Livre tradução do livro Pantheism and Christianity de John Hunt, 1884
Capítulo IV . Filosofia judaica
Philo Judeus
Se a influência da filosofia grega é apenas imperfeitamente discernida no Apocrypha ou em escritos fragmentários dos judeus helenistas, toda dúvida é removida pelos trabalhos do Philo Judeus – o próprio representante do judaísmo alexandrino. Nós não temos, também, nenhum tratado de Philo com o tema puramente especulativo e, consequentemente, não completo ou cuidadosamente definido como sistema de especulação, mas as ideias espalhadas entre seus escritos práticos e expostos e seus incessantes esforços para dar ao ensino do Velho Testamento uma harmonia com essas ideias, onde quer que elas parecessem diferir delas, é evidência suficiente de suas obrigações com os filósofos gregos.
Mas como poderia o Velho Testamento ser feito para o ensino de filosofia grega? A história prática de uma nação como a dos judeus pode ser, considerada, supostamente, de antemão, como tendo pouca relação com os pensamentos de filósofos, que gastam tempo de suas vidas no estudo de causas e essências. Mas, na verdade, muitas vezes, a conexão entre pensamento e ação, filosofia e vida diária é mais estreita do que nós imaginamos e os escritos do Velho Testamento podem ter pensamentos metafísicos, embora eles não tenham sido livros de metafísica. É, todavia, impossível ler Philo, sem notar a vantagem que teve em usar a versão grega dos setenta, não achando que suas interpretações são mais frequentemente lidas nas escrituras do que achadas lá. Mas essa necessidade não nos concerne aqui, nós viemos até aos escritos do Philo nem para refutá-los nem para aprová-las, mas apenas para traçar a característica da filosofia que se manifestou em si mesma entre os judeus de Alexandria.
A tradução grega de “Eu sou” para “Ele que é”, uma vez aliada a teologia dos judeus e de Platão, como “O ser” foi preeminentemente o nome da Deidade Suprema de Platão. Desse Philo poderia, uma vez, ser dito que o Deus dos judeus como o dos eleáticos e platônicos fizeram do ser sem atributos, aquele de quem nada pode ser verdadeiramente afirmado; aquele de quem nenhuma aproximação pode ser feita, aquele que é como nenhum outro no Céu e na Terra. Ele é infinito, imutável e incompreensível; mas esses predicados não dizem o que ele é, apenas o que ele não é. Qualidades pertencem a seres finitos, não a Deus. Ele é mais sábio que a sabedoria, mais belo que a beleza, mais forte que a força. Pela razão nós sabemos que ele é; mas não temos a faculdade de saber por que meio ele é. Nós auxiliamos nossos pensamentos fracos com as metáforas e as ilustrações das coisas materiais. Nós o chamamos a luz primitiva, da qual todas as luzes emanam; a vida, da qual toda vida provem; a inteligência infinita, mas dele, em si mesmo, nós apenas sabemos que ele é um, simples e incapaz de destruição. Ele não tem nome. Para Moisés ele se revelou como “Eu sou aquele que eu sou” o que diz Philo, é o equivalente a dizer: “É minha natureza ser, não descrito, mas em ordem para que a raça humana não possa ser totalmente destituída de qualquer apelação de que eles possam dar ao mais excelente dos seres, eu permito que se use a palavra Senhor como um nome.” Ele de novo diz: “Tão indescritível é o Deus vivo que até os poderes que ministra ele, não o anunciam com o seu próprio nome.” Depois da luta com o anjo, Jacó diz ao mestre invisível: “Diga-me o teu nome.” Mas ele responde, “Porque tu perguntas o meu nome?” E então ele não diz seu próprio e peculiar nome. Ele diz: “É suficiente para ti, ser ensinado por explanações ordinárias; e não por nomes que são símbolos das coisas criadas, não devem achá-las entre as naturezas imortais.” De novo, “Um nome pode apenas designar alguma coisa que é conhecida; ela dá a conexão com alguma coisa além. Agora, a um ser absoluto não pode vir em relação com alguma coisa a mais. Ele se basta, ele é suficiente em si mesmo. Como antes da existência do mundo, e como depois também, o ser é tudo. Portanto, Deus que é o ser absoluto, não pode ter nome.”
O nome Deus não pode expressar produtivamente o Ser Superior. Ele não declara o como ele é, ele apenas expressa uma relação do maior primeiro princípio que foi criado. Em referência ao universo, Deus é “o bom”, mas ele é mais do que isso, ele é mais do que Deus. É suficiente para a natureza divina ser ou não ser conhecida. Ele deve ser imutável, por que é perfeitamente simples e o mais perfeito de todos os seres que não pode ser unido a nenhum outro. “Deus não pode ser misturado com nada mais, pois o que está misturado com ele deve ser melhor do que ele, ou pior ou igual; mas não há nada melhor ou igual e nada pior do que Ele pode ser misturado a Ele, por que Ele se tornaria pior ou quem sabe, aniquilaria a sua existência, o que é errado de se afirmar. Sem atributos, sem nomes, incompreensível para o intelecto do homem, Deus é o Um, a Mônada.
Philo acrescenta, fazendo um ainda maior esforço para expressar o inefável, “Os therapeutae reverenciaram Deus de modo profícuo, porque consideravam Ele mais simples do que a unidade e mais original do que a Mônada.” Ele é mais do que a vida, porque ele é a busca da vida, ela mesma.
A necessidade de, de novo, conectar o ser divino com o mundo criado e as coisas concebíveis e sensuais, depois de ter separado entre ele e essas coisas, envolve uma contradição, quem sabe, mai do que verbal. Deus, contudo, uma simples essência e diferente dessas coisas que procedem dessas coisas, é ainda a causa de todas as coisas criadas no universo. O Ser imutável, então, se torna a causa e o estágio de tudo tornado, que é fenomenal, Ele é, de alguma forma, tem relação com isso. O universo, é argumentado, não deve a sua origem diretamente do primeiro ser. O mais bonito dos mundos sensuais é improdutivo para Deus, dizer nada mais do que a parte mais improdutiva, que seria relacionada diretamente a Deus, seria blasfêmia e sem Ele, isso não poderia ser feito. Ele deve ser, no entanto, reconhecido, em última análise, como a causa das causas. O desconhecido, então, começa a ser conhecido, embora conhecido apenas como o desconhecido. Ser ignorante Dele, é, realmente, Conhecê-lo. “Contudo”, diz Philo, “nós, discípulos e amigos do profeta Moisés, que não nos deixou a inquirição concernente a que Ele é, na verdade, colocado, rapidamente, que o objetivo da fortuna é uma vida inquebrantável, a lei também, diz, que esses são os que estão perto da vida de Deus. Então, ainda, aqueles que estão separados de Deus, estão mortos em espírito. Uma importante doutrina, querida ao homem sábio e àqueles que estão no lugar de Deus e vivem uma vida imortal de novo.” O objetivo da vida é a sabedoria e a ciência de Deus. Ele é incompreensível e ainda assim, compreensível.
Incompreensível para nós homens e, ainda assim, compreensível a nós, tão logo fossemos divinos, porque o homem não foi feito só do barro, mas também, do divino espírito. Há em nós, o germe da divindade o qual pode ser desenvolvido numa existência divina e, embora Deus não possa entrar no círculo do humano, nós podemos nos igualar a Ele, e então, nós todos podemos vê-lo e conhecê-lo. Atualmente, nós conhecemos Deus imperfeitamente através dos seus trabalhos. Ele é um Deus à distância, um Ser cuja existência é demonstrável pela razão, embora também, sua sabedoria de Deus seja apenas negativa. Mas nós podemos ascender a uma sabedoria dele quando nosso ser se torna assimilado ao ser dele. Nós temos visões de Deus, uma pura e perfeita sabedoria, pela intuição, fantasia ou qualquer outro nome que dermos para essa revelação pela qual Deus é revelado na alma. “É como se tivesse sido dada em parte a Moisés quando transcendeu o criado, lá ele recebeu a representação do incriado e, embora isso compreenda ambos, Deus e sua criação. O supremo Deus não é o imediato fazedor dos mundos. Começa com o sentido, que é o primeiro degrau da escada celestial, nós ascendemos ao espiritual, pelo visível, evidentemente, revela-se o trabalho do invisível. Mas nós não podemos aqui inferir apenas um ser. Há, evidentemente, mais de um, pelo menos, dois, uma causa original primeira e um ser inteligente que é a próxima causa. A última é o sujeito da forma e é dele o poder de mediação entre ele e a matéria.
Essa mediação de poder é o Logos ou Palavra de Deus, o fazedor do mundo. Philo dá ao Logos uma variedade de nomes. Ele é o mediador entre as raças dos mortais e dos imortais. Ele é o nome de Deus, o intérprete de Deus, o vigário de Deus. Para o homem ele é Deus, mas no lugar do divino, ele é o segundo Deus ou a imagem de Deus. O mundo do espírito é o pensamento divino, o mundo sensual, o discurso divino é o Logos, a capacidade de Deus de pensar e falar. Como pensamento, ele é o Logos imanente, como discurso, o Logos transitório. Philo identifica o Logos com a sabedoria com que Deus é conhecido por ter criado como o primeiro de seus trabalhos e estabelecido antes os Aeons. Ele chama isso de a esposa de Deus, que é o pai e a mãe de tudo. Às vezes, o Logos é plural, não apenas a palavra, mas as palavras de Deus, e essas são identificadas com os poderes divinos ou atributos. Os dois querubins no Gênese são os dois maiores poderes de Deus, sua bondade e seu poder. Por um ele criou tudo, pelo outro, preserva tudo. Entre eles, como um elo de união, está o Logos, que abarca ambos, pelas leis do Logos, Deus age, cria e mostra clemência. O querubim foi um dos símbolos desses poderes e a espada flamejante que é mostrada nesses caminhos, era o divino Logos. Da mesma maneira, o Logos é identificado com outros atributos e distribuído em diferentes potenciais do Ser Divino. Como em todas essas potências, ele é consubstancial, esse substratum em Deus, o Logos é idêntico, às vezes, às potências e, em outras vezes, é a primeira causa ou o Deus supremo.
Philo termina em descrever a primeira causa, através do Logos, suas qualidades, trabalhos e atributos, que ele tinha rejeitado de outro modo, considerando-o indigno do primeiro Deus. A divindade não pode invadir a matéria nem vir em nenhuma relação com ela, mas através do Logos ele é a marca e o preservador do mundo. Pelo Logos, Deus é restaurado ao mundo e o único do criado e do que não foi criado torna-se manifesto através da mediação do poder dos poderes. Esses poderes são Deus; eles são também o plano espiritual do mundo, o mundo perfeito depois do qual esse mundo sensual é formado e até, tão longe quanto for bem formado, é, ele mesmo, o Logos ou a palavra de Deus. Os mundos espirituais são os primeiros lances de Deus e o mundo sensual seu filho mais jovem. Ideias, demônios, heróis, anjos, os mais altos poderes tem a mesma relação com a criatura sensual que Deus tem com o espiritual. A necessidade de personificação pode ter causado a eles aparecerem como seres distintos, mas eles tem os mesmos e todos os degraus com a existência divina. Anjos e espíritos são o pensamento divino e não são separados dele que pensa. De acordo com Philo, os caldeus disseram, inclusive, que o mundo visível é, ele mesmo, um deus ou Deus contido em si mesmo como a a alma de todas as coisas. Philo entendeu por bem diferir dos caldeus pelo Logos, palavra, palavras ou pelos poderes invisíveis distintos de Deus e, ainda, idênticos a ele; mas ele diferiu apenas na intenção, porque o Deus de Philo satisfaz todas as coisas e vai através delas e não deixou nenhum lugar vazio ou oco dele mesmo. A alma do universo é Deus. Todos os deuses inferiores, os poderes mediadores, bem como o mundo, são partes do primeiro Deus. Ele é o lugar de todas as coisas – que abarca todas as coisas, mas não é abarcado por nenhuma. Ele estende-se a todas as coisas visíveis e satisfaz todas as coisas com ele mesmo. Ele é a luz original, enquanto que a matéria é a escuridão.
Os círculos do ser são luz, os círculos sobe o primeiro Ser. O Logos é uma brilhante luz, muito semelhante a Deus. Os poderes individuais são raios e que espalham-se largamente, à luz que eles recebem. A inteira criação é um tornar-se iluminado de matéria pela primeira luz, o único Deus que trabalha sempre em tudo. “O Senhor inclinou-se para ver a cidade e a torre.” É dito antes da maneira dos homens, como quem não sabe que ele olhou para baixo, necessariamente deixou um lugar e pegou o outro. Mas tudo está cheio de Deus. Dele sozinho pode ser dito que está em todos os lugares e, ainda, em nenhum lugar. Ele não é nenhum lugar, porque criou o espaço e as coisas corpóreas e não se pode dizer que o Criador esteja contido nas coisas criadas. Ele está em todos os lugares, por que ele não deixa nenhuma parte do mundo vazia; desde que a sua presença está junto da terra e da água , do céu e de todas as coisas.
O Logos fez o mundo. O ideal de criação, de acordo com Platão, existe na mente de Deus. Philo dizia que o Logos criou o mundo depois do padrão colocado pelo ideal. Mas temos que tomar cuidado com a necessidade de personificar; que ela não nos desencaminhe. Nós vemos que o ideal é, ele mesmo o Logos. O pensamento de Deus estava na sua imagem e como o pensamento era semelhante a Deus, então o homem era como o Logos. A criação pode ter vindo direta de Deus ou, pela vontade dele. É, na realidade, uma emanação; mas como nos personificamos Deus no Logos, devemos considerar isso como um ato de vontade. Moisés ensinou que o material ou criação jovem foi formada no modelo de arquétipo ou antiga criação. Como um plano existe na mente de um arquiteto, assim também, a criação existe idealmente na mente de Deus.
No começo, fora do tempo, Deus criou o céu incorpóreo e a terra incorpórea, depois do modelo perceptível pela mente. Ele criou também a forma do ar e o encheu de espaço. Ele chamou o ar de escuridão e o espaço de profundidade. Ele então, fez as substâncias incorpóreas dos elementos e, por último, o homem ideal. Depois de ter formado o céu e a terra invisíveis com seus habitantes, o Criador formou o visível. Mas ele não poderia ser totalmente responsável pela criação das naturezas misturadas; então ele chamou outros. “Deixe-me fazer o homem.” A criação de Adão foi a criação da razão humana, não ainda unida a um corpo. Através dessa união com o sensual veio a queda. Foi uma necessidade, o resultado natural da criação, foi um estágio no procedimento divino. O homem deve ascender através do Logos, através do trabalho da razão divina com ele. A mente do homem é um fragmento da divindade. Sua natureza imortal não é outra, senão o Espírito de Deus. Ela deve superar o corpo e ascender ao puramente divino. Para fazer algo como um sistema congruente do sistema de Philo, devemos pensar, desejosamente, por passar por suas inconsistências e, especialmente, suas alegorias com as escrituras. “Não é matéria fácil,” diz Dähne, “determinar as qualidade que Philo deu à matéria, desde que ele, como todos os seus predecessores filosóficos, para tirar todas imperfeições que ele não sabia como separar de outra forma do mais perfeito Deus, colocou a matéria ao lado de Deus como um segundo princípio, que foi naturalmente criado com ele; mas com isso a fé nacional estava em guerra e a fé das pessoas proibia sua entrada, ela foi mantida nos bastidores, às vezes, ele parece esquecê-la e, às vezes, ele vai de uma escola à outra. O mesmo acontece com todos os alexandrinos, gentios e cristãos e, o mesmo acontece, com todos os gnósticos heréticos. “Philo chama a matéria de “o vazio” ,“o que está oco” e, como o demônio da alma do mundo de Platão, ele é causa do mal. Ele parece admitir essa existência como alguma coisa e embora ele receba bem o axioma de que nada vem do nada, ele fala, às vezes, da matéria como se tivesse sido criada, não tendo nenhuma existência prévia. Embora ele tenha falado profundamente, concernindo a criação e a primeira existência com o mundo sensual, ele ainda fala que “Essa é a mais absurda das ideias, fantasiar que houve, em algum tempo, um tempo em que o mundo não existia, porque a sua natureza é a de não ter começo nem fim.” Deus eternamente cria. Não há tempo antes do mundo. Ele é constituído pelo movimento dos Céus. Eternidade não tem passado nem futuro, ele é agora. Não há uma ordem de sucessão. Deus fala e está feito, “Quando Deus falou a Moisés, todas as pessoas viram a sua voz. A voz do homem é audível, mas a voz de Deus é visível, em verdade. O que Deus fala não é a palavra, mas seus trabalhos, com olhos vistos, mas não ouvida.”