[Paul Krugman] O papel do dólar: quem se importa?

Data de postagem: 19/01/2011 03:01:33

17 de janeiro de 2011 | 14h53

Paul Krugman

Bem, Hu se importa:

O presidente da China, Hu Jintao, questionou o papel do dólar dos Estados Unidos no sistema monetário global às vésperas de uma visita de Estado a Washington, dizendo que “o atual sistema monetário internacional é produto do passado”.

Hu, que chega a Washington amanhã, terça-feira, também fez uma crítica velada à política monetária americana, sublinhando a preocupação da China com o impacto das recentes medidas de estímulo implementadas pelo Federal Reserve sobre a economia chinesa.

“A política monetária dos Estados Unidos tem um grande impacto sobre a liquidez global e os fluxos de capital, e por isso a liquidez do dólar deve ser mantida num patamar estável e razoável”, disse Hu.

O presidente chinês fez esses comentários respondendo a perguntas formuladas por escrito por dois jornais americanos, o Washington Post e o Wall Street Journal.

Seus comentários surpreendentemente bruscos sobre o sistema monetário liderado pelos Estados Unidos, que taxou de “produto do passado”, é confirmação de que a China continuará adotando medidas para internacionalizar sua própria moeda, o yuan.

Tudo isso é uma reminiscência dos japoneses 20 anos atrás. Na época, eu participava de conferências em que as autoridades falavam da importância de promover o papel internacional do iene e afirmava que o papel internacional do iene, ou a falta disso, não era realmente muito importante: e o moderador nas conferências sempre me agradecia por enfatizar a importância do papel internacional do iene. Nunca consegui entender se isso se devia a uma má tradução ou se era uma maneira educada de me dizer que eu tinha dito alguma coisa inaceitável.

Portanto, vou fazer novamente a pergunta: que benefícios os Estados Unidos têm com o papel internacional do dólar?

Um benefício claro é que US$ 500 bilhões em moeda – peças de papel verde trazendo o retrato de presidentes falecidos – estão mantidos fora do país. O que é, na verdade, um empréstimo a juro zero que, em condições normais, não sujeitas à armadilha da não liquidez, equivale a algo como US$ 25 bilhões ao ano em poupança. O que é bom, mas é uma fração de 1% do PIB.

Além disso: bem, o que se fala é que somente o papel do dólar permite aos Estados Unidos tomarem emprestado tanto dinheiro nos mercados externos e contabilizarem uma enorme dívida. Mas há países que estão administrando uma dívida externa muito grande sem ter uma moeda internacional. É o caso da Austrália:

O melhor que posso dizer a partir dos dados que tenho em mãos é que o endividamento dos Estados Unidos e da Austrália como porcentual do PIB é praticamente o mesmo: a posição internacional líquida dos Estados Unidos, na verdade, é menor, porque as empresas americanas têm muitos ativos no exterior.

Agora, talvez os Estados Unidos consigam tomar emprestado a juros mais baixos, embora seja realmente difícil comprovar isso a partir dos dados.

E é verdade que a dívida externa americana é predominantemente denominada em dólar americano, enquanto que somente 40% da dívida da Austrália é denominada em dólar australiano. Em certas circunstâncias isso pode ser muito importante.

No geral, contudo, é difícil ver que o papel internacional do dólar faça uma grande diferença em termos de poder econômico dos Estados Unidos.