Cosmovisão e Espiritismo

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito. 3. Histórico. 4. Inversão Cósmica. 5. Missão do Espiritismo. 6. A Parte, o Todo e o Espiritismo: 6.1. Fé e Razão; 6.2. Fé, Razão e Matéria; 6.3. Absolutização do Relativo; 6.4. O Indivíduo e a Sociedade. 7. Conclusão. 8. Bibliografia Consultada.

1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste estudo é mostrar a influência que a Doutrina Espírita pode exercer na formação da Visão Geral de Mundo. Para que possamos desenvolver nossas idéias, elaboramos um pequeno roteiro: conceito de cosmovisão, histórico, inversão cósmica e visão comparada do Espiritismo.

2. CONCEITO

Cosmo – do grego kosmos significa ordem, oposto ao Caos (kaos), desordem.

Cosmovisão (Visão Geral de Mundo). Da soma geral dos conhecimentos, os filósofos organizaram, sistematicamente ou não, uma espécie de panorama geral de todo o conhecimento, formando uma totalidade de visão, uma coordenação de opiniões entrelaçadas entre si.

Com essa sistematização lhes é possível formular, não só uma opinião geral de todo o acontecer, mas também compreender e relacionar um fato individual com a visão geral formulada do todo. (Santos, 1955, p. 123)

Cosmovisão, além de significar uma visão ou concepção de mundo, expressa também uma atitude frente ao mesmo. Portanto, não é uma mera abstração, já que a imagem que o homem forma do mundo possui um fator de orientação e uma qualidade modeladora e transformadora da própria conduta humana. Implícito em toda cosmovisão há um caminho de ação e realização”. (Crema, 1989, p. 17)

O Materialismo, o Espiritualismo e o Idealismo são cosmovisões. O que caracteriza essas diversas cosmovisões? Primeiro, um anelo de saber integral; segundo, a apreensão da totalidade; terceiro, a solução de problemas do sentido do mundo e da vida.

Além das cosmovisões fornecidas pela ciência e pela filosofia, podemos também enumerar as determinadas pela psicologia, pela raça, pela classe social, pela cultura histórica, bem como as fornecidas pela biologia, pela matemática, pela física. (Santos, 1955, p. 124)

3. HISTÓRICO

J. Torres, em Totalidade e Sociologia, resume a visão geral de mundo nos seguintes termos:

1.ª FASE – ESPIRITUALISMO (a Fé)

Antigüidade: Caos Oriental – Grego – Romano.

Fim da Antigüidade: Empirismo Latino-Politéico.

Idade Média: Teologia Monoteísta (Escolástica).

Síntese: PAPAS (Cruz) ==> CATOLICISMO Triunfante (Tomismo).

2.ª FASE – RACIONALISMO (a Razão)

Fim da Idade Média: Humanismo Renascentista – Filosofia Herética (repúdio da Fé, repúdio da Escolástica) ==> REFORMA.

Início da Idade Moderna: Naturalismo Ateológico – Filosofia da dúvida (Cartesianismo).

Idade Moderna: Ideologias Relativistas – Filosofia da Observação (empirismo), Filosofia Política (Democratismo) ==> REVOLUÇÃO.

Síntese:  REIS (Espada) ==> DEMOCRATISMO Triunfante (Catolicismo decadente e      capitalismo começante).

3ª FASE – MATERIALISMO (a Matéria)

Início da Contemporaneidade: Racionalismo Filosófico – Filosofia Transcendente (Panteísmo, Criticismo).

Idade Contemporânea: Cientificismo Positivo – Filosofia Científica (Positivismo), Filosofia dos Fatos (Pragmatismo) ==> GUERRA

Atualidade: Materialismo Cultural – Marxismo, Filosofia da Violência (Comunismo, Fascismo etc.)

Síntese: POLÍTICOS (a Palavra) ==> CAPITALISMO Triunfante (Democracismo Vacilante e Catolicismo Expirante). (1956, p. 270 e 271)

4. INVERSÃO CÓSMICA

A marcha excêntrica da degradação histórico-filosófica ocidental foi esta: Fé, Razão, Matéria.

A marcha normal dessa evolução teria sido: , Raciocínio (nada de endeusamento da razão, nada de racionalismo), Consciência. Da Fé ainda primitiva, do estado ainda caótico (geocêntrico) da sociedade, atingiríamos um estado empírico normal (heliocêntrico), de reflexão madura, o qual teria conduzido à noção sistemática (cosmocêntrica) do Todo, à Consciência da Totalidade, à Verdade Cósmica. Em suma, no lugar hoje ocupado pela Matéria estaria simplesmente Deus – isto é, a Causa. Mas, com a inversão de tudo, está a antítese, isto é, o Efeito (a Matéria). E que é isto tudo, toda essa inversão arbitrária de coisas e valores? Demência – caracterizada demência cultural e histórico-filosófica da Humanidade. Por isso, ao invés da Consciência, temos a Violência. A humanidade está filosoficamente invertida! Raciocinou às avessas. Em vez de atingir a Causa, atingiu o Efeito; em vez de chegar à Verdade, chegou à Ilusão; em vez de se cosmocentralizar regeocentralizou-se. Devendo aproximar-se do Criador, enroscou-se em si mesma e permaneceu egocêntrica, antiteocêntrica. (Torres, 1956, p. 272 e 273)

Esta é a situação do mundo na atualidade. Urge reinverter a ordem. Os postulados espíritas auxiliar-nos-ão eficazmente.

5. MISSÃO DO ESPIRITISMO

Para a concepção de mundo idealista, o Espírito é o motor do Universo; para a concepção de mundo materialista, o motor do Universo é a matéria. Cada qual defendendo o seu ponto de vista, torna difícil e quase impossível a compreensão do Todo.

O Espiritismo veio no momento certo: reorganizar o edifício da FÉ, abalado pelo culto da RAZÃO e da MATERIALIDADE. Procedendo à síntese das várias concepções de mundo,  encaminha o nosso pensamento para a Unidade do Todo. Por isso, dizemos que o Espiritismo é Ciência, Filosofia e Religião, ou seja, temos material suficiente para sintetizar  Deus, Espírito e Matéria, sem pender para nenhum dos lados, mas analisando-os como uma trilogia inseparável. 

Emmanuel no livro Roteiro diz-nos que a missão do Espiritismo, tanto quanto o ministério do Cristianismo, não será destruir as escolas da fé, até agora existentes. A Doutrina dos Espíritos apoia os princípios superiores de todos os sistemas religiosos. O Espiritismo não vem para censurar esta ou aquela forma de crer em Deus. O Espiritismo é, acima de tudo, o processo libertador de nossas consciências, a fim de que a visão do homem alcance horizontes mais altos. (Xavier, 1980, cap. 38)

6. A PARTE, O TODO E O ESPIRITISMO

6.1. FÉ E RAZÃO

A , sendo um sentimento inato de cada ser, pode manifestar-se de forma  racional (razão) ou dogmática (cega). Allan Kardec no capítulo XIX de O Evangelho Segundo o Espiritismo trata do assunto com muita clareza, inclusive, acrescentando que a fé pode ser também humana e divina. É nesse ponto que podemos fazer uma ligação da parte com o todo. Assim,  a , sendo inata, liga-se a Deus (causa). A denominação humana — indivíduo — é a parte que deve estar relacionada com o Todo (Deus).

6.2. FÉ, RAZÃO E MATÉRIA

Em O Livro dos Espíritos, Kardec fala-nos da ação dos Espíritos sobre a Matéria. Mas o que está em jogo aqui, é a unidade que se pode intuir dessa relação: Fé (Deus), Razão (homem) e Matéria (natureza).

Transformar a natureza para o progresso. Porém, se fizermos de acordo com a vontade de Deus, é possível que não estejamos destruindo o nosso planeta e nem criando necessidades superficiais.

6.3. ABSOLUTIZAÇÃO DO RELATIVO

Tendo conhecimento da parte, queremos generalizar para o Todo. É preciso tomar cuidado, pois podemos estar raciocinando em erro. Observe a leitura de um romance mediúnico. Somos facilmente levados a generalizar o caso relatado, quando, ao contrário,  deveríamos verificar se o caso relatado se enquadra dentro da Lei Natural, da Lei Geral, da Lei de Causa e Efeito.

Um exemplo: quando um país está em guerra, logo imaginamos que o país inteiro está em guerra. Às vezes é pequena porção deste. 

6.4. O INDIVÍDUO E A SOCIEDADE

Aristóteles, na Antiguidade, já nos dizia que o homem é um animal, devendo viver em sociedade. Será que todo ato que praticamos, pensamos no todo? Senão, vejamos: quando viajamos, o lixo produzido dentro do carro é jogado na rua. Deixamos limpo o bem privado, mas poluímos o bem público (todo); famílias que moram no alto impermeabilizam o solo. Consequência: quando chove, alaga-se em baixo; ligamos o nosso som no último volume sem nos importarmos se estamos prejudicando o nosso vizinho.

Estando em sociedade, é bom verificar que a intenção boa vê os interesses particulares; a boa intenção, o interesse geral, com pena de sacrificar os próprios; que a tristeza, desânimo, desespero do discípulo do Mestre eqüivale a bloquear o ânimo, as virtudes na almas que nos compartilham a existência; que sempre precisamos de alguém menor do que nós; que a espiga de milho quando sofre a trituração não tem consciência da “farinha” que irá se tornar; que na semente minúscula reside o germe do tronco benfeitor; que educando transformaremos a irracionalidade em inteligência, a inteligência em humanidade e a humanidade em angelitude. 

7. CONCLUSÃO

O Espiritismo é, ao mesmo tempo, Filosofia, Ciência e Religião. Ele é a unidade sintética de todo o conhecimento. A conscientização desse fato faz-nos observar melhor o mundo que nos rodeia. Observando melhor, teremos a nossa visão acurada. Com nossa visão acurada, teremos mais condições de compreender o nosso próximo. Compreendendo melhor o nosso próximo, poderemos amá-lo, respeitá-lo e fazer-lhe tudo o que gostaríamos fosse feito a nós mesmos.

8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

CREMA, R. Introdução à Visão Holística. São Paulo, Summus, 1989.
KARDEC, A. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 39. ed., São Paulo, IDE, 1984.
KARDEC, A. O Livro dos Espíritos. São Paulo, FEESP, 1972.
SANTOS, M. F. dos. Filosofia e Cosmovisão (Introdução à Filosofia e Visão Geral de Mundo). 2. ed., São Paulo, Logos, 1955.
TORRES, J. Totalidade e Sociologia (Introdução. Exposição Geral e Sumária de Cosmonomia. Cosmovisão Geral). Rio de Janeiro, s. e., 1953-1956.
XAVIER, F. C. Roteiro, pelo Espírito Emmanuel. 5.ed., Rio de Janeiro, FEB, 1980.

 São Paulo, abril de 1996.