Carta à Ernesta

Carta à Ernesta

 

Querida Ernesta,

Ainda devemos chamá-la de mamãe, vovó, bisa? Quem será você agora? Agora que está liberta de tudo que a mantinha por aqui, nosso amor e nossa lembrança serão suficientes para mantê-la unida a nós? Acreditamos que sim, queremos que sim! Talvez queira então saber como andam as coisas por aqui na sua ausência física.

Sua família está bem, continua suficientemente unida, cada um de seus filhos segue tal como era no seu tempo, ora mais, ora menos, mas parecemos sempre os mesmos. E seguimos nos recusando a dispersar, teimando nos reunir no Natal, para a sua e a nossa alegria. Nossa união nos mantém conectada a você.

Mirinho anda por aí e você deve saber mais sobre ele do que nós. Mande-lhe nossas saudades. Mariô não desiste de conhecer o mundo todo, seus joelhos reclamam, mas ela segue em frente, é guerreira. A Rê tá sumida, tá distante, mas nunca esteve tão próxima à família dela como agora. Logo, deve estar muito bem, e é isso o que importa. A Gi, ah, a Gi, continua a mesma, transbordando energia, especialmente a verbal. Não quer parar de trabalhar; não pode parar de trabalhar. Mas haverá de encontrar um substituto ao trabalho, algo que a compense por tudo. Seus filhos homens, Ernesta, serão eternamente “os meninos” para nós, embora já possam ter cartão de idoso!  Guilherminho, sempre estressado, divertido, e com um quê de garoto amoroso que tanto conhecemos. Beto, longe, mas se segurando, provavelmente só, num mundo totalmente feminino. A Kau, seu último anjo da guarda, está bem melhor, não precisa se preocupar com ela. Agora mais espiritualizada, mais descapitalizada também, mudou bastante e tem feito muito para nos manter juntos. E quanto a mim, sigo envelhecendo e tentando ser um pouco melhor do que era antes, procurando aprender um pouco de tudo, depois de ter ensinado muito pouco.

Cada um de nós, a sua maneira, tem feito o seu melhor para não desmerecer sua memória, pois, por mais que o destino tenha nos reservado histórias diferentes, no fim das contas, e para sempre, seremos sempre “os filhos da Dona Ernesta”.

Seus netos são quase todos pais e mães, e todos levam de você algo grande que se reflete ou na personalidade, ou no profissionalismo, no caráter ou na espiritualidade. Acho que não temos com o que nos preocupar com eles e seus descendentes. Caberá a eles preservar sua memória.

Seu Berçário querido segue ajudando quem a ele recorre, sob a batuta da Ma e a ajuda de todos nós. O país tá vivendo uma grande crise política e, consequentemente econômica, mas desde quando isso é novidade pra você? Quantas crises presenciou? Para quem nasceu antes da 1ª. Guerra Mundial, o que mais pode surpreender? Pobre de nós para quem pessoas como Dilma, Cunha, Lula têm alguma relevância! Tudo isso vai passar e vai continuar na mesma.

Neste Natal não temos nada a pedir, mas se existir mesmo o Papai Noel, que um dia ele nos dê uma carona – de ida e volta – para onde você estiver. Na verdade, só temos a agradecer. Passada a tristeza do momento da partida, nos restam agora o privilégio e o orgulho de tê-la tido como mãe, avó e bisavó, a saudade boa que nos faz reviver momentos inesquecíveis ao seu lado, além da eterna responsabilidade de honrar sua memória.

Fique com um abraço apertado de cada um de nós e com nosso até breve!

 

Sertãozinho, Natal de 2015