Viver é Perder

Viver é Perder

Anelê Volpe, 2022

Viver pressupõe perder. E inúmeras vezes. São tantas que quase não nos damos conta. Ainda bem! Pensar nas perdas pode ser frustrante. Já no nascimento perdemos o conforto do útero materno, e a partir daí iniciamos nossa coleção: perdemos o peito, o colo, as fraldas; mais tarde perdemos a juventude, eventualmente os pais, a boa saúde, alguns amigos, a lista é enorme.

Para compensar perdas, conquistas. O problema é que achamos que nascemos para viver a vida ideal, e qualquer desvio é considerado perda. Na verdade, corremos tantos riscos sobre os quais não pensamos, que cada dia vivido representa, de fato, uma conquista. A partir disso, toda perda torna-se insignificante. Só que não é assim que pensamos no dia a dia.

Perdas são ausências ou términos definitivos. As perdas temporárias e revertidas são apenas percalços da vida. Sem dúvida a maior delas é a morte; a mais sentida é a morte de alguém que se ama. Mas a morte é inevitável; o seu momento é que nos pega despreparados. Se todas as outras perdas parecem menores, a soma delas, ou sua intermitência quase cruel não nos deixa esquecer que somos seus sobreviventes.

Diariamente perdemos o bom humor, a paciência, a hora certa para dizer ou para calar, perdemos o fio da meada, a razão e oportunidades diversas. Perdemos também as chances de detectar as conquistas por detrás das perdas. Perda remete a algo que se tem, ou que se tinha. Algo anteriormente conquistado, consciente ou inconscientemente.

Só perde um grande amor aquele que o viveu, que o conquistou. Só perde uma grande amizade quem soube conquistá-la. E a dor da perda é proporcional ao valor da conquista. Pena que não se comemora a conquista com a mesma força com que se sofre a perda. Talvez porque, enquanto não perdemos, não damos o valor que afinal atribuímos quando chega ao fim.

Seja como for, é preciso aprender a sobreviver às perdas. Algumas delas deixam um rastro amargo. É quando perdemos sentimentos que nos são caros, como a confiança, por exemplo. Deixar de confiar em alguém ou em algo pode representar um divisor de águas na vida de uma pessoa. Perder o prazer ou a vontade de fazer algo também pode deixar a vida bem mais sem graça.

A dura realidade leva para longe as ilusões, e, quando nos damos conta, também nossa fé se perdeu no caminho. E a esperança, como diz o ditado, é a última que morre, a última que se perde. Até que esse momento fatal nos alcance, melhor mesmo é aprender a identificar e comemorar as conquistas.