Travessa das cunhas - uma reflexão sobre as ditas

Data de publicação: Nov 30, 2012 10:58:12 AM

Cunhas! Quantas cunhas temos atravessadas nas nossas vidas? Provavelmente cada um de nós terá algumas.

Depois de numa das últimas reuniões do GEPE se ter falado bastante de “cunhas”, e porque o que se disse foi importante, impunha-se uma pequena exposição e partilha de algumas ideias.

O GEPE é constituído por desempregados, como tal ao falar-se de candidaturas e concursos a emprego surgiu, inevitavelmente, a questão das “cunhas” e o quanto elas são importantes para se conseguir qualquer trabalho neste país. Como é voz corrente, as “cunhas” são um dos grandes males de Portugal. Aliás, “cunha” é uma expressão utilizada vulgarmente para definir tráfico de influências. Mas…

Mas ao longo da discussão deu para retirar uma conclusão: existem situações em que a “cunha” é admissível e outras em que não o é. Explicamos.

Que fazemos quando, a nível profissional, dizemos que é necessário criar e manter uma rede de conhecimentos, de contactos? Que procuramos quando frequentamos eventos para adquirir e melhorar competências nessa área? Será que com isso pretendemos enganar os outros? Passar por cima deles a qualquer custo? Parece-nos que não. Pretende-se apenas interagir com os outros, indivíduos ou organizações, criar uma rede de conhecimentos que sirva como instrumento para adquirir, trocar e disseminar conhecimento entre todos, na busca de melhoria de desempenho e eficiência na persecução dos objectivos de cada um.

É errado? É eticamente condenável? É crime? Não, desde que à partida estejamos em campos onde isso é possível (domínio privado) e as regras do jogo sejam claras para todos.

Aliás, a este propósito, as grandes multinacionais utilizam redes de conhecimento, formais e informais, nos seus processos de recrutamento. E aqui falamos do conceito de cooptação utilizado na gestão de recursos humanos. A ele talvez voltemos noutra ocasião.

Agora existem situações em que a “cunha” é inadmissível. Apontamos duas: quando se trata da “coisa pública” e quando se procura mascarar com vestes de imparcialidade, respeito, mérito e rigor, concursos privados cujos resultados, à partida, já estão definidos.

Quanto à primeira situação, e no que respeita ao trabalho, um país de Democrático e de Direito, apenas pode aceitar um processo de recrutamento e selecção com regras claras, objectivas, imparciais e que valorizem a competência e o mérito. Só dessa forma se consegue o respeito pelo cidadão e pelo indivíduo. Qualquer coisa diferente disto é, simplesmente, inaceitável. Infelizmente, é exactamente o contrário que acontece: o tráfico de influências e o compadrio são a norma e, infelizmente, parece que cada vez mais, neste nosso país, aceites como normais. Provavelmente estaremos a ser injustos com alguns (mas sejamos claros que são uma minoria) mas não com a maioria.

Quanto à segunda situação, trata-se de muitos processos de recrutamento e selecção de entidades privadas onde os dados, logo de início, já estão viciados e todos os passos deste processo apenas são uma encenação para dar um “ar” de respeitabilidade e rigor à iniciação do “escolhido”. Quando se publicita um anúncio de um concurso de recrutamento era bom que pensassem que isso vai mexer com as pessoas, suscita interesse, esperança e leva as pessoas a agir. Gastam as suas energias nisso, muitas vezes já quando elas começam a escassear, como é o caso em muitos desempregados de longa duração. Isso deve ser respeitado. Mas infelizmente muitas vezes não o é. Não o é quando a entidade nem se dá ao esforço de responder e agradecer a candidatura àqueles que não são seleccionados para fases posteriores do processo; não o é quando no decorrer do processo se percebe que, afinal, a escolha já estava feita; não o é quando se percebe que os objectivos do concurso são pouco claros.

Muito haveria mais a dizer mas isto já vai longo. Agora a vós continuar a reflexão.

Já agora, “Cunha” é, antes de mais, uma ferramenta utilizada para que seja necessário a aplicação de menos força na realização dum trabalho.