Petróleo - Indústria intrinsecamente poluidora - parte 3

Os riscos ambientais do pré-sal

e os ocasionados pela geologia específica da costa brasileira

Muito tem se discutido economicamente sobre o pré-sal, até em receitas que ainda nem se concretizaram, mais um tanto da viabilidade dos campos mais profundos, porém, até agora pouco foi tratado dos seus impactos ambientais, devendo passar a este assunto importante na agenda do governo.

caroldaemon.blogspot.com.br

Os riscos “clássicos”

Apesar do uso de alta tecnologia já existente e por desenvolver na exploração do pré-sal, é inevitável que ocorram vazamentos de petróleo nos equipamentos e instalações, ao modo do que ocorreu no ano de 2010, no Golfo do México.

Este vazamento, mundialmente noticiado e acompanhado, essencialmente ocorrido em equipamentos acarretou perdas irreparáveis para todo os ecossistemas da região. Por similaridade, a exploração do pré-sal no Atlântico a leste do Brasil implicará em similares possíveis vazamentos de óleo com efeitos na costa brasileira, em especial com prejuízos de difícil e cara remediação para a fauna e a flora do litoral do sudeste e sul brasileiro.[1]

O país em todos os seus níveis de organização e as empresas que vão operar na extração de petróleo da camada do pré-sal, com reservatórios situados quilômetros abaixo do solo, terão que se adequar a um nível de controle de risco ainda inexistente.

Tais alterações em relação aos padrões offshore convencionais porque, em se tratando do cenário pré-sal, não há como ter-se respostas rápidas, nem identificar com facilidade as origens de possíveis acidentes. Detalhando, não pode-se considerar que, em caso de vazamento, uma empresa faça um trabalho de dispersão e considerar-se que posteriormente parte do óleo será absorvido pelo ambiente, pois nas dimensões do pré-sal, isso não é aceitável.[2]

Os riscos geológicos inéditos

Tem-se de entender também que as camadas perfuradas continuem parte de uma parte da crosta terrestre que está sendo estirada, tracionada pela placa da América do Sul, produzindo a permanente fragilização dos materiais que formam os reservatórios do pré-sal.[4][Nota 1][Nota 2]

Formação dos continentes há 122 Milhões de Anos a.C. Reconstrução Paleogeográfica - Aptiano.[10]

Estudos feitos pelas empresas antes de iniciar as perfurações, por mais complexos e detalhados que sejam, não são garantia total no momento da perfuração. Há pesquisas realizadas sobre o solo da Bacia de Campos que já chegaram a custar 70 milhões de dólares em casos extremos, sendo preciso ter o máximo possível, mas não podendo-se ter 100% das informações necessárias. Devido à quantidade de camadas de rochas, sobrepostas, torna-se impossível recolher amostras de todos os pontos.[2]

As rochas perfuradas na exploração do petróleo pré-sal foram formadas por deposição de material de oceanos e mares primitivos e podem ter quilômetros de extensão. Os estudos feitos recolhem recolhe amostras dessas rochas para estimar sua composição e propriedades, estando a dificuldade no fato de que ela pode ser estável em um ponto e apresentar fraturas e instabilidade em outro. Cada fratura na rocha pode provocar migração de fluidos e redistribuição de pressões. Se a rocha tiver direção preferencial do fraturamento, um trajeto onde ela seja mais frágil, pode continuar se fraturando naquela direção por longos trechos.[2]

Seção geológica na bacia sedimentar contendo o petróleo pré-sal.[10]

Quando se realiza a perfuração perfuração, são injetam-se fluidos de perfuração cuja finalidade é manter a estabilidade do poço. A pressão desses fluidos é outra questão complexa. No caso de aplicação de uma pressão muito baixa, o fluido da rocha pode entrar no poço. No caso contrário, de pressão excessivamente alta, a rocha pode fraturar-se. Com a ignorância das propriedades das rochas que serão perfuradas, e sua distribuição e homogeneidade, a situação se complica tremendamente.[2]

O vazamento da Chevron em novembro de 2011, que resultou no vazamento de 3.700 barris, noticiado amplamente pela imprensa dia 15 havia sido descoberto no dia 4 do mesmo mês. Havia a suspeita, então, de que uma fissura em uma região próxima ao poço onde ocorreu o primeiro problema, no Campo de Frade, teria sido a origem do afloramento do petróleo. Fontes que acompanhavam o caso apontavam para a existência de afundamento do solo e fissuras na rocha num raio de 3,5 quilômetros no entorno da plataforma, com indicações da possibilidade de ocorrer uma série de vazamentos na região.[2]

A Chevron informou que decidiu suspender a exploração no Campo de Frade por precaução, por tratar-se de “uma área complexa”, passando a pretender obter posteriormente mais dados do terreno, de onde então extraia 61,5 mil barris de petróleo por dia.[2]

Questiona-se se o modelo de exploração permitiria a ação de fissuras geológicas sensíveis a abertura de poços como aconteceu com a Chevron. Na avaliação da própria Petrobras, a exploração do pré-sal é um desafio tecnológico inédito não só por exigir a construção de poços que atravessarão cerca de 2 mil metros de sal, como também por constituir-se reservatórios formados por rochas ainda pouco conhecidas na indústria petroleira. A camada de sal sob alta pressão e temperatura se comporta como um material plástico, o que torna complicado garantir a estabilidade das rochas, que podem fluir e impedir a continuidade da perfuração dos poços e sua produção.[3]

A posição no campo legal

Por estas questões de desafios tecnológicos da profundidade do petróleo existente na camada pré-sal, sua exploração deve ser acompanhada pelo Direito Ambiental, onde certamente novos instrumentos legais serão necessários como proteção do meio ambiente. Há a presença de conceitos completamente diferentes do que tenha sido até então segurança na exploração offshore. Por comparação, pode-se dizer que atingir-se-á os níveis de segurança da aviação, que recorre a vários sistemas de redundantes, registro de operações e a busca de erros estatísticos nulos.

O governo ainda mantinha pendente em 2013 o anúncio do Plano Nacional de Contingência para Acidentes de Poluição por Óleo em Águas Sob Jurisdição Nacional, aprovado por lei 13 anos antes, que estabelece responsabilidades e atribuições para cada diferente setor governamental ou privado quando houver vazamentos. É um planejamento detalhado da atuação de cada um dos órgãos que devem ser envolvidos em caso de vazamento de óleo, cabendo à Marinha interditar o tráfego de embarcações nos arredores do local do acidente, à À ANP o acompanhamento operacional da contenção, aos ministérios da Pesca e do Turismo, bem como ao Ibama, ter suas atuações detalhadas, pois o derrame pode comprometer a atividade pesqueira e turística. Um grupo de trabalho chegou a ser montado em 2010, após o grande acidente da BP no Golfo do México[Nota 3], mas a inércia das autoridades impediu que ele fosse à frente.[5]

O atendimento ao incêndio do vazamento da BP - blog.thereadyproject.com.

Este plano possui como partes planos de contingência locais e regionais, cuja consolidação é necessária a sua implantação, previstas pela Lei do Petróleo e fundamentais para atribuir as responsabilidades para cada setor. Este plano era previsto já na Lei nº 9.966, de 28 de abril de 2000, e seria adotado em acidentes de maiores proporções, nos quais a ação individualizada dos agentes envolvidos não se mostrasse suficiente para a solução do problema. Esse plano complementaria e consolidaria as ações do Plano de Emergência Individual (PEI) e do Plano de Área (PA). Este plano é necessário não apenas para enfrentar-se acidentes de grandes proporções, mas também garantindo estrutura e governança adequadas no momento de acidentes que possam prejudicar outras atividades econômicas, tais como o turismo, a pesca e até mesmo os serviços relacionados aos ecossistemas e na proteção de espécies, nos serviços ambientais prestados pelos territórios costeiro e ambiente marinho. Após seu anúncio, tonam-se difíceis justificativas para falta de prudência ou agilidade em caso de acidentes.[6][7][8]

Planos de Contingência e Planos de Emergência devem ser acessíveis à comunidade em geral e sua eficácia constantemente avaliada pelo Poder Público.[9]

O Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EPIA) apresenta-se como mecanismo adequado na mensuração do impacto advindo de uma nova atividade petrolífera, sendo certo que outros estudos que o substituam são inviáveis do ponto de vista legal e ambiental. É de se observar que um estudo deve ser feito para cada caso e não por região, como tem sido pretendido, não havendo acolhimento jurídico para tal proposta.[9]

A Lei nº 12.351/2010, de 23 de dezembro de 2010, trata da exploração e produção de petróleo sob o regime de partilha de produção em áreas estratégicas e da camada pré-sal, e instituiu a obrigatoriedade de apresentação de inventário periódico sobre emissões de gases que provocam estufa. Existe também a previsão legal de auditoria ambiental em todo o processo de retirada e distribuição de petróleo proveniente das reservas pré-sal e a meta de criação de fundos para investimento em pesquisa e tecnologia para a inserção de energias renováveis em maior escala na matriz energética nacional.[9]

Notas

1. Uma observação sobre um engano comum

Alguns textos abordam que a exploração do pré-sal deixará espaços vazios em “forma de cavernas”, susceptíveis a abalos sísmicos, que até produziriam tsunamis. Taios afirmações são um erro até pelo conceito de como seja um reservatório de petróleo e gás, que não é uma caverna, e sim, um material poroso. Outro erro é achar que o petróleo e o gás são retirados de lá deixando um vazio - leia-se vácuo - quando na verdade recebe o gás de cima para baixo - natural ou injetado, quando se usa dióxido de carbono, ou “empurrado de baixo para cima por lençois de águas subterrâneas, como os aquíferos, ou mesmo por injeção de água. Logo, o espaço dos poros não fica vazio, e sim, é repreenchido.

2. Os continentes americano e africano formavam um super continente, chamado Gondwana, há aproximadamente 122 milhões de anos.

Intensas movimentações no interior da crosta terrestre causaram a divisão do Gondwana. Ao longo da fratura que se estabeleceu entre os novos continentes, desenvolveu-se uma estreita e longa bacia sedimentar, que evoluiu de um lago, onde se depositaram sedimentos ricos em matéria orgânica no seu fundo, para um golfo alongado com a entrada do mar (predecessor do Atlântico Sul). Neste golfo circulavam águas saturadas de cloreto de sódio (sal marinho) e outros sais solúveis. Sucessivas épocas de evaporação intensa propiciaram a deposição de evaporitos (sais residuais da evaporação). Assim, atualmente uma espessa camada de sal é encontrada na margem continental brasileira e recobre sedimentos lacustres e transicionais que geraram o petróleo e o gás natural presentes nas bacias sedimentares do sudeste brasileiro.

Estas jazidas de petróleo encontram-se em rochas reservatórios imediatamente abaixo das espessas camadas de sal em sua posição original (autóctone), isto é, in situ, numa determinada idade geológica.

Devido às características de mobilidade do sal e sob intensa pressão de uma coluna de sedimentos sobreposta (pós-sal) e ainda, em consequência de movimentos no interior da crosta terrestre (tremores, manifestações de vulcanismo, etc.) camadas de sal tendem a se movimentar ascendentemente e lateralmente (alóctones) buscando alívio de pressão, intrudindo camadas de rochas sedimentares mais novas e tomando as mais diversas formas.[10]

3. Uma citação sobre este vazamento:

“Em outras palavras, a geologia sob o fundo do mar é tão fraturada, com formações de sal macias e instáveis, que poderemos nunca ser capazes de selar totalmente o poço, mesmo com poços de alívio. Em vez disso, a perda de contenção do reservatório de óleo causada pelo acidente de perfuração de petróleo pode causar o vazamento através de escoamento pelos próximos anos.” [11]

Referências

1. Os prováveis impactos da exploração do pré-sal no meio ambiente - www.japb.com.br

2. João Marcello Erthal e Cecília Ritto;Segurança no pré-sal preocupa especialistas; originalmente em Veja - www.mundosustentavel.com.br

3. Entenda o pré-sal e o esforço para tirá-lo do mar - www.conjur.com.br

4. Christian Vérard, Kennet Flores, Gérard Stampfli;; Geodynamic reconstructions of the South America–Antarctica plate system; Journal of Geodynamics, Volume 53, January 2012, Pages 43–60. - www.sciencedirect.com

5. André Trigueiro; A armadilha submarina do pré-sal - envolverde.com.br

6. DANIELLE NOGUEIRA; País não está preparado para acidentes ambientais - oglobo.globo.com

7. Acidentes com óleo em águas brasileiras serão debatidos na Comissão de Meio Ambiente - www.pvsp.org.br

8. Danielle Denny; Caso Chevron encarece pré-sal - www.advivo.com.br

9. Roseli Ribeiro; A indústria do petróleo e o frágil meio ambiente - www.observatorioeco.com.br

10. Pré-Sal - O que é geologicamente- www.ibp.org.br

11. “Geology beneath the seafloor is so fractured, with soft and unstable salt formations, that we may never be able to fully kill the well.” - oilandgasleaks.wordpress.com

Leituras recomendadas

Pré-Sal e seus desafios - www.cintec-ufs.net

Os desafios do Pré-Sal - livroaberto.ibict.br

Nanotecnologia & Engenharia de Poço - www.desenvolvimento.gov.br

R. L. C. Beltrão, C. L. Sombra, A. C. V. M. Lage, J. R. Fagundes Netto and C. C. D. Henriques; Pre-salt Santos basin - Challenges and New Technologies for the Development of the Pre-salt Cluster, Santos Basin, Brazil; PETROBRAS; Offshore Technology Conference, 4-7 May 2009, Houston, Texas - www.onepetro.org

Integrated Workflow Characterizes Campos Basin Fractured [...] - www.slb.com

C.T.Azevedo, M.A.Rosolen, J.D.H.Rocha, L.F.Neumann, R.C.L. Melo, Petrobras, Rio de Janeiro, R.J; Challenges Faced to Execute Hydraulic Fracturing In Brazilian Pre-Salt Wells; 44th U.S. Rock Mechanics Symposium and 5th U.S.-Canada Rock Mechanics Symposium, June 27 - 30, 2010 , Salt Lake City, Utah - www.onepetro.org

Basin to Basin - Plate Tectonics in Exploration - www.slb.com