14/05/1980
A-01
A folha seca desprendeu-se
da árvore frondosa
e caiu,
solitária,
no orvalho da grama pisada...
Meu olhar
desprendeu-se da vida agitada
e prendeu-se na folha caída...
Sumiram de mim os ruídos do mundo,
fugiram de mim os sonhos malucos...
Entre as cores, as flores,
as orquídeas e as mariposas,
o útil e o fútil,
vislumbrados por meus olhos,
uma e apenas uma coisa,
naquele místico instante,
podia chamar-me a atenção:
Da solitária árvore frondosa,
a única folha seca,
caída no orvalho do chão.
27/11/2011
A-08
Sempre no coração
A tristeza dos passos perdidos,
A alegria dos gritos contidos,
Que nunca pudemos dar.
Sempre no coração,
As asas da liberdade
Se quebraram,
Se partiram,
Não voam mais.
Sempre no coração
“A alegria de um barco voltando
A ternura de mãos se encontrando”
São apenas sonhos,
Nada mais!
Sempre no coração
Os tambores de guerra,
Invadem a terra,
Dissipam as cores,
Secam as flores,
Desertam florestas.
Sempre no coração
As aves que gorjeavam
Não gorjeiam mais.
Sempre no coração
Só desilusões e amargura,
E nada mais!
11/12/2011
A-15
O sol se foi,
a noite chegou,
o dia findou,
a angústia começou,
a cama tem espinhos.
O insone se vira pra cá, pra lá,
conta carneirinhos,
que acabaram dormindo
ao lado da cerca que deveriam pular.
Seus olhos, abertos,
sentidos despertos,
Ruídos infernais.
Lá fora, pássaros dormem,
corujas crocitam (piam),
grilos o irritam,
sapos coaxam,
Nada de luar.
A noite caminha,
chega ao fim.
O dia desponta,
e quando, finalmente ele dorme,
o despertador dispara,
chamando-o ao trabalho.
28/05/2012
A-20
Às vezes
parece que o mundo é um quadrado,
o sol um triângulo,
a lua uma estrela.
Ao tentar saborear
os frutos do pomar
plantados e cuidados por décadas,
eles apodrecem nas mãos!
Ao buscar outro alimento,
de modo sofrido,
suado,
maltratado,
sob humilhações,
incompreensões,
iras,
invejas,
maledicências,
provações...
Deus nos alimenta.
Deus nos prova.
Testa nossa resistência.
Muitas vezes nos sentimos
“Como um pelicano no deserto” (Sl 102,7).
O que um pelicano faz no deserto?
Ele se alimenta de peixes!
É ave marítima!
Sta. Teresinha
queria ser uma bola de brinquedo
nas mãos do Menino Jesus,
para que ele brincasse à vontade,
e a jogasse para onde quisesse.
Jesus não é mais menino.
Não brinca mais com bolas.
Quando crescemos,
esquecemos nossos brinquedos no armário!
Somos talvez
como um antigo brinquedo esquecido.
Como um pedaço de pizza
sobrando no prato.
Entretanto, continuemos nosso caminho,
enquanto houver sol,
Enquanto houver caminho,
Enquanto houver esperança!
Espero com ardor
que os frutos do pomar
fiquem doces
e possamos desfrutar deles,
com Jesus,
ao lado da lareira do paraíso.
03/06/2012 –
A-384
A voz de Deus nos nossos ouvidos é apenas um leve sussurro,
mas tem a força de mil megatons...
A voz do mundo nos nossos ouvidos é um forte alarido
que nos ensurdece,
entristece,
escurece nossa vida,
desafina qualquer som.
Nossos passos lentos num caminho estreito
ainda esperam por uma decisão:
ou se alarga o caminho em que caminhamos,
ou alarguemos os limites do nosso coração!
O tempo passa, o tempo se acelera,
Nossos sonhos, um a um, pisados no chão.
Ao sentir-nos por Deus tanto amado,
as forças nos invadem,
nosso céu se ilumina,
o mundo se cala.
Alarguemos o caminho!
Escancaremos nosso coração!
– 17/06/2012
A-385
O silêncio da noite o agride,
grita-lhe no pensamento o que ele fora outrora,
o que passou,
o que fizeram dele,
o que ele será,
o que ele não poderá ser.
O silêncio da noite o envolve,
o fascina,
o aglutina,
faz com que ele vibre,
faz com que ele reze,
faz com que ele viva.
O silêncio da noite o faz ver
o negror das flores,
o sumiço das cores,
o céu estrelado,
o nada enluarado.
O silêncio da noite o vislumbra,
projeta-lhe nos olhos
a presença de Deus,
seu último adeus,
seus sonhos bonitos,
que viraram pesadelo.
No silêncio da noite a lua, tão bela,
torna-se amarela,
por um eclipse.
As nuvens chegaram,
as estrelas sumiram.
O silêncio da noite
acompanha lentamente
o ruído inaudível
de suas lágrimas caindo...
AGOSTO 2012
A-389
De repente o mundo que o eremita via
mudou de cor.
De repente, o carro que subia,
começou a descer.
A flor que se abria se fechou,
o canto da abadia se calou.
O murmúrio da feira sumiu.
As águas da cachoeira se congelaram,
Os urubus começaram a pastar,
as galinhas começaram a pôr ovos de ouro,
o bolinho que ele fazia,
tão apreciado no mosteiro,
perdeu o sabor:
ninguém mais quer comer.
Sua voz tornou-se um sussurro.
Seu amor tornou-se um repúdio;
seus ouvidos se encheram de sons azedos;
sua vida tornou-se
uma gruta no deserto.
30/09/2012
A-394
Na calma da noite,
os olhos abertos,
do insone,
recusam fechar-se.
Lá fora,
as flores noturnas,
abertas ao orvalho,
atraem,
com perfumes extasiantes os insetos,
que as e se fecundam.
A dama da noite
lhe fere o olfato,
enquanto seus olhos se fixam
na claridade do luar,
que penetra em seu quarto.
Nos seus lábios
orações se afloram,
mas sua mente recusa,
indomável,
a fixar-se na imagem
que tenuemente aparece na parede.
Sua mente sai dele
e vagueia pelas ruas obscuras,
onde o perfume se muda
em odores diversos,
em cores diversas,
em etnias diferentes,
em classes sociais antônimas,
odores de drogas,
odores fétidos,
poluição descontrolada,
pobreza esmagada,
juventude perdida,
velhice desamparada,
meiguice atraiçoada,
inocência ofendida,
infância inexistente,
inferno materializado.
Apesar do frio,
o suor lhe umedece a face,
seus olhos lacrimejam,
não consegue dormir.
Na calma da noite,
os soluços dos que sofrem,
o desespero eufórico dos que se drogam,
a sonolência dos que trabalham,
superam a beleza das flores,
a suavidade do orvalho,
a sinfonia dos pequenos animais noturnos,
e o angustiam.
Num esforço supremo,
num ímpeto de ascese,
desliga-se de tudo,
pára de pensar,
pára de se preocupar,
cai na indiferença,
coloca tudo nas largas costas de Deus,
e consegue dormir.
Na calma da noite,
os sapos coaxam,
os grilos fazem barulho
a coruja se faz ouvir,
alguns cães ladram,
mas no quarto do que era insone,
finalmente,
o único som que se ouve
é o ressonar do seu sono.
Na calma da noite,
Na apatia de sua impotente vida.
07/10/2012
A-395
Sem nenhum dos seus sonhos,
sem casa,
sem amigos,
sem filhos,
sem seus livros,
sem TV,
sem CD,
sem DVD,
sem eira nem beira,
cacos de seus planos espalhados no chão,
objetos pessoais repartidos,
distribuídos,
jogados no lixo,
como os dos que morrem.
Memória apagada dos anais,
das agendas;
sem aniversários,
sem carro,
sem telefone,
sem cervejinha,
sem internet,
sem contas pra pagar,
sem camisa pra passar,
sem calça pra ajustar,
sem salada nem sobremesa.
Ele é visto como poleiro de galinheiro,
anátema da comunidade,
azáfama dos moralistas,
títere da sociedade,
negação de cidadão,
apenas um sofrível cristão.
Sente-se nu diante do Senhor Deus:
vê-se novamente nas fraldas,
ensaiando os seus primeiros passos,
recomeçando a sua viagem,
agora mais curta,
menos aventurosa,
menos movimentada,
menos apaixonada,
em direção ao Reino de Deus.
Tudo lhe fugiu da mente,
todas as coisas sumiram do seu redor.
Na nudez de seu novo ser,
só quatro palavras ele consegue dizer:
“JESUS, CONFIO EM VÓS!”
(03/11/2012)
A-397
Tudo desabara a seus pés quando foi preso.
Os amigos fugiram,
os inimigos chegaram,
os duvidosos continuaram sobre o muro,
tudo acabou,
seu mundo caíra,
a tranquilidade partira.
A alegria se fechou,
a dor se abriu,
a ferida não apareceu:
permaneceu escondida.
Alguns choraram,
sentidos pela sua ausência,
alguns rezaram,
pedindo a Deus clemência,
mas a demência das autoridades
venceu.
A mentira reinou.
A falsidade desabrochou.
O vil interesse se expandiu...
a mídia sorriu...
não!
A mídia gargalhou!
Se ufanou!
Sobre a desgraça sentou-se!!
A glória apagou-se,
o escândalo engordou...
Quase uma década!
Quase 3650 dias perdidos...
Jogados no lixo...
Nesse triste domingo de novembro,
ombros caídos,
lágrimas nos olhos,
sobrancelhas franzidas,
alma partida,
ele se percebeu,
e não gostou do que viu:
quantos planos decepados!
Quantos projetos parados!
Um abismo se abriu...
a ponte caiu,
os passos fraquejaram,
as lembranças imperaram,
tomaram conta da singela Hora Santa
já quase no fim.
“Deus quis assim!”
“Senhor, tende piedade de mim!”
-Ele rezava.
“É muito tempo!”
“Já não aguento!”
“Quero parar!””
“Quero ficar no nada!”
“Que a vida estacione!”
“Para que lutar?”
“Para que vencer?”
“Por que alimentar outros sonhos?”
“Para que tanta ilusão?”
“Empedrou-se o meu coração!”
“Partiu-se minha esperança!”
“Vejo tudo no chão!”
O silêncio de seu cantinho na cela,
apenas era quebrado pelo jogo da TV,
Palmeiras e Botafogo.
De repente, num seu cochilo,
a cela sumiu,
as paredes caíram,
os céus se abriram,
e ele viu-se numa planície,
se aquela mesmice,
sem aquele cheiro azedo da prisão.
Um perfume das flores da campina
rescendeu.
A tristeza morreu.
Tudo se iluminou.
Ele apenas via um canteiro de flores,
ali no céu:
eram as flores que ele plantara,
no céu,
em seus quase dez anos de prisão.
No instante seguinte,
tendo ele acordado,
a cela voltou ao cheiro azedo,
as grades da solidão,
mas no altarzinho de sua cama,
um lindo vaso branco
trazia uma rosa perfumada,
e alegria imensa,
do amor de Deus e de Maria,
inundou seu coração.
Meu amigo continuava a chorar,
Mas agora era de alegria!
23/01/2013
A-24
O silêncio do deserto me fascina!
O silêncio do deserto me domina”!
Me faz pensar,
me faz rezar,
me faz sonhar...
Sonhar com um mundo incrível,
em que tudo se ajusta,
em que todos se amam,
em que todos se unem,
em que o mal é vencido,
em que não há falsas necessidades,
em que Deus é o centro,
domina todas as coisas com seu domínio de amor,
tão suave,
tão leve.
O silêncio do deserto está em meu coração,
no meu mais íntimo aposento interno.
Ele não existe no meu exterior.
Abstraio-me de tudo,
deixo de lado todas as coisas,
as finanças,
as lutas,
as brigas,
a blogagem,
o esporte,
o lazer,
o cinema,
o passeio,
a cervejinha,
o Mac Donald's,
e entro no meu deserto,
dentro do meu quarto.
Ali meu horizonte se descortina,
as paredes caem,
o sol me ilumina,
a areia tudo domina ao meu redor.
Ouço, então, a presença de Deus,
Sinto sua voz,
Vejo sua bondade a me chamar,
a me guiar,
a me conduzir pelos caminhos da vida.
Fortalecido pelo deserto do meu quarto,
pelo deserto do meu coração,
volto à luta,
à labuta do meu dia-a-dia.
Sou um eremita,
Um eremita da cidade,
Eremita de Jesus Misericordioso
(10/04/13)
A-33
A saudade apertou meu pobre coração
a saudade ordenhou os meus olhos
e as lágrimas caíram.
Nada mais me resta
daqueles tempos felizes...
Nada mais é festa,
nada mais resiste,
tudo é melancolia,
acabou-se a alegria.
As cinzas da fogueira
se espalharam pelo vento,
e ainda hoje eu tento,
mas tudo é coisa passageira.
Algumas brasas restaram,
insistem em ficar...
Algumas notas musicais ficaram,
escondidas pela timidez,
esquecidas pela velhice,
desafinadas pela voz trêmula,
entrecortadas pelo esquecimento.
Alimento meu pensamento,
nutro minha fantasia,
e meu coração se desaperta em alegria,
nas lembranças ligeiras
daqueles tão lindos dias.
Esse mundo maravilhoso que vivi
não pega no teu canal,
não entra na tua tevê,
mesmo que seja digital!
Então eu te dou uma dica:
olha-te no espelho
e preenche o espaço vazio
do meu mundo maravilhoso
com aquilo que passaste,
com aquilo que viveste,
e verás às vezes com alegria,
às vezes com tristeza,
as coisas bonitas que perdestes,
as coisas tristes que vivestes!
Estamos numa nova estrada,
diariamente,
e sempre podemos recomeçar!
Não percamos mais os caminhos!
Que nossos descaminhos,
que nossos desatinos,
à sensatez deixe lugar.
(27/04/13)
A-35
O silêncio da tarde me fascina,
o silêncio da tarde me domina,
me desatina,
me enche de alegria,
me enche de unção,
me cobre de afeição,
me faz vibrar!
O silêncio da tarde me trai!
Ele me faz revelar tudo o que eu sinto,
tudo o que vai dentro de mim...
O silêncio da tarde me encanta,
pois a beleza é tanta!
Faz-me pensar,
faz-me lembrar
tudo o que passou,
tudo o que me feriu,
amigos e amigas que partiram,
sonhos e desejos que fugiram,
"trancos e barrancos" vencidos,
limites e cercas assumidos,
ofensas esquecidas,
mágoas tornadas perdão!
O silêncio da tarde é quebrado
pelo ruído do sol se escondendo,
pelas estrelas aparecendo,
pelo frio que começa...
O silêncio da tarde findou!
Deu lugar à noite,
noite gostosa e também silenciosa,
silêncio apenas quebrado
pelo vento frio e constante
assobiando nas frestas,
dando ares de deserto!
O silêncio da noite é fatal!
Junto os pedaços do meu coração,
esparramados pelo chão,
e os recoloco no meu peito.
Saio do silêncio da noite,
entro no silêncio gostoso
da solidão!
- 19/07/2013
A-43
O sussurro do silêncio me chama...
A paz da quietude me atrai!
Entre os atropelos do mundo me aquieto,
nas sendas da noite me abrigo!
Afasto meu interior das vozes,
retiro-me das palavras,
Retraio-me dos hediondos decibéis
que invadem meus ouvidos.
O barulho me afoga,
me inunda,
mas eu me violento e me abstraio,
saio de mim mesmo,
saio do ruído externo,
e coloco-me no silêncio do infinito!
27/07/2013
A-44
As lembranças congestionam minha mente!
Elas pululam como os peixinhos na água rasa,
Elas se mostram tristes ou alegres,
agradáveis ou doloridas,
todas me abstraem do aqui e do agora,
e me levam
a outros lugares e ao ontem...
Algumas delas são como nuvens passageiras,
correm ligeiras e não voltam mais...
Outras, são como tempestades de verão,
que ficam por pouco tempo,
mas me estraçalham...
Finalmente, há outras que,
docemente,
vão se instalando,
me enlevando,
e me conduzem
ao delicioso sabor
de um "quero mais"!
Lembranças de outrora,
lembranças de ontem,
que amanhã voltarão.
Mas...
Será que o meu hoje
será lembrança depois?
29/09/13
A-52
Mais um dia que finda,
e eu me vejo, ainda,
neste mundo de ilusões!
Meu ombro ainda está molhado
pelas lágrimas derramadas
pelos que nele choraram!
Meu coração ainda está apertado
por tantos problemas contados,
por tantas vidas frustradas...
Ao escrever estes versos,
alguém me interrompeu
e o meu ombro,
já quase seco,
novamente se molhou.
Estou novamente só!
Na minha garganta, um nó
que me impede de chorar,
de sorrir,
de sofrer,
de me alegrar,
de fazer qualquer coisa.
Sinto-me inerte
e impossibilitado de agir.
Olho para o céu,
o dia todo nublado,
acinzentado,
chateado,
chateante,
pedante,
e também me sinto assim!
Amigo (a),
se você chegou até este verso,
neste mundo tão perverso,
faça como eu!
Desligue o computador,
e vá dormir!
16/02/14
A-77
Noite escura, sem estrelas,
Nada se enxerga,
nada se define,
tudo se confunde!
Após um sono saudável
acordo num novo dia,
abro a janela,
sinto o sol em meu rosto.
Dentro de mim, entretanto,
a escuridão continua!
23/02/14
A-79
Estou sozinho;
o tédio se avizinha.
A mente minha
por espinhos se envereda.
As horas não passam,
o relógio pára,
os pensamentos doem.
Eles se destroem,
se corroem
e escolhem as mesmas rimas,
das mais simples às mais tortas,
pois tudo é mais difícil,
quando o tédio tranca as portas....
(11/07/14)
A-111
Insônia.
O silêncio da madrugada
dói-me nos ouvidos.
O barulho dos meus pensamentos
dói-me no meu coração!
(11/07/14)
A-112
Desligo o rádio,
a tevê,
o computador,
desligo o fogão,
o mundo,
o ventilador!
Desligo o telefone fixo,
o celular,
a campainha,
o despertador!
Duas coisas, entretanto,
permanecem ligadas:
o meu incessante pensamento
e o meu grande amor por você,
N.!
(põe o nome da pessoa. Na poesia original, pus o nome de Jesus).
31/08/14
A-124
As horas passam lentamente,
as lembranças rapidamente.
O trem que te levava
parou na estação.
Catorze anos atrás,
parou lá meu coração,
meu amor mais veraz!
Mãe, o teu trem parou!
O meu continuou,
às vezes descarrilando,
às vezes quase parando,
que saudades!
Teu afeto materno,
semelhante ao do Eterno,
cobria os meus pés
nos dias de inverno,
no sofá da sala,
quando eu te visitava.
Tua lembrança persiste,
parada no tempo, no espaço;
o meu coração resiste
às intempéries do tempo.
Quanto tenho a relembrar!
Mar só uma tem lugar!
Por tuas mãos envelhecidas,
o cobertor colocado,
nas minhas pernas estendidas,
no sofá daquele lar,
lar tão amado!
20/10/2014
A-130
Mão na mão,
coração com coração,
atravessei a rua
com minha mãe querida!
Os carros, parados,
esperavam, ansiosos,
que acabássemos a travessia,
e eu, orgulhoso como qual,
importante me sentia.
Os anos passaram,
minha mão (MÃO) está sozinha,
não tem mais em que se amparar!
Os carros não mais param
em respeito à minha mãezinha,
não consigo atravessar!
Quando tudo parecia perdido,
os carros não paravam,
as mentes me zombavam,
os cães me latiam,
grunhindo sarcasmos,
descobri no meu bolso
um apito antigo
presenteado pela mamãe,
para eu usar na solidão:
nele estava escrito:
“Recorra à oração!”
Apitei!
Os carros pararam.
Eu passei!
23/10/2014
A-133
Amigos!
Minha solidão,
eu a busco
não por misantropia,
não por utopia!
Eu a busco, creiam todos,
para encontrar-me com Deus!
Amigos de meu bem-querer,
a solidão que eu procuro
não é, como diz Epicuro,
a busca do prazer!
A solidão desejada
não é a simplesmente amada,
não é solidão forçada,
mas a procurada por amor!
Sozinho com Deus,
coloco-me em suas mãos
com toda a disposição
de fazer o que Ele quer!
Sinceramente eu lhes digo,
minha amiga, meu amigo,
Deus “fala” comigo
e pede-me o meu coração!
Eu sei, entretanto,
que o meu coração,
por Ele desejado,
não é um coração isolado,
um coração egoísta.
Deus deseja um coração
que não venha sozinho,
mas com as flores e os espinhos
dos corações que eu amo!
Na solidão de minha cela
sinto os raios e a procela
que vejo, no mar da vida,
do amor nela inserida
que dou e recebo dos irmãos.
Solidão não é uma fuga,
nem corrida para o pódio,
não é gana, não é ódio.
A verdadeira solidão
é uma tática do coração,
uma pausa na escuridão,
para que a luz divina do amor
aos amigos e inimigos
possa brilhar na imensidão!
06/11/2014
A-136
Lírios, sim,
mas plantados, um a um,
num canteiro de espinhos!
Lírios, sim,
mas envoltos, um a um,
num laço de carinho!
Às vezes me pergunto:
“Por que escolhi esse caminho?”
Às vezes me dizem
que vivo em louco destino!
A pureza dos lírios
sobe até o paraíso!
A rudeza dos espinhos
às vezes me rouba o sorriso!
A paz que me envolve sobremaneira,
a simplicidade que me chega sorrateira,
como o dia radiante,
após a noite hesitante!
Artigos em profusão
atacam essa virtude!
Não conhecem a unção,
a alegria, a beleza, a atitude
da pureza de coração!
A brisa roça no meu rosto,
no sol quase posto.
Ergo aos céus minha alma,
sinto em mim muita calma,
agradeço a Jesus
tanta paz,
tanta luz!
(15/02/15)
A-155
Águas passadas
não movem moinho;
filhotes já com asas
não voltam ao seu ninho;
mas eu insisto em pensar
no que me fez chorar...
O passado já não existe!
Já foi, já era, acabou!
O meu, porém, insiste,
quer ele retornar
ao mesmo banco que me deixou
Não posso esquecer-te,
não quero de ti me afastar!
Poderia, talvez, deter-te!
Mas prefiro continuar a sonhar
com tudo o que fizeste por mim
naquele banco de jardim!
(08/04/15)
A-169
Alegria imensa
de se saber amado por Deus,
tristeza intensa
pelos pecados que cometeu,
assim é aquele eremita,
assim são todos os demais
que têm a ala aflita
por amarem cada vez mais
a Deus, e à sua graça bendita!
Sua vida é oração,
agradecimento e caridade.
O amor é sua opção,
sua regra é a bondade.
Seu mentor é o coração,
seu caminho é a lealdade!
Reza por tudo e por todos,
pensa no rico e no pobre:
para o rico deixar seus engodos,
e o pobre ter vida nobre.
Muitos o chamam de louco,
muitos o chamam de santo
nessa vida tão bendita.
Mas para viver esse tanto,
o nosso querido eremita
de ambos tem um pouco!
(03/05/15)
A-180
Com o leite materno,
dádiva do Eterno,
fui alimentado.
Meus pais, operários,
apenas dois mínimos salários,
por eles fui criado.
A infância, sofrida,
a juventude dolorida,
me calejaram.
Muita bondade,
muita generosidade,
meus pais me legaram!
Um bolo à tarde,
sem muito alarde,
meus pais assavam.
As visitas constantes,
algumas até maçantes,
o bolo elas aprovavam.
Os natais concorridos,
presentes garantidos,
os doces não faltavam!
O abono do fim de ano,
o 13º ainda era um plano,
comigo eles gastavam!
Nascidos meus irmãos,
com dor no coração,
com eles eu dividia!
Agora, já idoso,
fico muito choroso,
quando vejo a tumba fria!
Lá estão os meus pais,
eu não os vejo mais,
a saudade me angustia!
Mas eu os verei no paraíso,
no meu rosto, um sorriso,
encho-me de alegria!
(06/06/15)
A-189
(baseada no Adágio de Albinoni. Para ouvi-la, clique aqui: https://youtu.be/ye5JlhAyYhg
Sublime enlevo da orquestra,
em que se destacam o órgão e o violino!
No início, a harmonia atesta
que a música é algo de divino!
A dado momento, porém,
o violino se sobressai,
seguido pelo órgão também
que o contesta e o retrai
O violino, sem desanimar,
continua a sua subida,
seu som se eleva no ar,
a vida, ele a torna florida!
O órgão, mais sério,
o acompanha e o tenta inibir,
envolto num mistério,
com que ele quer subir.
Ambos chegam a um consenso
e a orquestra os sustenta;
o som harmônico é intenso,
é a poesia que o alimenta”!
No final, quase um sussurro,
o adágio cumpriu sua missão:
Tirar nossa mágoa do escuro,
e massagear nosso coração!
(18/06/15)
A-191
A paz que me envolve e acalma,
não vem da inércia negativa,
mas procede da luta da alma
contra o mal e suas investidas
É luta que refresca e anima,
é paz que me leva a Jesus,
que me envolve e encaminha pra cima,
nos acompanha na cruz!
Não estou só. Sempre comigo
estão todos os por mim amados,
aos que sempre dou abrigo,
no meu coração apaziguado.
A paz que me envolve e acalma
é fruto da graça de Deus.
Eu não mereço ganhar essa “palma”!
Não vem dos méritos meus
Você que me lê e medita,
também nela pode estar!
A paz, para uma alma aflita,
provém de orar, vigiar, amar!
(21/08/15)
A-204
A solidão apavora,
devora,
deprime!
A solidão só não apavora
quando a sede que devora
se sacia no sublime!
Meu coração chora,
ao Senhor implora,
de tudo se redime!
Na solidão busco abrigo,
ninguém comigo,
a não ser o Altíssimo!
Sou sacerdote dele,
permaneço nele,
amor tão caríssimo!
Tudo me some de vista,
ele me reconquista
a cada instante!
Tudo o mais é secundário,
quando, diante do sacrário,
nada há que mais me encante!
No silêncio do meu nada,
sigo a minha estrada
em sua presença operante!
(01/09/15)
A-209
O vento que me acaricia a face
leva consigo minhas tensões...
Sinto-me caminhando nas nuvens,
Deus me envolve totalmente.
A tarde amena, quase no final,
sacia minha sede de amor,
me une a esse Deus tão maternal,
que me ama com ardor.
Abandono o passado, ignoro o futuro,
tudo o que eu vejo é o agora salutar.
A alegria toma conta do meu íntimo,
mas não a quero revelar!
Quero capturá-la qual perfume,
com ela untar todo o meu corpo,
lubrificar as dobradiças de minha mente,
massagear o coração!
Meu universo se abre à minha frente,
muito maior que o pátio em que estou.
Vejo-me sozinho em meio a tanta gente,
como eremita, a quem nada mais restou!
Minha solidão me faz feliz,
porque nunca estou sozinho!
“Estou contigo!” - Deus me diz,
e a vocês todos, eu os encontro pelo caminho!
04/12/15-
A-237
Dos desertos que já fiz
de dois deles não me esqueço:
fizeram-me feliz,
e isso não tem preço!
Um deles foi no Saara,
numa abadia emergida
da arreia, coisa tão rara,
que solidão tão querida!
Areia, calor e suor,
bisturis que me dissecaram,
fazendo aflorar todo o amor
que os mistérios de Deus me mostraram
O outro foi numa praia,
sem casas, sem gente, sem nada,
só mato, areia e uma arraia
sem vida, ali mesmo deixada.
A sensação foi igual
à que tive lá no deserto!
Areia ou mar, tudo é sinal
de que Deus está tão perto!
No deserto, solidão silenciosa,
no oceano, solidão barulhenta.
Ambas são capciosas,
a quietude me alimenta!
Mas o deserto do dia a dia
a dizer sou o primeiro:
não traz nenhuma poesia,
mas é o deserto verdadeiro!
19/12/15-
A-243
Olho ao redor e já sinto saudades
da vida tão simples que aqui eu vivi,
no anonimato e na simplicidade,
e das muitas graças que aqui recebi.
Daqui me retiro com muita esperança,
volto à cidade onde cresci!
Muitas das coisas já me vêm à lembrança,
os desígnios divinos, nunca os entendi!
Só peço a Deus, pela Virgem Maria,
poder recomeçar meu itinerário,
com santidade e com muita alegria,
da messe divina, fiel operário.
Mais alguns meses e me mudo daqui,
Mas o amor de Jesus, eu nunca esqueci.
09/02/16
A-252
Como o ouro quase tão pura,
a areia do deserto ao sol brilhava;
o irmão Carlos, tão simples criatura,
em Assekrem, vendo o ocaso, meditava!
No mundo quase não há pôr-do-sol
como em Assekrem, tão lindo!
Ele funciona como um farol
que mostra de Deus, o amor infindo!
Deixando, porém, esse ocaso maravilhoso,
o Irmão Carlos, com muita alegria,
encontrava seu momento mais saboroso
na adoração constante da Eucaristia.
Meu Deus, criastes tudo o que existe!
Vistosos e ricos elementos!
Mas o bem mais precioso consiste
no Santíssimo Sacramento!
29/02/16
A-258
Seja bem vinda, dona alegria,
a este meu triste coração!
Exerça em mim sua magia,
faça de mim seu pobre irmão!
O mundo me causa tristeza,
o egoísmo me faz sofrer!
Tira do ser humano a beleza,
impede-nos qualquer renascer!
Que sua presença, dona alegria,
nos leve a amar o irmão,
envolva a todos de euforia,
a todos dê um novo coração!
06/03/16
A-259
A vida, intensa correria,
fazer nada...nem pensar!
Mas sempre chega aquele dia
em que nos obrigam a parar!
A angústia me reveste o coração,
o tempo se recusa a passar!
Onde colocar as mãos?
O que fazer? Não posso parar!
Jesus me fez dar uma brecada,
paro, no tempo e no espaço.
Tento descobrir aqui suas pegadas,
acomodo-me em seu regaço.
Dificulta-me contemplar
quão terrível é o deserto!
Um imenso espelho em que nos mirar,
torno-me nele um livro aberto!
17/04/16
A-270
(Para ouvir essa música clique aqui: Meditação, de Thaís. Eu não encontrei para órgão).
O som do órgão maravilhoso,
tocando “meditação”, na tardinha,
levava-me ao Senhor tão bondoso,
na minha natal cidadezinha.
Jovem e aventureiro, com certeza,
fim de semana familiar,
a despedida, uma tristeza,
deixando minha casa, meu lar,
voltava à capital, à sua grandeza.
Acordes finais nas cores da tarde,
o último amém em minha oração,
lágrimas enxugadas, sem alarde,
meu corpo partia, ficava meu coração.
Fim de domingo.
No silêncio do meu quartinho
enxugo as lágrimas de saudade.
Peço de Deus o carinho,
e durmo, na sua bondade.
27/05/16
A-278
Minha casa é como um mosteiro
onde eu me encontro com Deus!
Nele penso o dia inteiro,
ele ouve os rogos meus!
Qualquer lugar pode ser
um bom e saudável deserto!
Basta que possamos sempre ter
a presença de Deus bem perto!
Tudo o que penso e almejo
nem sempre me convém!
Quero que o meu desejo
seja o mesmo que Deus tem!
O barulho me incomoda
a perda de tempo também!
Quase nunca sigo a moda,
pois é Deus que me mantém!
07/06/16
A-279
O silêncio exterior
escancara o louvor
de todos os corações!
São murmúrios suaves,
pendências e entraves
que brotam aos borbotões!
O silêncio é eterno,
é o veículo Paterno,
que nos fala em efusões!
Os problemas se declinam,
as virtudes se atinam,
no ardor das orações!
Eu vos peço, meu Senhor,
concedei-nos o vosso amor,
sejam muitas as unções!
04/07/16
A-287
Instantes mágicos que de Deus me aproximam,
momentos sublimes de amor e de unção;
minutos felizes que muito me ensinam,
celeste harmonia que me envolve o coração!
Assim é essa força impregnada de amor,
que do sacrário ao redor se irradia!
Não ser pode ver nem luz, nem calor,
mas minha alma, cheia de ardor, se extasia!
Pudera eu, com esta humilde poesia,
mostrar todo o encanto desta hora tão santa!
Jesus, no sacrário, é perene alegria,
é força inefável, é a esperança que canta!
02/08/16
A-294
O carro quebrou, a ponte caiu,
o tempo fechou, não posso partir.
A porta que ontem se abriu
fechou, vai demorar-se a reabrir.
Entre pessoas que não conheço,
não sei que atitude tomar!
Lá longe, meus filhos, que nunca esqueço,
pensam que vou logo chegar.
Peço a Deus que me ajude,
que me abra um largo caminho,
que me dê muita virtude,
que nunca me deixe sozinho!
Na solidão, entre dezenas,
não pude dizer adeus!
Consigo dizer apenas:
“Senhor, cuida de mim, sou teu”!
28/08/16
A-306
Rumores de vozes me cercam,
risos e músicas doídos,
sufocam-me e me apertam,
sorrisos e acenos fingidos!
Caneta e papel me são dados,
encontro um calmo cantinho.
Escrevo em prosa e versado,
ali permaneço quietinho.
Os ruídos continuam, fortemente,
mas meu coração se aquieta.
Coloco um aviso em frente,
“Ninguém incomode o poeta”!
13/10/16
(de alguém que voltou a ser católico)
A-327
As lágrimas da sua face
são de plena alegria!
Finalmente um desenlace
o faz voltar à Maria!
Foram tantos anos ausente
da romana e santa religião.
Agora ele se faz presente
tanto de alma como de coração!
Quanta saudade da Mãe de Deus,
Quantas lembranças tão queridas!
Na infância dos anos seus,
Ela lhe dava muita guarida!
Por puro e imbecil orgulho,
por falta de compreensão,
em Lutero deu um mergulho,
magoou o Imaculado Coração!
A Mãezinha o recebe voltando
ao berço de sua alegria.
Seu coração está gritando:
“Sois minha mãe, ó Maria”!
23/10/16
A-329
O silêncio é pesado e dolorido,
até hoje o porquê não sei!
É sempre desprezado, preterido,
confesso que nem sempre o amei.
Foucauld, na solidão do Saara,
no silêncio encontrava Deus!
No silêncio que me agride e me pára
Às vezes só encontro os ruídos meus!
Na solidão desta manhã agradável
busquei silenciar meus ruídos,
procurei encontrar meu Deus amável,
mas permaneci nos meus próprios zumbidos!
Esta poesia saiu de improviso
quando eu tentava me silenciar...
As palavras me atacaram sem aviso,
perdoem-me! Vou tentar me calar!
(Sobre o G.M.A.)
26/10/16
A-332
Amigos que partem deixam saudade,
amigos que morrem deixam muito mais!
Tenho um amigo esmerado na bondade,
deixou o mal há muito tempo atrás.
Hoje nos despedimos, lágrimas na face,
está desenganado, logo vai morrer.
Antes que se dê o triste desenlace,
não mais nos veremos, enquanto ele viver!
Apenas no céu nos encontraremos,
daqui a dez ou vinte anos? Não sei!
Apenas sei que cremos no Deus supremo,
nenhum outro valor no mundo eu encontrei.
Adeus, querido amigo!
A ti, muito obrigado!
Só em Deus se encontra abrigo
para o coração estraçalhado!
(ele faleceu em 08/11/16).
11/12/16
A-345
A tarde, cansada e pachorrenta,
é a própria imagem do meu coração!
De Deus minha alma está sedenta,
simplesmente olho as nuvens, sem outra ação.
O dia foi pesado e aborrecido,
muitas coisas pediam minha atenção.
Diante de Deus me sinto fortalecido,
quero curtir esta hora de solidão.
O silêncio me transporta ao paraíso,
a tarde sisuda me leva a Jesus!
Quando ele vem sem qualquer aviso,
plenifico-me todo com sua luz.
Quando ele se oculta eu me sinto carente,
busco a Palavra nas Santas Escrituras,
pois mesmo quando ele parece ausente,
permanece no íntimo das criaturas.
Peço ao Senhor, sem nunca me cansar,
que nunca me prive de sua presença!
Que ele me faça sempre o amar,
que nunca me atinja a indiferença!
07/08/17
A-354
Gente apressada,
dia calmo, céu limpo,
dependência pública lotada,
espero minha carona.
Por longo tempo esperando,
nada a fazer, apenas contemplo!
Quanta coisa estou deixando!
Pra estar à toa nunca acho tempo!
O pior de tudo é que eu estou gostando!
A natureza, temperatura amena,
tudo está colaborando!
Aqui minha vida parece tão serena!
Corremos demais!
Nos ocupamos demais!
Nunca ficamos à toa
para contemplar o nada!
Nossa, que coisa boa!
19/12/17
A-359
Um copo simples,
cerveja espumada,
copo suado,
duas lágrimas solitárias
descendo pela face que o segura...
A frágil mesinha,
sustentando seus cotovelos,
também sustenta sua tristeza...
Suas mãos,
espalmando seu rosto,
sentem o leve tremor
causado pelo pranto contido.
Despedida...
saudade antecipada,
memórias vivas do passado,
que agora termina.
O futuro se descortina,
mas é um imenso vazio!
É uma tela branca,
nela nada se vê...
Apenas algumas nuvens,
de chuva ou de poluição?
Ainda não se vislumbra...
Apenas uma esperança,
uma réstia de luz,
uma suave melodia
no silêncio do nada.
O copo de cerveja já está vazio,
o momento de ilusão terminou,
esse momento de paz
quão pouco durou!
Ele já se foi.
A mesinha, ainda tristonha,
é despojada de seus adereços,
se esvazia,
e nada mais lembra
da triste agonia
que há pouco presenciou.
Um copo de cerveja,
em cima da mesa,
não é uma certeza,
mas pode sugerir a solução!
(01/01/2028)
A-360
A solidão deprime,
reprime a Consolação...
A solidão devassa,
arrasa o coração...
Com Jesus na cruz,
com Pedro em seu pecado,
com o rico traído,
com o menor abandonado...
Nos hospitais é a grande dama,
reina em toda cama!
Nos asilos, no envelhecimento,
ela ataca a todo momento.
Na mesa do bar
aperitivo principal,
escurece todo horizonte,
sangra o melhor jornal.
As músicas ela entristece,
não suporta o “allegro”,
só aceita a “Tristesse”,
ou de Albinoni o “Adágio”.
Ó solidão, minha amiga!
Não se faça de rogada!
Se não fosse sua cantiga,
Eu não escreveria nada!
12/03/2018
A-361
O caminho é de pedras
que ferem os meus pés.
O horizonte é sombrio,
esconde a esperança!
O sol, escondido,
recusa-se a me aquecer.
O frio de minha alma
congela-me o coração.
Nada à vista,
nenhum pássaro,
nenhuma flor,
nenhuma árvore.
O único Oásis
que vejo possível
é teus braços,
que me amam,
que me confortam!
03/05/2018
A-362
No inverno, alegrias rarefeitas...
No verão, tristezas imensas...
Nada mais me alegra!
O mundo vomita cicuta,
a política se disputa,
mas você pode escolher o seu gênero...
Nada mais é preciso,
tudo se torna indeciso,
não sei se estou no verão ou no inverno!
Lembro o colo materno,
a segurança ingênua,
a bondade particularizada!
Os corações se esclerosaram,
as compras se endeusaram,
abundou-se a tristeza!
Muitos comem enfastiados,
outros lutam desgraçados,
não conseguem pão na mesa...
Aparições de Maria,
acabou-se a guerra fria,
previsões de holocaustos...
Enquanto isso, no notebook,
sentado numa cadeira,
eu simplesmente escrevo,
ao lado de um copo de uísque...
22/05/2018
A-363
A luz do sol
violenta aquela sala,
se reflete num copo vazio de uísque,
esquecido no tapete,
e repousa sobre um jovem,
adormecido,
que jaz no sofá, ainda bem vestido,
como se fosse a um encontro.
O dia, recém chegado,
deletou de sua mente
os últimos lampejos,
embriagados,
das apaixonadas ilusões
ainda da noite agitada,
que acabara de falecer.
Se ainda restasse alguma esperança
naquele angustiado coração,
estaria adormecida,
ou, por que não dizer,
arrefecida!
No celular,
jogado no canto do sofá,
ainda estava ativa
uma mensagem dolorida:
“Carlos, me esqueça”!
“Não dá mais”!
22/02/2019
A-367
Como as nuvens que passam,
passam e não voltam,
foi minha infância querida.
Nuvens claras,
nuvens de tempestade,
nuvens trovejantes,
todas elas já passaram,
algumas deixaram marcas,
marcas indeléveis,
que mais aumentam a saudade.
Crianças e jovens me olham,
acham que já nasci adulto,
que nunca fui criança,
que nunca passei pelo que agora passam.
Alguns não ouvem,
não querem escutar,
querem fazer o próprio caminho,
e, decerto, vão tropeçar,
vão cair,
vão se enlamear,
espero que possam se levantar.
Minha infância,
fase tão querida,
quanta coisa linda,
flor que agora murchou,
enrugou,
embranqueceu,
encheu-se de manchas,
limitações,
apuros para subir no ônibus,
para enxergar seu destino,
para cruzar a rua.
Virei diminutivo:
mãozinha para tirar digital,
cabecinha para cortar o cabelo,
cabelinhos brancos,
pezinho para experimentar o sapato,
bracinho para tirar a pressão,
comidinha para o almoço,
leitinho para o desjejum...
Um dia eu fui criança!
Brinquei, briguei, me sujei,
me lavei, respondi mal,
xinguei,
gritei onde não devia,
chamava N. Senhora de “Apatatida”,
e cheguei à reta final.
Quão longa será?
Não sei.
Talvez seja também uma “retinha”.
(Talvez 2011)
(Pequena brincadeira poética)
A-399
O silêncio da noite
Agride a mente
Com lembranças doloridas
De uma vida que se esvaiu.
O silêncio da noite
torna presente
As lembranças queridas
Da alegria que partiu
São dois mundos distintos,
São facas cortantes,
Inquilinos que habitam
E fatiam seu coração.
Ora um, ora outro,
Disputam, intermitentes,
Qual lhe chamará a atenção.
Numa síntese forçada
Por lutas embalada,
Ele assume a direção.
Nem dores, nem alegria,
Nem guerra, nem harmonia
Poderão assaltá-lo.
Apenas fecha os olhos
E degusta o silêncio,
Até o sono desligá-lo.