Fundação colonial (século XVIII)
O povoado original, chamado San Lorenzo de Jibacoa del Norte, foi fundado em 1756 por Gonzalo de Herrera y Berrio, marquês de Villalta. Nos primeiros anos, era uma pequena localidade rural, com cerca de 65 casas em 1827, boticas, tabernas e uma ermida simples.
Com o tempo, graduou-se a sede de um partido municipal. Em 1862, já contava com mais de 300 casas, algumas em alvenaria e com abastecimento de produtos via o rio Jibacoa e rotas rudimentares até Santa Cruz del Norte .
Títulos nobiliários e plantio de manga
Em 1764, Don Jerónimo Espinosa de Contreras, proprietário da região, recebeu o título de Conde de Jibacoa. Sua esposa, Doña Micaela de Jústiz y Zayas, plantou ali a primeira mangueira de Cuba por volta de 1782 — um marco que transformou a produção de mango na ilha.
Participação na Guerra de Independência
Em 9 de outubro de 1868, Jibacoa foi palco de um alzamento antiespanhól, liderado pelos irmãos Marcano. Esse agitamento local se uniu ao levante de Céspedes para a tomada de Bayamo, reforçando o movimento de independência cubana.
Da vila rural a destino turístico
No século XX, Jibacoa mudou o foco da construção — preservou arquitetura colonial apenas em vestígios, enquanto o local se reestruturou sobretudo na era pós-revolucionária e com foco no turismo.
Hoje faz parte do município de Santa Cruz del Norte (província de Mayabeque), numa enseada protegida por falésias de até 100 m, onde surgiram hotéis, bases de campismo e um ambiente voltado ao ecoturismo
Rotilla Festival / Verão em Jibacoa: evento musical anual que reúne DJs e bandas de rock, hip‑hop e eletrônica, realizado na praia e marcado por música ao ar livre, barracas, tatuagens e muita gente curtindo ao sol e ao mar.
Turismo ecológico: atividades como snórquel, mergulho em recifes a poucas dezenas de metros da orla, passeios a cavalo, trilhas por morros e cachoeiras, pesca e caiaque .
Por trás da areia branca e das águas cristalinas, esconde-se a face reversa de Jibacoa
Todos os dias, aproximava-se a mesma menina — a pele e os cabelos desbotados pela vida ao ar livre. Quer fosse na areia ou dentro do mar, lá vinha ela, com o olhar vivo e a mesma frase nos lábios:
— Pero yo no tengo casa — dizia, em espanhol, enquanto estendia a mão.
— Me llamo Camila. ¿Y tú? — perguntava-me.
No olhar, havia a luz clara da manipulação. Uma lição, talvez, aprendida com os próprios familiares. Ao longe, distinguiam-se figuras adultas — provavelmente os pais — rodeados por vários filhos, numa cena silenciosa e inquietante. Permaneciam imóveis, como se aguardassem algo, enquanto a menina se lançava, sozinha, às mãos de desconhecidos.
Se lhe déssemos alguma coisa, logo corriam os outros, surgindo das dunas, à espera de algo também. Não vinham com violência, vinham com pressa. Com necessidade.
Pela praia, circulavam outras crianças, de pele queimada pelo sol, cabelos emaranhados e olhos inquietos. Vendiam conchas e pedrinhas como se fossem tesouros, ofereciam sorrisos frágeis e súplicas por atenção.
Havia também homens — talvez reformados, ou na idade da reforma — que, com um facão, abriam com destreza os cocos que colhiam dos coqueiros que nos abrigavam do sol.
Um dia, num espanhol meio aportuguesado, perguntei o preço.
— Lo que usted quiera dar — respondiam.
— Gracias — agradeciam educadamente e aceitavam, sem regatear, o valor estipulado por nós.
Como eu gostaria de lhes dizer que éramos iguais. Que eu estava ali apenas porque a vida me proporcionara essa oportunidade. Que também sabia o que era lutar pela sobrevivência.
Mas há coisas que não nos atrevemos a dizer — ou talvez não se saibam dizer. Pena que tantos de nós esquecemos isso, e vamos até ali como se fôssemos reis do mundo, superiores àqueles que, naquele momento, apenas se encontram noutra condição.
Infelizmente — talvez inevitavelmente — Camila parece destinada a tornar-se uma das adolescentes que desfilam dentro do resort, acompanhadas por homens de idade avançada. Não são pares, mas relações marcadas por interesses desiguais — homens que as mantêm como companheiras, numa realidade que expõe, sem filtros, a exploração e a desigualdade.
Não se trata de condenar diferenças de idade, mas de relações de natureza puramente comercial, nas quais o mais velho exerce poder e suborno sobre jovens que veem, ali, uma oportunidade de fuga para escapar de uma vida que julgam sem saídas.
Conversei com alguns empregados do resort. Um simples dólar americano bastava para provocar um sorriso genuíno. Não sei quanto ganham por mês, mas havia um — talvez com uns sessenta anos — que, sempre que recebia uma gorjeta, benzia-se, elevando a mão com a nota como se fosse uma bênção.
Uma funcionária do bar desabafou que, por vezes, até tinha algum dinheiro no bolso, mas muitas vezes não encontrava mantimentos para comprar.
Ainda assim, apesar das dificuldades, os cubanos são um povo alegre, que sabe cantar e dançar. Demonstraram-no com belos espetáculos noturnos, tendo a lua e as estrelas como testemunhas.
Jibacoa é assim — um lugar de belezas naturais que fascinam, mas também um microcosmo das contradições mais profundas de Cuba: a esperança depositada no turismo e o peso esmagador das desigualdades sociais.
Olhar para além do cartão-postal é essencial para compreender o que realmente significa viver — e sobreviver — ali.
Ada Abaé
Durante a minha estadia em Jibacoa, testemunhei num fenómeno natural: todas as tardes, por volta das 16h30, o céu cobria-se de nuvens pesadas. O vento mudava, relâmpagos rasgavam o céu e, pouco depois, desabava uma intensa chuva tropical, que vinha aliviar o calor do dia. Esse espetáculo da natureza era breve — a chuva trazia o cheiro a terra molhada e renovava o ar quente.
Havia momentos em que a aproximação da tempestade ganhava contornos quase irreais. Sobre o mar pairava uma nuvem negra e densa, tão baixa e compacta que parecia surgir das próprias águas — como uma sombra que se erguesse do fundo do oceano. Por instantes, lembrava a ondulação de um tsunami prestes a formar-se, mas era apenas a tempestade a anunciar-se, com o seu peso suspenso no horizonte… uma beleza que impressiona. O abrigo tornava-se obrigatório.
Ada Abaé