Ensinar a responsabilidade às crianças

Data de publicação: Jan 16, 2013 4:18:49 PM

Falemos de um outro valor: a responsabilidade.

Todos os educadores, e nomeadamente os pais, esperam que as suas crianças sejam responsáveis. Esse desejo é notório quando as crianças começam a sair do espaço familiar e a entrar na escola.

No que respeita à responsabilidade, é sobretudo com a entrada no 1º ciclo (um contexto diferente, onde o cumprimento da regra vai ganhar rapidamente espaço ao lúdico, à criatividade; um novo papel para a criança, mais exigente no cumprimento da norma e na aprendizagem dirigida; outras exigências para os pais) que muitos pais se defrontam com o produto das suas práticas educativas. Por vezes os resultados não são bons. Na sala de aula a criança não sabe estar no novo espaço; continua a só querer brincar; cansa-se facilmente nas novas tarefas; não tem autonomia suficiente para as fazer; qualquer coisa a distrai; por vezes não obedece ao adulto. Em casa continua a fazer o que sempre fez e a brincadeira vem sempre primeiro do que o trabalho, chegando, em alguns casos, a ser só brincadeira; o trabalho é feito sempre com muita insistência e esforço dos pais; a dinâmica familiar altera-se e exige mais do que os pais estavam à espera. Com o avançar do tempo de escola começam a chegar informações menos boas, por vezes preocupantes, que colocam em causa o projecto pensado pelos pais e onde eles se sentem julgados pela comunidade. A situação confirma-se quando chegam as avaliações. O diagnóstico, na maioria das situações, é fácil de fazer: falta de responsabilidade, recusa em crescer.

Mas tem que ser assim? Não, não tem. A responsabilidade também se ensina.

Ensinar a responsabilidade nas crianças começa com as pequenas tarefas e deve iniciar-se assim que as crianças têm idade suficiente para conseguir perceber orientações muito simples, como dar um livro ao pai, colocar o papel no lixo, apanhar a colher que caiu. E, para que tudo isto dê frutos, sempre que a criança realiza a tarefa, deve receber muitos elogios e abraços, para que perceba que fez um bom trabalho e que isso nos deixou felizes. Elas vão apreciar estas nossas reacções.

É assim se começa. E à medida que elas crescem vamos também pedindo mais: ensinámos a colocarem a roupa suja no cesto, a vestirem-se, a fazer a cama, etc. Ao envolvê-las nestas tarefas domésticas não apenas se desenvolve o sentido de responsabilidade mas também hábitos e noções importantes para a vida em família, como a partilha de espaços ou a entreajuda entre todos.

Quando as tarefas começam a exigir alguma mestria não nos devemos esquecer que primeiro devemos fazê-las com as crianças até que tenham compreendido e apreendido o processo para as fazer “bem-feitas”. Depois, o próximo passo, é acompanhar enquanto as fazem, para nos certificarmos de que estão a ser feitas como deve ser e, também, para nos certificarmos de que não se estão a acomodar. Esta supervisão deve ser constante e manter-se por muito tempo, mesmo quando os pequenos acham que já não precisam. Para que isto resulte temos de ser capazes de as deixar fazer as coisas, mesmo sabendo que a seguir temos que ir “arranjar” melhor, como nós queremos. Não devemos esquecer que se não houver espaço para fazer, errar e voltar a fazer, e para fazer sozinho, não há aprendizagem nem interesse para aprender.

E, já que estamos nos trabalhos domésticos do dia-a-dia, devemos evitar “pagar” pela realização da tarefa, muito menos em dinheiro. Não faz sentido pagar para que os miúdos façam a sua cama ou arrumem o seu quarto. Persistindo nesta via vamos chegar onde não queremos, pois estamos a contribuir para formar alguém que age apenas pensando no material. Chagará o dia em que não há material que chegue para os motivar. O que deseja é que as crianças apreendam que a casa é o espaço da família, partilhado por todos, da responsabilidade de todos e onde todos trabalham para o bem comum. Mas é claro que certas tarefas extraordinárias, que não fazem parte das rotinas e que também exigem mais esforço, como cortar a relva, pintar o muro, lavar o carro, etc, podem ser “pagas” (mas com senso).

Mas nem sempre tudo corre linearmente. Podem existir momentos em que as crianças estão preocupadas com outras coisas e que não se vão sentir motivadas para nos ajudarem, por vezes não querem mesmo. É preciso entender esses momentos e mudar a abordagem. Talvez tenhamos de ser um pouco mais persuasivos ou tornar as tarefas mais divertidas. Por vezes isso não chega e temos de impor mas sem usar a força. Acontece também que estes momentos se podem tornam em períodos mais longos, chegando-se mesmo à constatação de que as crianças não querem assumir as suas responsabilidades. E dizem-no abertamente. Não devemos deixar que este estado de coisas se prolongue, pois quanto mais tempo estiver neste estado mais difícil é o retorno. Há que agir rapidamente. O bem comum (e o desenvolvimento psicológico dos menores) exige que cada um faça o que lhe compete, doutra forma a harmonia acaba, e relações desequilibradas tendem para a ruptura.

E, finalmente, as responsabilidades e tarefas não têm que ser maçadoras, podem ser divertidas. É certo que exige alguma criatividade, fantasia e paciência mas é possível. Para além do mais, para nós crescidos, que já fomos crianças e que sabemos que o tempo é único e não volta, quando estamos com os mais pequenos, sobretudo os filhos, o importante não é retirarmos o máximo prazer possível?

E, terminamos voltando ao princípio, se a responsabilidade, o trabalho e o sacrifício, fizerem parte da filosofia de vida da família, as crianças levam-nos consigo para toda a parte.

Adaptado de: Teaching Honesty and Responsibility to Your Children (Sandra Hardin Gookin and Dan Gookin)