Coerência e Honestidade

Coerência e Honestidade

Anelê Volpe, 2022


           É bem-sabido que muito se ensina só pelo exemplo. É o que se espera, por exemplo, de pais, mestres, governantes, autoridades civis ou religiosas. Pois são essas pessoas que costumam cobrar comportamentos, atitudes e ações de quem lideram.

         Viver exemplarmente, porém, é praticamente impossível. Mas se for para viver sem grandes feitos, fazer do seu comportamento uma contribuição para esse mundo maluco já é uma grande coisa. Nas menores coisas, no dia a dia, basta agir da forma que você mesmo gostaria que os outros agissem, com respeito, educação e coerência. Fácil, não é? Nem sempre. Reagimos quando achamos que o mundo conspira contra nós, e assim acabamos cometendo os mesmos erros que queremos combater: a intolerância, a ignorância, a estupidez.

         Escorregar uma vez ou outra também não é pecado mortal. Perder a paciência em situações estressantes, com pessoas mal educadas, pode até ser um ato didático, afinal, essas pessoas têm que aprender a se comportar bem. O mais difícil, no entanto, é a tal da coerência.

         Para ser coerente, em primeiro lugar, é preciso estar muito seguro sobre seus valores e convicções, caso contrário, qualquer vacilo já indica incoerência. Só isso já basta para fazer da coerência uma virtude difícil, pois parece haver aí um conflito: convicções rígidas indicam uma certa incapacidade para mudar de opinião, adaptar-se a novas situações, aprender, reavaliar – todas elas também atitudes virtuosas. Afinal, tudo muda o tempo todo, inclusive sua opinião sobre essas coisas.

         Em segundo lugar, a coerência exige um estado de atenção permanente. É preciso agir segundo seus preceitos o tempo todo. Sabemos que nossa vida é repleta de escapadas: às vezes bebo um pouquinho a mais, fumo escondido um cigarro, dirijo depois de beber, ofereço uma ajuda para a cerveja do guarda, olho para outras mulheres com segundas intenções, aceito um agrado daquele que vou julgar amanhã, e assim por diante. Se você aponta esses erros nos outros, jamais você poderia agir assim sob qualquer desculpa, caso queira ser coerente.

         Mas, se a coerência pode representar amarras difíceis de se aturar, ela também é absolutamente necessária. Pequenos deslizes de cada um de nós, somados, representam o comportamento de toda nossa sociedade. Evitar a todo custo essas incoerências, que parecem pequenas, mas não são, fará de você um exemplo a ser seguido, um telhado que não é de vidro, uma voz que pode ser bradada sem receio. A soma de vozes assim pode mudar o mundo.

         Você não precisa ser igual aos outros, nem convencer os outros sobre suas crenças, basta agir coerentemente. Se você estiver realmente convicto do que diz, não será tão difícil. Um pouco de autocrítica já será suficiente. Mas se for muito difícil, talvez seja porque seu discurso não corresponde às suas ideias. E o que lhe falta, realmente, é honestidade.