110) A arte da prevenção - Barragens
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A arte da prevenção
Monitoramento constante e equipamentos especializados são algumas das alternativas utilizadas para garantir a estanqueidade e a segurança em barragens de rejeitos
Por: Melina Fogaça
Muito já foi dito a respeito das barragens de rejeitos de mineração, especialmente sobre os cuidados que devem ser tomados para que não se repitam incidentes como o da barragem do Fundão, em Mariana (MG), que ao se romper causou o maior desastre ambiental do país.
Como o próprio nome diz, uma barragem de rejeitos é composta por material residual dos processos de mineração, evitando a degradação das áreas à jusante, ou seja, o impacto nas regiões que estão em uma posição geográfica mais baixa em relação ao ponto central das atividades minerárias. “Em síntese, a finalidade de uma barragem consiste em reter os rejeitos em um local, evitando-se que se espalhem pela região, especialmente pelos cursos d’água e lençóis freáticos”, explica o geólogo Flavio Miguez de Mello, presidente honorário do Comitê Brasileiro de Barragens (CBDB) e diretor da Academia Nacional de Engenharia (ANE).
O fato é que, à medida que a exploração prossegue, os rejeitos vão se acumulando, o que exige ações periódicas de manutenção e monitoramento. “Em geral, as barragens vão sendo progressivamente alteadas, com aumento da altura e do nível do reservatório, sendo que em alguns casos elas podem ultrapassar os cem metros de altura”, completa o especialista. “Além disso, depois de concluída, a barragem deve ser descomissionada, de modo a garantir a segurança da região à jusante.”
Assim, de tempos em tempos é fundamental que a barragem de rejeitos receba cuidadosas inspeções para verificação das condições de segurança. Como apoio a essas averiguações, além de inspeções estruturais, operacionais e de superfície, é crucial uma análise dos registros de instrumentação, principalmente da evolução da piezometria, que consiste na medição de pressão (ou compressibilidade) dos líquidos presentes no solo. “Isso está previsto na Legislação em vigor, o que, aliás, resultou de uma iniciativa do Comitê Brasileiro de Barragens”, comenta o geólogo.
INSPEÇÃO
Segundo o geólogo Fábio Magalhães, da Vogbr Recursos Hídricos e Geotecnia, o que ocasiona a queda de uma barragem é justamente o nível de água interna. Por isso, diz ele, devem-se mobilizar equipamentos que garantem a drenagem do local, além da utilização de piezômetros, que são instrumentos capazes de medir o nível de água existente na estrutura. “Na verificação da segurança são aplicados métodos de análise de estabilidade convencionais de mecânica dos solos. As trincas na barragem, por exemplo, são reveladas por inspeções de superfície”, diz Magalhães. “Entretanto, há instrumentos específicos como inclinômetros, utilizados para determinar deslocamentos horizontais, superficiais e na subsuperfície, além de marcos superficiais para indicar movimentos e pressões anormais”, complementa.
Outros equipamentos, de acordo com Luiz Antonio Naresi Jr., gerente de planejamento da Progeo Engenharia, são utilizados para tratamento e consolidação das estruturas, incluindo perfuratrizes rotopercussivas, sondas rotativas, equipamentos de injeção, obturadores duplos e outros. “Quando uma barragem apresenta problemas, é necessário realizar uma sondagem mista, de percussão e rotativa, para descobrir a causa”, afirma o especialista.
Em alguns casos ainda, quando a barragem apresenta vazamentos no núcleo e/ou nas ombreiras, é necessário injetar calda de cimento (chamada de “cortina de injeção”) para evitar que a água passe pelo maciço da barragem, impedindo que os vazamentos arrastem finos e provoquem erosão, o que pode levar à ruptura catastrófica.
Conforme descreve Naresi, nesse tratamento são utilizados equipamentos como misturadores duplos horizontais, perfuratrizes rotopercussivas e bombas d’água de alta pressão, para lavagem dos furos e execução dos ensaios de perda d’água. “A bomba é acoplada em um obturador duplo para verificar os locais específicos em que possa haver perda d’água”, detalha.
ESTRUTURA
As técnicas de construção de uma barragem são muito variadas, podendo haver transporte dos rejeitos por meio de rejeitodutos, tubulações, ciclones ou correias transportadoras. Os rejeitos podem ser bombeados ou depositados diretamente em meio aquoso, seja por esteiras ou separados por meio de ciclones, que são cones que recebem os rejeitos em meio aquoso incidindo tangencialmente em seu interior.
Ao incidir no cone, a mistura de rejeito e água assume um movimento circular, tangenciando internamente as paredes do cone. Estimulado por aceleração centrípeta, esse movimento concentra os grãos maiores e mais pesados, mais próximos à parede do cone. No cone, há duas saídas: uma por cima (por onde sai a parte mais fina) e outra por baixo (em uma pequena abertura na boca do cone, por onde saem as frações mais granulares).
Como afirma Miguez, o rejeito fica dividido entre a crista da barragem (ou à montante dela) e o reservatório, nesse caso com grãos mais finos e maior quantidade de água. “Dessa forma, a parte mais grossa dos rejeitos é a que compõe o talude da barragem. Quando os rejeitos são muito finos, pode ser adotado um processo de alteamento de pequenos diques com material de empréstimo, sendo construídos dentro do método de montante”, explica. “Em sua etapa inicial, esse método consiste na construção de um dique de partida, geralmente formado de materiais argilosos ou enrocamento compactado.”
Segundo Naresi, para determinar a contenção de uma barragem, é necessária a realização de diversos estudos geotécnicos, que incluem investigação de campo, definição dos parâmetros de solos e rochas, estudo do comportamento da tensão e deformação dos solos, análise de estabilidade dos taludes, ensaios complementares de laboratório e definição do fator de segurança, por exemplo. “Ao construirmos uma obra de engenharia, principalmente quando lidamos com uma obra de contenção, é preciso se adaptar às condições da geologia local e ter conhecimento prévio do perfil geológico-geotécnico do subsolo”, diz o gerente, destacando que o reconhecimento elaborado por meio de sondagem do solo possibilita conhecer a fundo o terreno, evitando que desabe.
A sondagem também permite escolher com exatidão o melhor tipo de contenção e de fundação do empreendimento a ser executado. “Com frequência, são relatados casos em que a pressa em construir e a ausência de técnicas, sondagens mistas e profissionais especializados qualificados levaram a atrasos em obras ou, ainda, a desastres completos”, alerta.
FLUXOS
De todo modo, a operação de barragens abre espaço para equipamentos mais específicos. Para bombeamento dos rejeitos, por exemplo, são utilizadas soluções como bombas de pistão duplo, que por meio de tubulações transportam o material até as áreas de deposição. De acordo com Artur Mendes, gerente de vendas da Putzmeister, uma unidade de bombeamento hidráulico de deslocamento positivo bombeia os rejeitos da planta de beneficiamento para um sistema subterrâneo de enchimento (denominado Backfill) ou para uma área de deposição a três ou mais quilômetros de distância. “Os sistemas são compostos por três unidades principais, contendo bomba de pistão impulsionada hidraulicamente, unidade de pressão hidráulica e painel de controle, incluindo o comando”, lista.
Como informa o executivo, as soluções são projetadas para bombeamento de material com alto teor de sólidos secos e baixo teor de água. “Em comparação com barragens convencionais, o bombeamento de pasta reduz a área de deposição de rejeitos”, frisa.
No portfólio da empresa, há bombas HSP que utilizam um sistema de válvulas hidráulicas equipadas com discos. O transporte em si pode alcançar uma pressão de até 160 bar, com vazão de até 550 m³/h. “O material pastoso pode ser bombeado por longas distâncias, sendo que a transferência com alto teor de sólidos minimiza o uso de água, além de reduzir seu escoamento para o meio ambiente”, comenta Mendes.
A Metso, por sua vez, conforme destaca Vinicius Lisboa de Souza, especialista de processos da empresa, produz soluções que têm o objetivo de reduzir os volumes de material enviado para as barragens. “Para tanto, são utilizadas tecnologias de desaguamento que possibilitam o empilhamento do rejeito e, consequentemente, a redução dos riscos das operações”, ressalta.
As principais tecnologias da fabricante finlandesa incluem equipamentos como filtros-prensa – ou Vertical Pressure Filter (VPA), um equipamento de desaguamento que utiliza a pressão do ar para filtrar a polpa de material, de forma a separar os substratos sólidos e líquidos. Após o espessamento, o material sólido filtrado pode então ser empilhado, ao passo que o material líquido (água) pode ser reutilizado no processo. Já os espessadores, como explica o especialista, são equipamentos que realizam a primeira fase do desaguamento, reduzindo o volume de água da polpa. “Esta redução também pode ser chamada de adensamento”, conta, complementando o material é enviado para a filtragem logo após ser adensado. O portfólio conta ainda com clarificadores espirais, que também realizam o adensamento do material, mas são aplicáveis apenas para materiais mais espessos, acima de 1 mm.
MANEJO
Já na Vermeer, a oferta concentra-se em soluções de manejo de fluidos como o reciclador R9x12T, utilizado em projetos de tubulações de grande escala. Os equipamentos podem ser utilizados na instalação de dutos, fazendo a separação de sólidos como pedras, areia e outros detritos dos fluidos de perfuração.
Este equipamento realiza a primeira etapa no processo de reciclagem de água, principalmente quando a operação já estiver utilizando uma bacia de decantação para fornecer água limpa para a lavagem de pedras. A água usada é alimentada no reciclador, que remove as partículas finas e, em seguida, descarrega a água limpa na bacia. “Isso reduz drasticamente a necessidade de dragagem e permite a fácil recuperação das partículas finas para mistura em outros produtos”, diz Espedito Junio Fonseca, gerente da Vermeer Brasil.
Como um sistema de tratamento de água independente, a solução permite que as operações deixem de usar o sistema de bacia de decantação tradicional. “Tirando água do sistema de lavagem da operação, ele separa o material da água, alimentando a água limpa de volta para a planta, enquanto também descarrega o material de partículas finas para processamento ou mistura adicional”, comenta.
Para o vice-presidente da Vermeer na América Latina, Steve Heap, a utilização deste equipamento pode evitar que uma barragem mantenha uma grande quantidade de fluidos. “Com os recicladores, é possível separar os sólidos à medida que se utiliza os fluidos, resultando em uma barragem de menor porte”, finaliza.
Técnica é alternativa às barragens de rejeitos
Alternativa para reduzir os impactos ambientais de barragens de rejeitos, a técnica de “dry stacking” (literalmente empilhamento a seco, em inglês) adveio da indústria de alumínio e, segundo Gustavo Castro, gerente de serviços da Weir Minerals, tem como principal característica a formação de um rejeito pastoso com baixo teor de água, obtido por meio de espessamento prévio ou desaguamento dos resíduos. “Para evitar que a soda cáustica vá para a barragem, é feito um processo de filtragem do elemento, transformando o rejeito líquido em uma pasta, o que diminui o risco de contaminação e escorrimento do líquido”, pontua. “Com essa técnica, a quantidade de água dentro da área de deposição é menor e, com isso, o volume da área também se torna ser menor, reduzindo o tamanho da barragem de rejeito. No caso de rompimento, é possível controlar, diferentemente do que ocorre quando o resíduo contém líquido.”
Outra vantagem do “dry stacking” está relacionada ao transporte dos rejeitos, que antes era feito por meio de caminhões e correias transportadoras, mas evoluiu para outras soluções. “Para evitar riscos de contaminação, passou-se a utilizar bombas de diafragma de pistão, que são projetadas para lidar com pastas abrasivas e corrosivas sob altas pressões”, conclui Castro.
Luiz Antonio Naresi Júnior é engenheiro civil com ênfase na área de Saneamento, possui pós-graduação em Engenharia de Segurança do Trabalho, Analista Ambiental pela UFJF (Universidade Federal de Juiz de Fora), e em Engenharia Geotécnica pela UNICID (Universidade Cidade de São Paulo). É especialista em obras de Fundação Profunda, Contenções de Encosta, Obras de Artes Especiais, Projetos de Contenção, Infraestrutura Ferroviária e Rodoviária. Atualmente é sócio da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica), diretor do Clube de Engenharia de Juiz de Fora (MG) desde 2005, participa como voluntario pela ABMS como apoio a defesa civil de Belo Horizonte, Professor da Escalla Cursos para Mestre de Obras (CEJF / CREA/MG), consultor de fundação pesada e geotecnia, comercial e assessor da diretoria da Empresa Progeo Engenharia Ltda.
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