MEDO DE MORRER
Rodrigo, 29 anos, procura o cardiologista com queixa de uma persistente palpitação no peito, cansaço fácil e tensão muscular, há pelo menos 8 meses. Está cada vez mais preocupado com isso, chega a imaginar que está infartando. Resolveu procurar o atendimento médico, pois semana passada, enquanto fazia compra com sua mãe, teve uma crise de dor no peito, sensação iminente de morte, acompanhado de taquicardia, sudorese e tremores. Esse episódio durou menos de 5 minutos, mas foi grave o suficiente para achar que ia morrer. Desde então tem evitado frequentar lugares muito movimentados ou grandes. Está passando por fortes pressões no trabalho e tem certeza que não dará conta, fica noites sem dormir, pois apresenta dificuldade para iniciar e manter o sono.
Além disso, está preocupado com seu casamento que ocorrerá no prazo de um ano, sua noiva está a frente da organização da festa, porém ele fica preocupado em não conseguir dividir as despesas com ela.
Relata fazer uso de álcool duas ou três vezes por semana, no máximo duas latinhas de cerveja a cada ocasião, entretanto nota que com seu estado de preocupação atual, está bebendo mais. Não faz uso de cigarro e nem de outras substâncias psicoativas.
No exame físico apresenta-se com FC 96, FR 18, PA 130x90, ausculta cardíaca normal e sem outras alterações no restante do exame físico. O ECG não evidenciou alterações. Apesar disso, ainda tem dúvida se não está com problemas cardíacos ocultos.
O cardiologista tentou tranquilizá-lo que não havia nenhuma doença cardíaca no momento e o encaminhou para psiquiatria. Relutante, ele foi e lá se sentiu bem acolhido. Foi orientado iniciar psicoterapia individual, além da prescrição de desvenlafaxina 50mg por dia e durante o início do tratamento stilnox CR 6,25mg (zolpidem de liberação lenta) por no máximo duas semanas. Após 30 dias, já se sentia melhor, mas lhe foi recomendado pelo menos 1 ano e meio de medicação, além de concluir suas sessões de psicoterapia.
IDENTIFICAÇÃO: Rodrigo, 29 anos
PROBLEMAS: grifados.
HIPÓTESES:
1. Paciente tem ansiedade, mas teve uma fase aguda de pânico. Exames físicos sem alterações dignas de nota. (Transtorno de Ansiedade Generalizado?)
2. Para ansiedade, é melhor utilizar recaptadores de serotonina e noradrenalina (gerar relaxamento).
3. Alterações dos sintomas físicos: insônia. o quadro de rodrigo é um quadro psiquiátrico que manifestou sintomas físicos como a insônia (por suas preocupações?) razão pela qual foi prescrito zolpidem para o paciente.
4. A preocupação extrema + stress podem agravar o quadro do transtorno de ansiedade, levando muitas vezes a uma crise.
5. O álcool (depressor do sistema nervoso) foi utilizado como um mecanismo de relaxamento, mas iniciou-se um quadro de abuso.
QUESTÕES DE APRENDIZAGEM:
1. Explique a epidemiologia do transtorno de ansiedade.
2. Explique a fisiopatologia do transtorno de ansiedade.
3. Explique o quadro clínico e como fazer o diagnóstico da ansiedade.
4. Qual o tratamento farmacológico e não farmacológico do transtorno de ansiedade?
5. Explique os mecanismos de ação do zolpidem e da desvenlafaxina.
6. Crise de pânico x crise de ansiedade: qual a diferença? Explique.
7. Fobia, medo, pânico: diferencie as condições e características que as diferem.
8. Quais são as fases da insônia? Explique-as.
9. Quanto de álcool se considera abuso? Correlacione o uso/abuso do álcool com a ansiedade.
QUESTÕES DE APRENDIZAGEM:
1. Explique a epidemiologia do transtorno de ansiedade.
A ansiedade é um estado mental suscitado em antecipação a uma ameaça ou a uma ameaça potencial, resultando em um estado de maior vigilância. É caracterizada por experiências subjetivas, como preocupações, tensão e alterações fisiológicas, incluindo sudorese e tontura, bem como aumento da pressão arterial e da frequência cardíaca. Esse estado emocional pode ser desencadeado por estímulos que não representam perigo imediato ou pode ser gerado por estímulos internos (p. ex., sensações corporais). A ansiedade ocasional, ou adaptativa, é parte normal da experiência humana, ajudando na sobrevivência dos indivíduos ao aumentar sua consciência e permitir respostas rápidas a possíveis perigos. Embora pessoas saudáveis experimentem episódios esporádicos de ansiedade, quando persistente, disruptiva ou desproporcional ao perigo real, ela pode ser debilitante e considerada patológica.
A ansiedade clínica (ou patológica) sempre esteve presente na história humana. Em 1621, Robert Burton descreveu os sintomas de ataques de ansiedade em seu livro The anatomy of melancholy: “Muitos efeitos lamentáveis que esse medo causa no homem, como ficar vermelho, pálido, tremer, suar, sentir frio e calor repentinos se espalharem por todo o corpo, palpitações no coração, síncope, etc.”. No mesmo livro, Burton citou os escritos de Hipócrates sobre um de seus pacientes, que aparentemente sofria do que hoje é chamado de transtorno de ansiedade social: “Ele não se atreve a fazer companhia por medo de ser mal compreendido, desonrado [...] ele acha que todo homem o observa”.
Os transtornos de ansiedade podem ser conceituados não apenas de modo categorial, mas também de modo dimensional, variando, dentro do espectro, de formas subclínicas a apresentações muito graves. Para ilustrar, o transtorno de ansiedade social (ou fobia social) abrange ansiedade social leve (p. ex., ansiedade em situações de desempenho que prejudica o funcionamento em reuniões de trabalho), ansiedade social moderada (p. ex., ansiedade em várias situações interativas que prejudica o desempenho no trabalho e as relações sociais) e ansiedade social grave (p. ex., ansiedade em quase todas as situações que resultam em interação social, podendo levar a perda de emprego e completo isolamento social). Embora o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e o transtorno obsessivo-compulsivo (TOC) tenham sido historicamente incluídos na categoria transtorno de ansiedade do DSM, eles foram movidos para módulos adjacentes no DSM-55 e não serão abordados aqui.
PREVALÊNCIA
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), um em cada quatro indivíduos apresenta ou já apresentou um transtorno de ansiedade. A estimativa de prevalência ao longo da vida é variável entre os países, podendo situar-se entre 4,8% na China, 31% nos Estados Unidos e 9,3% no Brasil, oscilando devido a variações na coleta das informações, perfil e características das amostras avaliadas, critérios diagnósticos utilizados e potenciais aspectos culturais.
Globalmente, a prevalência em 12 meses é um pouco menor que a prevalência ao longo da vida, indicando que esses transtornos são relativamente persistentes. Ademais, essas condições em geral ocorrem no início da vida.
Além disso, mais da metade dos pacientes com um transtorno de ansiedade apresenta múltiplos transtornos de ansiedade comórbidos.
IDADE DE INÍCIO
Grande parte dos transtornos de ansiedade se manifesta já na infância, sendo que sua prevalência de 12 meses na infância e na adolescência é semelhante à observada em adultos. Fobias e TAS têm início particularmente precoce, com maior risco de incidência entre os 6 e os 17 anos de idade. No entanto, para alguns transtornos de ansiedade, como o TAG, os sintomas podem surgir na idade adulta e no final da vida.
A idade de início média estimada para os transtornos de ansiedade, de modo geral, foi de 21,3 anos. Tal estimativa é menor para o TAS (10,6 anos), seguido por fobia específica (11,0 anos). Por sua vez, as idades de início médias estimadas foram maiores para o TP (30,3 anos) e o TAG (34,9 anos).
VULNERABILIDADES ASSOCIADAS AOS TRANSTORNOS DE ANSIEDADE
Diversos fatores de risco podem favorecer a modificação do curso da ansiedade normal para a patológica, incluindo ser do sexo feminino, utilizar drogas e apresentar histórico familiar de transtornos de ansiedade ou depressão. Ser do sexo feminino duplica o risco de desenvolver transtornos de ansiedade, embora as razões para tanto ainda não sejam totalmente conhecidas.
Ter pais com ansiedade e depressão aumenta o risco de desenvolver um transtorno de ansiedade, particularmente TP e TAG. Os filhos de indivíduos que apresentam pelo menos um transtorno de ansiedade têm risco aumentado em duas a quatro vezes para esses transtornos. Ademais, têm maiores chances de desenvolver transtornos de ansiedade em uma idade mais precoce do que os filhos de indivíduos sem o transtorno. Esses fatos demonstram que aspectos genéticos, ao menos parcialmente, contribuem para o desenvolvimento dos transtornos de ansiedade.
Outros fatores de risco incluem alterações temperamentais específicas, como temperamento inibido, interações entre pais e filhos caracterizadas por controle e negatividade, além de sociabilidade reduzida. Em adultos jovens, fatores estressores da vida, como estresse financeiro, doença familiar e divórcio, podem prever sintomas e diagnósticos de transtornos de ansiedade subsequentes.
O tabagismo e o abuso de álcool também são fatores de risco para esses transtornos, estando associados epidemiologicamente. No entanto, as associações são bidirecionais e a causalidade não é comprovada.
Enquanto pode ser normal ou até mesmo adaptativo ficar ansioso ao ser atacado por um tigre-dentes-de-sabre (ou algo equivalente), existem muitas circunstâncias em que a ansiedade não é adaptativa e constitui um transtorno psiquiátrico. A ideia de ansiedade como transtorno psiquiátrico está evoluindo rapidamente e caracteriza-se pelo conceito de sintomas centrais, ou nucleares, de medo e preocupação excessivos. Em contrapartida, a depressão maior caracteriza-se por sintomas centrais de humor deprimido ou perda de interesse.
Os transtornos de ansiedade apresentam considerável sobreposição de sintomas com a depressão maior, particularmente transtorno do sono, problemas de concentração, fadiga e dificuldades psicomotoras/de ativação. Cada transtorno de ansiedade apresenta, ainda, várias sobreposições de sintomas com outros transtornos de ansiedade. Os transtornos de ansiedade também estão associados a extensa comorbidade, não apenas com a depressão maior, mas também uns com os outros, visto que muitos pacientes demonstram ter, com o passar do tempo, um segundo ou, até mesmo, um terceiro transtorno de ansiedade concomitante. Por fim, os transtornos de ansiedade são frequentemente comórbidos com muitas outras condições, como uso abusivo de substâncias, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, transtorno bipolar, transtornos dolorosos, transtorno do sono e outros.
Desse modo, o que vem a ser um transtorno de ansiedade?
Todos esses transtornos parecem manter as características centrais de algum tipo de ansiedade ou medo associados a algum tipo de preocupação. No entanto, sua história natural ao longo do tempo revela que eles se transformam uns nos outros e evoluem para a expressão de uma síndrome completa de sintomas de transtornos de ansiedade. Em seguida, retornam a níveis subsindrômicos de sintomas, para reaparecer outra vez como o transtorno de ansiedade original, como um transtorno de ansiedade diferente ou como depressão maior. Se todos os transtornos de ansiedade compartilham sintomas centrais de medo e preocupação e, como será discutido mais adiante, se todos eles são basicamente tratados com os mesmos fármacos, como muitos daqueles usados na depressão maior, surge a questão: qual é a diferença entre um transtorno de ansiedade e outro? Também poderíamos perguntar: qual é a diferença entre a depressão maior e os transtornos de ansiedade? Todos os transtornos são realmente diferentes, ou representam, na verdade, aspectos distintos da mesma doença?
Sobreposição do transtorno depressivo maior e dos transtornos de ansiedade. Embora os sintomas nucleares dos transtornos de ansiedade (ansiedade e preocupação) sejam diferentes dos sintomas nucleares da depressão maior (perda de interesse e humor deprimido), existe considerável sobreposição entre os demais sintomas associados a esses transtornos (compare o quebra-cabeça dos “transtornos de ansiedade” à direita com o quebra-cabeça do “TDM” à esquerda). Por exemplo, fadiga, dificuldades de sono e problemas de concentração são comuns em ambos os tipos de transtornos.
Transtorno de ansiedade generalizada (TAG). São mostrados aqui os sintomas tipicamente associados ao TAG. Envolvem sintomas nucleares de ansiedade generalizada e preocupação, bem como excitação, fadiga, dificuldade de concentração, problemas no sono, irritabilidade e tensão muscular. Muitos desses sintomas, inclusive os nucleares, também aparecem em outros transtornos de ansiedade.
Transtorno de pânico. São mostrados aqui os sintomas característicos do transtorno de pânico, tendo como os nucleares a ansiedade antecipatória e a preocupação sobre os ataques de pânico. Os sintomas associados consistem nos próprios ataques de pânico inesperados e esquiva fóbica ou outras alterações comportamentais associadas à preocupação sobre os ataques de pânico.
Ansiedade: o fenótipo. A ansiedade pode ser desconstruída ou decomposta em dois sintomas nucleares: medo e preocupação. Esses sintomas aparecem em todos os transtornos de ansiedade, embora o que os desencadeia difira de um transtorno para outro.
Ligação entre sintomas de ansiedade e circuitos. A ansiedade e os sintomas do medo (p. ex., pânico, fobias) são regulados por um circuito centrado na amígdala. Por outro lado, a preocupação é regulada por uma alça corticoestriadotalamocortical (CETC). Esses circuitos podem estar envolvidos em todos os transtornos de ansiedade, nos quais os diferentes fenótipos não significam ser circuitos únicos, mas disfunções divergentes dentro desses circuitos.
2. Explique a fisiopatologia do transtorno de ansiedade.
OS CIRCUITOS NEURAIS
Os transtornos de ansiedade são um grupo diversificado de condições, e a compreensão atual dos mecanismos neurofisiopatológicos subjacentes a eles reflete essa heterogeneidade. No entanto, algumas generalidades em relação à neurobiologia do medo e da ansiedade são conhecidas. Por exemplo, sabe-se que, quando estímulos ambientais são interpretados como ameaçadores, se origina a ansiedade. Para que essa interpretação ocorra, uma pessoa deve primeiro detectar que os estímulos existem por meio de seus sistemas sensoriais, por meio do córtex sensorial, do tálamo e dos folículos superior e inferior. Uma vez que ameaças importantes são detectadas, ocorre uma interpretação do estímulo que é, em parte, determinada pela experiência anterior do indivíduo e inclui a atribuição de valência ao estímulo via circuitos da amígdala basolateral.
Circuitos neurais envolvidos na ansiedade.
Se os eventos são ou não interpretados como ameaçadores depende do equilíbrio entre os circuitos de apoio e o circuito de comportamentos defensivos. Um mecanismo importante que pode permitir que um sistema se sobreponha ao outro é o recrutamento de determinadas populações definidas pela projeção de neurônios na amígdala basolateral. A valência positiva e a negativa são codificadas por neurônios da amígdala basolateral, sendo interpretadas como situações de recompensa ou medo (sistemas nucleus accumbens e subdivisão centromedial da amígdala, respectivamente). Especificamente, a ativação de neurônios da amígdala basolateral que se projetam para a subdivisão centromedial da amígdala pode influenciar o sistema de interpretação em direção a uma avaliação de ameaça. Outros aspectos que podem contribuir para interpretações de perigo no meio ambiente são, por exemplo, a exposição repetida a fatores estressantes ou estímulos de ameaça que podem causar a potencialização específica de circuitos que promovem comportamentos relacionado à ansiedade, de forma que, em situações ambíguas, os circuitos de ansiedade prevaleçam. Posteriormente, os estímulos interpretados como ansiosos serão avaliados pelo córtex pré-frontal medial, pelo hipotálamo e pela área ventrotegumentar, que, aliados ao córtex motor, ao núcleo parabraquial, à substância cinzenta periaquedutal e ao nucleus accumbens, originarão as respostas somáticas de ansiedade, como dispneia, taquicardia, sudorese, tremores, entre outras.
FATORES GENÉTICOS
Os transtornos de ansiedade apresentam estimativas de herdabilidade entre 30 e 40%. Apesar disso, os loci de risco genético específico e os mecanismos de transmissão familiar ainda não foram totalmente esclarecidos.
INTERAÇÕES GENE-AMBIENTE
Fatores de risco genético podem influenciar a sintomatologia ansiosa em um contexto ambiental. Essas observações clínicas estão em acordo com estudos pré-clínicos que investigam o efeito do estresse no início da vida nos circuitos neurais que promovem a ansiedade. A interação entre os genes e o meio ambiente pode assumir várias formas. A variante genética mais amplamente examinada nos transtornos de ansiedade é a 5-HTTLPR, polimorfismo de SLC6A4 (que codifica o transportador de serotonina), um marcador funcional com duas variantes associadas a diferentes níveis de transcrição de serotonina. O polimorfismo 5-HTTLPR está associado a traços relacionados a ansiedade, maus-tratos e outros eventos negativos da vida que podem aumentar o risco para transtornos de ansiedade.
EIXO HIPOTÁLAMO-HIPÓFISE-ADRENAL
A literatura demonstrou que o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA) encontra-se hiperativado em uma ampla gama de modelos animais de ansiedade. Ademais, níveis reduzidos de cortisol circulante e hipersensibilidade a glicocorticoides têm sido observados nesses transtornos. Esses achados remetem às alterações cerebrais e límbicas encontradas nos transtornos de ansiedade, demonstrando que os glicocorticoides são mediadores cruciais de anormalidades funcionais nesses sistemas cerebrais. Ademais, estudos genéticos mostraram que variações nos genes relacionados aos glicocorticoides são fatores de risco para o desenvolvimento de transtornos ansiosos. No entanto, uma relação entre o eixo HHA e a ansiedade não é encontrada em todas as investigações. As razões para essa variabilidade de resultados ainda não foram totalmente compreendidas, mas ela parece resultar de diferenças no curso do desenvolvimento de cada um dos transtornos, suas cronicidade e sua variabilidade individual.
NEUROTRANSMISSORES
Os níveis plasmáticos de serotonina (5-HT) estão reduzidos nos diversos transtornos de ansiedade. Evidências mostram que algumas subpopulações de neurônios serotoninérgicos do núcleo dorsal e mediano da rafe, por meio de projeções topograficamente organizadas, direcionadas a diferentes alvos cerebrais, têm funções importantes para a fisiopatologia desses transtornos. Podem-se ser citados os neurônios serotonérgicos do núcleo dorsal da rafe, que se projetam para a amígdala, facilitando a expressão do medo condicionado e da ansiedade, bem como para a substância cinzenta periaquedutal, inibindo as respostas comportamentais do tipo fuga, e os neurônios serotonérgicos do mediano da rafe, que apresentam a capacidade de aumentar a resiliência ao estresse. Ademais, o receptor serotonérgico 5-HT1A é estimado como modulador da ansiedade nas suas formas normais e patológicas.
A norepinefrina (NE) é uma catecolamina produzida principalmente no locus coeruleus na ponte. Seu metabolismo e suas funções têm sido avaliados nos transtornos de ansiedade, sendo que a sua hiperfunção é evidenciada em tais transtornos. A NE é considerada um marcador da atividade simpática.
O sistema do ácido gama-aminobutírico (GABA) serve como o mais importante sistema neurotransmissor inibitório do sistema nervoso central. Evidências crescentes apontam para seu envolvimento na fisiopatologia dos transtornos de ansiedade, sendo que os benzodiazepínicos, que atuam no sistema GABA, são utilizados para tratar essas condições.
Amígdala e neurobiologia do medo
A amígdala, núcleo cerebral com formato de amêndoa localizado próximo ao hipocampo, apresenta conexões anatômicas importantes, o que a torna capaz de integrar as informações sensoriais e cognitivas e, em seguida, determinar se haverá ou não resposta de medo. Especificamente, o afeto ou o sentimento de medo podem ser regulados por conexões recíprocas que a amígdala compartilha com áreas essenciais do córtex pré-frontal, as quais regulam as emoções, isto é, o córtex orbitofrontal e o córtex cingulado anterior. Todavia, o medo não é apenas um sentimento. A resposta de medo também pode envolver respostas motoras. Conforme as circunstâncias e o temperamento do paciente, essas respostas motoras podem ser fuga, luta ou paralisação. As respostas motoras de medo são reguladas, em parte, pelas conexões entre a amígdala e a área cinzenta periaquedutal do tronco encefálico (Figura 9.9).
Existem, também, reações endócrinas que acompanham o medo, devido, em parte, a conexões entre a amígdala e o hipotálamo, o que provoca alterações no eixo HHSR (hipotálamo-hipófise-suprarrenal) e, portanto, nos níveis de cortisol. Uma rápida elevação do cortisol pode aumentar a probabilidade de sobrevida quando o paciente se defronta com uma ameaça real, de curta duração. Entretanto, a ativação crônica e persistente desse aspecto da resposta de medo pode levar ao aumento de comorbidades clínicas, como doença arterial coronária e diabetes tipo 2, bem como acidente vascular encefálico e atrofia do hipocampo. A respiração também pode ser alterada durante a resposta de medo, regulada, em parte, pelas conexões entre a amígdala e o núcleo parabraquial no tronco encefálico. Uma resposta adaptativa ao medo consiste em acelerar a frequência respiratória diante de uma reação de luta/fuga para aumentar a probabilidade de sobrevivência. Todavia, em excesso, isso pode levar a sintomas indesejados de dispneia, exacerbação da asma ou falsa sensação de asfixia. Todos eles são sintomas comuns durante a ansiedade e, em particular, durante crises de ansiedade, como os ataques de pânico.
Sentimento de medo. Os sentimentos de medo são regulados por conexões recíprocas entre a amígdala e o córtex cingulado anterior (CCA) e entre a amígdala e o córtex orbitofrontal (COF). Especificamente, pode ser que a hiperexcitação desses circuitos produza sentimentos de medo.
Esquiva. Os sentimentos de medo podem ser expressos por meio de comportamentos como esquiva, que é regulada, em parte, pelas conexões recíprocas entre a amígdala e a substância cinzenta periaquedutal ou central (SCC). Nesse sentido, a esquiva é uma resposta motora e pode ser análoga a ficar paralisado sob ameaça. Outras respostas motoras consistem em lutar ou correr (fugir) para sobreviver às ameaças do ambiente.
Resposta endócrina ao medo. A resposta do medo pode caracterizar-se, em parte, por efeitos endócrinos, como o aumento do cortisol, que ocorrem devido à excitação do eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal (HHSR) pela amígdala. A excitação prolongada do eixo HHSR e a liberação de cortisol podem ter implicações significativas para a saúde, como aumento do risco de doença arterial coronária, diabetes tipo 2 e acidente vascular encefálico.
Resposta respiratória. Podem ocorrer alterações da respiração durante uma resposta de medo. Essas alterações são reguladas pela excitação do núcleo parabraquial (NPB) por meio da amígdala. A excitação inapropriada ou excessiva do NPB pode levar não apenas a aumento da frequência respiratória, mas também a sintomas como dispneia, exacerbação da asma ou sensação de asfixia.
O sistema nervoso autônomo é sintonizado com o medo e tem a capacidade de deflagrar respostas do sistema cardiovascular, como aumento do pulso e da pressão arterial para as reações de luta/fuga e sobrevivência durante ameaças reais. Essas respostas autonômicas e cardiovasculares são mediadas pelas conexões entre a amígdala e o locus coeruleus, a “casa” dos corpos celulares noradrenérgicos. Quando as respostas autonômicas são repetitivas e desencadeadas de modo inadequado ou cronicamente como parte de um transtorno de ansiedade, isso pode levar ao aumento do risco de aterosclerose, isquemia cardíaca, hipertensão, infarto do miocárdio e até morte súbita. “Morrer de susto” pode nem sempre ser um exagero ou uma figura de retórica!
Por fim, talvez a ansiedade seja desencadeada internamente por memórias traumáticas armazenadas no hipocampo e ativadas pelas conexões com a amígdala, especialmente em condições como o transtorno de estresse pós-traumático.
Resposta autonômica ao medo. As respostas autonômicas costumam estar associadas aos sentimentos de medo. Essas respostas envolvem aumento da frequência cardíaca (FC) e da pressão arterial (PA), que são reguladas por conexões recíprocas entre a amígdala e o locus coeruleus (LC). A ativação a longo prazo desse circuito pode levar a aumento do risco de aterosclerose, isquemia cardíaca, alteração da PA, diminuição da variabilidade da FC, infarto do miocárdio (IM) ou mesmo morte súbita.
O hipocampo e a revivência. A ansiedade pode ser desencadeada não apenas por estímulo externo, mas também pelas memórias do paciente. As memórias traumáticas armazenadas no hipocampo podem ativar a amígdala, fazendo com que esta, por sua vez, ative outras regiões cerebrais e produza a resposta de medo. Chama-se isso de revivência, uma característica particular do transtorno de estresse pós-traumático.
O processamento da resposta de medo é regulado pelas numerosas conexões neuronais que fluem para dentro e para fora da amígdala. Cada conexão utiliza neurotransmissores específicos, os quais atuam em receptores específicos (Figura 9.14). Nessas conexões, vários neurotransmissores estão envolvidos na produção dos sintomas de ansiedade em nível da amígdala, além de numerosos agentes ansiolíticos que exercem ações sobre esses sistemas de neurotransmissores específicos para aliviar os sintomas de ansiedade e medo (Figura 9.14). Os reguladores neurobiológicos da amígdala, como os neurotransmissores GABA, 5HT e NA, os canais de cálcio controlados por voltagem e os ansiolíticos que atuam sobre esses neurotransmissores para mediar suas ações terapêuticas são discutidos especificamente mais adiante, neste capítulo.
Alças corticoestriadotalamocorticais e neurobiologia da preocupação
Dopamina e preocupado ao nascer?
O segundo sintoma nuclear dos transtornos de ansiedade, a preocupação, envolve outro circuito específico (Figura 9.15). A preocupação, que pode envolver o sofrimento ansioso, as expectativas apreensivas, o pensamento catastrófico e as obsessões, está ligada a alças de retroalimentação corticoestriadotalamocorticais (CETC) do córtex pré-frontal. Alguns especialistas formularam a teoria de que alças semelhantes de retroalimentação CETC regulam os sintomas relacionados de ruminações, obsessões e delírios, sendo todos estes recorrentes. Vários neurotransmissores e reguladores modulam esses circuitos, como serotonina, GABA, dopamina, noradrenalina, glutamato e canais iônicos regulados por voltagem. Existe grande sobreposição entre estes e muitos dos mesmos neurotransmissores e reguladores que modulam a amígdala. Como vários genótipos para a enzima COMT (catecol-O-metiltransferase) regulam a disponibilidade de um desses neurotransmissores, isto é, a dopamina, no córtex pré-frontal, as diferenças na disponibilidade de dopamina podem reduzir o risco de preocupação e transtorno de ansiedade e ajudar a determinar se alguém é “preocupado ao nascer” e vulnerável ao desenvolvimento de um transtorno de ansiedade, particularmente quando submetido a estresse.
Ligação da ansiedade com circuitos e neurotransmissores. Os sintomas ansiedade e medo estão associados à disfunção dos circuitos centrados na amígdala. Os neurotransmissores que regulam esses circuitos são a serotonina (5HT), o ácido γ-aminobutírico (GABA), o glutamato, o fator de liberação da corticotrofina (CRF) e a noradrenalina (NA), entre outros. Além disso, os canais iônicos controlados por voltagem estão envolvidos na neurotransmissão desses circuitos.
Ligação da preocupação com circuitos e neurotransmissores. A preocupação está associada à disfunção de alças corticoestriadotalamocorticais (CETC), que são reguladas pela serotonina (5HT), pelo ácido γ-aminobutírico (GABA), pela dopamina (DA), pela noradrenalina (NA), pelo glutamato e pelos canais iônicos controlados por voltagem.
Circuito da preocupação/obsessões. A figura mostra uma alça corticoestriadotalamocortical (CETC) que se origina e termina no córtex pré-frontal dorsolateral (CPFDL). A hiperexcitação desse circuito pode levar à preocupação ou às obsessões.
Guerreiros versus preocupados (Warriors versus worriers)
No Capítulo 4, foi mencionado o impacto de variantes genéticas da COMT sobre o funcionamento cognitivo na esquizofrenia. Especificamente, controles normais com a variante Met da COMT apresentam processamento de informações mais eficiente no córtex pré-frontal dorsolateral (CPFDL) durante uma tarefa cognitiva, como o teste n-back. Esses pacientes apresentam menor atividade da COMT, níveis mais altos de dopamina e, presumivelmente, melhor processamento de informações durante tarefas de funcionamento executivo, que recrutam os circuitos do CPFDL. Devido ao processamento cognitivo mais eficiente de informações, esses pacientes também correm menor risco de esquizofrenia do que os portadores de Val da COMT.
GABA e benzodiazepínicos
O GABA (ácido γ-aminobutírico) é um dos neurotransmissores essenciais envolvidos na ansiedade e na ação ansiolítica de muitos fármacos usados no tratamento dos transtornos de ansiedade. O GABA é o principal neurotransmissor inibitório do cérebro, que normalmente desempenha um papel regulador importante na redução da atividade de numerosos neurônios, como os da amígdala e os das alças CETC. Os benzodiazepínicos, talvez os ansiolíticos mais conhecidos e mais largamente usados, atuam ao intensificar as ações do GABA na amígdala e no córtex pré-frontal, nas alças CETC, para aliviar a ansiedade. Para entender como o GABA regula os circuitos cerebrais na ansiedade e como os benzodiazepínicos exercem suas ações ansiolíticas, é importante conhecer o sistema neurotransmissor gabaérgico. Deve-se saber, inclusive, como o GABA é sintetizado e como sua ação termina na sinapse, além das propriedades dos receptores gabaérgicos (Figuras 9.18 a 9.24).
Especificamente, o GABA é produzido ou sintetizado a partir do aminoácido glutamato (ácido glutâmico) por meio das ações da enzima ácido glutâmico descarboxilase ou GAD. Uma vez formado nos neurônios pré-sinápticos, o GABA é conduzido por transportadores vesiculares de aminoácidos inibitórios (VIAAT) para dentro das vesículas sinápticas, onde é armazenado até ser liberado na sinapse durante a neurotransmissão inibitória. As ações sinápticas do GABA são interrompidas pelo transportador de GABA (GAT) pré-sináptico, também conhecido como bomba de recaptação de GABA, de modo análogo a transportadores semelhantes de outros neurotransmissores, discutidos ao longo deste texto. A ação do GABA também é finalizada pela enzima GABA transaminase (GABA-T), que o converte em substância inativa.
Existem três tipos principais de receptores de GABA e numerosos subtipos. Os principais tipos são os receptores de GABAA, GABAB e GABAC (Figura 9.20). Os receptores de GABAA e GABAC são canais iônicos controlados por ligantes e fazem parte de um complexo macromolecular que forma um canal de cloreto inibitório (Figura 9.21). Vários subtipos de receptores de GABAA são alvos de benzodiazepínicos, hipnóticos sedativos, barbitúricos e/ou álcool (Figura 9.21) e estão envolvidos na neurotransmissão inibitória tônica ou fásica nas sinapses gabaérgicas (Figura 9.22). O papel fisiológico dos receptores de GABAC ainda não está bem esclarecido, porém eles não parecem ser alvos dos benzodiazepínicos. Em contrapartida, os receptores de GABAB são membros de uma classe diferente de receptores, isto é, os receptores ligados às proteínas G. Os receptores de GABAB podem se acoplar aos canais de cálcio e/ou potássio e estar envolvidos na dor, na memória, no humor e em outras funções do SNC.
Produção de ácido γ -aminobutírico (GABA). O aminoácido glutamato, precursor do GABA, é convertido em GABA pela enzima ácido glutâmico descarboxilase (GAD). Após sua síntese, o GABA é transportado em vesículas sinápticas por meio de transportadores vesiculares de aminoácidos inibitórios (VIAAT) e armazenado até sua liberação na sinapse, durante a neurotransmissão.
Término da ação do ácido γ -aminobutírico (GABA). A ação do GABA pode ser interrompida por meio de múltiplos mecanismos. O GABA pode ser transportado para fora da fenda sináptica, de volta ao neurônio pré-sináptico pelo transportador de GABA (GAT), onde pode ser reacondicionado para uso futuro. Além disso, uma vez transportado de volta à célula, o GABA pode ser convertido em substância inativa pela enzima GABA transaminase (GABA-T).
Receptores de ácido γ-aminobutírico (GABA). São mostrados aqui os receptores de GABA que regulam sua neurotransmissão. Esses receptores são o transportador de GABA (GAT), bem como os três tipos principais de receptores de GABA pós-sinápticos: GABAA, GABAB e GABAC. Os receptores de GABAA e GABAC são canais iônicos controlados por ligantes; fazem parte de um complexo macromolecular que forma um canal de cloreto inibitório. Os receptores de GABAB são receptores ligados às proteínas G, que podem se acoplar aos canais de sódio ou de potássio.
Receptores de ácido γ-aminobutírico A (GABAA).
A. São mostradas aqui as quatro regiões transmembrânicas que compõem uma subunidade do receptor de GABAA.
B. Existem cinco cópias dessas subunidades em um receptor GABAA totalmente constituído, em cujo centro se localiza o canal de cloreto.
C. Diferentes tipos de subunidades (também denominadas isoformas ou subtipos) podem se combinar para formar o receptor de GABAA. São seis isoformas alfa (α) diferentes, três isoformas beta (β) diferentes, três isoformas gama (γ) diferentes, delta (δ), épsilon (ε), pi (π), teta (θ) e três isoformas rô (ρ). O tipo e a função finais de cada subtipo de receptor GABAA dependerão das subunidades que ele contém. Os receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos (dois do meio) contêm subunidades γ e α1-3 e medeiam a inibição fásica desencadeada por concentrações máximas de GABA liberadas na sinapse. Os receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos com subunidades α1 estão envolvidos no sono (segundo, a partir da esquerda), enquanto os que contêm subunidades α2 e/ou α3, na ansiedade (segundo, a partir da direita). Os receptores de GABAA com subunidades α4, α6, γ1 ou δ (extrema direita) são sensíveis aos benzodiazepínicos e de localização extrassináptica e regulam a inibição tônica.
Subtipos de receptores GABAA
Os receptores GABAA desempenham um papel fundamental na mediação da neurotransmissão inibitória e como alvos dos ansiolíticos benzodiazepínicos. A estrutura molecular dos receptores de GABAA é mostrada na Figura 9.21. Cada subunidade do receptor de GABAA apresenta quatro regiões transmembrânicas (Figura 9.21A). Quando cinco subunidades se reúnem, elas formam um receptor de GABAA intacto, com um canal de cloreto no centro (Figura 9.21B). Existem muitos subtipos diferentes de receptores de GABAA, dependendo das subunidades presentes (Figura 9.21C). As subunidades dos receptores de GABAA também são denominadas isoformas e contemplam os tipos α (com seis isoformas, α1 a α6), β (com três isoformas, β1 a β3), γ (com três isoformas, γ1 a γ3), δ, ε, π, θ e ρ (com três isoformas, ρ1 a ρ3) (Figura 9.21C). Para esta discussão, é importante o fato de que, dependendo das subunidades presentes, as funções de um receptor de GABAA podem variar significativamente.
Receptores de GABAA insensíveis aos benzodiazepínicos
Os receptores de GABAA insensíveis aos benzodiazepínicos são os que apresentam as subunidades α4, α6, γ1 ou δ (Figura 9.21C). Os receptores de GABAA com uma subunidade δ, em vez de uma subunidade γ, mais as subunidades α4 ou α6, não se ligam aos benzodiazepínicos. Esses receptores de GABAA ligam-se a outros moduladores, isto é, aos neuroesteroides de ocorrência natural, bem como ao álcool e a alguns anestésicos gerais (Figura 9.21C). O sítio de ligação desses moduladores não benzodiazepínicos localiza-se entre as subunidades α e δ, com um sítio por complexo de receptor (Figura 9.21C). Duas moléculas de GABA ligam-se por complexo receptor nos sítios localizados entre as subunidade α e β, designados sítios agonistas GABAérgicos (Figura 9.21C). Como o sítio para os moduladores está em uma localização diferente dos sítios agonistas para o GABA, o modulador costuma ser denominado alostérico (literalmente, “outro local”). Assim, os agentes que se ligam aí são chamados moduladores alostéricos.
Os subtipos de receptores de GABAA insensíveis aos benzodiazepínicos (com subunidades δ e subunidades α4 ou α6) estão localizados fora da sinapse, na qual capturam não apenas o GABA que se difunde para longe dela, mas também neuroesteroides sintetizados e liberados pela neuróglia (Figura 9.22). Acredita-se que os receptores de GABAA extrassinápticos insensíveis aos benzodiazepínicos possam mediar um tipo de inibição no neurônio pós-sináptico, que é tônica, diferentemente do tipo fásico de inibição, que é mediado pelos receptores de GABAA pós-sinápticos sensíveis aos benzodiazepínicos (Figura 9.22). Desse modo, a inibição tônica pode ser regulada pelos níveis de moléculas extracelulares de GABA que escaparam da recaptação pré-sináptica e da destruição enzimática. Acredita-se que a inibição tônica estabeleça o tônus e a excitabilidade gerais do neurônio pós-sináptico e sejam importantes para determinados eventos reguladores, como a frequência de descarga neuronal em resposta a estímulos excitatórios.
Como os receptores de GABAA que modulam essa ação são insensíveis aos benzodiazepínicos, eles provavelmente não estão envolvidos nas ações ansiolíticas desses fármacos em vários transtornos de ansiedade. Todavia, os novos hipnóticos, bem como os anestésicos, têm como alvo esses receptores de GABAA extrassinápticos insensíveis aos benzodiazepínicos. Assim, é possível que novos neuroesteroides sintéticos que também têm como alvo subtipos de receptores de GABAA insensíveis aos benzodiazepínicos possam, algum dia, se tornar novos ansiolíticos. Com efeito, a própria ansiedade pode depender, em parte, da quantidade correta de inibição tônica em áreas anatômicas essenciais, como a amígdala e as áreas corticais das alças CETC. Além disso, os neuroesteroides de ocorrência natural podem ser importantes para estabelecer esse tônus inibitório em áreas cerebrais críticas. Se esse tônus sofrer desregulação, é possível que a excitabilidade neuronal anormal possa se tornar um fator no desenvolvimento de vários transtornos de ansiedade.
Receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos
Os receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos apresentam diversas características estruturais e funcionais que os distinguem dos receptores de GABAA insensíveis aos benzodiazepínicos. Diferentemente dos receptores de GABAA insensíveis aos benzodiazepínicos, para que um receptor de GABAA seja sensível a esses fármacos e, portanto, constitua alvo para os ansiolíticos benzodiazepínicos, são necessárias duas unidades β e uma unidade γ do subtipo γ2 ou γ3, bem como duas unidades α do subtipo α1, α2 ou α3 (Figura 9.21C). Os benzodiazepínicos parecem ligar-se à região do receptor entre a subunidade γ2/3 e a subunidade α1/2/3, com uma molécula de benzodiazepínico por complexo receptor (Figura 9.21C). O próprio GABA liga-se com duas moléculas de GABA por complexo receptor aos sítios agonistas de GABA nas regiões do receptor entre as unidades α e β (Figura 9.21C).
Acredita-se que os subtipos de receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos (com subunidade γ e subunidades α1–3) sejam de localização pós-sináptica e possam mediar um tipo de inibição no neurônio pós-sináptico que é fásica, ocorrendo em surtos de inibição desencadeados por concentrações máximas de GABA liberado na sinapse (Figura 9.22). Teoricamente, os benzodiazepínicos que atuam nesses receptores, particularmente os subtipos α2/3 agrupados em sítios de GABA pós-sinápticos, devem exercer um efeito ansiolítico, devido ao aumento da inibição pós-sináptica fásica. Se essa ação ocorrer em neurônios muito ativos na amígdala ou em alças CETC, ela deve produzir ações ansiolíticas, com redução do medo e da preocupação.
Nem todos os receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos são iguais. Curiosamente, os receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos com subunidade α1 podem ser os mais importantes para a regulação do sono e constituem os supostos alvos de numerosos agentes sedativo-hipnóticos, como moduladores alostéricos positivos tanto benzodiazepínicos quanto não benzodiazepínicos do receptor de GABAA (Figura 9.21C). O subtipo α1 de receptores de GABAA e os fármacos que se ligam a ele são discutidos de modo mais detalhado no Capítulo 11, sobre o sono. Alguns desses agentes são seletivos exclusivamente para o subtipo α1 do receptor de GABAA.
Por outro lado, os receptores de GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos com subunidades α2 (e/ou α3) podem ser os mais importantes para a regulação da ansiedade e constituem os supostos alvos dos ansiolíticos benzodiazepínicos (Figura 9.21C). Entretanto, os benzodiazepínicos atualmente disponíveis não são seletivos para receptores de GABAA com subunidades α diferentes. Por esse motivo, existem constantes pesquisas em busca de agentes α2/3 seletivos que possam ser usados no tratamento de transtornos de ansiedade nos seres humanos. Teoricamente, esses agentes seriam ansiolíticos sem serem sedativos. Os agonistas parciais seletivos para as subunidades α2/3 dos receptores GABAA sensíveis aos benzodiazepínicos causariam menos euforia e seriam menos reforçadores. Portanto, seriam menos passíveis de uso abusivo e ocasionariam menos dependência e menos problemas durante a abstinência. Esses fármacos estão sendo investigados, porém ainda não foram inseridos na prática clínica. A expressão anormal de subunidades γ2, α2 ou δ tem sido associada a diferentes tipos de epilepsia. A expressão dos subtipos de receptores pode se modificar em resposta à administração crônica de benzodiazepínicos e à sua abstinência e pode estar alterada em pacientes com vários subtipos de transtornos de ansiedade.
Serotonina e ansiedade
Desde que os sintomas, os circuitos e os neurotransmissores ligados aos transtornos de ansiedade apresentam grande sobreposição com os do transtorno depressivo maior (Figura 9.1), não é surpreendente que os fármacos desenvolvidos como antidepressivos tenham demonstrado ser tratamentos efetivos para os transtornos de ansiedade. Na verdade, os principais tratamentos para os transtornos de ansiedade na atualidade são, cada vez mais, fármacos originalmente desenvolvidos como antidepressivos. A serotonina é um neurotransmissor essencial, que inerva a amígdala, bem como todos os elementos dos circuitos CETC, isto é, o córtex pré-frontal, o estriado e o tálamo. Portanto, ela está envolvida na regulação tanto do medo quanto da preocupação. Os antidepressivos capazes de aumentar os estímulos serotoninérgicos por meio do bloqueio do transportador de serotonina (SERT) também se mostram efetivos na redução dos sintomas de ansiedade e do medo em todos os transtornos de ansiedade ilustrados nas Figuras 9.2 a 9.5 – ou seja, TAG, transtorno de pânico, transtorno de ansiedade social e TEPT. Esses agentes são os ISRS (inibidores seletivos da recaptação de serotonina; discutidos no Capítulo 7, com seu mecanismo de ação ilustrado nas Figuras 7.12 a 7.17), bem conhecidos, assim como os IRSN (inibidores da recaptação de serotonina e de noradrenalina; também discutidos no Capítulo 7, com seu mecanismo de ação ilustrado nas Figuras 7.12 a 7.17 e nas Figuras 7.33 e 7.34).
Ações terapêuticas potenciais dos ansiolíticos sobre a ansiedade e o medo.
A. A ansiedade e o medo patológicos podem ser causados pela hiperexcitação dos circuitos da amígdala.
B. Os agentes gabaérgicos, como os benzodiazepínicos, podem aliviar a ansiedade e o medo ao aumentar as ações inibitórias fásicas nos receptores de GABAA pós-sinápticos na amígdala.
C. Os agentes que se ligam à subunidade α2β dos canais de cálcio sensíveis a voltagem N e P/Q pré-sinápticos podem bloquear a liberação excessiva de glutamato na amígdala e portanto, reduzir os sintomas de ansiedade.
D. A amígdala recebe estímulos dos neurônios serotoninérgicos, que podem ter um efeito inibitório sobre parte de seus impulsos. Assim, os agentes serotoninérgicos podem aliviar a ansiedade e o medo, aumentando os impulsos serotoninérgicos para a amígdala.
A buspirona, um agonista parcial do receptor de serotonina 1A (5HT1A), é reconhecida como ansiolítico geral, porém não como tratamento para os subtipos de transtornos de ansiedade. Os agonistas parciais de 5HT1A, como agentes potencializadores dos antidepressivos, são discutidos no Capítulo 7, assim como os antidepressivos que combinam agonismo parcial de 5HT1A com inibição da recaptação de serotonina (i. e., APIRS e vilazodona: ver as Figuras 7.25 a 7.29), que, teoricamente, devem ser ansiolíticos, bem como antidepressivos em sua ação. As propriedades agonistas parciais de 5HT1A de diversos antipsicóticos atípicos são discutidas no Capítulo 5 e ilustradas nas Figuras 5.15, 5.16, 5.25 e 5.26.
As ações ansiolíticas potenciais da buspirona podem resultar de ações agonistas parciais de 5HT1A nos receptores 5HT1A tanto pré-sinápticos quanto pós-sinápticos, com ações em ambos os locais. Isso resulta em aumento da atividade serotoninérgica nas projeções para amígdala, córtex pré-frontal, estriado e tálamo. Teoricamente, os ISRS e os IRSN exercem as mesmas ações. Como o início da ação ansiolítica da buspirona é tardio, do mesmo modo que o dos antidepressivos, isso levou à suposição de que os agonistas de 5HT1A exerçam seus efeitos terapêuticos em virtude de eventos adaptativos nos neurônios e nos receptores, e não simplesmente pela ocupação aguda dos receptores 5HT1A. Dessa maneira, o suposto mecanismo de ação dos agonistas parciais é análogo ao dos antidepressivos – que também atuam supostamente por meio de adaptações dos receptores daquele dos neurotransmissores – e diferente dos ansiolíticos benzodiazepínicos – que atuam de modo relativamente agudo pela ocupação dos receptores de benzodiazepínicos.
Ações terapêuticas potenciais dos ansiolíticos sobre a preocupação.
A. A preocupação patológica pode ser causada pela hiperexcitação dos circuitos corticoestriadotalamocorticais (CETC).
B. Os agentes gabaérgicos, como os benzodiazepínicos, podem aliviar a preocupação ao potencializar as ações dos interneurônios gabaérgicos inibitórios no córtex pré-frontal.
C. Os agentes que se ligam à subunidade α2δ dos canais de cálcio sensíveis à voltagem N e P/Q pré-sinápticos podem bloquear a liberação excessiva de glutamato nos circuitos CETC e, assim, reduzir a preocupação.
D. O córtex pré-frontal, o estriado e o tálamo recebem impulsos de neurônios serotoninérgicos, que podem exercer um efeito inibitório. Assim, os agentes serotoninérgicos podem reduzir a preocupação ao potencializar o impulso serotoninérgico nos CETC.
Ações dos agonistas parciais de 5HT1A na ansiedade. Os agonistas parciais de 5HT1A, como a buspirona, podem reduzir a ansiedade por meio de ações tanto nos autorreceptores somatodendríticos pré-sinápticos (à esquerda) quanto nos receptores pós-sinápticos (direita). O início de ação da buspirona, como o dos antidepressivos, é demorado. Isso sugere que os efeitos terapêuticos estejam efetivamente relacionados com alterações adaptativas distais e não com ações agudas sobre esses receptores.
Hiperatividade noradrenérgica na ansiedade
A noradrenalina é outro neurotransmissor com estimulação reguladora importante para a amígdala, bem como para o córtex pré-frontal e o tálamo nos circuitos CETC. A estimulação noradrenérgica excessiva a partir do locus coeruleus pode não apenas resultar em diversas manifestações periféricas de estimulação autonômica excessiva, conforme discutido anteriormente e ilustrado nas Figuras 9.8 a 9.12, mas também desencadear vários sintomas nucleares de ansiedade e medo, como pesadelos, estados de hiperexcitação, flashbacks e ataques de pânico. A atividade noradrenérgica excessiva também pode reduzir a eficiência do processamento de informações no córtex pré-frontal e, assim, nos circuitos CETC, o que causaria preocupação. Hipoteticamente, esses sintomas podem ser mediados, em parte, pela estimulação noradrenérgica excessiva dos receptores α1 e β1 adrenérgicos pós-sinápticos na amígdala ou no córtex pré-frontal. Os sintomas de hiperexcitação, como pesadelos, podem ser reduzidos em alguns pacientes com o uso de bloqueadores α1 adrenérgicos, como o prazosin. Já os sintomas medo (Figura 9.28C) e preocupação (Figura 9.29B) podem ser reduzidos por inibidores da recaptação de noradrenalina, também denominados NAT ou inibidores do transportador de noradrenalina). Os efeitos clínicos dos inibidores do NAT talvez sejam confusos, visto que pode haver agravamento transitório dos sintomas de ansiedade imediatamente após o início da administração de um IRSN ou de um inibidor seletivo do NAT, quando a atividade noradrenérgica é inicialmente maior, porém os receptores pós-sinápticos ainda não estão adaptados. Entretanto, essas mesmas ações inibitórias do NAT, se forem sustentadas ao longo do tempo, irão infrarregular e dessensibilizar os receptores NA pós-sinápticos, como os receptores β1, e reduzir efetivamente o medo e a preocupação a longo prazo (Figura 9.29B).
3. Explique o quadro clínico e como fazer o diagnóstico da ansiedade.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DIAGNÓSTICAS DOS TRANSTORNOS DE ANSIEDADE
Os principais critérios diagnósticos para transtornos de ansiedade de acordo com os dois principais sistemas de classificação, o DSM-5 e a CID-10, estão resumidos aqui. O símbolo * indica critério singular no DSM-5 e o símbolo ‡ indica recursos presentes apenas na CID-10.
Transtorno de ansiedade de separação
■Medo ou ansiedade marcados sobre a separação de figuras de apego (como membros da família) em um grau que seja inadequado para o desenvolvimento.
■Medo persistente ou ansiedade sobre danos causados a figuras de apego e eventos que poderiam levar à perda ou à separação deles.
■Relutância em deixar figuras de apego.
■Pesadelos e sintomas físicos de angústia, como dores de estômago.
■Os sintomas geralmente se desenvolvem ao longo da infância, mas também podem se desenvolver ao longo da vida adulta.*
■O diagnóstico requer uma duração de 4 semanas na infância e uma maior duração, tipicamente de pelo menos 6 meses, na idade adulta.*
Mutismo seletivo (eletivo)
■Falha consistente em falar em situações sociais específicas (p. ex., escola) nas quais existe uma expectativa, apesar de falar em outras situações.
■Não limitado à interação com adultos.
■Não é explicado pela falta de familiaridade com a língua falada.
■Persiste por pelo menos 1 mês (além do primeiro mês de escola).*
Fobias específicas
■Medo marcado, ansiedade ou evitação de objetos ou situações circunscritas.
■O medo é desproporcional à ameaça real representada.*
■O indivíduo reconhece que os sintomas são excessivos ou irracionais.‡
■Normalmente persiste por pelo menos 6 meses.*
■Os subtipos incluem fobias de animal, ambiente natural (p. ex., alturas tempestades), injeção, sangue ou outras.
Transtorno de ansiedade social
■Medo, ansiedade ou evitação de interações sociais e situações em que alguém é examinado, ou situações em que alguém é o foco da atenção (como ser observado enquanto fala, come ou executa uma tarefa específica).
■Medo de julgamento negativo de outras pessoas, em particular, medo de ser envergonhado, humilhado, rejeitado ou ofendido.
■O medo é desproporcional à ameaça real representada.*
■O indivíduo reconhece que os sintomas são excessivos ou irracionais.‡
■Sintomas físicos e sintomas de rubor, medo de vomitar, urinar ou defecar.‡
■Normalmente persiste por pelo menos 6 meses.*
■A ansiedade social é limitada a situações de desempenho.
Transtorno de pânico
■Ataques de pânico inesperados, recorrentes (ocorrem sem um gatilho aparente).
■O indivíduo se preocupa em ter mais ataques de pânico ou modifica seus comportamentos devido ao ataque de pânico.*
■Persiste por pelo menos 1 mês.*
Agorafobia
■Acentuado medo, ansiedade ou evitação de situações como transporte, espaços abertos, locais fechados, filas ou multidões ou estar fora de casa sozinho.
■Medos de que a fuga possa ser difícil ou que a ajuda não esteja disponível no evento de sintomas de pânico ou outros efeitos incapacitantes ou situações embaraçosas.
■O medo é desproporcional à ameaça real representada.*
■O indivíduo reconhece que os sintomas são excessivos ou irracionais.‡
■Normalmente persiste por pelo menos 6 meses.*
Transtorno de ansiedade generalizada
■Ansiedade e preocupação diárias sobre vários domínios, como trabalho e desempenho escolar.
■Sintomas físicos como inquietação, fadiga, dificuldade de concentração, tensão muscular e distúrbios do sono.
■Sintomas de excitação autonômica (como hiperventilação e taquicardia).
■Normalmente persiste por pelo menos 6 meses.*
TRANSTORNOS DE ANSIEDADE ESPECÍFICOS DA CULTURA
Algumas formas de ansiedade ligadas à cultura foram identificadas, mas entender até que ponto essas categorias são únicas ou variações culturais de uma patologia existente é algo desafiador. Por exemplo, Taijin Kyofusho é um transtorno relacionado à ansiedade social em culturas do leste asiático, nas quais o medo principal é ofender ou embaraçar outras pessoas.
Além disso, é típico de países como Porto Rico e culturas dominicanas os chamados ataques de niervos, condições induzidas pelo estresse, uma síndrome muito semelhante a um ataque de pânico.
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
O diagnóstico diferencial dos transtornos de ansiedade envolve a distinção entre transtornos de ansiedade, outras condições psiquiátricas e outras condições médicas gerais.
A determinação do diagnóstico de um transtorno de ansiedade específico e sua distinção de outros transtornos psiquiátricos são obtidas por meio de entrevistas com o paciente, baseando-se nos critérios diagnósticos do DSM-5 ou da CID-10. Esse processo inclui indagações sobre cada uma das características dos sintomas de ansiedade do paciente e as diferentes situações em que eles ocorrem: se são episódicos ou crônicos, se ocorrem inesperadamente ou em situações específicas.
Determinar se os sintomas de ansiedade, como ataques de pânico, estão ocorrendo como manifestações de outros transtornos mentais, como depressão maior ou transtorno bipolar, também é essencial. No entanto, a presença de mais de um transtorno psiquiátrico em um indivíduo, como a ocorrência simultânea de depressão maior e transtornos de ansiedade, é muito comum. Portanto, muitas vezes pode ser menos uma questão de obter um diagnóstico diferencial do que de atribuir uma multiplicidade de diagnósticos e priorizar o seu tratamento e seguimento para o paciente.
Diferenciar a ansiedade de outras condições médicas gerais ou mentais é fundamental.
A intoxicação por medicamentos (p. ex., o uso de estimulantes) e a abstinência de substâncias (p. ex., álcool) podem causar sintomas de ansiedade proeminentes. Para transtornos de ansiedade induzidos por substâncias ou por medicamentos, ataques de pânico ou ansiedade são proeminentes e se desenvolvem rapidamente após intoxicação ou retirada da substância. Além disso, a substância ou medicamento podem produzir sintomas que não são mais bem explicados por outro transtorno de ansiedade e que não ocorrem somente durante um quadro de delirium.
QUALIDADE DE VIDA E COMPLICAÇÕES
Estudos longitudinais mostraram que os transtornos de ansiedade estão entre os transtornos mentais mais persistentes, com remissão espontânea ocorrendo em menos de 23% dos indivíduos.
Esses transtornos prejudicam significativamente várias áreas do desenvolvimento cognitivo e os papéis sociais, sendo associados a consequências adversas, o que resulta em uma qualidade de vida global reduzida, principalmente em pacientes com depressão comórbida. Em relação aos transtornos de ansiedade de modo distinto, o TP e o TAG são tipicamente mais graves em termos de incapacidade e complicações comórbidas, enquanto as fobias específicas são menos graves; já o TAS encontra-se entre os intermediários.
Os transtornos de ansiedade raramente ocorrem de forma isolada, com transtornos mentais comórbidos, como depressão e transtornos por uso de substâncias, ocorrendo em 60 a 90% dos casos. De fato, um aumento das taxas de transtornos depressivos e, em menor grau, transtornos por uso de substâncias pode ser observado nos anos após o início do transtorno de ansiedade. Evidência longitudinal prospectiva sugere que todos os transtornos de ansiedade, particularmente o TP, a agorafobia e o TAS, são fortes fatores de risco para o desenvolvimento de transtornos depressivos e abuso de substâncias. A presença desses quadros na infância, na adolescência ou no início da idade adulta aumenta o risco de transtornos depressivos e a probabilidade de um curso grave de depressão com cronicidade e tentativas de suicídio. Por exemplo, o TAS confere um risco relativo de 1,49 a 1,85 para depressão quando os dados são controlados por idade e sexo.
O impacto negativo dos transtornos de ansiedade no paciente envolve imensa carga social, familiar, laboral e econômica.59 Suas consequências, como fracasso escolar, desempenho acadêmico insuficiente, desemprego ou subemprego, além de problemas interacionais e conjugais, podem se combinar em escaladas persistentes de maiores complicações ao longo da vida.59 Estima-se que os transtornos de ansiedade tenham o segundo índice mais alto em termos de ônus, com base em anos de vida.
Além do impacto econômico extremamente alto para toda a sociedade, as estimativas do custo desses transtornos também se estendem aos amigos e à família do paciente. Ademais, esses encargos são repassados para a próxima geração via transmissão familiar, mediando o aumento do risco de complicações de saúde mental.
Transtorno de ansiedade generalizada
O quadro de TAG caracteriza-se pela presença de sintomas ansiosos excessivos, na maior parte dos dias, por vários meses. A pessoa vive angustiada, tensa, preocupada, permanentemente nervosa ou irritada.
Nesses quadros, são frequentes sintomas como insônia, dificuldade em relaxar, angústia constante, irritabilidade aumentada e dificuldade em concentrar-se. São também comuns sintomas físicos como cefaleias, dores musculares, dores ou queimação no estômago, taquicardia, tontura, formigamento e sudorese fria. Alguns termos populares para esses estados são: “gastura”, “repuxamento dos nervos” e “cabeça ruim” (ver Glossário no hotsite do livro). Para se fazer o diagnóstico de uma síndrome ansiosa, também é necessário verificar se os sintomas ansiosos causam sofrimento clinicamente significativo e prejudicam a vida pessoal, social e ocupacional do indivíduo. No Brasil, estudos epidemiológicos nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro revelaram a presença de TAG, nos últimos 12 meses, em 2,2 a 3,5% da população e, pelo menos uma vez na vida, em 5,8 a 6,0% (Andrade et al., 2012; Ribeiro et al., 2013).
Transtornos da personalidade (TPs) ocorrem com frequência associados ao TAG; os diagnósticos de TP mais frequentes nesse grupo são borderline e paranoide (Marco, 2013; Latas; Milovanovic, 2014).
Crises de ansiedade, crises de pânico
Em muitos pacientes, a ansiedade se manifesta sob a forma de crises intermitentes, com a eclosão de vários sintomas ansiosos, em número e intensidade significativos (Nardi; Valença, 2005). Associados às crises agudas e intensas de ansiedade, pode ou não haver sintomas constantes de ansiedade generalizada.
Assim, as crises de pânico são crises marcantes de ansiedade, nas quais ocorre importante descarga do sistema nervoso autônomo. Nelas ocorrem sintomas como batedeira ou taquicardia, suor frio, tremores, desconforto respiratório ou sensação de asfixia, náuseas, formigamentos em membros, dedos e/ou lábios.
Nas crises intensas, os pacientes podem experimentar diversos graus da chamada despersonalização, que se revela como sensação de a cabeça ficar leve, de o corpo ficar estranho, sensação de perda do controle, estranhar-se a si mesmo. Pode ocorrer também a desrealização, ou seja, a sensação de que o ambiente, antes familiar, parece estranho, diferente, não familiar.
Além disso, ocorre com frequência nas crises de pânico um considerável medo de ter um ataque do coração, um infarto, de morrer e/ou enlouquecer. As crises são de início abrupto (chegam ao pico em 5 a 10 minutos) e de curta duração (duram em geral 15 minutos, raramente mais de 1 hora). São muitas vezes desencadeadas por determinadas condições, como estar em aglomerados humanos, ficar “preso” (ou com dificuldade para sair) em congestionamentos no trânsito, supermercados com muita gente, shopping centers ou estar em situações de ameaça (Costa Pereira, 1997).
Transtorno de pânico
Denomina-se o quadro de transtorno de pânico caso as crises sejam recorrentes, com desenvolvimento de medo de ter novas crises, preocupações com possíveis implicações da crise (perder o controle, ter um ataque cardíaco ou enlouquecer) e sofrimento subjetivo significativo. O transtorno de pânico pode ou não ser acompanhado de agorafobia, ou seja, muito desconforto e fobia de lugares amplos e aglomerações (Nardi; Valença, 2005).
No Brasil, estudos epidemiológicos nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro revelaram a presença de transtorno de pânico, nos últimos 12 meses, em 18,8 a 20,8% da população e, pelo menos uma vez na vida, em 27,7 a 30,8% (Andrade et al., 2012; Ribeiro et al., 2013).
Pessoas com transtorno de pânico têm, com bastante frequência, TP, e até um terço dos pacientes com transtorno de pânico pode ter um TP associado, como TP borderline, evitativa e paranoide (Marco, 2013; Latas; Milovanovic, 2014).
Transtorno de ansiedade de separação (CID-11 e DSM-5)
Sobretudo em crianças, pode haver medo e ansiedade importantes relacionados a separar-se de pessoas significativas, percebidas como protetoras (mães, avós, pais, entre outras). Tipicamente, a criança tem muito medo e ansiedade de, para ir à escola, separar-se da mãe ou de outros membros da família. Chora muito, fica muito ansiosa e amedrontada, tem medo de que algo muito ruim ocorra.
A criança muitas vezes pede ou exige que a mãe fique com ela na sala de aula. Também pode ter dificuldades em dormir sozinha e/ou ter pesadelos relacionados à separação. Em adultos, isso pode ocorrer com o(a) companheiro(a) romântico(a) (separar-se do[a] namorado[a] ou esposo[a]). Para o diagnóstico, os sintomas devem durar muitos meses e ser suficientemente graves, prejudicando o desenvolvimento escolar, pessoal e social da criança, adolescente ou adulto.
Síndromes ansiosas de base orgânica
Os quadros de ansiedade podem ser de origem orgânica, isto é, pode ocorrer uma síndrome ansiosa (em crises de pânico ou ansiedade generalizada) que é claramente resultante de doença física, uso de fármacos, substâncias ou outra condição orgânica. Nesses casos, a síndrome ansiosa associa-se temporalmente à instalação de uma doença orgânica (p. ex., hipertireoidismo, doença pulmonar obstrutiva crônica, câncer, entre outras) ou ao uso de medicamentos, como corticoides, antiparkinsonianos, anti-hipertensivos, ou substâncias tóxicas, como cocaína, álcool, maconha, gasolina, chumbo ou mercúrio.
As síndromes ansiosas também são comuns nos quadros psicopatológicos associados ao período pré-menstrual e ao puerpério e relacionados a grandes cirurgias (como transplante cardíaco). Na ansiedade de base orgânica, é particularmente frequente a presença da irritabilidade e da labilidade do humor.
A Tabela 31.1 apresenta as principais causas das síndromes de ansiedade secundárias ou orgânicas, assim como as principais substâncias que desencadeiam ou causam depressão.
4. Qual o tratamento farmacológico e não farmacológico do transtorno de ansiedade?
Devido às baixas taxas de detecção, especialmente na atenção primária, a maioria dos pacientes com transtornos de ansiedade não recebe tratamento. De fato, em alguns países (como Colômbia, México, Líbano, Nigéria e China), 50 a 85% dos pacientes podem receber tratamento dentro de 50 anos após o início do transtorno. Em geral, o tratamento não é procurado até duas décadas após o início da ansiedade – exceto no caso de TP e TAG, para os quais o período de busca é significativamente menor em alguns estudos. De acordo com a OMS, o tempo médio para procurar tratamento após o quadro inicial dos transtornos de ansiedade varia de 3 a 30 anos, com diferenças significativas entre os países avaliados. Atrasos no tempo de tratamento foram maiores em países de baixa e média renda do que nos países mais desenvolvidos.
Vários tratamentos psicológicos e farmacológicos estão disponíveis para o gerenciamento dos transtornos de ansiedade.
TRATAMENTOS PSICOLÓGICOS
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é o principal tratamento psicológico baseado em evidências para a abordagem de transtornos de ansiedade na infância, na adolescência e na idade adulta. A TCC é o tratamento psicológico de primeira linha para transtornos de ansiedade, conforme recomendado por várias práticas de saúde em diversos países, incluindo Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, Alemanha e Singapura.41 (O Quadro 23.2 apresenta mais informações sobre a TCC.)
TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL E SEU FUNCIONAMENTO
A TCC reduz vieses direcionados à ansiedade para interpretar estímulos ambíguos como ameaçadores, substitui a prevenção e a segurança de comportamentos por comportamentos de abordagem e enfrentamento, e reduz os níveis excessivos de excitação autonômica. Essa psicoterapia inclui uma ampla variedade de estratégias – como a psicoeducação (ou seja, o aprendizado e o automonitoramento de pensamentos, sensações físicas e comportamentos), a reestruturação cognitiva (identificação de erros de pensamento, substituindo-os) e a exposição sistemática repetida a estímulos temidos (p. ex., dirigir para lugares desconhecidos) ou por meio de exercícios interoceptivos (que abordam o medo de sintomas corporais de ansiedade) –, além de fornecer diferentes técnicas respiratórias e de relaxamento.
Metanálises indicam que a TCC é um tratamento eficaz para os mais diversos transtornos de ansiedade em crianças, adolescentes, adultos e idosos.40-42 Seu maior efeito foi observado quando comparada com controles da lista de espera.40 A TCC também pode resultar em melhora na qualidade de vida em comparação com pacientes na lista de espera ou com aqueles que recebem placebo.41
A base de evidências para outros tratamentos psicológicos é muito menos robusta do que para a TCC. Mindfulness (atenção plena) e abordagens baseadas em aceitação e compromisso, ou seja, manter a atenção do indivíduo e ensiná-lo a aprender e a aceitar sentimentos e experiências, usando uma combinação de meditação e exercícios de respiração, estão crescendo em popularidade, mas as conclusões quanto a sua eficácia ainda são dificultadas pela baixa qualidade dos estudos e um número limitado de ensaios clínicos randomizados (ECRs). No entanto, atenção plena e abordagens baseadas em aceitação são declaradamente superiores a nenhum tratamento ou ao uso de placebo.
Poucos ECRs avaliaram abordagens psicodinâmicas visando ao tratamento de transtornos de ansiedade. Por exemplo, uma metanálise relatou apenas 14 ECRs, desde 1970, para terapias psicodinâmicas (ou seja, entender como o pensamento inconsciente processa e pode se manifestar como pensamentos e sentimentos atuais) nos transtornos de ansiedade.43 Cabe destacar, porém, que em alguns dos estudos selecionados nessa metanálise não foram incluídas medidas de diagnóstico ou de resultados confiáveis ou válidos, o que dificulta a generalização dos achados.
A terapia interpessoal (tratamento de curta duração focado em relacionamentos interpessoais) foi mais eficaz para sintomas de ansiedade do que condições de comparação inativas em três estudos. Entretanto, foi evidenciado um tamanho de efeito menor para terapia interpessoal do que para TCC.44 Para o tratamento de transtornos de ansiedade específicos, sabe-se que a terapia interpessoal é menos eficaz do que a TCC para o tratamento do TP com agorafobia.
Em indivíduos de 7 a 17 anos de idade com quadros de ansiedade, técnicas cognitivo-comportamentais de exposição, modelagem e estratégias, e psicoeducação mostraram as evidências mais consistentes e grandes efeitos em vários estudos, enquanto brincadeira, biofeedback, terapia centrada no cliente ou terapia de fixação apresentaram efeitos pequenos e inconsistentes.
TRATAMENTO FARMACOLÓGICO
Os antidepressivos e os benzodiazepínicos são considerados medicamentos farmacológicos de primeira linha para o tratamento da maioria dos transtornos de ansiedade, com exceção da fobia específica. Esse fato é baseado em evidências de eficácia de numerosos ECRs com essas classes de fármacos.
Os antidepressivos mais utilizados para o tratamento dos transtornos de ansiedade são os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs) e os inibidores da recaptação de serotonina e noradrenalina (IRSNs). Os ISRSs e os IRSNs demonstraram eficácia para todos os transtornos de ansiedade, exceto para a fobia específica.
Preditores de respostas individuais que permitiriam uma abordagem mais personalizada para a farmacoterapia ainda não estão disponíveis. Dessa forma, a seleção de uma terapia farmacológica específica deve basear-se na resposta prévia a determinado medicamento (no caso do paciente que já havia sido tratado com sucesso), na preferência do paciente, no perfil de efeitos adversos, na tolerabilidade e na familiaridade do médico com a droga.
O tratamento com ISRSs ou IRSNs é comumente associado com efeitos adversos, principalmente nos primeiros 14 dias de tratamento, incluindo aumento do desconforto gastrintestinal, diarreia, piora da ansiedade no início, alterações sexuais, insônia, dor de cabeça, entre outros.
Os benzodiazepínicos são bastante eficazes no tratamento de transtornos de ansiedade. Sua grande vantagem é que combatem a ansiedade imediatamente, eliminando os sintomas de forma rápida. No entanto, preocupações com possíveis abusos e dependência podem limitar o seu uso. Devem ser usados com cautela ou não utilizados em indivíduos com histórico de abuso de álcool ou outras substâncias.52 Efeitos adversos associados ao tratamento com benzodiazepínicos incluem sonolência, tontura e, particularmente em idosos, aumento do risco de queda.
Outros antidepressivos, como tricíclicos e inibidores da monoaminoxidase, foram amplamente utilizados no passado para o tratamento de transtornos de ansiedade, mas seus efeitos adversos e perfis de segurança os tornaram menos populares nos dias atuais.49 Entretanto, esses dois grupos são eficazes e têm sua utilidade no arsenal terapêutico desses transtornos, sobretudo no TP e no TAG. Os inibidores da monoaminoxidase são particularmente eficazes na fobia social, apesar da cuidadosa restrição dietética de alimentos que contenham tiramina (queijos, vinhos, embutidos, entre outros) que deve ser implementada.
Medicamentos anticonvulsivantes que modulam a sinalização do GABA, como gabapentina e pregabalina, podem ser empregados como terapêuticas para transtornos de ansiedade.
Outros tipos de medicamentos usados no tratamento desses transtornos incluem buspirona (um ansiolítico não benzodiazepínico) e bloqueadores β-adrenérgicos.53 A buspirona é um tratamento eficaz somente para TAG.49 Bloqueadores β-adrenérgicos (como propranolol ou atenolol) são eficazes para alguns indivíduos com TAS do tipo de desempenho (que apresentam ansiedade ao falar ou se apresentar em público), mas não há evidências apoiando sua eficácia para a ansiedade em geral.
Os transtornos de ansiedade em crianças e adolescentes podem ser tratados com ISRSs ou IRSNs, que geralmente são administrados quando abordagens psicológicas não estão disponíveis ou não estão funcionando.54 Mas é necessário cuidado, já que algumas evidências indicaram aumento das taxas de suicídio com ISRSs nessa população.55 Entretanto, os benefícios do tratamento com ISRSs com monitoramento cuidadoso são considerados superiores a esse risco.
Mulheres com transtornos de ansiedade durante o período perinatal, inclusive durante a gravidez e a amamentação, provavelmente devam optar pela TCC.56 Alguns ISRSs, como a sertralina, podem ser considerados para uso nessas pacientes quando a TCC não estiver disponível, mostrar falta de eficácia ou quando a paciente preferir a farmacoterapia, ainda que o impacto da medicação sobre a formação do bebê e os efeitos adversos no recém-nato durante a amamentação mereçam ser considerados com cuidado durante o tratamento.
TRATAMENTOS COMBINADOS
Dados de metanálises indicam um benefício da combinação de psicoterapia (sobretudo TCC) e farmacoterapia em comparação com o uso de farmacoterapia ou psicoterapia isoladamente em adultos.57 Algumas evidências, embora limitadas, apoiam a superioridade do tratamento combinado, por exemplo, o uso de TCC e ISRS para o tratamento de transtornos de ansiedade em crianças e adolescentes, embora, para a maioria dos pacientes, a abordagem seja iniciar um deles e adicionar outro apenas se necessário, seja por não resposta ou por resposta parcial.
RESPOSTAS AO TRATAMENTO
A resposta ao tratamento para transtornos de ansiedade é geralmente medida por meio do autorrelato do paciente e pode ser avaliada por meio de questionários específicos para cada transtorno.
No caso de as respostas ao tratamento estarem abaixo do ideal e os sintomas persistirem, apesar de um número adequado de sessões, horário ou dosagem do medicamento, mudanças de estratégias terapêuticas devem ser consideradas. Até o momento, não existem biomarcadores preditivos para respostas a tratamentos medicamentosos ou psicoterápicos.
Farmácia para o transtorno de ansiedade generalizada (TAG). Os tratamentos de primeira linha para o TAG envolvem ligantes α2δ, inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS), benzodiazepínicos (BZ), inibidores da recaptação de serotonina e de noradrenalina (IRSN) e buspirona. Os tratamentos de segunda linha envolvem antidepressivos tricíclicos (ATC), mirtazapina, trazodona e agonistas parciais/inibidores da recaptação de serotonina (APIRS; por exemplo, vilazodona). As medicações adjuvantes que podem ser úteis são os hipnóticos ou um antipsicótico atípico. Além disso, a terapia cognitivo-comportamental (TCC) também é um importante componente do tratamento da ansiedade.
Farmácia para o pânico. Os tratamentos de primeira linha para o transtorno de pânico consistem em ligantes α2δ, inibidores seletivos para a recaptação da serotonina (ISRS), benzodiazepínicos (BZ) e inibidores da recaptação de serotonina e de noradrenalina (IRSN). Os tratamentos de segunda linha envolvem inibidores da monoamina oxidase (IMAO), antidepressivos tricíclicos (ATC), mirtazapina e trazodona. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) pode ser benéfica para muitos pacientes. Além disso, medicações adjuvantes para os sintomas residuais podem envolver hipnóticos ou um antipsicótico atípico.
Farmácia para a ansiedade social. Os tratamentos de primeira linha para o transtorno de ansiedade social consistem em ligantes α2δ, inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) e inibidores da recaptação de serotonina e de noradrenalina (IRSN). Foi demonstrado que os inibidores da monoamina oxidase (IMAO) são benéficos e podem constituir uma opção de segunda linha. Outras opções de segunda linha são os benzodiazepínicos (BZ) e os betabloqueadores. Várias medicações podem ser usadas como adjuvantes para os sintomas residuais. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) também pode ser útil.
Farmácia para o transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). As opções farmacológicas de primeira linha para o TEPT são inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) e inibidores da recaptação da serotonina e noradrenalina (IRSN). No TEPT, diferentemente de outros transtornos de ansiedade, não foi demonstrado que os benzodiazepínicos (BZ) sejam tão úteis, embora possam ser considerados com cautela como opção de segunda linha. Outros tratamentos de segunda linha são os ligantes α2δ, os antidepressivos tricíclicos (ATC) e os inibidores da monoamina oxidase (IMAO). Várias medicações podem ser usadas como adjuvantes para os sintomas residuais. A terapia cognitivo-comportamental (TCC) também costuma ser recomendada.
5. Explique os mecanismos de ação do zolpidem e da desvenlafaxina.
Zolpidem
1. PARA QUE ESTE MEDICAMENTO É INDICADO?
O hemitartarato de zolpidem é indicado para o tratamento da insônia (dificuldade para dormir) que pode ser ocasional; (eventual), transitória (passageira) ou crônica (que dura há muito tempo).
2. COMO ESTE MEDICAMENTO FUNCIONA?
O hemitartarato de zolpidem é um medicamento que possui em sua fórmula uma substância chamada zolpidem. O zolpidem age sobre os centros do sono que estão localizados no cérebro. Por isso, o médico prescreve hemitartarato de zolpidem para o tratamento da insônia, isto é, para aquelas pessoas que têm dificuldade em adormecer ou permanecer adormecidas. O tempo médio de início de ação do hemitartarato de zolpidem ocorre entre 0,5 e 3 horas.
https://eurofarma.com.br/produtos/bulas/patient/pt/bula-zolpidem-hemitartarato-de-5mg-sublingual.pdf
Hipnóticos da classe dos novos agonistas do receptor benzodiazepínico são conhecidos como “Fármacos Z” e incluem zolpidem, zopiclona e eszopiclona. Possuem propriedades sedativas semelhantes às dos benzodiazepínicos, embora não estejam estruturalmente relacionados.
Mecanismo de ação
Presume-se que exerçam seus efeitos através da ligação ao local benzodiazepínico da subunidade α-1 do complexo receptor GABA-A, aumentando a frequência da abertura de canais de cloro, resultando em inibição da excitação neuronal. A possível seletividade a essa subunidade, envolvida na regulação do sono, é responsável por menores propriedades ansiolítica, relaxante muscular e anticonvulsivante desses fármacos.
Uso terapêutico
Zolpidem é usado como hipnótico no tratamento por curto prazo de insônia (duas a seis semanas). O risco de abuso e dependência aumenta com a duração do tratamento.
Como possui um início de ação rápido, deve ser usado imediatamente antes de deitar. Sua duração de ação é de 6 a 8 horas, não deve ser readministrado durante a mesma noite.
As doses máximas diárias de zolpidem para adultos não devem exceder 10 mg (comprimido de liberação imediata ou sublingual) ou 12,5 mg (comprimido de liberação prolongada).
Mecanismos de ação dos hipnóticos
O ácido gama amino-butírico (GABA) é o principal neurotransmissor inibitório do sistema nervoso central. O receptor GABA é o complexo molecular receptor-benzodiazepínico-ácido gamaaminobutírico do tipo A ou GABA-A, sendo que este receptor contém uma região específica de ligação para os benzodiazepínicos (BZDs) e para outras moléculas como os barbitúricos e álcool (figura 1). A ligação do GABA e de seus agonistas ao receptor GABA-A produz uma modificação estrutural com abertura dos canais de cloro aumentando o influxo celular deste íon gerando uma inibição sináptica rápida e hiperpolarização de membrana celular.
Zolpidem
É um agonista seletivo do receptor ômega 1 de início de ação e meia vida curta (Tabela 2) que produz alterações mínimas na arquitetura do sono em pessoas normais, mantendo as porcentagens de estágio 2, sono delta e do sono REM e normaliza o sono em pacientes insones com alterações da arquitetura do sono.
Os efeitos indesejáveis do zolpidem são sonolência no dia seguinte, fadiga, irritabilidade, cefaléia e amnésia no dia seguinte. Estes efeitos são geralmente discretos e relacionam-se com a dose e a susceptibilidade de cada paciente, ocorrendo nas horas seguintes à administração do zolpidem, caso o paciente não vá para a cama e adormeça imediatamente. O efeito clínico hipnótico do zolpidem dura geralmente por até 6 meses. O zolpidem nas doses de 5 a 10 mg à noite por até 28 dias seguidos, não altera significativamente os resultados dos testes neuropsicológicos de alerta, concentração, memória e coordenação motora em populações de pacientes com insônia, voluntários normais jovens e idosos.
file:///C:/Users/Usuario/Downloads/levi_heitor,+Pages+from+RN+12+04-5.pdf
DESVENLAFAXINA
O succinato de desvenlafaxina, denominado oficialmente como1 - [ ( 1RS ) -2 - (dimetilamino) -1 - (4 - hidroxifenil) etil ] ciclohexanolsuccinato de monohidrato, consiste em um fármaco de última geração para o uso clínico no tratamento da depressão.
Seu mecanismo consiste em ser um dual bloqueador seletivo da recaptação dos neurotransmissores serotonina e noradrenalina. Nos Estados Unidos foi aprovada em 2008 para o tratamento do transtorno depressivo maior (TDM) em adultos [27]. A desvenlafaxina representa o principal metabólito ativo da venlafaxina, outro representante dos IRSN, diferenciando-se deste pela ligação a uma molécula do sal succinato monohidratado reproduzido artificialmente, ou seja, este medicamento é ingerido na sua forma ativada farmacologicamente [28] [29]. Tal peculiaridade lhe permite uma ação que dispensa o metabolismo de primeira passagem, no entanto a desvenlafaxina apresenta outras vantagens como antidepressivo, pois possui poucas interações medicamentosas, boa tolerabilidade perante aos pacientes e uma posologia simples que dispensa titulações, constituindo-se, portanto em uma importante opção na terapia antidepressiva [30].
3.6 FARMACODINÂMICA
Os antidepressivos IRSN impedem a recaptação dos neurotransmissores noradrenalina e serotonina na fenda présinaptica num mecanismo que se baseia na ligação destas drogas as respectivas proteínas transportadoras destas monoaminas. Tal processo se assemelha a atividade dos antidepressivos tricíclicos, no entanto, os IRSNs diferem destes por apresentarem insignificante afinidade por outros receptores como os muscarínicos, colinérgicos, α1-adrenérgicos e histaminérgicos H1, consequentemente, os efeitos adversos advindos com a atividade destes receptores não serão observáveis no uso clínico dos IRSNs [31] [32]. A desvenlafaxina inibe cerca de dez vezes mais a recaptação da serotonina do que a noraepinefrina em ensaios em vitro, além de uma fraca afinidade pelos transportadores da dopamina [32]. O retardamento da recaptura de cada neurotransmissor de volta ao neurônio que a libertou, aumenta a concentração extracelular deste na fenda sináptica potencializa-o quanto ao estímulo de sinalização celular no cérebro [31].
3.7 FARMACOCINÉTICA
A desvenlafaxina em comprimidos é formulada para ter uma liberação controlada, além de possuir uma farmacocinética linear e de fácil previsibilidade observados em estudos de dose única nas doses de 100 mg e 600 mg ao dia [33] [34]. O tempo de meia-vida terminal médio deste fármaco é em torno de 10 horas, alcançando a concentração plasmática máxima em cerca de 7,5 horas, sendo que em doses únicas diárias, o estado de equilíbrio no plasma são atingias após 4 a 5 dias [35] [30]. A biodisponibilidade da droga ativa após ingestão da formulação oral é cerca de 80%, uma vez que a absorção é minimamente influenciada pelos alimentos. Além de apresentar baixa proporção de ligação com as proteínas plasmáticas, em torno de 30 %, independentemente da concentração da droga, o que resulta em altas concentrações cerebrais [35]. Em torno de 45% da droga é excretada na urina de forma inalterada em 72 horas após a ingestão do fármaco, ao passo que de 19% da desvenlafaxina é eliminada na forma de um metabólito glucuronado num processo de conjugação hepático conhecido como glucoronidação. E em uma proporção inferior a 5%, por meio do metabolismo oxidativo de Ndesmetilação, a droga surge na urina como N,O-didesmetilvenlafaxina através da isoenzima CYP3A4 do citocromo P450 [34] [35].
Como consequência dos processos metabólicos e de eliminação, deve-se pensar nas dosagens de dias alternados para pacientes com insuficiência renal grave assim como também se recomenda um ajuste de doses às pessoas com disfunção hepática de moderada a grave [33]. É importante dizer que a desvenlafaxina não se utiliza da isoenzima 2D6 do CYP450, sendo metabolizada apenas pela isoenzima 3A4 de forma mínima, o que constitui em grande vantagem em relação à maioria das outras drogas psiquiátricas, além disso, a desvenlafaxina pouco se liga às proteínas plasmáticas, tampouco inibe ou é substrato da glicoproteína-P transportadora, que está diretamente ligada à metabolização e excreção de drogas, o que leva a crer que este fármaco possui interação medicamentosa farmacocinética irrelevante [30].
file:///C:/Users/Usuario/Downloads/admin,+Gerente+da+revista,+201-635-1-PB.pdf
6. Crise de pânico x crise de ansiedade: qual a diferença? Explique.
7. Fobia, medo, pânico: diferencie as condições e características que as diferem.
Transtornos Fóbicos:
Transtornos da ansiedade nas quais o aspecto central é um medo persistente e irracional de um objeto, atividade ou situação específicos, que o indivíduo se sente compelido a evitar. O indivíduo reconhece que o medo é excessivo e despropositado.
Fobia Social:
Transtorno de ansiedade caracterizado pelo medo persistente e irracional, ansiedade ou evasivas de situações ou atuações sociais.
Agorafobia:
Medo obsessivo, persistente e intenso de espaços ou situações dos quais não se poderia escapar sem dificuldade ou embaraço.
Pânico:
Estado de ansiedade aguda extrema e de medo sem fundamento, acompanhado pela desorganização do funcionamento da personalidade.
Transtorno de Pânico:
Tipo de transtorno da ansiedade caracterizado por ataques de pânico inesperados com duração de minutos ou, mais raramente, de horas. Ataques de pânico iniciam-se com uma apreensão, medo ou terror intenso e, frequentemente, com um sentimento de tragédia iminente. Os sintomas experimentados durante um ataque de pânico incluem dispneia, sensações de sufocamento, tontura, perda do equilíbrio ou fraqueza, sensações de engasgamento, palpitações ou taquicardia, tremores, suor, náusea ou outra forma de sofrimento abdominal, despersonalização ou desrealização, parestesias, calores ou arrepios, dor ou desconforto no peito, medo de morrer ou de perder o controle sobre si mesmo ou de enlouquecer. Também pode se desenvolver agorafobia. Assim como os outros transtornos da ansiedade, pode ser herdado como uma característica autossômica dominante.
Medo:
A resposta afetiva a um perigo externo real, que desaparece com o fim da situação ameaçadora.
8. Quais são as fases da insônia? Explique-as.
O transtorno de insônia acomete principalmente pessoas na terceira idade, indivíduos de segmentos socioeconômicos inferiores, podendo estar associada com doenças físicas, psiquiátricas, transtornos circadianos, medicações e transtornos primários do sono.
Quanto à classificação da insônia podemos dividi-la didaticamente em:
I.I. Quanto ao momento do sono em que ocorre:
a) Insônia inicial – paciente refere dificuldade para iniciar o sono; mais comum em jovens.
b) Insônia de manutenção – paciente cita dificuldade em manter o sono, apresentando despertares durante a noite; mais comum em adultos e idosos.
c) Despertar precoce – paciente apresenta despertar final em horário muito anterior ao desejado.
Essa caracterização pode sugerir possíveis etiologias para o quadro (síndrome das pernas inquietas em casos de insônia inicial; apneia do sono em casos de insônia de manutenção; transtorno de humor em casos de despertar precoce etc.). Ela perde força, porém, quando o paciente refere a mesma dificuldade em mais de um segmento da noite, padrão que é relativamente comum.
A queixa de “sono não restaurador” costumava ser relacionada à caracterização temporal da insônia. Ela não é mais assim considerada pelos critérios diagnósticos mais recentes, uma vez que costuma estar mais associada a outros transtornos de sono (ex.: apneia do sono) e não há relação causal evidente com a insônia.
I.II. Quanto ao curso:
a) Insônia aguda – quadro de insônia que não chega a atingir os critérios mínimos de frequência e duração associados à insônia crônica.
b) Insônia recorrente – quadro que se caracteriza pela ocorrência de ao menos dois episódios de insônia aguda no período de um ano.
c) Insônia crônica – dificuldade para dormir que determina sintomas diurnos ocorrendo ao menos três vezes por semana por no mínimo três meses.
Mais do que o aspecto temporal, sabe-se que essa divisão também implica na gravidade do quadro clínico, sendo a insônia crônica (ou transtorno de insônia) a forma mais completa e de maior impacto.
I.III. Quanto ao tempo de sono:
a) Insônia com tempo de sono curto – refere-se ao insone que apresenta tempo de sono muito menor que o fisiologicamente normal para sua faixa etária.
b) Insônia com tempo de sono normal – refere-se ao insone que apresenta tempo de sono dentro ou próximo do fisiologicamente normal para sua faixa etária.
Os pacientes privados de sono apresentam quadro clínico mais intenso, com repercussões e consequências potencialmente graves. Esse impacto tem justificado as várias tentativas de se associar esse parâmetro à insônia. Porém fenômenos como a má percepção do sono, presente em muitos casos, tendem a contrariar essa ideia, a julgar pelo achado de alguns estudos que sugerem um tempo objetivo de sono semelhante entre indivíduos insones e assintomáticos.
https://www.sbnewsgroup.com/wp-content/uploads/2022/06/Neurologia_zolpidem.pdf
9. Quanto de álcool se considera abuso? Correlacione o uso/abuso do álcool com a ansiedade.
https://linhasdecuidado.saude.gov.br/portal/transtornos-por-uso-de-alcool-no-adulto/definicao/
A porcentagem de álcool pode variar dentro do mesmo tipo de bebida (por exemplo, há cervejas com teor alcoólico de 3,5% e outras com 6%, mas a maioria tem cerca de 5%. A média de doses é referente a uma pessoa com ≅ 70 kg.