O desastre ambiental influenciou negativamente na saúde de recém-nascidos?

Por: André Luiz Baldutti Campagnacci & João Vitor Paiva de Brito Rocha - 29/06/2021Orientação: Miguel Fernandes Felippe

Fatores socioeconômicos se relacionam com a saúde das crianças recém-nascidas cujas mães foram atingidas pelo desastre do rio Doce. Um dos problemas é o baixo peso ao nascer.

Diversos grupos de pesquisa do Brasil e do mundo dedicaram-se, nos últimos anos, a analisar a qualidade da água e do solo após a liberação dos rejeitos de minério decorrentes do rompimento da barragem de Fundão. Pesquisadores da Universidade Federal de Juiz de Fora foram além e se dedicaram a um estudo caso-controle sobre a relação entre a exposição e consumo de água contaminada pelo rompimento da barragem e os fatores associados ao baixo peso em recém-nascidos expostos aos fatores de risco trazidos pelo rejeito da Samarco. Esse estudo ganha grande importância, visto que os serviços de abastecimento de água dos municípios atingidos encontram-se comprometidos, uma vez que se utilizam das águas do Rio Doce. Partindo desse ponto, o baixo-peso ao nascer é um grave problema de saúde pública e deve ser sempre relacionado aos aspectos sociodemográficos, ambientais e comportamentais. Além da motivação da exposição pré-natal às diferentes fontes de água para o consumo humano na região, os fatores socioeconômicos foram importantes para esse estudo. Os estudos de caso-controle são importantes para analisar os processos em que o período de tempo compreendido entre a exposição e o desenvolvimento da doença estão diretamente relacionados como causa e consequência. As variáveis dos estudos de caso-controle são analisadas de forma independente e progressiva para garantir que mesmo posteriormente a exposição de riscos, os fatores sejam estudados na forma de regressão lógica, ou seja, para definir a probabilidade de um evento ocorrer devido a uma ou mais variáveis.


Neste estudo, foram selecionados dois grupos: nascidos vivos com baixo peso (foco do estudo) e nascidos vivos com o peso adequado (grupo controle). As parturientes residentes do município de Governador Valadares e região cederam informações através de entrevistas ainda no Hospital Municipal de Governador Valadares e posteriormente através de cartões de pré-natal e prontuários do recém-nascido e da puérpera. Diversos fatores foram verificados para a obtenção dos dados que foram analisados através de uma técnica de regressão logística. Estes fatores (variáveis) foram segmentados em blocos, sendo eles: fatores socioeconômicos, demográficos e ambientais; reprodutivos; comportamentais; relacionados à assistência à saúde durante o pré-natal e parto; e, por fim, fatores relacionados às doenças maternas.

Figura: Modelo explicativo das variáveis independentes divididas em blocos e ordem de entrada dos fatores na análise de regressão logística.

Fonte: DEFILIPO et al. (2020)

Os resultados mostram que os principais fatores associados aos riscos mais elevados de baixo-peso ao nascer estão relacionados com: ser o primeiro filho da parturiente, o hábito de fumar durante a gravidez e o consumo de água fornecida pelo sistema de abastecimento dos municípios atingidos pelos rejeitos provenientes do rompimento da barragem de Fundão. Os pesquisadores citam que existem estudos que mostram a presença de metais pesados no Rio Doce, que já era contaminado anteriormente ao desastre ambiental em função do beneficiamento mineral no alto curso do rio, mas que registrou concentrações de contaminantes ainda mais altas após a chegada do rejeito. Além disso, são levantadas diversas questões sobre os efeitos a longo prazo na saúde dessas pessoas que consomem a água contaminada por metais pesados. As águas do Rio Doce voltaram a ser fornecidas para consumo humano, por isso, há ainda grande preocupação das populações sobre o consumo dessas águas. Por essa apreensão, muitas das famílias estudadas (40%) ainda faziam o uso de água mineral três anos após o desastre, ao invés da água fornecida pelo sistema de abastecimento, mesmo com o nível econômico das famílias estudadas sendo predominantemente baixo.


O estudo evidenciou algumas de suas próprias limitações, como o tamanho da amostra. Porém, é importante ressaltar que todos os participantes que atendiam aos critérios de inclusão nos grupos integraram a amostra. Outra limitação demonstrada se deu quanto à qualidade da água consumida, uma vez que o estudo não fez esta avaliação, tendo apenas utilizado informações sobre o tipo de água consumido pelas participantes. Por fim, apesar de alguns questionamentos permanecerem, as evidências sobre os efeitos da água no baixo-peso ao nascer são alarmantes, demonstrando que é de fundamental importância a continuidade de estudos que avaliem e esclareçam tais questões. Além disso, o estudo traz consigo a urgência da continuidade e ampliação do monitoramento da qualidade da água que é utilizada para o abastecimento público, evidenciando a necessidade de políticas sanitárias que garantam o bem-estar da população.