A busca pela felicidade

Débora Romagnoli (Professora de Filosofia e Sociologia do Ensino Médio)

Esse tema, a busca da felicidade, assim, logo de cara, num primeiro momento, pode nos parecer mais um título de algum livro de autoajuda. Não que os livros de autoajuda não tenham a sua importância, claro que têm, mas para além do trivial, o tema felicidade é, na verdade, em última instância, o objetivo final de todos nós. Sendo assim, não parece ser uma tarefa muito fácil, essa, a nossa, enquanto seres humanos.

Como alcançarmos a felicidade em tempos tão difíceis? E ainda, o que é felicidade? Ela existe? É possível? Será que o que eu entendo por felicidade é o mesmo que todas as pessoas entendem?

Aristóteles, diferentemente de seu mestre Platão, buscou respostas sobre esta e outras questões, no mundo material. Aquele dado pelos sentidos, tudo o que eu posso ver, sentir, tocar e classificar para o meu melhor entendimento.

Pois bem, Aristóteles, representante do empirismo, via na experiência, a fonte de tudo aquilo que podíamos conhecer, desprezando as ideias inatas e perfeitas de Platão e, por isso, estava convencido de que a verdade estava no mundo e não em uma dimensão superior.

Sua metodologia baseava-se na classificação de tudo que passava, por, pelo menos, um dos cinco sentidos, ou seja, o mundo e todos os seres pertencentes a ele, assim como, na concepção de que tudo possui uma causa final. Vamos tomar como exemplo, o olho humano. Sua causa final é ver, essa função é a sua finalidade. Assim, a causa final dos seres humanos é o bem supremo que só pode ser alcançado por meio de uma vida virtuosa.

Mas como saber se minhas escolhas me levarão ao bem supremo, ou seja, à felicidade? Afinal de contas, nós não damos saltos em nossas conquistas, elas são feitas a partir de cada ação tomada a cada segundo, cada decisão abre precedentes para o meu futuro e se estamos falando da busca por uma vida feliz, agora já podemos levar em consideração o fato de que nossas ações passam pelas virtudes, segundo o que aprendemos com Aristóteles. E o filósofo nos deixou um aprendizado fantástico que está ligado diretamente aos aprendizados das filosofias orientais, assim como o Budismo, no qual, o caminho para a felicidade é o equilíbrio, o chamado “caminho do meio” que, no caso aristotélico, conhecemos por mediania, ou “continuum das virtudes”.

Estamos tratando aqui de emoções e lembrando que nossa humanidade só pode ser conhecida assim, justamente por sermos seres feitos de emoções, todas elas estão em nós. Pode parecer difícil aceitar essa realidade, mas sim, sentimos amor, raiva, gratidão, revolta, inveja, coragem, medo, vaidade, humildade e está tudo bem. Está tudo bem, na medida em que aceito cada uma delas e decido razoavelmente equilibrá-las.

Se a felicidade está numa vida virtuosa, cabe a nós estabilizarmos as nossas emoções. Por exemplo, se eu tenho muito medo de tudo, eu posso acabar sem forças para levantar da cama e enfrentar o dia, mas ao mesmo tempo, se eu for extremamente “corajosa”, posso, por exemplo, reagir a um assalto e acabar me ferindo ou até colocando minha vida em risco. É nesse ponto que conseguimos aplicar a filosofia de Aristóteles, entendendo que o medo me paralisa (covardia) e a coragem em excesso (imprudência) me coloca em risco. Então, devo buscar a virtude da coragem por meio dos hábitos equilibrados e, assim, poderei vislumbrar uma vida feliz. Até o amor, a emoção considerada mais elevada em todos nós, quando em excesso, pode se transformar em possessividade, e a falta de amor pelo outro, por exemplo, acaba me tornando uma pessoa egoísta.

As virtudes são absolutas, ou seja, não possuem o seu contrário, o que ocorre é que a sua falta ou o seu excesso podem nos desequilibrar e aí fica muito difícil conviver com as nossas emoções; mas o legado da tradição filosófica pode nos servir como uma espécie de guia, uma luz que clareia qualquer emoção para que a coloquemos em seu devido lugar.

Hoje, por exemplo, ao acordar, a saudade estava de prontidão à espera do meu despertar, mas com calma eu disse a ela que era bem-vinda e que poderia ficar por um tempo, desfrutando de minha companhia. Disse a ela, também, que talvez pudesse me ajudar a acender uma vela aos meus antepassados, a rezar por eles e que me abraçasse durante a oração, mas que não demorasse muito, pois, afinal de contas, eu tinha que dar conta dos afazeres do meu dia. E aos poucos, enfim, enquanto o Sol entrava pela janela, ela se foi e eu pude sentir uma felicidade e uma calma que só o tempo e os bons hábitos trazem.