Fundamentalistas bugrinos
Hoje perguntei aos amigos da lista de discussão se alguma santa alma poderia me explicar por que a faixa da torcida Fúria Independente tem sido colocada de cabeça pra baixo nos jogos do Bugre. Qual seria o bode? Afinal, ganhamos as cinco primeiras partidas da série B de 2009 e tudo parece seguir às mil maravilhas no clube e no time. Onde a roda pega? Por quê? Quem pisou no calo de quem?
Julian Martínez respondeu-me:
"Álvaro,
Pelo que sei, a Fúria tem colocado sua faixa de cabeça pra baixo desde o último rebaixamento, em sinal de protesto. Inclusive, eles conversaram com a comissão técnica e os jogadores para deixar claro que o protesto não é contra eles. E, convenhamos, essa faixa de cabeça pra baixo não tem atrapalhado em nada, não é verdade? Pode-se questionar, mas pelo menos esse tipo de protesto é mais decente do que bater em jogador, quebrar carros, pichar muros e outras coisas que já se fizeram em outras ocasiões.
Mas, falando em faixa, me chamou a atenção ontem o ato dos membros da Fúria no estádio (do Figueirense, em Florianópolis). A bem da verdade, havia apenas um membro da Fúria do Guarani, acompanhado de quatro da Fúria do Paraná. Eles chegaram no estádio faltando uns 10 minutos para o começo do jogo, trazendo uma grande faixa (que ficou de cabeça pra baixo). Porém, já havia vários outros bugrinos lá, e alguns tinham levado suas faixas e bandeiras, pendurando-as no alambrado. Eis que o pessoal das Fúrias, sem conversar, simplesmente pendurou a sua faixa POR CIMA das faixas e bandeiras dos outros bugrinos, sendo que havia espaço suficiente ao lado para pendurar a faixa da Fúria sem cobrir as demais. No final, os bugrinos que chegaram antes tiveram que trocar suas bandeiras e faixas de lugar.
Puxa vida! Pergunto eu: qual a necessidade de se ter uma atitude tão antipática com os bugrinos que foram até Floripa ver o Guarani? Custava colocar a faixa da Fúria mais pro lado ou conversar com os donos das bandeiras e combinar a melhor forma de pendurar e deixar tudo visível? Depois, a Fúria é vista com antipatia por algumas pessoas e (eles) não sabem por quê.
Bem, pelo menos os bugrinos que estiveram lá, sem pertencer a essa ou aquela organizada, fizeram mais barulho e representaram o Guarani muito bem, e melhor, que os cinco das Fúrias. Mas fica o recado, pessoal: o Guarani é de TODOS OS BUGRINOS."
Concordo com Julian!
O que mais me assusta é que esse fato tem, digamos assim, uma base teológica tenebrosa. Corresponde com precisão ao que afirma a consigna "Acima da Fúria, só o Bugre", que os mais furiosos tanto batem no peito. Na verdade, se trocarmos o nome da torcida e o nome do time essa é a consigna que guia o comportamento de toda – ou da maioria – das tais torcidas ditas organizadas.
O que é o time de futebol nesse contexto? O Bugre, no caso. É apenas um ícone difuso; uma entidade sobrenatural que paira acima das pessoas comuns e não lhes pertence. É uma espécie de divindade que teria escolhido um dado povo para lhe conferir representação e o direito exclusivo de dominar os outros. Se nós – eu e você – não nascemos entre os eleitos, não podemos ser bugrinos... ou corinthianos ou palmeirenses ou pontepretanos. Quando muito, podemos nos converter à seita que diz representar a divindade, mas desde que rezemos pelo seu catecismo e, principalmente, nos submetamos aos seus arautos – estes, sim, os eleitos originais, donos por direito divino da verdade suprema e única.
Essa gente faz com o distintivo do nosso time de futebol o mesmo estrago que fazem as demais pragas fundamentalistas que atazanam o mundo, sejam as que brandem a estrela de Davi ou a Lua crescente do Islã ou a cruz dos cristãos. Eles avacalham as histórias dos seus povos e dos seus times.
(06/06/2009)
O futuro do Guarani – Álvaro Caropreso