Dieta pré-competição: segredos e truques

A primeira coisa que você precisa avaliar é que nenhuma dieta é uma “receita”. Algumas pessoas acham que vão acessar a web, folhear uma revista e simplesmente seguir uma dieta pronta, enlatada. Ou seguir o plano alimentar de um Mr Olympia como Coleman, Yates ou Cutler. Ou pior ainda, seguir uma daquelas dietas de seminários de telenovela baratos que são, no meu entender, criminosas! A dieta é que precisa ser adaptada a você e não o contrário. Um dos erros mais frequentes, acredite, acontece até mesmo em consultórios de nutrição, é fazer um cálculo para a estimativa do consumo calórico e acreditar que de fato, é a quantidade meticulosamente precisa para você.

Nós, seres humanos, não chegamos até aqui por acaso. Muito antes do advento da civilização e tecnologia, nossos ancestrais enfrentaram agruras e dificuldades que mesmo com a mais fértil das imaginações não poderíamos conceber. Épocas de escassez de alimento, ora ocasionadas pela estiagem, ora pelas glaciações implacáveis, fizeram com que desenvolvéssemos uma extrema adaptabilidade a tais condições.

Este traço ancestral nos deu a notável capacidade de adaptação frente a oferta de alimento, mesmo nos dias de hoje. Pense um pouco: Por que aquelas pessoas que sofrem com o flagelo das secas no continente africano chegam a níveis tão baixos de inanição, mas no entanto, conseguem sobreviver por semanas sem alimento? Adaptação metabólica é a resposta. É muito comum encontrar uma pessoa que simplesmente cortou algumas calorias de sua dieta e apresentou uma perda de peso logo na primeira semana, mas esta perda de peso se estagnou na semana seguinte até que a pessoa não consiguiu mais emagrecer e simplesmente resolveu fazer uma nova redução. Novamente, irá haver uma perda de peso, mas esta será quantitativamente menor que a vivenciada na primeira semana de redução. Isto ocorre porque o metabolismo tende a reduzir mediante a diminuição da oferta de alimento. E o que acontece quando a pessoa resolve sair da dieta depois de algum período? Acaba recuperando todo o peso perdido e talvez até mais do que quando iniciou o regime. Esse é o tão famoso "efeito sanfona" e é justamente devido a alteração no ritmo metabólico que ele ocorre.

Baseados nesse raciocínio central, percebemos que, embora exista uma estimativa de consumo das calorias (e ela pode até ser bem precisa!), estamos adaptados metabolicamente a dieta atual que estamos seguindo. Isto explica porque algumas pessoas vão até o nutricionista e após seguir a prescrição alimentar rigorosamente durante um período, há em alguns casos um inexplicável aumento de peso, especialmente de gordura corporal! Claro que estes são casos isolados, mas eles acontecem com alguma frequência.

A dieta na qual conseguimos manter estável nosso peso corporal denominamos de normocalórica, lembrando que dieta refere-se ao total de calorias ingeridas diariamente e não deve ser confundida com regime, que se trata de uma diminuição das calorias, mais conhecida como dieta hipocalórica.

O primeiro passo então é descobrir qual é sua necessidade (que você pode estimar através de cálculos como METs, equação de Harris Benedict ou simplesmente somar todas as calorias que você ingere em um dia, fazer o somatório da semana e calcular a media aritmética). Com base nestes dados você chegará a uma ingesta normocalórica de nutrientes, ressaltando que para um culturista é sempre interessante haver um consumo relativamente alto de proteínas. Uma ingesta de cerca de 2 g/kg é o mais usual. Culturistas profissionais chegam a ingerir 3g/kg ou mais de proteínas, mas isso faz parte de outra realidade. As gorduras não devem ultrapassar 15% do total calórico da dieta.

Lembre-se que quanto antes você começar sua dieta pré-competição mais fácil e cômodo será para você fazer algum ajuste, se necessário. Eu costumo começar de 12 a 8 semanas antes do dia D. Vamos tomar como exemplo um atleta hipotético que pese 80 kg, que tenha uma dieta normocalórica de 3000 kcal e que começará sua preparação três meses antes da competição. Com base nos 2 g/kg de proteína, nosso atleta terá que ingerir diariamente cerca de 160 g de proteína. Cada grama de proteina tem um valor calórico aproximado de 4 calorias, logo multiplicamos 160 por 4, o que resulta em um valor de 640 kcal advindas de proteínas. Como a dieta é de 3000 kcal vamos colocar 15% deste valor de calorias advindas da gordura, totalizando 450 calorias. Como cada grama de gordura tem um equivalente de cerca de 9 kcal, temos um valor de 50 g de gorduras na dieta. Então temos 640 calorias da proteína somadas a 450 calorias das gorduras, o que dá um total de 1090 calorias, sendo obviamente, o restante advindo dos carboidratos. Como são 3000 calorias totais, subtraimos 1090 de 3000 e obtemos 1910 calorias. Como cada grama de carboidrato tem em média 4 kcal, temos um total de 477,5 g de carbo para a dieta de nosso atleta.

É consenso na literatura que um déficit calorico de 1000 kcal diários provoca em uma semana perda de

aproximadamente um quilo de peso corporal. Lembre-se que déficit calórico é uma diminuição de calorias que pode ser gerada por uma restrição na dieta ou um aumento do consumo calórico. Alguns atletas não fazem aerobiose durante sua preparação, neste caso o déficit calórico será advindo exclusivamente da restrição calórica da dieta. Eu, particularmente, opto pela inclusão de aerobiose em minha preparação por dois motivos muito simples: A redução na dieta tende a ser menor, pois o gasto calórico irá auxiliar o processo de queima de gordura e posso modular mais facilmente a intensidade dos aeróbios caso necessite de um dispêndio energético maior e ainda com isso posso manter meu metabolismo acelerado. Costumo diminuir 500 kcal da alimentação e gastar 500 kcal em média com exercícios aeróbios (esteira, bic. ergométrica etc) o que gera um déficit de cerca de 1000 kcal. (Claro que esta redução também depende de como você se encontra no início da preparação, se você está numa situação de percentual de gordura relativamente baixo, o tempo de preparação e o gasto calórico da aerobiose tendem a ser menores.) Considerando nosso atleta-exemplo, no 3° mês antes da competição ele deverá fazer uma redução de 500 calorias na dieta e começar suas sessões de aeróbios em um outro horário do dia, preferencialmente mais afastado do horário de treino da musculação. Uma média de quatro vezes por semana é o ideal nesta fase. A redução de 500 calorias deve ser exclusiva dos carboidratos. Proteínas e gorduras tendem a permanecer inalteradas. A distribuição calórica ficará da seguinte forma: 640 kcal das proteínas, 450 kcal dos lipídeos e 1410 dos carboidratos, totalizando 2500 kcal. Neste primeiro mês de preparação a dieta é basicamente linear ao longo da semana, não havendo dia do lixo, como alguns atletas gostam de fazer. A lógica do dia do lixo também se baseia no ritmo metabólico e tem como intenção acelerar o metabolismo ingerindo mais calorias no final de semana. Tem entre seus seguidores Mauro di Pasquale, autor de "Solução Anabólica para Culturistas". Eu, particularmente, não vejo com bons olhos esta prática, porque o atleta se arrisca a ingerir gorduras saturadas e carboidratos processados. Compartilho uma linha ideológica com autores como Chris Aceto, que propõe uma dieta com flutuação calórica mais frequente. (neste caso, não se corta carboidratos, como sugere Di Pasquale, apenas alterna-se períodos de baixo carbo com alto carbo, a fim de manter o metabolismo acelerado e evitar perda de massa magra.) Considerando os dias em que não há aerobiose, em média 3 dias, teremos um progressivo aumento do dispêndio energético a medida que acrescentarmos aeróbicos extras nos próximos meses. No 2° mês, aumentaremos a frequência de aeróbios, fazendo-os alternadamente em um turno diferente do dia e em outro dia após o treino de musculação. Neste ponto começamos a fazer a flutuação calórica. Devemos proceder da seguinte maneira: Tendo como base nossa ingesta de 2500 kcal, apelidamos de Dia B, por tratar-se de referência. Neste dia reduziremos 30% do total de carboidratos do dia , o que resulta em cerca de 220 g, ou seja, cerca de 880 kcal. Procure ingerir estes carboidratos na forma de pães e massas integrais, tubérculos (devido ao baixo indíce glicêmico) e divida esta oferta de carbo no desjejum e pós-treino. Este dia de redução de 30% de calorias dos carboidratos será chamado de Dia A, ou simplesmente baixo carbo. Por outro lado acrescente 30% de calorias dos carbos e apelide de Dia C ou alto carbo. Agora é só seguir a ordem alfabética: Dia A = 220 g, Dia B = 325 g e Dia C = 430 g (Lembre-se, esta relação é só para os carboidratos!) No ultimo mês, nosso atleta fictício decidirá pela inclusão ou não de aeróbios em jejum. Eu utilizo aerobiose em jejum em minha preparações de acordo coma necessidade de uma maior mobilização de gordura. Muitos autores condenam esta prática, mas a grande maioria dos estudos não avalia o estado nutricional dos atletas competitivos e os estudos não levam em consideração os recursos ergogênicos utilizados nesta fase. Esta é, portanto, uma indicação que é completamente subjetiva. Quanto a dieta, nesta fase, nosso atleta-exemplo terá de voltar a fazer os cálculos. Aqui, não utilizaremos mais o dia B. Serão então dois dias A precedidos de um dia C. Neste ponto haverá em média um déficit calórico na dieta de cerca de 1260 kcal semanal ou 180 kcal diárias.

Na última semana, considerando que nosso atleta atingiu seu peso ideal, só nos resta lidar com os líquidos corporais. Neste ponto da preparação, faremos uma redistribuição da oferta de calorias. Praticamente seguimos o dia A, porém com um acréscimo de proteína e gorduras. Eu recomendo não zerar completamente o carboidrato, mas reduzi-lo consideravelmente e utilizá-lo somente no pós-treino (cerca de 60 g) por cerca de 4 dias,(domingo, segunda, terça e quarta) onde o treino aeróbio e anaeróbio é intenso (eu recomendo séries gigantes, no caso do anaeróbio). Como no dia A ingeríamos cerca de 220 g de carbo, há um déficit de 160 g ou cerca de 640 kcal, que devem ser redistribuídas para proteínas e lipídeos. Supondo que dividamos ao meio este valor, teremos um acréscimo de 320 calorias na proteína, ou seja 80 g. No caso das 320 kcal para as gorduras teremos um incremento de 35 g. Nesta fase a ingestão de líquidos deve ser alta e a de sódio (sal de cozinha) deve ser NORMAL, justamente para causar um impacto no equilibrio hidro-eletrolítico quando reduzirmos o sódio nos últimos dois dias antes do dia D. Na Quinta-feira, diminua a ingestão de sal e de líquidos. Aumente o consumo de carboidrato para cerca de 100% da dieta. exemplo: Usando como base nossa dieta de 3000 kcal, consuma cerca de 750 g de carboidratos. Procure ingerir proteínas livres de sódio, como claras de ovo. Não há necessidade de gorduras nesses dias, mantenha a proteína cerca de 1g/kg. No caso do nosso exemplo seriam 80 g de proteína/dia.

Não recomendo que você use diuréticos, além de perigosos (muitos atletas morreram ou tiveram complicações por sua causa), eles drenam a água presente no tecido muscular e deixam a musculatura com uma aparência flácida, sem falar na diminuição da vasculatura, decorrente de queda na volemia. NÃO elimine o sódio, pois haverá dificuldade na formação da molecula de glicogênio, pois a glicose necessita do transporte acoplado do sódio para entrar na célula.

Bem, basicamente são essas as dicas que posso dar acerca de preparação pré-competição. Não somos donos da verdade, estas dicas são fruto de minha experiência pessoal e de aplicação teórica utilizada na prática, por mim e por atletas que acompanhei. Para mim e meus atletas funcionaram, as vezes perfeitamente, as vezes nem tanto. Pode ser que funcionem para você, ou talvez não…

Espero que esta postagem tenha sido útil e esclarecedora, mas não deixa de ser somente ilustrativa. LEMBRE-SE - como diz Waldemar Guimarães: “não existe receita de bolo”. A individualidade biológica de cada um deve ser respeitada! Pesquise, estude e use estas informações como referência para suas futuras preparações.

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