JERUSALÉM

A cidade de Salomão, Cristo e Maomé

Alguém escreveu um dia que uma das visões mais perturbadoras em Jerusalém é a proximidade física dos lugares santos judeus e islâmicos nesta cidade que existe há pelo menos quatro mil anos.

Os muçulmanos crêem que o profeta Maomé ascendeu ao céu no seu cavalo alado do cimo da Haram, a dourada cúpula do do Rochedo - exactamente no mesmo lugar onde Salomão, rei de Israel, construiu o primeiro templo, do qual resta o Muro Ocidental ou das Lamentações.

Os cristãos, que em 1099 lançaram as cruzadas pela conquista da Palestina, naturalmente que veneram também Jerusalém. O seu principal ponto de peregrinação - e símbolo de divisão - é a Igreja do Santo Sepulcro. Aqui, o espaço é repartido por católicos a quem foi reservado um pequeno altar no lugar onde Jesus foi crucificado; por ortodoxos, que gerem as zonas do calvário e da ressureição; por arménios, os zeladores do rés-do-chão, também com memórias da agonia de Cristo. O mais extraordinário é que, no telhado da igreja, em quartos que parecem celas, continuam a orar monges etíopes, desde que foram banidos do santuário no século XIX.

Em 1967, após conquistarem o sector oriental árabe à Jordânia, os israelitas proclamaram Jerusalém como "capital eterna, una e indivisível" do Estado judaico. Uma proclamação que nunca foi reconhecida pela comunidade internacional, sobretudo pelos muçulmanos e pelos cristãos. Os palestinianos também a reclamam como capital, e o Papa quer para ela o estatuto de universal.

"Indivisível" só no papel, porque Jerusalém continua a ser uma cidade dividida. Apanhe um táxi no Hotel Hyatt, junto à antiga"linha verde", e o motorista judeu negar-se-á a transportá-lo até ao bairro árabe mais próximo do sector oriental.

Depois da Intifada, a revolta palestiniana, uma nova barreira se ergueu. Só os guardas fronteiriços israelitas, temidos pela sua brutalidade, se arriscam a penetrar nos intricados becos da Cidade Velha, com as suas muralhas do século XVI, construídas pelo sultão otomano Suleiman. Um condutor árabe evitará também entrar nas zonas maioritariamente judaicas.

Em Jerusalém, com as suas quase uniformes casas de pedra e os seus incontáveis painéis de energia solar, só os turistas parecem não ter medo. No Muro das Lamentações, gentios curiosos de obrigatório "kippa" na cabeça, enviam recados a Deus colocando bilhetinhos nas frestas do muro, enquanto judeus de trancinhas e chapéu preto entoam, balançando o corpo, preces da Torah.

A entrada do Pátio das Mesquitas, onde ficam a Cúpula do Rochedo a a Al-Aqsa - terceiro santuário do Islão (depois de Mecae Medina)-, os visitantes são rigorosamente vigiados por soldados armados até aos dentes. Ás vezes sobretudo à sexta-feira, tradicional dia de oração muçulmana, o lugar é fechado, para não exarcebar tensões políticas e religiosas. Hà judeus extremistas que teimam em reconstruir neste local o Segundo Templo, e as mesquitas são muitas vezes púlpito de apelos revolucionários.

Na pacata Igreja do Santo Sepulcro, freiras de hábito ou saia-casaco oferecem doces e padres de longas barbas voluntarizam-se como guias e dão um "santinho" em troca de um donativo.