Casa-memória Camões

 Em Constância

Em edição do Instituto cultural de Macau e organizada pela Associação para Reconstrução e Instalação da Casa-Memória de Camões em Constância, vai ser apresentada, em começos de Junho, uma bonita brochura, a «Sétima Elegia», a que Luís de Camões chamou «Vergel  de Amor» e que anda afastada das modernas edições como outras, aliás, segundo o gosto e as concepções dos seus comentadores. (...)

No que respeita à mitologia das plantas, a edição de «Vergel de Amor» como que complementariza o significado do Jardim-Horto de Camões, a inaugurar em Junho, sob o alto patrocínio do governo de Macau, uma vez que dele participam, tanto quanto possível desde já, todas as plantas de que fala Camões, na «Lírica» e em «Os Lusíadas».

Poético, malicioso, científico, segundo os conhecimentos da época, quando ainda não estava espalhado o conhecimento de Garcia de Orta sobre as plantas da Índia (recorda-se que Camões prefaciou esta obra traduzida no seu tempo em várias línguas), os comentários de Manuel Faria y Sousa partem de conceitos já no século XVII ultrapassados mas nem por isso menos fascinantes. Daí que «Vergel de Amor» possua um encanto muito superior à própria factura do poema.

Todavia, há ainda, repito, outra razão, para esta nota à «Sétima Elegia», digamos que até certo ponto, a consubstanciação de algo que é o espírito do Horto, um museu botânico, legendado pelos versos de Camões em cada espécie, bela criação do ilustre arquiteto-paisagista Gonçalo Ribeiro Teles, com seus laguinhos e repuxos, uma cascatinha, um lago chinês sobre o qual se ergue um pavilhão, cujos elementos cerâmicos vieram directamente de Macau, oferecidos pelo governo do território.

E como se não bastasse este conjunto de elementos artísticos e pedagógicos, há que ver, feito de vidraço preto e branco, desenhado no chão de um auditório para 250 pessoas, o Planetário de Ptolomeu , inspirador de Camões no canto X de «Os Lusíadas». No seu extenso monólogo, Vénus explica a Vasco da Gama, apontando-lhe um globo «vindo no ar» que o lume claríssimo por ele penetrava:

Vês aqui a grande máquina do Mundo,

Etérea e elemental, que fabricada

Assi foi do Saber alto e profundo,

Que é sem princípio e meta limitada.

Quem cerca em derredor este rotundo

Globo e a sua superfície tão limada,

É Deus: mas o que é Deus, ninguém o entende,

Que a tanto o engenho humano não se estende.

(est. 80)  

No entanto do que eu pretendo falar é da «Sétima Elegia». O Poeta, diante daquele vergel cheio de variegadas plantas ( flores, árvores de fruto, espécies silvestres), imitando Virgílio, rematava o seu vocativo:

E vós, ovelhas minhas, sem piedade,

Vos apartai de mim, se algum desejo

Tendes de ter do pasto mais vontade

(...)

lograi do Tejo plácido ruído;

Sós, lograi estas veigas florescidas...