Matéria

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. A Física Aristotélica. 4. Matéria Primitiva. 5. A Matéria e o Espírito. 6. União do Espírito à Matéria. 7. Matéria e Materialismo. 8. Desapego à Matéria. 9. Conclusão. 10. Bibliografia Consultada

1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste estudo é buscar uma melhor compreensão do termo matéria, verificando as suas várias acepções e comparando-as com a visão da Doutrina Espírita.

2. CONCEITO

Para a Física, matéria é tudo que ocupa lugar no espaço, ou, mais especificamente, é qualquer substância sólida, líquida ou gasosa que ocupa lugar no espaço, ou substância capaz de receber determinada forma ou na qual atua determinado agente.

Para a Biologia, matéria de que se compõem os seres vivos.

Para a Filosofia, o que dá realidade concreta a uma coisa individual, que é objeto de intuição no espaço e dotado de uma massa mecânica; aquilo a que se atribui força ou energia, que é princípio de movimento; o que é transformado ou utilizado pelo trabalho do homem para um determinado fim. (Dicionário Aurélio)

Para o Espiritismo, a matéria vai além da máxima comum, de que é tudo que pode impressionar os sentidos (visão, audição, paladar, olfato e tato). Para os Espíritos, em seus ensinamentos, a MATÉRIA existe em estados ainda desconhecidos por nós, de forma tão sutil, que não afete qualquer dos nossos sentidos. Mesmo assim, embora imperceptível aos nossos sentidos, é sempre matéria. A matéria é o liame que escraviza o Espírito; é o instrumento que ele usa, e sobre o qual, ao mesmo tempo, exerce sua ação. (Kardec, 1995, pergunta 22)

3. A FÍSICA ARISTOTÉLICA

Para Aristóteles, os corpos são classificados a partir da teoria dos quatro elementos, elaborada pelo pré-socrático Empédocles, segundo a qual os elementos constitutivos de todos os seres são: terra (matéria sólida); ar (matéria gasosa); água (matéria líquida); e fogo (matéria em combustão). Essa teoria foi aceita até o século XVIII, quando Lavoisier demonstrou que não se tratava de elementos, mas de substâncias compostas.

No universo aristotélico, todos os corpos possuem um "lugar natural" conforme sua essência. É a partir daí que constrói a teoria da queda dos corpos. O peso e a leveza são qualidades dos corpos e determinam formas diferentes do movimento. Então, a terra e a água, como são corpos pesados, têm lugar natural embaixo; o ar e o fogo, sendo leves, têm o lugar natural em cima. O movimento natural é aquele em que as coisas retornam ao seu lugar na ordem estática do  cosmos (situação de repouso).

Assim, para os gregos o repouso não precisa ser explicado. O que precisa ser explicado é o movimento, que pode ser natural e violento.

Por trás dessas afirmações, há uma série de noções metafísicas, quanto à natureza dos corpos e do movimento.

Todo o ser é constituído de matéria e forma, princípios indissociáveis. Enquanto a forma é o princípio inteligível, a essência comum aos indivíduos de uma mesma espécie, pela qual todos são o que são, a matéria é pura passividade, contendo a forma em potência.

É através da noção de matéria e forma que se explica o devir (o movimento). Todo o ser tende a atuar (tornar atual) a forma que tem em si como potência. Assim, a semente, quando enterrada, tende a se desenvolver e transformar-se no carvalho que era em potência.

Quando Aristóteles fala em movimento, não se refere apenas ao conceito de movimento local. Movimento também pode ser compreendido como movimento qualitativo, pelo qual o corpo tem uma qualidade alterada, como, por exemplo, quando o homem analfabeto aprende a ler. Ou ainda, o movimento quantitativo, da planta que cresce, da alteração de tamanho. Há também a mudança substancial, pela qual um ser começa a existir (geração) ou deixa de existir (destruição das essências)

Aristóteles, ao explicar a passagem da potência ao ato, admite a necessidade de um motor que esteja em ato. Todo o movimento, supondo um motor, faz a física desembocar numa teologia: de causa em causa, é preciso parar numa primeira causa (incausada), num primeiro motor (imóvel), evidentemente de natureza divina e que  daria movimento a todas as coisas. Aristóteles chama esse Deus de Ato Puro (pois não têm potência alguma) e de Primeiro Motor Imóvel. (Aranha, 1986, p. 126 a 128)   

4. MATÉRIA PRIMITIVA

De acordo com Allan Kardec, os materiais constitutivos do mundo são matéria cósmica primitiva, simples e una, que se diversifica desde sua origem, continuando durante sua vida e se desmembrando pela decomposição. Se observarmos a diversidade da matéria, ver-se-á que as forças que realizam suas transformações, e as condições em que são produzidas, são ilimitadas, porque ilimitadas são as combinações da matéria. Assim, conclui Kardec: “Em todo o Universo, há uma só substância primitiva: a matéria cósmica ou fluido etéreo, que enche o espaço e penetra os corpos. “é essa matéria cósmica primitiva geradora do mundo e dos seres, por forças e leis imutáveis que regem o Universo. (Kardec, 1975, p. 107 a 109)

5. A MATÉRIA E O ESPÍRITO

"Se admitirmos que a força é uma maneira de ser, um aspecto da matéria, não haverá mais do que dois elementos distintos no Universo — matéria e espírito — irredutíveis entre si. O que caracteriza essencialmente o espírito é a consciência, isto é, o eu, mediante o qual ele se distingue do que não está nele, isto é, da matéria. Desde as primeiras manifestações vitais, o eu evidencia a sua existência reagindo, espontaneamente, a uma excitação interior. No mundo inorgânico, tudo é cego, passivo, fatal; jamais se verifica progresso, não há mais que mudanças de estados, as quais em nada modificam a natureza íntima da substância. No ser inteligente há aumento de poder, desenvolvimento de faculdade latente, eclosão do ser, a traduzir-se  por exaltação íntima do indivíduo". (Delanne, 1988, p. 234)

6. UNIÃO DO ESPÍRITO À MATÉRIA

O Espírito, sendo de natureza quintessenciada, e necessitando de se unir à matéria (corpo físico) para a sua evolução, utiliza um corpo semimaterial, denominado Perispírito. Desse modo, "quando o Espírito tem de encarnar num corpo humano em vias de formação, um laço fluídico, que mais não é do que uma expansão do seu perispírito, o liga ao germen que o atrai por uma força irresistível, desde o momento da concepção. À medida que o gérmen se desenvolve, o laço encurta. Sob a influência do princípio vito-material do gérmen, o perispírito, que possui certas propriedades da matéria, se une, molécula a molécula, ao corpo em formação, donde o poder dizer-se que o Espírito, por intermédio do seu perispírito, se enraíza, de certa maneira, nesse gérmen, como uma planta na terra. Quando o gérmen chega ao seu pleno desenvolvimento, completa é a união; nasce então o ser para a vida exterior". (Kardec, 1975, it. 18, p. 214)  

7. MATÉRIA E MATERIALISMO

A matéria,  sendo o elemento concreto e visível, levou muitos filósofos a assumirem, como denominador comum, a idéia de que matéria é ou a substância única, negando a existência de qualquer realidade supramaterial, ou a substância decisiva ou predominante nos processos psicológicos, sociais e históricos. O termo materialismo advém do fato de a matéria ser o elemento predominante, a essência. O Espírito surgiria como um epifenômeno. Foi a partir dessa idéia que Marx e Engels desenvolveram a teoria do materialismo histórico, segundo a qual os fatos econômicos, fundamentalmente materiais, são a base e causa determinantes de todos os fenômenos históricos e sociais.

8. DESAPEGO À MATÉRIA

Enquanto vivemos neste mundo, temos necessidade de um corpo físico que, segundo as alternativas da saúde e da doença, influi de maneira muito importante sobre a alma, que é preciso considerar como cativa da carne. O desapego à matéria não é abater o corpo, desprezá-lo e sacrificá-lo.  Nesse sentido, o Espírito Georges diz: "Sereis, pois, mais perfeitos se, martirizando o corpo, som isso não ficais menos egoístas, menos orgulhosos e pouco caridosos para com  o vosso próximo? Não, a perfeição não está nisso; ela está inteiramente nas reformas que fareis ao vosso Espírito suportar; dobrai-o, submetei-o, humilhai-o, mortificai-o: é o meio de torná-lo dócil à vontade de Deus, e o único que conduz à perfeição". (Kardec, 1984, p. 232)

9. CONCLUSÃO

A matéria não é o fim último da existência terrena; ela é o meio utilizado pelo Espírito para promover a sua evolução. Assim, se lhe dermos o que ela realmente merece, viveremos felizes e alcançaremos a paz de espírito.

10. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

ARANHA, M. L. de A. e MARTINS, M. H. P. Filosofando: Introdução à Filosofia. São Paulo, Modena, 1986.

DELANNE, G. Evolução Anímica. 5. ed., Rio de Janeiro, FEB, 1988.

FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, s/d/p.

KARDEC, A. A Gênese - Os Milagres e as Predições Segundo o Espiritismo. 17. ed., Rio de Janeiro, FEB, 1975.

KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed., São Paulo, IDE, 1984.

KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. 8. ed., São Paulo, FEESP, 1995.

São Paulo, dezembro de 1995.