O seu público é bom em reconhecer problemas mas ruim em resolvê-los

Mark é uma espécie de porta voz da empresa por ser uma pessoa muito aberta ao diálogo com os jogadores. Em suas contas ele já respondeu mais de 60 mil perguntas de jogadores nas redes sociais. A metáfora que ele usa é a de uma visita ao médico. O médico conhece as doenças e os sintomas. Ele sabe o tratamento e tem um vasto conhecimento médico. O paciente por sua vez não tem o mesmo conhecimento, então a visão que ele tem das doenças é mais limitada. Um adendo. Um médico pode ser um incompetente e saber menos do que o paciente. Assim como o paciente pode ser arrogante e achar que sabe mais do que o médico. Mas isso é outro assunto.

O ponto é. Os jogadores são especialistas no seu jogo. Eles sabem estratégias. Sabem identificar virtudes e defeitos. Afinal, se eles são apaixonados pelo seu jogo é natural que eles tenham um vasto conhecimento também. Porém, eles não tem o ponto de vista de quem criou o jogo. Para eles é fácil ver um problema. Mas resolver o problema é outra habilidade. Os jogadores não sabem como é processo criativo. Não sabem quais imposições foram feitas. Não sabem quais limites de tempo, dinheiro, mão de obra, existem na criação do jogo. Outro adendo. Não entra em questão se há jogadores que são também desenvolvedores, Mark esta assumindo que a maioria não é.

Isso se aplica a level design? Totalmente. A maioria dos jogadores vai identificar problemas no level design muito facilmente. Se há um trecho do level que é muito difícil o jogador sabe disso porque é ele quem vai jogar. Se o level é confuso o jogador percebe isso ficando perdido no level. Se o level é irritante o jogador vai se sentir irritado. Se o level é muito longo o jogador vai se sentir cansado. É claro que há variações, estamos tratando de uma média de jogadores. O level designer tem a obrigação de ver o jogo sob a perspectiva de um jogador, afinal é disto que se trata a criação do level. O level é feito para agradar ao jogador. Mas o level designer não tem condições de examinar cada jogador individualmente, são milhares senão milhões deles. O importante é haver um diálogo entre o level designer e os jogadores, assim como Mark faz com os jogadores de magic.

Uma auto-crítica: este site tem muitas críticas sobre level design. Mas é impossível saber de todo o processo e de todos os envolvidos nos jogos. Às vezes o level design ruim não é ruim por ser ruim, mas por culpa de outros fatores como tempo, exaustão, limitações técnicas e outros fatores desconhecidos. Ou a questão vai além de avaliar como bom ou ruim, mas há intenções, filosofias ou objetivos não conhecidos por trás de um level.

Como nota final eu comentaria uma coisa que Mark não mencionou. Frequentemente confundimos o que é um gosto pessoal com um erro. Cada pessoa tem as suas preferências e formas de fazer algo. Quando temos comida, roupas, artes e coisas que sejam de ordem emocional e percepção pessoal. Temos que nos lembrar que o que nos é confortável e aquilo que entendemos são parte de uma realidade particular de cada um. Não vou entrar em discussões filosóficas ou psicológicas aqui. A experiência de cada jogador(a) vai ser diferente porque eles(as) são pessoas diferentes. A confusão acontece quando um jogador confunde o seu gosto pessoal com um erro. Um jogador pode gostar de um certo tipo de roupa, personagem no jogo, um tipo de habilidade, etc. Como Mark bem ensina na lição número 8, os jogadores se apaixonam por algo no jogo e cada jogador se apaixona por algo diferente.

Como diferenciar um gosto pessoal de um erro? Em Magic um erro acontece quando eles fazem uma mecânica que não é bem entendida ou bem recebida (há muitos tipos diferentes de erros, mas estou focando em apenas dois por hora) Se os jogadores não estão se divertindo ou não estão entendendo algo, isto é um bom indicativo de um erro. Agora pense em quem fez a mecânica que não foi bem recebida pelos jogadores. Provavelmente temos uma ideia que parecia ótima para quem a teve, mas não era pelos olhos dos jogadores. Note o plural, jogadores. Não apenas um, você mesmo. Vamos mudar para a perspectiva do jogador agora. Eu posso ter me apaixonado por um certo level, um certo personagem, alguma magia ou arma num jogo. Eu não sei quem fez essas coisas ou o que os criadores estavam pensando ou sentindo, mas eu me apaixonei de qualquer forma. Suponha que as coisas que eu me apaixonei são odiadas pela maioria dos jogadores daquele jogo e a maioria evita aquelas coisas. Se os criadores do jogo fizessem uma enquete entre os jogadores, eu teria um viés muito grande e estaria mais inclinado a votar a favor daquelas coisas, enquanto os outros jogadores votariam pela retirada ou substituição daquelas coisas.

Temos uma questão de ego no cenário hipotético descrito acima. O que é mais importante? O meu gosto pessoal ou o ambiente do jogo? Da perspectiva de um desenvolvedor de jogo, o que é mais importante, as suas próprias ideias ou a coesão e coerência do jogo em si? Em Magic eles tem a ferramenta de banir cartas quando eles acham / sentem (não sei dizer ao certo) que uma ou mais cartas estão perturbando o ambiente. Uma estratégia esta se tornando dominante e sufocando as outras e isto é indesejável. Se eu sou um jogador e um jogo tem 20 levels, com dois que são muito mais jogados do que os outros. Eu aprendi na escola em aulas de geografia (Deus abençoe aquela professora!) que quando as pessoas saem de uma cidade, estado ou país em direção a outro lugar, temos que considerar duas forças motrizes: uma força esta afastando as pessoas do seu lugar de origem; a outra força esta atraindo as pessoas para o seu destino. No meu exemplo há uma força que esta afastando os jogadores de 18 mapas, enquanto os outros dois tem alguma força atratora. Os jogadores são normalmente mais enviesados em ver um problema num jogo porque eles valorizam o seu gosto pessoal primeiro, a sua experiência pessoal. Por outro lado, os desenvolvedores de um jogo precisam atender à uma ampla audiência. Os desenvolvedores tem outras prioridades e desafios próprios que os jogadores não sabem resolver ou desconhecem.