2.2.3. Ensino Aplicação e Andragogia

Desde sua criação, a Enap orienta-se pelo “ensino de aplicação”, metodologia de aprendizagem inspirada no socioconstrutivismo15 educacional, que consiste em promover a aprendizagem por meio da aproximação dos alunos às situações concretas da prática governamental, incorporando os saberes que dispõem em função de sua vivência. Os alunos são levados a analisar, a compreender, a distinguir e a avaliar os conceitos e preceitos da administração pública e do seu papel profissional, para (re)elaborar o conhecimento sobre o contexto complexo da ação governamental e decidir sobre como agir e interagir em situações concretas.

Sem defender um modelo fechado, porém inspirada na rica experiência brasileira de educação de adultos, a Enap incorpora contribuições da Andragogia, que é a ciência de orientar adultos a aprender, segundo a definição cunhada, na década de 1970, pelo educador Malcolm Knowles16. Ele explicita cinco pressupostos que devem ser considerados na educação de adultos:

  • Autonomia: o adulto é capaz de tomar suas próprias decisões e de se autogerenciar.

  • Experiência: a experiência acumulada pelos adultos que serve de base para o aprendizado de novos conceitos e novas habilidades.

  • Prontidão para a aprendizagem: o adulto tem maior interesse em aprender aquilo que está relacionado com situações reais de sua vida.

  • Aplicação da aprendizagem: o adulto busca aprender ou favorecer a aprendizagem daquilo que possa ter aplicação. Tal fato fomenta a preferência pela aprendizagem centrada em solução de problemas.

  • Motivação para aprender: os adultos são mais afetados pelas motivações internas que pelas motivações externas.

Em suma, o aluno adulto precisa saber por que ele precisa daquele conhecimento; aprende com a experiência; encara a aprendizagem como fonte para solução de problemas e aprende melhor quando o conhecimento gera valor a curto prazo. Em alinhamento com os pressupostos da Andragogia, a Enap utiliza metodologias e abordagens para trabalhar a realidade do aluno e suas necessidades profissionais para que se possa aplicar o conhecimento adquirido.

A concepção de “aprendizagem experiencial” 17, proposta por David Kolb em 1984, também é inspiradora das práticas educacionais na Enap. A partir dessa abordagem, foi incorporada a noção dos diferentes estilos de aprendizagem do aluno adulto, que fundamenta a busca constante pela diversificação de abordagens e métodos didáticos para a capacitação e desenvolvimento dos agentes públicos. Para o autor, “aprender é um processo contínuo e ascendente, impulsionado pela experiência(...). O ciclo de aprendizagem envolve experiência concreta, observação reflexiva, conceituação abstrata e experimentação ativa”.

A partir dos referenciais educacionais supramencionados, destacam-se como metodologias/abordagens educacionais praticadas na Enap: Aprendizagem Baseada em Problemas18, Aprendizagem Significativa19, Estudo de Casos, Aprendizagem Imersiva20, Visitas Técnicas, Gamificação21, Aprender fazendo22, Sala de Aula Invertida23, Aprendizagem entre pares24. Destaca-se que, na Aprendizagem Baseada em Problemas, o aluno é confrontado com situações - problema que, no âmbito da educação corporativa, devem ter significado para o seu contexto profissional, ou seja, as situações-problemas devem ser reais ou passíveis de acontecer. O problema é o ponto de partida para a construção de novos conhecimentos.

As estratégias educacionais podem ser utilizadas para criar situações de aprendizagem totalmente personalizadas. Para facilitar esse processo, a Enap valoriza a utilização de metodologias ativas e ágeis em suas ações de ensino e eventos educacionais. As metodologias ativas25 são aquelas que valorizam a participação efetiva dos alunos na construção do conhecimento e no desenvolvimento de competências, possibilitando que aprendam em seu próprio ritmo, tempo e estilo, por meio de diferentes formas de experimentação e compartilhamento. Nesse contexto, as metodologias ativas constituem alternativas pedagógicas que colocam foco no aprendiz, envolvendo-o na aprendizagem por descoberta, investigação ou resolução de problemas (BACICH; MORAN, 2017). Reflexão e ação são os alicerces fundamentais que sustentam as metodologias ativas26.

As metodologias ágeis, por sua vez, contemplam as práticas educacionais com objetivo educacional de curto prazo. O foco das metodologias e ferramentas ágeis é a gestão do tempo na educação. Pode-se citar como exemplo, microlearning27, cuja tradução livre pode ser microaprendizagem.

Em suma, a problematização, a indagação, a realidade prática e o aprendizado centrado no aluno, ao longo da formação, são abordagens essenciais para o processo de ensino, pesquisa, gestão do conhecimento e as demais ações desenvolvidas na Escola. Ademais, a Enap tem tradição na realização de intercâmbios com escolas nacionais e estrangeiras, fonte para renovação das concepções e das práticas educacionais. O propósito é transformar conhecimento em reflexões que resultam em ações práticas e no repensar da administração pública para que as políticas públicas sejam mais aderentes às necessidades da sociedade.





15 O socioconstrutivismo e o “ensino aplicação” correlacionam-se com as ideias de Vygotsky. Cabe ressaltar que na base de sua aplicação encontram-se, também, pensadores construtivistas como Piaget e fenomenologistas como Dewey e Heidegger. Incluem-se também as contribuições de educadores que refletiram sobre o ensino e aprendizagem de adultos como Paulo Freire e Scott Gray. 16 Definição retirada do livro “Andragogy in action: applying modern principles of adult education”. KNOWLES (1984). 17 A Teoria da Aprendizagem Experiencial de Kolb define que "o processo pelo qual o conhecimento é criado acontece por meio da transformação da experiência. O conhecimento resulta da combinação de se obter e transformar a experiência". KOLB (1984).18 Aprendizagem Baseada em Problemas ou PBL (abreviação do termo em inglês Problem-based Learning) é uma abordagem que emprega situações-problemas para a aprendizagem de novos conhecimentos. É adotada por grupos de alunos que trabalham em forma individual e coletiva para criar soluções para um problema apresentado. Definição retirada do glossário do Livro “Metodologias Inov-ativas”. FILATRO e CAVALCANTE (2018). 19 Aprendizagem significativa é o conceito central da teoria da aprendizagem de David Ausubel. Segundo Marco Antônio Moreira, “a aprendizagem significativa é um processo por meio do qual uma nova informação relaciona-se, de maneira substantiva (não-literal) e não-arbitrária, a um aspecto relevante da estrutura de conhecimento do indivíduo”. Em outras palavras, os novos conhecimentos que se adquirem relacionam-se com o conhecimento prévio que o aluno possui. Livro: Aprendizagem Significativa, MOREIRA (2012).20 Aprendizagem Imersiva. Segundo os pesquisadores Sherman e Craig, o termo imersão significa a sensação de presença em um ambiente específico, seja real ou virtual. Livro “Understanding virtual reality: interface, application, and design”, KAUFMANN (2003).21 Gamificação é a utilização da linguagem dos jogos em outros contextos. Definição retirada do glossário do Livro “Metodologias Inov-ativas”. FILATRO e CAVALCANTE (2018). 22 Aprender fazendo (learning by doing): Teoria exposta por John Dewey, que defende que o aprendiz deve interagir com o ambiente para adaptar e aprender. O Filósofo Americano via a educação como um processo de reconstrução e reorganização das experiências adquiridas que podem influenciar as experiências futuras. 23 Sala de Aula Invertida (flipped classroom) é uma estratégia educacional em que o aluno estuda o material antes da aula presencial, para que se leve a sala de aula dúvidas e discussões. Definição retirada do glossário do livro “Metodologias Inov-ativas”. FILATRO e CAVALCANTE (2018).24 Aprendizagem entre pares (peer to peer): estratégia na qual fins educacionais são obtidos por meio de interação entre indivíduos que têm um ou mais elementos em comum tais como posição, interesses, idade, local de trabalho entre outros.25 Definição retirada do livro Metodologias Ativas para uma educação inovadora: uma abordagem teórico-prática. BACICH e MORAM (2017).26 Segundo Bonwell e Einson, são aspectos fundamentais das metodologias ativas: ação e reflexão. BONWELL, C.C.; EISON,j. Active learning : creating excitement in the classroom, 1991.27 Microaprendizagem (microlearning) é a estratégia que apresenta conteúdo em pequenos “pedaços”, com alto nível de interação e feedback. Livro “Metodologias Inov-ativas”. (FILATRO; CAVALCANTI, 2018).