A leitura literária

             Annie Rouxel, Enseigner la lecture littéraire, Presses Universitaires de Rennes, 1996

 

             “Le savoir-lire s’acquiert dans une lutte permanente contre les anciens conditionnements, et c’est durant cette confrontation que se transforme et s’élabore la personnalité du jeune lecteur.” p. 129

 

             O aluno que chega hoje à Escola não é um “herdeiro”; a distância cultural  que muitas vezes o separa dos textos estudados em aula convida a repensar o ensino da literatura.

             Presentemente, o aluno ocupa o 1º lugar. O professor deve conduzi-lo a “uma maior autonomia face ao texto” e a leitura metódica substitui a explicação do texto.

             Neste contexto, a didáctica da leitura literária fundamenta-se na análise dos comportamentos dos estudantes face ao texto literário e assenta em três ideia-força:

 

·       A primeira diz respeito ao impacto da leitura literária sobre os outros modos de leitura - a concentração e a distanciação que ela exige  são posturas de leitura úteis e fecundas face a outros tipos de textos.[distância]

·       É fundamental propor aos alunos textos complexos que estimulem a curiosidade e os levem a tomar consciência da sua actividade como leitores. [complexidade]

·       A terceira interessa aos efeitos da leitura: paradoxalmente, há lugar para a emoção e para o prazer em aula no âmbito desta leitura codificada que é a leitura escolar. [prazer]

 

             A estratégia proposta consiste em combinar gradativamente as três componentes da didáctica que são a definição dos saberes, a observação dos alunos e a proposição de actividades.

 

             Ao mesmo tempo lugar de transmissão de valores mas também de aculturação, ela suscita nos alunos um sentimento de alteridade que o professor pode transformar em curiosidade e interesse. O professor deve, portanto, trabalhar a motivação fazendo da complexidade um factor de estímulo e do seu domínio um objectivo de formação.

             A complexidade da literatura é um factor essencial para  desenvolver as faculdades intelectuais dos alunos. Ela condiciona a elaboração dos conceitos  e das noções de análise literária e permite o desenvolvimento da memória pessoal e colectiva, fonte de identidade cultural. Para isso, a mediação do professor é fundamental. (13)

 

             1. Uma didáctica da literatura

 

             A dimensão praxeológica da didáctica exige uma reflexão constante sobre os saberes, a sua transposição e a sua  apropriação...

             A leitura literária constrói um conjunto de competências, em que algumas poderão ser reenvestidas na leitura dos outros textos.

             Tradicionalmente, o estudo da literatura modelava simultaneamente a memória colectiva e a identidade cultural.

             Hoje, o texto literário deixou de ser considerado como uma entidade a celebrar: o seu estudo abre a reflexão sobre o campo social em que foi produzido e toma sentido.

             A necessidade da exotopia[1] na abordagem do texto literário.

 

             2. Motivação[2]: o sentido em questão

 

             Que promessa de inteligência e de emoção pode o estudo dos textos literários oferecer aos adolescentes?

             De modo a possibilitar que os adolescentes construam uma representação do objectivo a atingir, é preciso  ser capaz de responder às questões seguintes:

 

·       O que é ler um texto?

·       O que é compreender?

·       O que é o conhecimento da literatura?

 

             No contacto com os textos, no momento do regresso reflexivo sobre eles próprios suscitado pelo professor, os alunos podem tomar consciência da sua actividade na construção do sentido e experimentar o carácter dialógico do conhecimento.[3]

 

             Motivar o estudo dos textos pela dificuldade

 

             Propor textos problemáticos e abertos...

             Trabalhos de escrita, de pesquisa no seio da qual os textos terão lugar, em que o seu estudo  é finalizado por um projecto que os inclui e os ultrapassa.

 

             Motivação e aprendizagem

 

             Crítica da pedagogia por objectivos,[4] na medida em que esta, apesar de permitir tomar consciência da complexidade das tarefas exigidas aos alunos, esquecia muitas vezes o essencial: o sentido que fundamenta as aprendizagens.

 

             Aplicação

 

             Ex. o conceito de focalização (21-22-28)

 

             É conveniente escolher textos onde aconteçam alterações de focalização (glissements), estudando, assim, não só as modalidades do olhar mas também a sua inserção na trama narrativa.

             Casos de dissociação entre voz e olhar; oscilação da fonte do olhar...

 

             Ex. o conceito de voz narrativa (22-23)

 

             A mesma estratégia: estudo a partir de textos onde se verifiquem mudanças da instância enunciativa.

 

             Contrariamente às aprendizagens organizadas de forma expositiva, aqueles que partem da realidade complexa dos textos têm uma dupla vantagem: não só preservam a motivação mas evitam uma pre-estruturação demasiado simplista dos saberes.

 

             Ex. a noção de romance (27-28-29)

 

             3.  A formação e a apropriação dos conceitos e noções[5]

 

             A categorização é uma operação fundamental na orden(ação) do pensamento: ela permite a conceptualização. Corre, porém, o risco de não passar de etiquetagem, de reduzir ao estereótipo ... a uma concepção do saber como sistema fechado e finito de conceitos...

             Em alternativa, os conceitos devem fazer sentido na diacronia.

             As categorizações contribuem para inculcar nos alunos horizontes de expectativa e são preciosas em literatura para pensar a diferença. Elas desempenham o papel da memória cultural através da qual os textos são lidos.

             A leitura literária tende a propor versões degradadas dos conceitos. Por isso certos autores[6] propõem a distinção entre conceitos e noções.

             A noção cuja constituição está articulada ao enunciado de uma problemática remete para a ideia de abertura dos conteúdos dos saberes analisados, enquanto que os conceitos remetem para ideia de fechamento, só aceitam uma definição. Deste modo, em literatura, a categoria romance seria uma noção enquanto que a focalização seria um conceito. (27)

             Quando se trata de noções, os saberes didactizados devem reflectir a heterogeneidade dos saberes de referência.

             Pensar e classificar

 

             Para assegurar a aquisição dos conceitos e das noções, eles devem ser construídos em aula, tornando-se objectos de estudo e de uma formalização correcta. Temos, assim, duas vias: estratégias inductivas; elaboração de protótipos.

 

             As estratégias indutivas

 

             O recurso a estratégias indutivas, ao longo das quais os alunos põem à prova as suas representações empíricas e experimentam, na procura de critérios, a dificuldade que está sempre ligada a qualquer discriminação, revela-se frequentemente muito eficaz. É porém necessário que um certo número de condições sejam preenchidas:

 

·       a escolha dos suportes

 

·       A contra-exemplificação[7]

·       Estes objectos devem ser suficientemente diferentes (dissemblables) e complexos para construir os conceitos. Da extensão do campo estudado depende a sua validade. Também a elaboração das noções depende deste tipo de extensão.

·       É necessário pôr à prova o conceito / noção em elaboração com o auxílio de contra-exemplos. Ao  fazer explorar o contraste, ajudamos o aluno a estruturar os elementos que ele encontra. Estes contra-exemplos devem ser apresentados de forma gradativa, recorrendo primeiramente aos que estão mais afastados do conceito em estudo...

  

             A elaboração de protótipos (30-32)

 

             Ligados ao funcionamento “imaginado” / imagé da rede conceptual, os protótipos são representações mentais individuais a partir das quais o sujeito dá sentido à realidade.[8]

             Este modo de conceptualização por protótipo acontece sobretudo quando o saber de referência em debate se apresenta sob aspectos contraditórios. Convém por definição às categorias e às noções estéticas, que elas sejam históricas ou formais.

             Face à pluralidade de definições de uma noção como, por exemplo, “romantismo”, esta noção pode, no entanto, ser construída em aula, na sua diversidade, a partir de leituras estruturantes.  O professor, através das suas escolhas didácticas, deve estar atento à pertinência  e à eficácia dos protótipos elaborados, e no caso das categorias estéticas, ele esforçar-se-á por pôr à prova recorrendo à interdisciplina, o que supõe uma descentração  e um contexto. (31)

 

             4. A memória

 

             Edelman apresenta a memória como um processo dinâmico e complexo que se modifica permanentemente.

            

·       memória de curto prazo ou memória de trabalho

·       memória de longo prazo (memória secundária):

1.     memória semântica

 

2.     memória episódica

 

 

·       relativa às informações abstractas, descontextualizadas, recorre a operações automáticas de armazenamento/ recouvrement da informação

·       regista a informação num contexto específico e pessoal - um episódio - requer um processo controlado de armazenamento.

 

 

             É, sobretudo, a memória secundária, enquanto princípio fundador da identidade e da consciência, que interessa directamente ao professor de língua materna. Na medida em que as funções cerebrais dependem do contexto e da sua história, cabe ao professor propor ao aluno um ambiente rico e complexo. (33)

             Por outro lado, cabe-lhe propor um retorno reflexivo sobre os conhecimentos, organizando com uma frequência determinada a revisão dos conhecimentos. (balanços periódicos)

 

             Construir uma cultura, uma identidade, uma sensibilidade (35-36)

 

             Através da escolha dos textos, o professor pode dar um importante contributo para modelar a personalidade do aluno.

            

             5. A mediação do professor

 

             A mediação manifesta-se de três formas:

 

·       na escolha dos suportes

·       na ajuda na aquisição dos conceitos, desenvolvimento da memória, na problematização

·       na formação do pensamento

 

             Confrontados com um texto, no momento em que devem emitir as hipóteses de leitura, os alunos têm muitas vezes vagas intuições mas não encontram as palavras para os exprimir. Se o professor não os ajuda à sua verbalização, estes pensamentos latentes apagar-se-ão sem tomar forma. É nesta situação que a estratégia maieutica é particularmente fecunda: trata-se de fazer nascer o pensamento, de o libertar, de o ciselar convocando e interrogando os seus pressupostos.

             Em aula, esta actividade socrática tanto se pode processar oralmente (interacção entre prof. e alunos, e entre alunos) como por escrito, porque a linguagem escrita favorece a conceptualização e tem um valor eminentemente heurístico. (37)

 

             2ª parte

 

             Ler, compreender, interpretar

 

             Resultante de uma aprendizagem, a leitura literária  representa para os alunos uma ruptura com as suas práticas de leitura.

 

             1. Diversas teorias sobre a leitura

 

             Como definir a leitura literária no ensino secundário sabendo que por um lado a instituição escolar se quer relativamente independente das diferentes teorias existentes e que por outro lado ela deu ela própria um conteúdo a alguns desses termos?

            

             2. Algumas respostas da hermenêutica contemporânea

            

             A distinção faz-se entre os teóricos para quem a leitura  supõe a compreensão e a interpretação como duas actividades sucessivas e diferentes[9] e aqueles que consideram que estes dois termos não devem ser dissociados[10] [Hans-georg Gadamer (1976), Hans-Robert Jauss (1988), Paul Ricoeur (1986)]. (42)

 

             Leitura e interpretação

 

             Michael Riffaterre distingue a leitura heurística - primeira apreensão do texto no seu desenrolar linear - da leitura hermenêutica , segunda, retroactiva, que organiza e transforma os elementos encontrados na leitura inicial.

 

             Sentido, significação, significância

 

             De acordo com o Dicionário das Ciências da Linguagem de O. Ducrot, T. Todorov:

 

             O sentido de uma palavra é dado na língua; a significação (ou efeito de sentido) provem do uso da palavra num discurso, portanto da alteração que o contexto impõe ao sentido; significância é “o jogo sem limites nem centro das possibilidades de articulações geradores de sentido.” (43)

 

             Uma transferência destas definições para o estudo dos textos deveria permitir associar significação e compreensão por um lado, e significância e interpretação por outro.

 

             3. A intronização do leitor: a literatura como actividade

 

             Esta deslocação corresponde a uma ruptura epistemológica profunda.  Significa a passagem de uma concepção da literatura como coisa para literatura como actividade: a do escritor e a dos leitores sem os quais o texto não tem existência. (44)

             No Acto de leitura, W. Iser analisa o conceito de leitor implícito e repertoria diferentes conceitos de leitores-tipos nascidos da crítica:

 

            

·       o arquileitor de M. Riffaterre

·       o leitor informado de Stanley Fish

·       o leitor visado de Erwin Wolff

Todos estes modelos, apesar da sua diversidade, pressupõem todos a intervenção do leitor.

 

             Actualmente, é a interacção entre sujeito e texto que suscita o interesse dos investigadores e dos professores: “ o texto não é mais objecto de explicação mas de vivência: trata-se, de facto, de sentir os seus efeitos.

            

             Esse efeito resulta da relação dialógica instituida pelo texto

 

             Considerar a leitura do texto ficcional como um acto de comunicação convida a interessar-se pela dimensão pragmática do texto e a reconhecer que o efeito produzido no leitor é uma reacção à força ilocutória.

 

             Destes teorias resaltam pelo menos dois ensinamentos preciosos para uma reflexão didáctica:

 

·       A leitura assume uma função construtiva em relação ao sujeito: este realiza-se intelectual e afectivamente na sua actividade de actualização do texto (abertura e reconhecimento da alteridade);

·       Mas isto só é possível, se se privilegiar, por entre os comportamentos do leitor, aqueles que se baseiam numa relação dialéctica do sujeito e do texto.

 

             4. A actualidade da tipologia de M. Bakhtine

 

             Bakhtine (46) - na análise da recepção dos textos - distingue três tipos de atitudes interpretativas:

 

·       narcísica

·       consiste na projecção do leitor na obra que lê; esta ilustra e exemplifica o seu próprio pensamento

·       empática

·       a fusão no êxtase: o sujeito perde a sua própria identidade; a sua consciência dilui-se numa outra

·       diálogo

·       implica simultaneamente a distância e o reconhecimento das posições respectivas das instâncias de comunicação: de um lado o leitor e do outro o autor ou a instância textual que o narrador representa.

 

             Bakhtine (47) aceita, porém, que a atitude fusional possa abrir caminho a uma atitude mais distanciada, na medida em que ela constitui por vezes o primeiro movimento da compreensão, não excluindo o momento inverso definido pelo termo exotopia:

 

·       É este regresso a si próprio , consciente da sua exterioridade ao texto, que é a condição e o fundamento da compreensão.

·       Esta compreensão põe em relação duas culturas.

·       A actividade de compreensão exige um trabalho de pesquisa e de documentação sobre o contexto da obra.

·       A actividade de compreensão exige ao leitor uma clara percepção da sua situação histórica, a consciência da sua exotopia.

 

             Em síntese: qualquer que seja o nome dado ao modelo interpretativo - atitude intelectiva, compreensão dialógica fundada sobre a exotopia ou recepção reflexiva ou modalidade de jogo - este representa pela sua fecundidade e pela sua dimensão formativa o horizonte das aprendizagens escolares.

 

             5. A retórica do leitor[11]

 

             A retórica do leitor, fundada na homologia com a retórica da escrita, comporta quatro momentos distintos:

 

·       Inventio

·       a escolha da leitura, escolha determinada por numerosos factores: o meio, os media, a escola...

·       Dispositio

·       a orientação de leitura: a expectativa do leitor, expectativa não ligada ao género, mas dependente da personalidade do leitor assim como das circunstâncias em que ele efectua a leitura.

·       Elocutio

·       a transposição: consiste na percepção dos códigos do texto e na sua transcrição em códigos do leitor.

·       L’actio do discurso

·       a acção de ler: definida pelas práticas muitas vezes observadas: situação, velocidade e ritmo de leitura e pelas operações mentais mais complexas e dificilmente observáveis: memorização, produção de imagens...

 

 

             A LEITURA ESCOLAR

 

             A especificidade da leitura escolar

 

             A leitura escolar diferencia-se dos outros modos de leitura - leitura funcional com alcance informativo e leitura ficcional, cursiva, visando o prazer através da emersão no texto - por três características:

 

·       a relação que ela institui com o tempo

 

 

 

·       a natureza do prazer que ela provoca

 

 

·        a sua dimensão social

·       um tempo de esforço, de tomada de consciência - um tempo dilatado: a leitura literária desdobra-se em 2 momentos: heurístico e hermenêutico (51)

·       A leitura decorre num tempo social que exclui a fusão com o texto e que reserva pouco tempo ao descontínuo, ao sonho, à imaginação. (53)

 

 

 

             Cf. a reflexão de Barthes - Prazer do texto - entre “lecture de jouissance” e “lecture de plaisir”.

 

             A leitura escolar hesita entre um prazer sensível e imediato e um prazer mais intelectual, prometido e diferido. A leitura metódica que é definida como uma explicação do texto consciente das suas estratégias e das suas opções, tende a favorecer a segunda tendência, ligada ao jogo social da construção do sentido, à interacção das retóricas de cada leitor-aluno. (53)

             Uma leitura metódica bem conduzida deve prever, no início da sessão, um tempo suficientemente longo de confrontação individual com o texto para que o aluno “sinta” em si os efeitos da sua leitura, de modo que possa aceder à emoção estética que, do ponto de vista da autora, só acontece - através do encontro essencial entre aluno e texto - fora do jogo social.(53)

             O que levanta o problema da organização dos espaços pessoais de leitura, na medida em que reconhecer a importância capital do corpo “é permitir a utilização da noção de imaginário, tornando possível uma teoria da leitura como consciência sui generis a meio caminho entre a actividade cognitiva e a sensação estética.”[12] Esta prova da emoção pode ter lugar no início da leitura metódica, antes que se dêem as trocas que favorecem a objectivação do texto e o acesso a um prazer de uma outra ordem.

 

             Na presença do Outro

             A leitura metódica vive, por um lado, da tensão entre o eu e o texto, e por outro, da tensão entre o eu e os outros - equilíbrio frágil onde o desaparecimento de um dos pólos põe em perigo o sentido do exercício. (54)

             Na presença do Outro, a verbalização do pensamento é um acto positivo, porque torna a explicitação do sentido mais exigente. Deste modo, a leitura surge como uma construção dinâmica. Porém, a partilha entre pares só é fecunda se resultar de um trabalho efectivo de cada um e se os contributos forem colocados ao assentimento de todos.

             O principal obstáculo à participação dos alunos é, de facto, o medo do juízo do Outro. Ao fazer uma proposta de leitura, o aluno expõe-se aos outros, revela o que é.

             A timidez, o pudor, o desencorajamento: aspectos que o professor terá que aprender a ultrapassar. (54)

 

             A leitura escolar surge como uma prática específica cuja finalidade é um saber - ler que desabrochará em leituras livres e pessoais.

 

             As representações dos alunos

 

             Testadas através de inquérito (58-66):

 

            

·       De onde é que provém o sentido de um texto?

·       O que é a literatura? Em que é que ela te diz respeito?

·       O que é que significa ler um texto nas duas situações seguintes:

1.     para ti-próprio?

2.     na escola?

·       A presença do grupo: ajuda ou obstáculo?

·       Quais são os saberes mais importantes para a compreensão de um texto?

·       Durante a leitura, que perguntas fazes ao texto?

·       O que é que esperas da actividade de leitura na aula[13]:

a - Compreender um texto?

b - Aprender a ler melhor por ti próprio?

c - Descobrir a tua personalidade?

d - Compreender melhor o mundo e os homens?

·       Que tipo de prazer sentes ao reler um texto estudado em aula?

·       Em que é que a leitura na aula modificou o teu modo de ler?

·       Que incidência é que a leitura escolar tem na escolha das tuas leituras pessoais?

 

             2. A leitura como objecto de reflexão na aula

 

             a - A importância de recorrer a textos literários que tematizam o acto de leitura e apresentam a imagem do leitor virtual[14], no caso francês: Mallarmé, Paul Valéry; no caso italiano, Italo Calvino , Si par une nuit d’hiver un voyageur[15]; no caso português, Almeida Garrett, com Viagens na minha Terra... Mas também Jacques le Fataliste de Diderot,  Vie et opinions de Tristram Shandy de Sterne, Le Dessin dans le tapis d’Henry James, Un drame bien parisien d’ Alphonse Allais.

 

             b - Um corpus de textos que ofereça as representações da leitura romanesca no romance do séc. XIX pode fornecer aos alunos a ocasião de descobrir a historicidade dos valores de que o livro está investido e os comportamentos “leitorais”. Observar, por ex., Julien Sorel / père Sorel; Mme Bovary...

 

             c - Um corpus que reuna os testemunhos de escritores sobre a sua relação com o livro e a sua primeira experiência de leitores pode permitir aos estudantes compreender o que a leitura deve ao “habitus cultural”, descobrindo como, em certos meios culturais, as leituras se geram a elas próprias. Ver, por ex. Livro I - Confessions - de Rousseau; Colette; Simone Beauvoir, Sartre (Les mots)

 

             3. Desconstruir a equação: literatura = “beau langage”

 

             É preciso levar os alunos a compreender o que a transformação da língua literária deve à História, e a pensar a categoria estética do “belo”, tomando consciência da sua dimensão histórica e ideológica. (73) Observar, por ex., o surgimento da língua popular na literatura como expressão do acontecimento que foi o reconhecimento do povo como sujeito da História e da literatura. (74)

 

             4. A leitura como arte da distância

 

             O leitor, criador de sentido, tem que procurar o difícil equilíbrio entre a fidelidade ao texto e a sua própria liberdade.

 

             a - O estatuto problemático do erro[16] na leitura literária. A natureza polissémica do texto literário torna o diagnóstico do erro mais aleatório e mais difícil. Por isso, os critérios “verdadeiro” / “falso” tornam-se redutores, sendo apenas úteis à leitura de informação.

             b - Para avaliar o erro (de leitura) é preciso tomar em consideração outros parâmetros como, por ex.: a sua extensão no texto e o grau de alteração que ele imprime ao sentido. Os maiores erros em leitura consistem em “fazer dizer ao texto o contrário do que ele diz” e, em geral, “construir sentidos que o texto não postula.” Deste modo, os critérios “verdadeiro /falso” podem ser substituídos pelos critérios “aceitável / inaceitável”.

 

             c -  As figuras da não distância: a ausência de distância situa o leitor ao mesmo nível do texto - o leitor confunde o seu universo pessoal com o texto.

 

             A ilusão referencial: a recusa da deslocação (dépaysement) - a recusa da “experiência de alienação”

 

             Uma atitude frequente consiste em sobrepor, reduzir (rapporter) o desconhecido ao conhecido, isto é, ao mundo que nos rodeia e à forma de linguagem quotidiana. É preciso reflectir profundamente com os alunos a partir do estudo do texto de modo a que descubram que a referencialidade efectiva nunca é partinente para a significância poética.[17]

             Þ O que supõe que consigamos desenraizar a crença ingénua de uma correspondência directa entre as palavras e as coisas e que abordemos quer a questão da arbitrariedade do signo quer a da sua motivação no texto poético. O que implica que nos interroguemos sobre a natureza do texto poético e sobre as relações que ele estabelece com a realidade, e sobre a equivalência dos enunciados sucessivos que constituem outras tantas variações da estrutura significante. (86)

 

             A não distância e a leitura anacrónica

 

             Consiste em substituir o referente ausente pelo referente do leitor, sobretudo quando os adolescentes se sentem implicados pela problemática do texto (movimento característico de egocentrismo típico desta fase em que se determina a personalidade). (87)

             Þ O que implica uma “mise à distance historique”, isto é, a confrontação do texto em estudo com outros textos da mesma época sobre o mesmo assunto.

 

             A ilusão, o erro (leurre) do código tomado à letra

 

             Uma outra forma de não distância consiste no desconhecimento do código e das convenções estéticas. Isto acontece sempre que os alunos explicam as suas emoções pela sinceridade que pensam descobrir no texto literário. (88) Têm dificuldade em desfazer-se do mito da sinceridade e em reconhecer que o texto obedece às regras de um género literário historicamente determinado.

             Þ A aprendizagem da distanciação passa pelo reconhecimento das convenções estéticas e pelo abandono de uma perspectiva histórica reduzida a dados biográficos.

 

             d - As figuras da proximidade e do sentido lacunar: comportamentos interpretativos gerados por um recuo insuficiente (leitor e texto não se encontram no mesmo plano, mas a proximidade é de tal ordem que ela limita o campo de visão do leitor). (89)

 

             Figuras de selecção arbitrária

 

             Integram todas as hipóteses de leitura incapazes de dar conta do conjunto da página estudada: tónica num tema secundário, num aspecto formal não motivado, ou enunciado lacónico do tema principal... Demasiado gerais ou restritas, estas hipóteses não podem constituir eixos de leitura. (89-91)

             Þ O ensino da distanciação requer o suporte de obras integrais ou, se impossível, a presença de extractos do co-texto capazes de informar a passagem estudada.

 

             Figuras de superfície

 

             Integram todas as formas de leitura que privilegiam o sentido manifesto...:

             - Leitura descritiva e atomização do sentido - o texto é descrito com a ajuda da nova metalinguagem ... os alunos refugiam-se nos levantamentos (répérages) de campos lexicais, sem no entanto, passarem à interpretação...

             Þ O professor deve ensinar (através da questionação, do diálogo, da confiança) os alunos a sair desta forma moderna de paráfrase, incitando-os a recuar para organizar os efeitos de sentido e compreender em que aspectos o texto lhes diz respeito.

             “ É a faculdade de relacionar os índices significantes que aqui está em causa.

             - Focalização sobre o sentido literal, que ignora o alcance metafórico [terrível empobrecimento do texto] e a dimensão irónica do texto...

             Þ a dimensão polissémica do texto, a noção de arte, a noção de obra aberta devem ser abordadas com os alunos. A aprendizagem da ironia exige distanciação e por isso, será talvez um dos meios mais eficazes de regulação da distância na leitura. (92-93)

             - figuras problemáticas da paráfrase: a paráfrase é a figura por excelência da proximidade. Em geral, a paráfrase corresponde a uma apropriação enfática do texto - a adesão do leitor, a sua “vizinhança” do texto manifestam-se por uma reformulação respeitosa dos movimentos de pensamento do autor, muitas vezes próxima da sua sintaxe e do seu léxico.

             e - As figuras da distância infinita e do delírio interpretativo

 

             Elas integram as situações de afastamento excessivo que fazem perder de vista o texto e conduzem às extrapolações mais extravagantes.

             A origem desta derrapagem:

             - a ignorância do sentido literal

             Þ É preciso segurar as rédeas da imaginação dos adolescentes, frustrar o gosto pela fuga, desenvolver a acuidade da leitura focalizando a atenção sobre os dados fundamentais da sintaxe.

             - o texto submetido e reescrito

             O leitor faz voluntariamente uma distorsão ao texto para que ele entre no seu projecto interpretativo. (96)

 

             5. As origens dos desequilíbrios: a ilusão do leitor

 

             Egocentrismo, narcisismo, centração em si, projeção no texto, qualquer que seja o termo utilisado no diagnóstico, ele assinala a preferência que o leitor dá à sua pessoa em detrimento na sua relação com o texto. (99)

 

             a - A resistência ao simbólico

 

             Segundo Umberto Eco, a ilusão referencial consiste em utilisar um texto “para aí procurar qualquer coisa que se encontra fora do texto, qualquer coisa de mais “real” do que o próprio texto. Este culto da realidade manifesta um desconhecimento da natureza do texto, isto é, a resistência ao que de ordem simbólica e das convenções.

             A recusa do jogo: apesar de na infância ter aceite as convenções do universo ficcional, o adolescente parece rejeitá-las em nome do culto do real.[18] Ora, como defende Henri Wallon (1970):

             “Le passage capital pour l’avenir intellectuel de l’enfant comme il l’a été pour l’espèce est celui qui le prend à sa fusion dans l’objet ou la situation (...) et qui l’amène au moment où il peut leur donner un équivalent fait d’images, de symboles, de propositions.”[19]

             A ilusão referencial, por ex., na abordagem do texto realista tem como consequência a impossibilidade de interpretação, porque a realidade se impõe por si própria... - prova de imaturidade (100)

             O mundo sob o cristal das palavras: a linguagem não é reconhecida pelo que ela é.

             “A crença fundamental do leitor em matéria de linguagem vem-lhe do seu uso quotidiano da língua. Os utilizadores da língua agarram-se à ilusão de que as palavras significam numa relação directa com a realidade, por razões práticas, e tanto mais que têm das coisas uma ideia em parte moldada pelos próprios conceitos do significado, como se as palavras gerassem a realidade.” M. Riffaterre

             No contexto da comunicação quotidiana, a prosa restringe-se ao uso descritivo e denotativo da linguagem; a poesia, tornada estéril, torna-se “in-signifiante”.

 

             b - A adesão a uma imagem tranquilizadora da realidade

 

             A percepção que o aluno tem da realidade contemporânea deve muito às representações do mundo, muitas vezes estereotipadas, propostas pela produção romanesca tradicional, a que reproduz os modelos narrativos do séc. XIX, onde tudo é subordinado à acção; o tempo linear e condensado dá sentido ao destino das personagens, os elementos contingentes são eliminados. A vida, a realidade tornam-se legíveis. Esquema simples e tranquilizador que tira ao mundo a sua opacidade. (101)

             Num mundo marcado pela velocidade, a conflitualidade, a dispersão, o modelo de um tempo romanesco acelerado e unido que dá coerência aos acontecimentos torna-se para ele uma referência. É esta realidade, falseada e anacrónica, que compõe a referencialidade apresentada ao olhar durante a leitura. (102)[20]

 

             c - Um comportamento sobredeterminado / conformismo dos doalescentes

 

             Um inquérito realizado em 1993 revela que:

             - os adolescentes preferem o romance - o policial, em particular - , as “histórias verdadeiras” e os “testemunhos vividos”... (a exigência mimética) interessam-se pelos livros que revelam preocupações sociais.

             - manifestam dificuldade em distinguir o real romanesco da realidade.

             - privilegiam na análise do romance contemporâneo, os seguintes critérios: realismo (actualidade, imagem da realidade, carácter documental); linguagem transparente que favoreça imersão no texto; coerência da obra (verdade ou verosimilhança mais do que a coerência formal) (102-103); estrutura clássica, linear...

 

             A Escola é muito permeável aos valores dominantes na literatura contemporânea, o que explica a hegemonia do género narrativo: romance, autobiografia, récit de vie... Só que estes géneros favorecem a ilusão referencial, reforçando ainda mais a dificuldade dos adolescentes em reconhecerem o simbólico... O que implica o incremento de processos didácticos que favoreçam uma leitura mais distanciada.

 

             6. Contrapeso do texto e mediação didáctica

 

             É preciso “planificar” situações onde o gesto mental de distanciação do texto seja exigido. Para favorecer esta distanciação, podemos encarar, em primeiro lugar,  situações onde a dimensão heurística do erro seja reconhecida. Por ex.: a exploração de certas hipóteses de leitura pode obrigar, pelos reajustamentos que suscita, a tomadas de consciência essenciais: a distanciação resulta deste percurso (conflito socio-cognitivo e metacognição).

             Em segundo lugar, acompanhamento de um texto a estudar por um conjunto de documentos susceptíveis de o informar, de o interrogar e de estabelecer deste modo a distância à partida (dispositivo didáctico que previu a dificuldade).

 

             a - Na origem do saber: a interrogação

 

             A interrogação, em ruptura com as formas do passado, deve ter um lugar de eleição  numa pedagogia que rejeita a conivência cultural.

             Não é fácil colocar questões pertinentes a um texto.

             As questões propostas pelos manuais começam por ter o defeito de “serem formuladas por outrém, um adulto estranho ao percurso do aluno. Elas pressupõem conhecimentos que o aluno não possui ® desencorajamento...

             Uma questão didacticamente pertinente deve ter simultaneamente em consideração o texto e os saberes dos alunos. ( 108)

             As grelhas de análise são tão impessoais como as questões dos manuais. Elas pressupõem que o caminho que leva à interpretação é o mesmo para todos. É preciso dar aos adolescentes a possibilidade de investir o texto de forma difeenciada e de experimentar o seu caminho de leitor.

             É fundamental uma formação à interrogação dos textos

            

             A aprendizagem da interrogação

 

             Para instaurar um verdadeiro diálogo com o texto, são necessárias duas condições:

             - o leitor deve dispor de um certo número de saberes que dêem peso e sentido às suas perguntas ou que as motivem;

             - deve sentir também necessidade de resposta, sentir-se envolvido.

             Análise de 2 tipos de situações didácticas:

             - as que conferem ao aluno um estatuto de verdadeiro interlocutor, dando-lhe conhecimentos que lhe permitirão investigações fecundas;

             - as em que, colocado em situação de pesquisa, ele se vê forçado a interrogar o texto e aprende a problematizar.

.

             Cada estudo da obra integral, pelas suas recurrências temáticas ou estruturais, permite que o adolescente construa os conjuntos de interrogações adaptadas ao objecto. Na base destas interrogações, os saberes genológicos podem ter um papel muito importante... ao interrogar os aspectos textuais e institucionais do fenómeno literário, a abordagem genológica mostra que os textos estabelecem relações um com os outros. Por outro lado, fornecendo ao leitor um contexto de recepção, este permite-lhe apreciar a historicidade e a alteridade do texto literário. Finalmente, suscitando o prazer, do jogo “regrado” com o texto, contribui-se para aproximar os alunos da literatura.(110)

             A partir do género podem ser abordadas as noções de historicidade e de legitimidade, a da intertextualidade e enfim os conhecimentos ligados ao funcionamento da forma textual considerada.

             ® É necessário que o professor preveja um dispositivo didáctico que interpele e provoque os alunos: o confronto de textos, o recurso a documentos críticos, iconográficos e sonoros, que são meios susceptíveis de gerar problemáticas. (111)

             O importante é que, ao interrogar o texto, os alunos cheguem a compreender que o texto é ele mesmo uma resposta dada pelo escritor a uma questão que lhe diz respeito e o impele a dar uma visão do mundo.

 

             Interrogação de si e formação de um pensamento

            

             A interrogação do texto é inseparável da interrogação de si. Nesta interacção entre o texto e o leitor que caracteriza o acto leitura, a criação do sentido resulta do comprometimento (engagement) do leitor. Este, ao esforçar-se em compreender o texto, descobre a alteridade que o habita e afirma-se simultaneamente.

             ® Em aula, é possível favorecer a construção da personalidade ao incitar os alunos a explicitarem o seu pensamento, a traduzi-lo em palavras.~

             ® É necessário levar os alunos a interrogar as palavras que utilizam  para identificar o que sentem, de modo a clarificarem o pensamento (sobretudo, quando a expressão é indigente, evasiva...), a assenhorearem-se de uma verbalização rigorosa... Desta exigência de precisão dependem não só a riqueza do sentido construído mas também a distanciação que se encontra no centro da aprendizagem da leitura.

 

             Poder dizer uma emoção é dar-lhe forma fora de si, objectivá-la. Exprimir uma ideia , é também exteriorizar-se em relação ao texto e colocar-se em posição de argumentar a sua leitura. (113) Para atingir este objectivo, não basta a interrogação, é preciso que os alunos enriqueçam o léxico: ao lado da metalinguagem necessária à análise textual, o vocabulário da nossa língua deve ser objecto de reflexão ® o estudo dos matizes que os sinónimos deixam antever é uma das pistas a explorar.

            

             Interrogação e mediação do professor

 

             A mediação do professor, antes de se manifestar pela presença física em aula, encontra-se no dispositivo que ele criou - a“ situação-problema[21]. Este dispositivo deve assegurar que a curiosidade dos alunos se mantém desperta e fornecer-lhe um nº suficiente de elementos para que eles possam apossar-se do texto, compreender o seu funcionamento e o seu alcance, propor uma interpretação.(114)

             ® O princípio do diálogo entre textos ou o confronto entre as representações dos alunos e a realidade dos textos, mostra-se muitas vezes eficaz para construir as problemáticas da leitura.

             Através da sua presença, o professor está lá para ajudar os alunos a interrogar de forma pertinente [recurso à dúvida metódica motivado por um elemento do texto].

 

             b - A consciência da textualidade

 

             A opacidade para iluminar a dimensão  “scripturale” do texto. Para este efeito, recorrer, por ex., à leitura dos textos surrealistas, [aos jogos de linguagem; certos textos contemporâneos, o “novo romance”[22]] porque estes recusam a mimese, gerando, assim, a distanciação tão necessária à leitura. À mimese opõem o fantástico.

             A ambiguidade, a polissemia favorecem a distanciação procurada no acto de leitura.

 

             ñ Apesar deste desvio, não podemos fugir à questão do realismo porque o problema da mimese é central na nossa cultura.

             A intervenção didáctica pode tentar delimitar a noção de realismo de duas formas: primeiramente, inscrevendo-a na História e, posteriormente, levando os alunos a dominar melhor certas noções de narratologia implicadas na ilusão referencial, o que é um outro modo de pensar a relação texto/mundo.  (119)

 

             Os princípios da estética realista podem ser descobertos a partir do estudo dos textos romanescos do séc. XIX assim como através da leitura dos textos teóricos redigidos naquela época: o importante é que os alunos compreendam que a “ representação não reenvia para a realidade mas substitui-a” e que o escritor cria a ilusão de um olhar.[23]

             Para aprofundar a reflexão sobre a literatura como representação e eliminar antecipadamente a ideia de um realismo monolítico, é útil abordar os problemas ligados à definição de categorias estéticas do realismo e do naturalismo: diferenças, contradições, sobreposições, evoluções...[24]

             É necessário clarificar com os alunos certas noções de narratologia muito implicadas na ilusão referencial. Em primeiro lugar: a personagem, devido à tradicional confusão entre pessoa e personagem. Por vezes, esta confusão é ainda reforçada pela  presença de personagens referenciais.

             ® É importante trabalhar sobre a visibilidade de certas convenções romanescas e sobre o tratamento histórico e genérico da noção de personagem:

            

·       A sobredeterminação das personagens nos romances do séc. XIX através da análise dos seus nomes.[25]

·       A noção de personagem é abordada de modo diferente, se o prof. optar por fazer observar um conjunto de personagens de diferentes épocas: a personagem como lugar privilegiado de investimentos ideológicos.

 

             A prova das artes plásticas: a ilusão da iconicidade

 

             A fotografia é provavelmente a arte visual que coloca com mais força o problema da semelhança entre referente e significante.[26] (126)

             ® Levar os alunos a fazer uma reflexão sobre a força da ilusão que os percorre (saisit) quando olham uma fotografia, pode permitir-lhes compreender o que se passa quando a ilusão é criada pelas palavras. Num caso como no outro, o significante é ignorado e o significado impõe-se.

             ® O professor pode tentar prolongar esta reflexão suscitada pela comparação através da leitura de textos , teóricos ou narrativos, que propõem uma reflexão sobre a fotografia.[27]

             A pintura

             A observação diacrónica das obras num museu é suficiente para demonstrar, por exemplo, que a ilusão da perspectiva na representação do espaço é uma convenção pictural inscrita na história da civilização ocidental e que a nossa percepção, muito cultural, utiliza um código de reconhecimento ligado às convenções gráficas.

             ® Dar particular atenção aos pintores aludidos no romance, porque a “mesma visão do mundo pode ser partilhada pelas duas artes: a de um mundo intelegível no qual o indivíduo integra um tipo e é explicado em parte pelo meio.”

 

             A demonstração mais radical é a que recorre à contestação provocante da ideia de representação pelas artes contemporâneas.

 

             7. Ler a ironia: figura por excelência da distância e do desdobramento

 

             Objecto de reflexão e de análise na aula (...) a ironia é raramente ensinada em termos de produção, como se a enunciação irónica fosse uma coisa irónica ou proíbida.

 

             a - A IRONIA: um conteúdo de ensino impreciso

 

             Na medida em que só existe um termo para designar coisas tão distintas como o tom, um facto de língua, um comportamento humano, o que é que transcende essas diferenças e as federa no seio da noção de ironia?

 

             Situação: os alunos não identificam facilmente as marcas da ironia no texto .  Revelam, na maioria, insensibilidade aos sinais do texto, à presença de figuras como a hipérbole, o eufemismo e a antítese que, através do jogo, são portadoras de valores... (139)

 

             1 - Abordagem linguística e pragmática da ironia[28]

 

             Para C. Kerbrat-Orecchioni, na ironia cohabita uma força ilocutória - ironizar é troçar, denunciar, o que supõe um alvo” - e um processo linguístico - a antífrase na maioria dos casos - que ela apresenta como um caso particular de infração à lei do discurso, designada de “lei da sinceridade”.

             Por outro lado, distingue, ao lado da ironia verbal, o que ela nomeia ironia referencial, e que de facto designa a ironia de situação. (143-144)

 

             b - A ironia como menção

 

             A ironia é, de algum modo, uma metalinguagem, uma forma de discurso relatado, visto que o locutor procura dar a entender uma ideia sobre outra ideia e a exprimir, de preferência, alguma coisa a propósito do (seu) enunciado do que através dele.

 

             Consciência e temporalidade

 

             Os enunciados irónicos são simultaneamente e mencionados... Paradoxo da ironia, ela exige para ser apreendida que o enunciado seja ao mesmo tempo assumido e posto à distância pelo locutor.

 

             c - A ironia: uma gama matizada de valores

 

             L. Hutcheon utiliza o conceito ethos para definir o efeito produzido pelo texto: o ethos é uma reação desejada, uma impressão subjectiva que apesar de tudo motivada por um dado objectivo: o texto. O ethos irónico articula toda uma série de valores que percorrem a gama: “de la déférence à la dérision, du pied de nez et du petit rire narquois à l’acrimonie ironique.” p. 145

 

             Nos textos literários, a ironia surge muitas vezes associada aos dois géneros que lhe concedem um lugar privilegiado: a paródia  e a sátira.

 

Paródia

modalidade da intertextualidade, efectua uma sobreposição de textos, e de um ponto de vista estrutural, corresponde à “incorporação” de um texto de um texto parodiado num texto parodiante, a fim de marcar a diferença.

Frequentemente, o seu ethos está marcado pejorativamente, dando lugar ao burlesco literário, pode, porém, estar marcado pelo respeito ou pela deferência.

Sátira

distingue-se da paródia pelo alvo que é extratextual; propõe-se corrigir os vícios e inépcias do comportamento humano, ridicularizando-as.

O seu ethos está ainda mais marcado negativamente: é um ethos “plutôt méprisant, dédaigneux qui se manifeste dans la colère présumée de l’auteur communiquée au lecteur.” (145)

 

             No extremo da gama irónica, no ponto em que a ironia coincide com a sátira, o ethos caracteriza-se por um riso mordente e essa intensidade faz a aficácia da sátira.

             Hutcheon apresenta a ironia e a paródia como fenómenos dialógicos, insistindo sobre a tripla competência exigida ao leitor:

 

            

·       Competência linguística, porque é necessário detectar o implícito

·       Competência genológica (générique), para identificar os desvios em relação à norma

·       Competência ideológica, no sentido largo dos saberes partilhados pelos locutores e da sociedade em que estes se integram. (146)

 

             d - A ironia, uma arte da distância

 

             Ph. Hamon chama a atenção para dois aspectos fundamentais da ironia: a teatralização da palavra e a distanciação.

             a) Teatro da palavra, a ironia implica a distribuição dos papéis entre “o ironizante” e “o ironizado”, “o ingénuo”, “o cúmplice” e “o perturbador”, este último, incarnação da lei, legitimando o recurso a um discurso mascarado.

             b) Quanto à arte da distância, esta oferece paralelamente grandes possibilidades combinatórias visto que alternadamente são consideradas:

             - a distância entre o sentido explícito e o sentido implícito;

             - o grau de adesão  do enunciador ao seu enunciado;

             - o grau de extensão da ironia, que se desenvolve da ironia “local”que visa um alvo identificável a uma ironia “global” que ataca a estrutura da obra - e chega por vezes a uma polifonia generalizada confusa e ambígua das fontes da enunciação - e todas as variações no emprego dos sinais utilizados para orientar o leitor. (147)

              

             2- A abordagem filosófica

 

             De acordo com o modelo socrático[29], a ironia é a “consciência” que funda um saber e “imuniza contra as estreitezas e as desfigurações de um pathos intransigente, contra a intolerância de um fanatismo exclusivista. Próxima de um espírito de finesse, traquinas (espiègle e subtil) é antes de mais uma estratégia heurística. Nisso opõe-se às ironias nihilitas, excessivas e superficiais, que se alimentam da provocação e do escândalo, ou ainda àquelas que se consideram sérias. Esta ironia dialéctica, sob uma aparência ligeira e jovial, é simultaneamente sabedoria e liberdade pelo recuo que ela estabelece em relação ao seu objecto.

 

             Na perspectiva filosófica, a ironia, ao serviço do conhecimento e da verdade, interroga e abre o caminho à reflexão. Nos textos literários, porém, a ironia assume, regra geral, outras funções: põe em causa ou denuncia uma ideia, um sistema, o próprio homem.

             Primeiramente, ela é jogo e jogo perigoso. Depois, é ligeira, ágil, “déliée”... Opõe-se ao discurso sério e supõe uma inteligência da linguagem: “L’ironie pourrait s’appeler au sens propre du mot, une allégorie, ou mieux une pseudologie, car elle pense une chose et, à sa manière en dit une autre.” Ela recusa portanto a ilusão de uma correspondência exacta entre as ideias e as palavras e inscreve-se, assim, numa reflexão sobre a linguagem, sobre os limites dos signos e a sua incapacidade para transcrever o que é da ordem dos matizes imponderáveis. (147)

 

             Q: Existem circunstâncias que favoreçem a emergência dos períodos irónicos? Quais são?

             Q: Em que medida é que a ironia, na sua natureza e na sua expressão, traz inscrita a história?

 

             3. Abordagem socio-histórica

 

             A ironia é sempre utilizada como arma das minorias em luta contra a ortodoxia. Ela pressupõe uma relação de forças tão desfavorável ao ironista que ela representa o único meio eficaz de contestação. Num contexto caracterizado pela desproporção das forças em presença, ela triunfa pelo seu fulgor e pela sua precisão. (148) Esta descrição corresponde melhor à ironia do séc. XVIII que à da nossa época.

             No séc. XVIII, a ironia foi um contra-poder. Privilegiava as formas breves: contos, cartas, artigos de dicionário.

             No final do séc. XX, a ironia corresponde sobretudo a uma postura de enunciação lúcida num mundo caracterizado pelo desmoronamento das ideologias, a pulverização dos valores, a inconsistência da linguagem. Atitude existencial própria à idade posmoderna, a ironia é um dos sobressaltos pelos quais a literatura contemporânea reage positivamente a essa ameaça de dissolução e de desmoronamento.

 

 

             8. Para uma didáctica do texto irónico

 

             É preciso aprender a detectar, a pensar e a praticar a ironia.

             A ironia é uma comunicação de “alto risco” que confere aquele que a domina uma postura de superioridade.

             A leitura do texto literário assenta, entre outros, na aptidão para fazer variar a distância em relação ao texto e na consciência dessa variação. Mas essa aptidão está ela mesma dependente da percepção do contexto da enunciação, o que impede que a leitura fique apenas entregue à intuição do aluno.

 

             a - Modelos de aprendizagem do passado e do presente

 

             1. Revista Pratiques (1992, nº 73) propõe - a propósito da ironia na argumentação -  estratégias para familiarizar os alunos com duas formas de ironia:

            

 

1.     A ironia de menção é em primeiro lugar apreendida a partir de enunciados simples

 

 

 

 

 

2.     Terminada esta abordagem, a aprendizagem continua a partir de um corpus de texos (artigos da imprensa). Estes textos são cuidadosamente escolhidos: relatam factos contemporâneos, supostamente conhecidos pelos alunos e capazes de motivar a sua reflexão.

·       os alunos são convidados a distinguir os efeitos de sentido conforme um enunciado é mencionado ou utilizado.

·       Num 2º exercício, é-lhes solicitado que construam um contexto de enunciação que permita uma leitura irónica dos enunciados propostos

·       É-lhes então pedido que detectem os enunciados mencionados e que reconstituam os discursos “tournés en dérision” /alvo de ironia (?) 

 

 

3.     A ironia antifrásica: trata-se de compreender “que a ironia infringe a lei da coerência discursiva do texto argumentativo na medida em que, numa sequência irónica, o mesmo enunciado pode entrar na argumentação de cada uma das teses em presença.

·       Os exercícios propostos convidam a detectar num texto a coerência de um conjunto de argumentos e os indícios que permitem pensar que um ou vários argumentos revestem a forma de antífrase e que então é conveniente proceder a uma inversão semântica.[30]

·       Por outro lado, deve ser solicitado aos alunos que produzam textos irónicos, para que possam experimentar “ la mise en mots de l’antiphrase”, a situação de “encodage”, contribuindo para reforçar a aptidão à descodificação dos textos irónicos.

·       Finalmente, é proposta aos alunos uma reflexão  sobre os indícios da ironia, da sua diversidade, do seu grau de explicitação e de visibilidade. (153)

            

 

             2. Cahiers de 2de “La parole de l’autre”  

 

             A ironia é apresentada como uma forma relativamente complexa de polifonia que consiste em citar o outro, sem, todavia, o nomear expliciamente, fazendo comprender que não se está de acordo com ele - e, por vezes, que a tese que ele defende é ridícula.

             A ironia de essência polifónica é definida pela co-presença de duas vozes, às vezes perfeitamente identificáveis, outras de tal modo entrelaçadas que se torna difícil distingui-las.

             Os exercícios propostos assentam na identificação dos dois discursos em presença e na determinação do alvo visado.

 

             Deste modo, uma didáctica do texto irónico (sob a forma de abordagem pragmática do discurso literário) deve assentar em três aspectos fundamentais (154):

            

            

·       recusa em limitar a ironia à antífrase

·       vontade em mostrar que a palavra irónica é acção e resposta a uma outra palavra

·       necessidade de estimular a reflexão, trabalhando escritos complexos

            

 

             b - Para uma abordagem em situação de leitura

 

             Apesar de familiarizados com a ironia (BD, emissões de televisão de carácter satírico), muitos alunos, face a um texto literário que não recorra aos processos mais ostensivos - caricatura, hipérboles “hiperbolicas”, antífrases radicais, ambiguidade limitada -, não são capazes de detectar a ironia (...) porque, não referidos à situação de comunicação, os sinais pelos quais se manifesta a ironia deixam de estar activados, perdendo a sua intensidade e funcionalidade... o que implica a necessidade da interrogação histórica do texto de modo a que o contexto de comunicação seja reconstituído e claramente entendido. (155)

 

             Propostas

 

             Experimentar o sentido errado, o equívoco (contresens)  ou a dúvida da dimensão irónica do texto, como factores de motivação do aluno, porque o insucesso ou o sabor do êxito podem determinar uma necessidade de reflectir de forma aprofundada sobre os factos d ironia, a sua finalidade, o seu funcionamento.

 

             Motivar através de práticas sociais de referência

 

             A distância entre comunicação oral irónica  e texto litérário irónico é fruto da percepção e não da própria ironia.

             A análise de um discurso , a partir de um video, permite  apreender a importância do contexto  e da situação de enunciação na prática da ironia[®conivência cultural entre ironizante e o seu interlocutor; o não-verbal / marcas cinestésicas e oralidade].

             O recurso à comunicação escrita marca um progresso na complexidade mesmo se o contexto extra-linguístico é tido como conhecido pelo aluno. O desaparecimento dos indícios não-verbais representa uma dificuldade e obriga a uma observação mais cuidada do texto. Neste momento, é fundamental chamar a atenção para os indícios (tipográficos) específicos do escrito: utilização do itálico, dos travessões ou das aspas para as menções que queremos reconhecidas como tais - trata-se de uma verdadeira explicitação da ironia; recurso às reticências, ao ponto de exclamação. Os outros indícios, de natureza linguística - inversão ou deslocamento (dácalage) do sentido, utilização de modalizadores, de figuras de feição (tournure) hiperbólica ou eufemística, que são comuns aos discursos orais e escritos. (156)

 

             Abordar a ironia singular dos textos literários

 

             A escolha dos textos, que servirão de suporte à aprendizagem da ironia, é determinante, porque não só condiciona a elaboração da noção, como influi directamente na relação do aluno com a actividade de leitura, assim como com o seu presente e futuro de leitor.

             Para possibilitar a apresentação da noção de ironia e as suas principais modalidades - a ironia antifrásica, a ironia de menção e a ironia referencial - os textos devem oferecer, alternada ou em conjunto, uma grande diversidade de situações irónicas...

 

             Proteger o leitor no aluno

 

             O estudo da ironia deve ser motivado pelo texto e não o contrário: o jovem leitor deve decifrar as alusões, distinguir os valores contestados pela ficção... ser sensível à pragmática do texto.

 

             Em termos de dispositivo didáctico, a ironia não se distingue dos outros objectos de aprendizagem. Mas, como meio de formação, a ironia ultrapassa-os pela actividade intelectual que impõe:

 

            

·       Implica uma atitude de distanciamento em relação ao texto

·       Uma relação com a linguagem para além do primeiro grau, isto é, impõe a dúvida

·       Habitua o aluno a explorar o implícito e a descobrir um prazer menos imediato, mas mais consistente

·       Favorece de facto a compreensão do que é a literatura. Ao pôr os textos em diálogo, pela citação ou pela alusão, a ironia é um dos lugares onde a intertextualidade se manifesta e não pode ser ignorada.

 

             Em síntese: a aprendizagem da ironia conduz necessariamente à iniciação à leitura literária, informada e distanciada.



[1]  - “Ce recul préconisé par M. Bakhtine, pour se situer historiquement et entrer dans le dialogue intertextuel.”

[2]  - Ver sobre a motivação na aprendizagem os trabalhos de Lev Sermionovitch Vygotsky - Pensée et Langage.

[3]  - “La compréhension répondante”, como definição da reacção do leitor ao texto (Bakhtine).

[4]  - “L’erreur de la pédagogie par objectifs a été de recourir à une autonomisation et une atomisation des savoirs sans penser la manière dont ils interféraient, se mêlaient ou se combinaient au sein d’une même tâche. Pour dépasser cette aporie, il est nécessaire de préserver le sens en finalisant les propositions didactiques.” p. 21

[5]  - “Si en classe de français, le travail sur les notions s’avère particulièrement formateur, c’est qu’il développe chez les élèves une relation positive au savoir en les gardant des fausses certitudes. Confrontés à des significations complexes et concurrentes, les élèves acquièrent le sens de la relativité. L’étude des concepts les place au contraire devant des savoirs stabilisés et spécifiés. (...) Elle développe les capacités d’abstraction en offrant aux élèves des filtres pour analyser les textes et penser la littérature. La maîtrise des concepts permet la distanciation qui émancipe le jugement; pour les adolescents, elle représente un gain de maturité.”(32)

[6]  - Jean-Marie Fournier e Bernard Veck.

[7]  - A genologia desempenha aqui uma função paradigmática essencial.

[8]  - Ver trabalhos de Rosch.

[9]  - Para Catherine Kerbrat - Orecchioni, “la compréhension est une saisie globalisante et normalisante d’un sens” que se opõe ao  “ calcul interprétatif qui se nourrit de conjectures” et qui, de ce fait, est plus aléatoire.

[10]  - “Comprendre c’est toujours interpréter”; “l’interprétation est la forme explicite de la compréhension”; “expliquer et comprendre ne constitueraient pas les pôles d’un rapport d’exclusion, mais les moments relatifs d’un processus complexe qu’on peut appeler interprétation.”

[11]  - Alain Viala e M.P. Schmitt (1978)

[12]  - Ver J. Leenhardt, 1987.

[13]  - Classificar as respostas de 1 a 4 (1= mais importante; 4= menos importante).

[14]  - Roman Reisinger (Univ. de Salzburgo), De l’acte de lecture à l’action pédagogique (Colloque de Reims, 1984).

[15]  - Ver cap. XI, que põe em cena 7 leitores que discutem sobre o modo de ler.

[16]  - Para as ciências exactas, a noção de erro é simples porque no seio de um sistema só existe uma resposta para um dado problema.

[17]  - M. Riffaterre, 1982

[18]  - Ver Daniel Pennac.

[19]  - Henri Wallon, De l’acte à la pensée, Paris, Flammarion, 1970.

[20]  - Ver ensaio de Ian Watt, Réalisme et forme romanesque (1982) e os textos d’Alain Robbe-Grillet, Pour un nouveau roman (1967).

[21]  - John Dewey: “Toda a lição deve ser uma resposta”. Ver ainda P. Meirieu (1987).

[22]  - O recurso aos textos teóricos de Butor (1964) ou de Robbe-Grillet (1963). Por ex., os cap. “Sur quelques notions périmées” e “Nouveau roman, homme nouveau”, in Pour un nouveau roman.

[23]  - Ver: M. Riffaterre, 1979; M. Bakhtine, W. Iser, P. Hamon, Un discours contraint; R. Barthes, sobre “o efeito do real”.

[24]  - Erich Auerbach, Mimesis.

[25]  - Philippe Hamon (1977): “De tels noms “transparents” fonctionnent  alors comme des condensés  de programmes narratifs anticipant et laissant préfigurer le destin même des personnages (nomen-numen) qui les portent.” Cf. J.P. Goldenstein, Pour Lire le Roman.

[26]  - R. Barthes, La Chambre claire: “percevoir le signifiant photographique n’est pas impossible (...), mais cela demande un acte de second savoir ou de réflexion.”

[27]  - Edgar Morin, Le Cinéma ou l’homme imaginaire; J.M.G. Le Clézio, Désert (romance).

[28]  - Ver: C. Kerbrat-Orecchioni, Problèmes de l’ironie; Dan Sperber et Deirdre Wilson, Les ironies comme mentions.

[29]  - Vladimir Jankélévitch.

[30]  - Berrendonner, A. - Éléments de pragmatique linguistique, Paris, Minuit, 1981.