Introdução aos Sofistas

Sofística e o deslocamento do eixo da pesquisa filosófica do cosmo para o homem

“Sofista” significa sábio, e precisamente sábio em cada um dos problemas que dizem respeito ao homem e à sua posição na sociedade.

A Sofistica constitui radical inovação da problemática filosófica, deslocando o eixo das pesquisas do cosmo para o homem. Inaugura, portanto, o período chamado “humanista” da filosofia grega.

Os Sofistas proclamaram possuir a arte de educar os homens e de prepará-los para a vida política, oferecendo-lhes novas idéias e novos instrumentos.

1.Significado do termo sofista”

“Sofista” é um termo que significa “sábio”, “especialista do saber”. A acepção do termo, que em si mesma é positiva, tornou-se negativa sobretudo pela tomada de posição fortemente polêmica de Platão e Aristóteles. Durante muito tempo os historiadores da filosofia adotaram, além das informações fornecidas por Platão e Aristóteles sobre os sofistas, também as suas avaliações, de modo que, geralmente, o movimento sofista foi desvalorizado e considerado predominantemente como momento de grave decadência do pensamento grego. Somente no século XX foi possível uma revisão sistemática desses juízos e, consequentemente, uma radical reavaliação histórica dos sofistas; e a conclusão à qual se chegou é que os sofistas constituem um elo essencial na história do pensamento antigo.

2.Deslocamento do interesse da natureza para o homem

Os Sofistas, com efeito, operaram verdadeira revolução espiritual (deslocando o eixo da reflexão filosófica da physis e do cosmo para o homem e àquilo que concerne à vida do homem como membro de uma sociedade) e, portanto, centrando seus interesses sobre a ética, a política, a retórica, a arte, a língua, a religião e a educação, ou seja, sobre aquilo que hoje chamamos a cultura do homem. Portanto, é exato afirmar que, com os Sofistas, inicia-se o período humanista da filosofia antiga.

Esse deslocamento radical do eixo da filosofia se explica pela ação conjunta de duas diferentes ordens de causas. De um lado, como vimos, a filosofia da physis pouco a pouco exauriu todas as suas possibilidades. Com efeito, todos os caminhos já haviam sido palmilhados e o pensamento “físico” chegara aos seus limites extremos. Desse modo, era fatal a busca de outro objetivo. Do outro lado, no séc. V a.C. manifestaram-se fermentos sociais, econômicos e culturais que, ao mesmo tempo, favoreceram o desenvolvimento da Sofistica e, por seu turno, foram por ele favorecidos.

3. Mudanças sociopolíticas que favoreceram o nascimento da Sofistica

Antes de mais nada, recordemos a lenta mas inexorável crise da aristocracia, acompanhada pari passu pelo sempre crescente poder do demos, do povo; o afluxo cada vez mais maciço de estrangeiros às cidades, especialmente em Atenas, com a ampliação do comércio, que, superando os limites de cada cidade, levava cada uma delas ao contato com um mundo mais amplo; a difusão dos conhecimentos e experiências dos viajantes, que levavam à inevitável comparação entre usos, costumes e leis helênicas, e usos, costumes e leis totalmente diferentes.

Todos esses fatores contribuíram fortemente para o surgimento da problemática sofistica. A crise da aristocracia implicou também a crise da antiga areté, os valores tradicionais, que eram precisamente os valores apreciados pela aristocracia. A crescente afirmação do poder do demos (povo) e a ampliação da possibilidade de aceder ao poder a círculos mais vastos fizeram desmoronar a convicção de que a areté estivesse ligada à nascença, isto é, que se nascia virtuoso e não se tornava, pondo em primeiro plano a questão de como se adquire a “virtude política”. A ruptura do círculo restrito da pólis e o conhecimento de costumes, usos e leis opostos deveriam constituir a premissa do relativismo, gerando a convicção de que aquilo que era considerado eternamente válido, na verdade não tinha valor em outros meios e em outras circunstâncias.

4.Posições assumidas pelos Sofistas e suas avaliações opostas

Os Sofistas souberam captar de modo perfeito essas instâncias da época conturbada em que viveram, sabendo explicitá-las e dar-lhes forma e voz. E isso explica por que alcançaram tanto sucesso, especialmente entre os jovens: eles respondiam a reais necessidades do momento, propondo aos jovens a palavra nova que esperavam, já que não estavam mais satisfeitos com os valores tradicionais que a velha geração lhes propunha nem com o modo como os propunha.

Tudo isso permite compreender melhor certos aspectos dos Sofistas, pouco apreciados no passado ou até julgados negativamente, em particular seu modo de difundir cultura, o fato de tornar esta difusão uma profissão, de percorrer várias cidades-Estado, sua liberdade de espírito e a crítica em relação à tradição.

5. Os diversos grupos de Sofistas

Os Sofistas não constituem, de modo algum, um bloco compacto de pensadores; todavia, visavam às mesmas finalidades com esforços independentes e com meios análogos, a fim de responder a algumas necessidades sentidas naquela época. Já vimos quais eram essas necessidades. Resta examinar esses “esforços independentes” e esses “meios análogos”. Mas, para nos orientarmos preliminarmente, precisamos distinguir quatro grupos de Sofistas:

1)Os grandes e famosos mestres da primeira geração, que não estavam em absoluto privados de reservas morais, e que o próprio Platão considerou dignos de certo respeito;

2)Os “Erísticos”, que levaram o aspecto formal do método à exasperação, perderam interesse pelos conteúdos e também perderam a reserva moral que caracterizava os mestres;

3)Os “Político-sofistas”, que utilizaram idéias sofistas em sentido “ideológico”, como diríamos hoje, ou seja, com finalidades políticas, caindo em excessos de vários tipos e chegando até a teorização do imoralismo;

4)Uma escola particular de Sofistas, que não se identifica com a dos mestres da primeira geração, e tomou o nome de “naturalista”, enquanto contrapunha a lei positiva à natural, privilegiando a última e relativizando a primeira.