Simulação Realística 4:
Marinalva Dias, 15 anos - acompanhada pela vizinha
QD: Dor abdominal há 3 dias
HPMA: com dor na região inferior do abdome, em faixa e com piora ao toque. Afebril, Hipocorada ++/4, saturação 98, FR 15, PA 100x70 (08:30 am) e 120x90 (09:00 am). À consulta foi administrado 0,5 L de soro e paracetamol. Na segunda consulta, foi administrado Ibuprofeno, tramal, Dramim e soro.
Paciente apresentava dor há 3 dias, com piora no dia de hoje. A dor era em faixa nos quadrantes inferiores do abdome, em cólica, quantificando, em primeira consulta, 7 a 8 de 10 e na segunda consulta, quantificando com 8 de 10. Apresentava náuseas, tendo êmese prévia. Fez uso de Ponstan, sem melhora do quadro. Melhora ao ficar parada e piora com o movimento. Refere atraso menstrual de 10 dias. Nega febre.
AP: Refere relações sexuais desprotegidas, com parceiro único. Comenta fazer o uso de um “chá” feito pela vizinha para evitar a gravidez.
AF: Nega histórico de apendicite
ISDA: Paciente relata ter tido atraso de 10 dias da menstruação. Relaciona achado com uma possível gravidez, visto a realização de atividade sexual sem preservativos. Menarca aos 11 anos. Nega queixas urinárias.
Exame físico:
Afebril, Hipocorada ++/4, saturação 98, FR 15, PA 100x70 (08:30 am) e 120x90 (09:00 am). BEG, LOTE, HAAAE, Glicemia capilar de 80 mg/dL. Perfusão de 2 s. Sem edema em MMII
Ausculta cardíacas: BRNF 2T SS
Ausculta Pulmonar: MV+ SRA
Abdominal:
Inspeção: plano, sem cicatrizes
Ausculta: RHA abolido na fossa ilíaca direita e aumentados no hipogastro.
Percussão: timpânica em toda extensão inferior do abdome.
Palpação: Abdome tenso, dor a palpação superficial e profunda na fossa ilíaca direita, sem visceromegalias
DB+ no ponto de McBurney, Murphy negativo, sinal do obturador, sinal de Rovsing
Perguntas relacionadas às fezes: Consistência, odor, presença de pus, sangue, gordura, formato, restos de comida,
Plastrão: massa endurecida na fossa ilíaca
Rovsing - palpação profunda x rolamento?
Como diferenciar clinicamente e no exame físico uma gravidez ectópica de uma apendicite?
Quais os diagnósticos diferenciais da apendicite?
Quais os exames de imagem usados para a avaliação de apendicite e gravidez ectópica? Quais exames de imagem podem ser feitos durante a gravidez?
Como conduzir um caso de apendicite?
Quais sintomáticos podem ser usados na gestação?
https://docs.bvsalud.org/biblioref/2018/04/882358/gestacao-ectopica-diagnostico-e-manejo.pdf
file:///C:/Users/Usuario/Downloads/47585-119024-1-PB.pdf
https://www.scielo.br/j/brjp/a/HfxQFjJNvfbFFjgJkrzckTb/?lang=pt#
https://www.ismp-brasil.org/site/wp-content/uploads/2020/02/boletim_ismp_dezembro.pdf
1.Como diferenciar clinicamente e no exame físico uma gravidez ectópica de uma apendicite?
MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
As manifestações clínicas típicas geralmente aparecem entre a sexta e oitava semana após o período da ultima menstruação normal, mas pode ocorrer mais tardiamente, principalmente na prenhez ectópica não tubária. Desconfortos da gravidez normal, como sensibilidade mamária, polaciúria, náuseas, podem ocorrer concomitantemente.
A tríade sintomática típica inclui: sangramento vaginal e dor abdominal após período de amenorreia, quadro este confundível com abortamento espontâneo. Deve-se suspeitar de prenhez ectópica em qualquer mulher em idade reprodutiva com esses sintomas, especialmente naquelas que tem algum fator de risco.
O exame físico poderá revelar dor, defesa e/ou dor à descompressão a palpação abdominal e dor a mobilização uterina e de anexos, assim como massa anexial ao toque vaginal.
Embora o exame físico seja de extrema valia, este, em pacientes com gestações ectópicas iniciais e não rotas, pode ser normal e a gestação extrauterina ser descoberta apenas como um achado casual à ecografia. Na presença de sinais de choque suspeita-se de ruptura tubária, podendo resultar em hemorragia intra-abdominal severa, a qual limita as opções de tratamento e aumentam a morbimortalidade materna.
O diagnóstico da gestação ectópica é baseado na história clínica, dosagem da betagonadotrofina coriônica humana (β-HCG) e achados da ultrassonografia transvaginal. Esta combinação permite o diagnóstico precoce desta patologia, permitindo assim, opções terapêuticas menos invasivas e radicais.
SINTOMAS INICIAIS DE APENDICITE AGUDA:
A AA inicialmente cursa com dor abdominal inespecífica ou periumbilical que, posteriormente, migra para o quadrante inferior direito. A dor, quando se torna localizada, é um sinal de que ocorreu inflamação do peritônio parietal adjacente. Em um período de 24 horas, o quadro álgico pode se intensificar e vir acompanhado, ou não, dos seguintes sintomas: perda ponderal, perda de apetite, náuseas e vômitos, febre (presente em 40% dos casos), diarreia, mal-estar geral e polaciúria ou urgência miccional. De forma menos comum, a dor pode chegar a interromper o sono do paciente. Em grávidas, pelo deslocamento do apêndice causado pelo útero, a dor pode ser percebida no abdome superior, dificultando o diagnóstico.
2. Quais os diagnósticos diferenciais da apendicite?
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL:
Por apresentar-se com sintomas inespecíficos, a AA deve ser investigada de forma minuciosa, com o histórico médico detalhado e a realização do exame físico, ambos essenciais para a exclusão dos diagnósticos diferenciais. Neste contexto, deve-se conhecer as patologias que mimetizam a AA, sendo elas: gravidez ectópica, endometriose, doença inflamatória pélvica, cálculos renais, doença do intestino irritável, doença de Crohn, colite do lado direito, entre outras. A partir destas patologias se observa que a evidência de infecção viral e o aumento da sensibilidade severa são fatores predominantes dentro do que é o diagnóstico diferencial da AA.
Somado aos fatores supracitados, deve-se também considerar a idade do paciente, devido ao fato de que se abre uma ampla gama de possíveis diagnósticos, pode-se inferir que o pico de maior incidência seria durante os anos escolares. Com esses dados, se utiliza de uma variedade de sistemas de pontuação para assim poder objetivar o diagnóstico e excluir outras patologias. Dentro dos sistemas de pontuação utilizados estão o escore de alvarado e o escore de resposta inflamatória da apendicite, sendo o primeiro usado para descartar AA ou determinar a necessidade de uma intervenção cirúrgica e o outro para confirmar a inflamação.
3. Quais os exames de imagem usados para a avaliação de apendicite e gravidez ectópica? Quais exames de imagem podem ser feitos durante a gravidez?
Os efeitos decorrentes das radiações ionizantes podem ser divididos em determinísticos e estocásticos.
Os efeitos determinísticos são aqueles consequentes à exposição a altas doses de radiação e dependem diretamente desta exposição, podendo levar a lesões multicelulares e até alterações cromossomais, como a morte de células malignas submetidas à radioterapia.
Os efeitos estocásticos ou aleatórios são aqueles que se manifestam após meses ou anos da exposição à radiação (geralmente em baixas doses contínuas), não permitindo estabelecer claramente uma relação de "causa e efeito".
O feto é mais vulnerável à radiação entre 8-15 semanas de gestação. A teratogenicidade causada pela radiação é dose dependente. O risco de mal formações aumenta significativamente com doses acima de 150-200 mGy para o feto, podendo gerar crescimento intra-uterino restrito, defeitos no sistema nervoso central como microcefalia e retardo mental. Danos fetais mais graves ocorrem com doses acima de 500 mGy. Após a 15ª semana de gestação, o feto é menos sensível a efeitos da radiação no sistema nervoso central. É importante salientar que é muito difícil que, em exames diagnósticos de rotina, mesmo quando realizados com campo de irradiação direto sobre o útero, o feto seja exposto a essas doses de radiação, pois a maioria desses exames usam doses menores que 50 mGy.
Após a 32ª semana de gestação não há riscos significativos ao feto, excetuando-se a possibilidade de aumento do risco de desenvolvimento de neoplasia maligna durante a infância ou a maturidade. Uma dose de 20 mGy representa um risco adicional de 0,8% no desenvolvimento de neoplasias na infância.
Nos últimos anos tem aumentado o uso de métodos de imagem para auxiliar no diagnóstico final de diversas afecções. Para pacientes gestantes, devem-se tomar alguns cuidados adicionais se o exame não puder ser adiado, como proteção de chumbo sobre o abdômen, diminuição do campo de visão, da tensão (kV) e do produto da corrente pelo tempo de exposição (mAs) ao mínimo necessário para o diagnóstico, diminuindo o número de cortes. Em equipamentos helicoidais, utilizar "pitch" maior (igual ou superior a dois) oferece sensível redução da dose de radiação. Também deve-se pesar o riscobenefício de cada exame em particular, de acordo com a doença ou suspeita da paciente.
A preocupação quanto ao uso da ressonância magnética deve-se a uma possível injúria tecidual do feto pelo aquecimento produzido pelas ondas de pulso da RM. O Comitê Internacional de Proteção de Radiação Não Ionizante recomenda postergar para depois do primeiro trimestre exames eletivos de RM. O uso de contraste iodado é conhecido por atravessar a barreira placentária e atingir o feto. Embora os contrastes iodados possam causar hipotireoidismo neonatal se instalados diretamente no saco embrionário, não foi relatado nenhum caso com efeito teratogênico após seu uso.
Indicações específicas por patologia:
Torção de ovário A incidência de torção de ovário aumenta durante a gravidez, atingindo uma em cada 800 gestações. O método preferido é a ultrassonografia e avaliação com Doppler (redução ou ausência de fluxo arterial). Outro achado é a dilatação ovariana. A RM pode demonstrar mais claramente o edema ovariano em eventos precoces.
Apendicite:
A apendicite aguda é a causa mais comum de cirurgia abdominal durante a gravidez. A avaliação é dificultada pela posição atípica do apêndice, deslocado pelo útero gravídico. A US é o método de primeira escolha, identificando uma estrutura tubular inflamatória com mais de 6mm no quadrante inferior direito, como visualizado na Figura 1. Se a US for inconclusiva, o próximo passo deve ser a RM, tendo alta qualidade na hora do diagnóstico. A tomografia computadorizada (TC) fica reservada para quando a RM não estiver disponível.
Nefrolitíase:
A prevalência em gestantes é baixa (0,4-5 a cada 1000), mas aumenta a incidência em multíparas. A primeira escolha é o uso da US, mas o exame pode ser dificultado pelo tamanho do útero e peso da paciente. O passo seguinte é usar uma TC de baixa dose se a paciente tiver mais de 24 semanas ou uma urografia se tiver menos de 24 semanas de gestação.
Trauma:
A maioria dos acidentes acontece no terceiro trimestre da gravidez, sendo os automobilísticos os principais. A lesão mais comum é a ruptura da placenta e do útero e hemorragias. A prioridade na hora do atendimento é salvar a gestante, mas sem descuidar do feto. Inicialmente pede-se raio x de tórax e coluna cervical e uma ecografia obstétrica. A ecografia abdominal não consegue visualizar com precisão algumas partes vitais do abdômen, por isso é usado uma TC como próximo passo. A RM não tem bom valor para avaliação de trauma.
Conclusão:
Apesar de a maioria dos métodos de imagem exporem a paciente e o feto a radiação em doses baixas (< 50mGy), as devidas precauções sempre devem ser tomadas, pois aliviam o estresse e ansiedade maternos, além de diminuir os riscos futuros para o feto. Uma preocupação maior com possíveis danos se instalará no caso de repetidos exames durante o período gestacional, elevando assim a dose absorvida de radiação pelo feto.
A lição maior é sempre pensar no risco-benefício de cada caso, isoladamente, na hora de escolher o melhor método de imagem para ajudar a paciente sem prejudicar o feto.
4. Como conduzir um caso de apendicite?
MANEJO DA APENDICITE NÃO PERFURATIVA EM ADULTOS
A apendicite não perfurada, também conhecida como apendicite simples ou apendicite não complicada, refere-se à apendicite aguda que se apresenta sem sinais clínicos ou radiográficos de perfuração (por exemplo, massa inflamatória, flegmão ou abscesso). Aproximadamente 80% dos casos de apendicite não são perfurados na apresentação.
TC: tomografia computadorizada; SU: pronto-socorro.
* A apendicite não perfurada, também conhecida como apendicite simples ou apendicite não complicada, refere-se à apendicite aguda que se apresenta sem sinais de perfuração na TC (por exemplo, massa inflamatória, flegmão ou abscesso).
¶ O manejo conservador não foi suficientemente estudado nesses pacientes, pois eles foram excluídos dos estudos.
Δ As opções de antibióticos não são padronizadas. Consulte a Tabela 2 para opções de amostra.
◊ A resposta antibiótica pode ser retardada em pacientes com 45 anos de idade ou mais; naqueles com apendicólitos, líquido ou ar extraluminal, febre ou marcadores inflamatórios elevados; e naqueles que tiveram sintomas por mais de 48 horas, todos associados a abscesso apendicular. Um período mais longo de observação e antibióticos intravenosos podem ser necessários para esses pacientes.
§ A porcentagem mais baixa foi relatada por ensaios excluindo pacientes com apendicólito; a porcentagem mais alta foi relatada por estudos incluindo pacientes com apendicólito.
¥ Estas são opções de amostra para infecções adquiridas na comunidade de baixo a moderado risco. As doses apresentadas são para pacientes com função renal normal; alguns agentes requerem ajuste para insuficiência renal; consulte a(s) monografia(s) de drogas Lexicomp.
‡ Amoxicilina-clavulanato é uma opção razoável se a taxa de resistência de Escherichia coli da comunidade ao agente não for >10%.
MANEJO DA APENDICITE PERFURADA EM ADULTOS
Pacientes com apendicite perfurada podem parecer agudamente doentes e apresentar desidratação significativa e anormalidades eletrolíticas, particularmente se febre e vômitos estiverem presentes por um longo período. A dor geralmente se localiza no quadrante inferior direito se a perfuração tiver sido isolada por estruturas intra-abdominais circundantes, como o omento, mas pode ser difusa se ocorrer peritonite generalizada. Nos estudos de imagem, a apendicite pode se apresentar com uma perfuração contida (uma massa inflamatória frequentemente chamada de "fleuma" ou um abscesso intra-abdominal ou pélvico) ou, raramente, uma perfuração livre.
Outras apresentações incomuns de perfuração do apêndice podem ocorrer, como formação de abscesso retroperitoneal devido à perfuração de um apêndice retrocecal ou formação de abscesso hepático devido à disseminação hematogênica da infecção através do sistema venoso portal. Uma fístula enterocutânea pode resultar de um abscesso intraperitoneal que fistuliza na pele. A perfuração do apêndice pode resultar em obstrução do intestino delgado, manifestada por vômitos biliosos e obstipação. Febres altas e icterícia podem ser observadas com pieflebite (trombose séptica da veia porta) e podem ser confundidas com colangite.
* A apendicite perfurada, também chamada de apendicite complicada, é caracterizada por uma massa palpável no quadrante inferior direito ao exame físico ou por um flegmão (massa inflamatória) ou abscesso nos exames de imagem.
¶ A apendicectomia imediata, ao contrário da apendicectomia intervalada, deve ser realizada dentro de 12 horas após a decisão de operar, exceto no caso de paciente instável/séptico ou presença de perfuração livre ou perfuração generalizada, onde a cirurgia deve ser realizada assim que possível.
Δ A escolha do antibiótico varia de acordo com as situações clínicas e está em constante evolução.
5. Quais sintomáticos podem ser usados na gestação?
Paracetamol
É o analgésico e antitérmico mais utilizado durante a gestação e lactação. Entretanto, a sua utilização antes do nascimento vem sendo associada à asma, distância anogenital mais curta em meninos (preditor de baixo potencial reprodutor), espectro autista, problemas neurológicos (desenvolvimento motor, comunicação), transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, alterações comportamentais, doenças alérgicas, dentre outros. Apesar disso, os estudos não são conclusivos e o paracetamol é considerado um fármaco sem efeitos teratogênicos, continuando a ser considerado o analgésico mais seguro durante a gestação e lactação.
A exposição pré-natal ao paracetamol pode estar relacionada às consequências na saúde reprodutiva da mulher, decorrentes de alterações no desenvolvimento dos ovários ainda na vida intrauterina. Com relação às complicações de origem materna, o uso do paracetamol pode estar relacionado ao risco aumentado para o desenvolvimento de pré-eclâmpsia, trombose venosa profunda e tromboembolismo pulmonar.
Como os estudos são inconclusivos e há grande experiência no uso do fármaco durante a gestação, o paracetamol continua sendo o analgésico de escolha durante a gestação, devendo-se utilizar a menor dose e por menor tempo possível. O paracetamol tem classificação B pelo FDA.
Dipirona
Apesar deste fármaco ter sido retirado de comercialização em alguns países, como nos Estados Unidos, em virtude de sua associação à agranulocitose e anemia aplásica, continua sendo usado em partes da Europa, Ásia e em países da América do Sul, como no Brasil. O seu uso durante a gestação não está associado às malformações congênitas, morte intrauterina, parto prematuro ou baixo peso ao nascer.
Apesar de ser largamente utilizada no Brasil, dois estudos mostraram possível associação entre o uso da dipirona e tumores na infância: tumor de Wilms e Leucemia. Por outro lado, em estudos in vitro em animais, a dipirona demonstrou pequeno potencial mutagênico ou carcinogênico e apenas quando administrada em altas doses.
A dipirona não está relacionada diretamente às malformações maiores ou menores no feto, mas o seu uso deve ser limitado a menores dose e tempo de uso possíveis.
Ácido acetilsalicílico (AAS)
O seu uso era limitado às suas propriedades analgésicas durante a gravidez. Entretanto, a prescrição nessa população vem aumentando nos últimos anos. O AAS não aumenta a incidência de abortamentos ou morte intrauterina, nem apresenta efeitos teratogênicos.
O AAS vem sendo utilizado para tratamento e prevenção da pré-eclâmpsia, principalmente em pacientes de alto risco, em mulheres portadoras da síndrome dos anticorpos antifosfolípides e com história de abortamentos de repetição (associado ou não à heparina), além de pacientes que se submeteram à fertilização in vitro. Quando utilizado em pacientes com alto risco para o desenvolvimento de pré-eclâmpsia, o AAS reduz a incidência de parto prematuro em 14% e de crescimento intrauterino restrito em 20%, provavelmente por sua ação reduzindo a isquemia placentária. O AAS interfere na função plaquetária, podendo causar sangramento materno ou fetal. Entretanto, quando utilizado em baixas doses, não tem demonstrado efeito significativo sobre o risco de hemorragia intraventricular e sangramentos de ocorrência neonatal.
O AAS em baixas doses (60-150mg/dia), quando utilizado no primeiro trimestre, não está associado ao aumento da incidência de malformações congênitas, sangramentos pós-parto, ruptura de placenta ou efeitos adversos na anestesia. Quando utilizado no terceiro trimestre, não foi associado ao aumento da incidência de hemorragia intraventricular, hemorragia neonatal ou fechamento prematuro do ducto arterial.
Quando utilizado em baixas doses, o AAS é seguro e apresenta efeitos positivos na reprodução. A aspirina em baixas doses é classe C pelo FDA, mas dose acima de 150mg por dia é considerada classe D.
ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDES
Os anti-inflamatórios não esteroides (AINES) estão entre as classes de fármacos mais utilizados durante a gestação, sejam eles derivados do ácido propiônico (naproxeno, ibuprofeno, cetoprofeno), do ácido fenilacético (diclofenaco sódico), dos salicilatos (ácido acetilsalicílico), dos oxicans (meloxicam, piroxicam) ou do indol (indometacina). Apresentam como mecanismo de ação a inibição da produção das prostaglandinas por inibição direta da enzima ciclo-oxigenase (COX). Em relação aos inibidores não seletivos da COX, quando utilizados no primeiro trimestre ou próximo da concepção, há dúvidas se existe associação entre o seu uso e o aumento da incidência de abortamento.
Por outro lado, um estudo envolvendo mais 65.000 mulheres evidenciou que o uso de AINES não é um fator de risco independente para abortamento. Estudos em humanos sugerem associação entre o uso de AINES e redução da fertilidade feminina, sendo prudente evitar o seu uso em mulheres que estão tentando engravidar. Em relação às malformações congênitas, a situação dos AINES é mais complexa. Na maioria dos estudos, o risco para qualquer malformação não apresenta aumento significativo com o seu uso, mas pode estar aumentado em algumas condições, notavelmente defeitos cardíacos. Por outro lado, um estudo que avaliou especificamente o risco de defeitos do septo interventricular não achou qualquer associação.
A utilização de AINES no terceiro trimestre da gestação pode estar associada, no feto, ao fechamento prematuro do ducto arterial (podendo levar à hipertensão pulmonar neonatal), oligodrâmnio (causado por redução do débito urinário fetal), enterocolite necrotizante e hemorragia intracraniana. Na mãe, pode estar relacionada ao trabalho de parto prolongado, hemorragia pós-parto. Embora a administração por curto período dificilmente esteja associada ao fechamento do ducto arterial fetal, é comum a prática de evitar-se o uso de AINES após o período que se estende entre 28 e 32 semanas até o final da gestação.
Em relação aos inibidores seletivos da COX-2, esperava-se que apresentassem menos efeitos adversos que os não seletivos, mas os mesmos problemas estão presentes, como oligodrâmnio e fechamento prematuro do ducto arterial. Como há poucos trabalhos sobre o uso dessa classe de fármacos durante a gestação, eles são considerados classe C até o segundo trimestre, e D no terceiro trimestre. Os anti-inflamatórios não seletivos apresentam classificação B pelo FDA até o segundo trimestre, sendo classificação D no terceiro.
ANALGÉSICOS OPIOIDE
Os opioides são fármacos importantes no tratamento da dor aguda durante a gestação, sobretudo quando associados ao AINES. Entretanto, para dor crônica, os riscos e benefícios do uso crônico devem ser discutidos com a mulher, e os guidelines da American Pain Society recomendam uso mínimo ou o não uso, se possível.
O uso dos opioides durante o primeiro trimestre foi associado em alguns estudos com alterações cardíacas, espinha bífida e gastrosquise, enquanto outros que tentaram demonstrar essas associações falharam em relacionar qualquer malformação com o uso de opioides.
Os opioides parecem não apresentar efeito teratogênico importante, mas há dúvidas em relação a defeitos cardiovasculares, sobretudo com opioides sintéticos.
Codeína
Em estudo envolvendo 67.982 gestantes, observou-se que a codeína foi utilizada em 2.666 (3,9%) dos casos. Não foram observadas diferenças na taxa de sobrevivência fetal ou a incidência de malformações entre gestantes que usaram ou não codeína. Por outro lado, seu uso foi associado à maior incidência de cesarianas eletivas e de emergência e hemorragia pós-parto, quando utilizada no final da gestação. Entretanto, essas alterações podem ser decorrentes da doença de base, e não do uso do fármaco. É considerada Classe C pelo FDA e Classe A pela ADEC.
Tramadol
Em estudo que avaliou 1.682.846 gestantes, observou que 1.751 fizeram uso de tramadol no início da gestação, com 96 recém-nascidos apresentando malformação congênita, sendo 70 graves (OR 1,33 IC95% 1,05-1,70). Dentre as malformações observadas destacam-se defeitos cardiovasculares (OR 1,56 IC95% 1,04-2,29) e pé torto congênito (OR 3,63 IC95% 1,61-6,89). Em estágios mais avançados da gestação, parece não causar efeitos fetais importantes, a não ser quando usado cronicamente, podendo levar à síndrome de abstinência neonatal (SAN). Não há evidência de alterações quando usado durante a lactação. É considerado Classe C pelo FDA e pela ADEC.
Morfina
Quando utilizada no primeiro trimestre, não há relatos de malformações, devendo ser usada com cautela. Durante a gestação, a morfina sofre alterações na farmacocinética, com aumento da depuração plasmática, encurtamento da meia-vida, diminuição do volume de distribuição, além do aumento da formação do metabólito 3-glucoronido. A morfina e o seu metabólito atravessam rapidamente a placenta e estabelecem o equilíbrio materno-fetal em aproximadamente 5 minutos. Recém-nascidos expostos a opioides com meia-vida mais curta, como a morfina, estão mais sujeitos a apresentar SAN. Apresenta classificação B pelo FDA e C pela ADEC.
Fentanil
O uso de fentanil durante a gestação e lactação, quando utilizado pela via transdérmica, pode ser uma boa opção para o tratamento da dor crônica. Em um relato de caso de uma gestante que utilizou o patch de fentanil (125µg/h) durante toda a gestação, observou-se que o recém-nascido apresentou sintomas leves de SAN, não necessitando de tratamento farmacológico. Por outro lado, em outro relato de uma gestante que usou o patch de fentanil (100µg/h), o recém-nascido apresentou SAN prolongada, necessitando de tratamento com morfina oral até o 29° dia de vida. Essas diferenças podem ser decorrentes de variação individual do fármaco. Apresenta classificação C pelo FDA e ADEC.
Metadona e buprenorfina
Ambas são seguras quando utilizadas para tratar dependência de opioides durante a gestação. A exposição pré-natal parece não alterar os desenvolvimentos físico, cognitivo e de linguagem em crianças acompanhadas até o 36º mês de vida. Apresentam classificação C pelo FDA e ADEC.