Augusto Cesar Radde da Silva
UFRGS
O presente trabalho, cuja base teórica é a Análise do Discurso de linha francesa, mobiliza os conceitos de silêncio e autoria na tentativa depromover um gesto de leitura do discurso poético de Clarice Lispector. Em Água Viva, objeto de análise desse trabalho, a grande temáticaé a desestabilização e a incompletude da linguagem. Desse modo, o silêncio constitutivo da linguagem, fundamental à significação,emerge como condição para que se chegue a uma possível leitura acerca da opacidade, da não transparência das palavras, tematizadanesse objeto. Do mesmo modo em que a autoria, posição imaginária assumida pelo sujeito enquanto construtor do seu discurso, se tornaextremamente relevante e singular no discurso materializado pelo sujeito poético em Água Viva. Ao tematizar a impossibilidade deapreensão do real pelo simbólico, em sua relação intrínseca ao silêncio, bem como o necessário olhar à condição de produção dos sujeitosenvolvidos, autor e leitor, o discurso de Clarice rompe com a imaginada estabilização dos sentidos e com a própria estrutura linear danarrativa. O que se vê é um sujeito que, em sua função de autor, parece dar-se conta do quanto imaginária é a unicidade do sentido, assimcomo da necessidade de levar ao leitor um discurso coerentemente organizado, dissimulado na materialidade linguística. Nesse sentido,ele reflete sobre a multiplicidade do sentido, levando o leitor a indagar-se sobre a ilusão da transparência imaginária da linguagem, aopasso que traz, no silêncio de sua materialidade, o dizer que tenta institucionalizar a ordem única, tanto da linearidade quanto do sentidode um discurso. Tais efeitos são o que se pretende ler nessa análise.