Teste 5

PROVA DE AVALIAÇÃO DE PORTUGUÊS

 

GRUPO I

 

Leia com atenção o poema seguinte.

 

Se eu morrer novo,

Sem poder publicar livro nenhum

Sem ver a cara que têm os meus versos em letra impressa,

Peço que, se se quiserem ralar por minha causa,

Que não se ralem.

Se assim aconteceu, assim está certo.

Mesmo que os meus versos nunca sejam impressos,

Eles lá terão a sua beleza, se forem belos.

Mas eles não podem ser belos e ficar por imprimir,

Porque as raízes podem estar debaixo da terra

Mas as flores florescem ao ar livre e à vista.

Tem que ser assim por força. Nada o pode impedir.

Se eu morrer muito novo, oiçam isto:

Nunca fui senão uma criança que brincava.

Fui gentio como o sol e a água,

De uma religião universal que só os homens não têm.

Fui feliz porque não pedi cousa nenhuma,

Nem procurei achar nada,

Nem achei que houvesse mais explicação

Que a palavra explicação não ter sentido nenhum.

Não desejei senão estar ao sol ou à chuva -

Ao sol quando havia sol

E à chuva quando estava chovendo

(E nunca a outra cousa),

Sentir calor e frio e vento,

E não ir mais longe.

Uma vez amei, julguei que me amariam,

Mas não fui amado.

Não fui amado pela única grande razão -

Porque não tinha que ser.

Consolei-me voltando ao sol e à chuva,

E sentando-me outra vez à porta de casa.

Os campos, afinal, não são tão verdes para os que são amados

Como para os que o não são.

Sentir é estar distraído.

Alberto Caeiro, 7-11-1915

 

 

 

 

Apresente de forma clara e bem estruturada, as suas respostas aos itens que se seguem.

1.       A poesia é frequentemente expressão da desilusão do sujeito poético. Mostre que tal não acontece neste poema, fundamentando a sua resposta com três elementos do texto.

2.        Enuncie e explique os recursos expressivos utilizados pelo poeta para garantir que os versos, quando belos, não deixar de ser impressos.

3.       Referindo a sua intencionalidade, classifique o ato ilocutório nos versos «Se eu morrer muito novo, oiçam isto:/ Nunca fui senão uma criança que brincava

4.        Explicite a cosmovisão do poeta expressa no verso «De uma religião universal que só os homens não têm.»

5.       Recorrendo a elementos do texto, mostre que Alberto Caeiro é um poeta sensacionista.

6.       Refira de que modo a estrutura estrófica do poema indicia o desenvolvimento do tema.

GRUPO II

Leia o excerto seguinte.

(…) O paradigma cultural republicano é marcado, antes de mais, por uma visão evolucionista, positivista e determinista da história, aliada a uma visão humanista e racionalista de tipo iluminista, no âmbito de uma mundividência totalizante que vê a República como o fruto natural da evolução do cosmos, da vida e da sociedade. Trata-se de uma visão profundamente optimista e até messiânica, complementada com a herança romântica do nacionalismo, e que se contrapõe ao paradigma decadentista das elites intelectuais da Monarquia Constitucional. A esta dimensão filosófica associa-se uma dimensão ética centrada no culto da Pátria como substituto do culto religioso e numa utopia demopédica, que confere à escola laica a missão de formar bons cidadãos, enérgicos, activos e altruístas. Já no plano estético, os republicanos privilegiam os modelos do realismo literário, do neo-romantismo poético e do naturalismo pictórico e plástico. Correntes como o simbolismo, que surge nos anos 90 do século XIX, ou o parnasianismo não lhes despertam um interesse significativo, porque a arte tem de estar necessariamente ao serviço de um ideário moral do Bem, e a arte pela arte tem algo de profundamente gratuito para um republicano que se preze. (…)

Com o advento da República em 1910, este paradigma cultural, que acaba de triunfar no plano político, começa a sofrer uma progressiva erosão nos meios intelectuais e artísticos.

Isto é particularmente visível com o primeiro grande movimento cultural do pós-5 de Outubro, a Renascença Portuguesa e a sua filosofia saudosista. O saudosismo poético-metafísico de Pascoaes situa-se nos antípodas do positivismo materialista, embora mantenha uma visão de optimismo profético da história e algo messiânica do papel de Portugal no mundo. (…)

A segunda grande tendência da cultura republicana desta época é o pessimismo trágico representado por um Manuel Laranjeira e Raul Brandão. (…) Este último define, assim, o momento presente, em pleno ano da implantação República: “ A vida antiga tinha raízes, talvez a vida futura as venha a ter. A nossa época é horrível porque já não cremos – e não cremos ainda. O passado desapareceu, do futuro nem alicerces existem. E aqui estamos, sem tecto, entre ruínas, à espera.” É uma temática que irá desenvolver no seu grande romance Húmus, de 1917. Aí, o espanto surge como a consciência do absurdo da existência da qual, não obstante, irrompem intermitentemente jactos de sonho. O sonho é visto como possibilidade de evasão face à certeza e miserabilidade de uma existência sem perspectivas. (…)

A terceira corrente cultural importante no âmbito da I República é a corrente modernista futurista, que tem os seus máximos representantes em Fernando Pessoa e Almada Negreiros. Ambos partem de um diagnóstico decadentista da sociedade portuguesa. Pessoa define mesmo o sensacionismo como um grupo de “descendentes directos do movimento decadentista e simbolista”. O elogio e a apoteose da força que os caracteriza não passaria daquela «ânsia de sensações fortes, aquele entusiasmo excessivo pela saúde que sempre distinguiu certas espécies de decadentes”. É esta a base do famoso Ultimatum de Álvaro de Campos. E veja-se a caracterização do português no não menos famoso Ultimatum futurista às gerações portuguesas do século XX de Almada Negreiros: “ O português, como todos os decadentes, só conhece sentimentos passivos, a resignação, o fatalismo, a indolência, o medo do perigo, o servilismo e até a inversão.” E a forma como termina este manifesto: “ Coragem, portugueses, só vos faltam as qualidades.” (…)

O quarto e último círculo cultural que aqui tomamos em consideração é o Grupo Seara Nova que não se apresenta como portador de uma filosofia oficial, para não incorrer no mesmo erro estratégico da Renascença Portuguesa, que os seus principais membros já haviam criticado antes. Agrupando personalidades tão distintas como Proença, Sérgio, Cortesão e Raul Brandão, o que os une é mais uma estratégia de intervenção na sociedade portuguesa e um propósito demopédico comum. (…)

Em jeito de conclusão, poderemos dizer que, no plano cultural, a I República exibe uma pluralidade contraditória de correntes e valores, como uma tensão permanente entre um vector patriótico-nacionalista e um vector cosmopolita-internacionalista, entre um vector popular democrático e um vector elitista-aristocrático, e entre um vector racionalista positivista e um vector irracionalista metafísico.

António Reis, Correntes e círculos culturais contemporâneos da I República, in Viva a República 1910-2010

 

1.       Para responder a cada um dos itens de 1.1. a 1.5., seleccione a única opção que permite obter uma afirmação correcta.

Escreva, na folha de respostas, o número de cada item e a letra que identifica a opção escolhida.

1.1.    O paradigma cultural republicano é resultado

(A)   de um ato voluntarista.

(B)   da rejeição do paradigma cultural monárquico.

(C)   da consagração da visão evolucionista da história.

(D)   de uma mundividência liberalizante.

 

1.2.    A escola laica é um instrumento

(A)   essencial ao bom funcionamento da Monarquia Constitucional.

(B)   fundamental para a formação do cidadão republicano.

(C)   valorizado pelo Catolicismo.

(D)   ineficaz, pois o Fado tudo determina.

 

1.3.    Na dimensão estética, os republicanos

(A)   são adeptos do romantismo.

(B)   não valorizam a arte.

(C)   valorizam a Educação Física.

(D)   rejeitam a arte pela arte.

 

1.4.    Com o advento da República, o paradigma cultural republicano

(A)   afirma-se definitivamente.

(B)   sofre lenta corrosão.

(C)   é substituído.

(D)   impõe-se lentamente.

 

1.5.    A cultura republicana, a seu modo, desenvolve-se em quatro tendências, tendo Fernando Pessoa participado

(A)   em todas.

(B)   em duas.

(C)   em três.

(D)   nenhuma.

 

2.       Responda de forma correcta aos itens apresentados.

 

a.        Divida e classifique as orações no seguinte parágrafo: Com o advento da República em 1910, este paradigma cultural, que acaba de triunfar no plano político, começa a sofrer uma progressiva erosão nos meios intelectuais e artísticos.

b.       Identifique a função sintáctica desempenhada pelo pronome em «A vida antiga tinha raízes, talvez a vida futura as venha a ter.»

c.       Classifique o acto ilocutório presente no seguinte enunciado: “ Coragem, portugueses, só vos faltam as qualidades.

 

GRUPO III

Na edição de 5 de fevereiro de 2012, o jornal Público cita Inês Familiar, directora técnica do Centro Social de Miragaia:

«Era um caso como o de outros idosos que não mantêm contacto com a família, não promovem relações de amizade, nem de vizinhança. Isolam-se. Quando mais isolados estão, mais querem viver na solidão.»

Num texto bem estruturado, com um mínimo de duzentas e um máximo de trezentas palavras, apresente uma reflexão sobre o papel da rede social no combate à solidão.

Fundamente o seu ponto de vista recorrendo, no mínimo, a dois argumentos e ilustre cada um deles com, pelo menos, um exemplo significativo.

FIM

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