Logo, é necessário chegar a um primeiro motor, que por nenhum outro é movido: e este, todos entendem ser Deus.

2) A segunda via parte da razão de causa eficiente. Encontramos, nas realidades sensíveis, a existência de uma ordem entre as causas eficientes. Mas não se encontra, nem é possível, que algo seja causa eficiente de si próprio; pois, assim, seria anterior a si próprio, o que é impossível. Tampouco é possível, entre as causas eficientes, proceder até o infinito. Porque, em todas as causas eficientes ordenadas, a primeira é a causa das intermediárias e as intermediárias são a causa da última, sejam as intermediárias muitas ou apenas uma. Por outro lado, removida a causa, remove-se o efeito: logo, se não existisse a primeira entre as causas eficientes, não haveria a última nem a intermediária. Mas, se procedêssemos até o infinito na série das causas eficientes, não haveria causa primeira: e, assim, também não haveria efeito último nem causa eficiente intermediária, o que é evidentemente falso. Logo, é necessário afirmar uma causa eficiente primeira: a que todos chamam Deus.

3) A terceira via é tomada do possível e do necessário. Ei-la. Encontramos, entre as coisas, as que podem ser ou não ser: com certeza, encontram-se algumas que nascem e perecem, consequentemente, podem ser e não ser. É impossível, para tudo de tal natureza, sempre ser: pois o que pode não ser, em algum momento não é. Então, se tudo pode não ser, houve um momento em que nada havia. Mas, se isso é verdadeiro, ainda agora nada existiria: pois o que não é, não começa a ser senão por meio de algo que já é. Por conseguinte, se não havia nenhum ente, seria impossível que algo começasse a ser, e, desse modo, nada existiria: o que é falso. Logo, nem todos os entes são possíveis: mas é preciso que algo seja necessário entre as coisas. Tudo, pois, que é necessário, ou tem a causa de sua necessidade em outro, ou não tem. Aqui também não é possível proceder até o infinito na série dos necessários que têm uma causa da sua necessidade, assim como nas causas eficientes, como está provado. Logo, é preciso afirmar algo que seja necessário por si, que não tenha a causa de sua necessidade em outro, mas que seja causa da necessidade para os outros: o que todos chamam Deus.

4) A quarta via se toma dos graus que encontramos nas coisas. Encontram-se, entre as coisas, algumas mais e menos boas, verdadeiras, nobres: e assim de outras semelhantemente. Porém, mais e menos se dizem de coisas diferentes conforme elas se aproximam diferentemente daquilo que é máximo: assim, mais quente é o que mais se aproxima do quente máximo. Existe, então, algo que é verdadeiríssimo, boníssimo, nobilíssimo e, por conseguinte, ente máximo: pois o que é máxima verdade é máxima existência, como mostrado [por Aristóteles] em Metafísica, II. Por outro lado, o dito máximo em algum gênero é causa de tudo que é desse gênero: assim, o fogo, que é quente máximo, é causa de todas as coisas aquecidas, como explicado no mesmo livro. Logo, existe algo que, para todos os entes, é causa de ser, de bondade e de toda a perfeição: e a este chamamos Deus.

5) A quinta via é tomada do governo das coisas. Vemos, com efeito, que algumas coisas carentes de conhecimento, como os corpos naturais, operam em vista de um fim: o que se manifesta pelo fato de que, sempre ou frequentemente, operam do mesmo modo, a fim de conseguirem o melhor. Fica claro que não é por acaso, mas por uma intenção que chegam ao fim. Aquilo, pois, que não tem conhecimento não tende a um fim, a não ser dirigido por algum conhecedor e inteligente, como a flecha pelo arqueiro. Logo, existe algo inteligente, pelo qual todas as coisas naturais são ordenadas ao fim: e a isso chamamos Deus.

Resposta às objeções: 1. À primeira, deve-se dizer: Como diz Agostinho, no Manual: “Deus, que é sumamente bom, de nenhum modo permitiria que qualquer mal existisse em suas obras, se não fosse a tal ponto poderoso e bom para poder fazer o bem a partir do próprio mal”. Logo, à infinita bondade de Deus pertence permitir males para deles tirar o bem.

2. À segunda, deve-se dizer: Como a natureza, em vista de um fim determinado, opera pela direção de um agente superior, é necessário que tudo o que a natureza faz chegue a Deus, assim como à causa primeira. Similarmente, tudo o que é feito por uma livre decisão é necessário fazer chegar a uma causa superior, além da razão ou da vontade humana: tudo que é mutável e falível é preciso, então, que chegue a um primeiro princípio imóvel e necessário por si, como acabamos de mostrar.

 

—  TOMÁS DE AQUINO

Suma Teológica, parte 1, q. 2, art. 3.

Ver Exposição moderna das provas da existência de Deus (com vídeos) – Orlando Fedeli 

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