Ameaças ao Pampa

Projeto Caçapava do Sul e o avanço da megamineração sobre o Bioma Pampa

Ao tomarmos conhecimentos, no final de julho de 2016, da existência de Projeto de Mineração da Votorantim Metais Holding (atualmente NEXA RESOURCES) e da canadense Iamgold Brasil, a ser instalado na localidade das Guaritas, em Caçapava do Sul, na Bacia do Rio Camaquã, para extração de metais pesados (cobre, chumbo e zinco), altamente lesivos aos seres vivos e ao meio ambiente, passamos a agir imediatamente, inicialmente através das ações dos moradores de Palmas, zona rural do município de Bagé, apresentando representação contra o projeto no Ministério Público Federal.

A seguir, tomamos conhecimento que a Associação para o Desenvolvimento Sustentável do Alto Camaquã (ADAC) também havia representado ao MPF. Assim sendo, unimos esforços e passamos a trabalhar em conjunto.

Posteriormente, a partir de diversas atividades nos municípios banhados pelo Rio Camaquã, logramos apoio de moradores, entidades, associações, universidades, sindicatos, autoridades, e.t.c., dos demais municípios, que se engajaram na luta contra a mineração, formando uma grande frente de defesa do Rio Camaquã e seu ecossistema.

Por que lutamos incansavelmente contra o projeto Caçapava do Sul?

O empreendimento, se instalado, ficará localizado nas Guaritas (Caçapava do Sul), mais precisamente a apenas 800 metros do Rio Camaquã, na divisa com o Distrito de Palmas (Bagé), na região mais preservada do Bioma Pampa (mais de 80% da cobertura vegetal original), declarada uma das sétimas maravilhas do Rio Grande do Sul e integrante da Associação Mundial de Montanhas Famosas, além de ser considerada de prioridade máxima para o Ministério do Meio Ambiente. Essa região possui diversas espécies animais e vegetais ameaçadas de extinção e que se encontram protegidos e vivendo nessa região há séculos.

A mineradora pretende captar 150 m3/h do rio, o que causará o seu assoreamento e a diminuição drástica do volume de água, situação que agravará a já precária situação dos municípios da Bacia do Rio Camaquã, que sofrem constantemente com estiagens, como a que ocorreu no verão passado, culminando, inclusive, com a decretação de situação de calamidade pública em vários deles, sendo esse rio uma das poucas fontes de água perene, utilizada para abastecimento de residências e dessedentação de animais.

Conforme o projeto, os rejeitos, que representam aproximadamente 95% de tudo que é extraído da mina, serão depositados em pilhas a céu aberto, causando efeitos nocivos a saúde e ao meio ambiente de forma perpétua, pois ficarão sujeitos às intempéries do tempo e, consequentemente, serão transportados para o Rio Camaquã e para o meio ambiente, atingindo os 28 municípios que formam a Bacia do Camaquã, chegando, consequentemente até a Lagoa dos Patos e ao oceano atlântico.

A região impactada pelo empreendimento possui características culturais próprias, com modo de vida diferenciado, próprias dos primeiros povos que habitaram essas terras, o qual vem sendo mantido e transmitido de geração em geração, destacando-se atividades de interesse antropológico como a esquila a “martelo”, a campereada, a doma, a tropeada, o modo de manejar os animais, o churrasco no fogo de chão, a pesca artesanal, a música, a dança, o trabalho em couro cru, o artesanato em lã e demais materiais, os doces de “tacho”, as receitas de pães, bolos e comidas campeiras, entre tantos outros, os quais correm o risco de desaparecer.

A região do Alto Camaquã tem como base econômica a pecuária, desenvolvida de forma sustentável há séculos, através de técnicas não invasivas, atividade incompatível com a mineração e que será inviabilizada caso o empreendimento se instale, pois os produtos como carne, mel, leite, queijo, doces, hoje detentores de selo de certificação, ficarão contaminados com chumbo e outros produtos tóxicos, tornando-se impróprios para o consumo.

Esse projeto é o primeiro de muitos outros que visam a metade sul do nosso Estado, visto que existem mais de cem requerimentos de prospecção em andamento, o que importaria numa alteração da matriz produtiva do RS, prejudicando milhares de pecuaristas familiares já estabelecidos, os quais perderiam sua fonte de renda e suas terras, sendo forçados a abandonar suas casas, na contramão de todas as políticas públicas que visam evitar o êxodo rural.

Atualmente existem cinco projetos em estágio mais avançado como o Projeto Fosfato, em Lavras do Sul, o Projeto Retiro, em São José do Norte, o Projeto Mina Guaíba, em Eldorado do Sul, o Projeto Caçapava do Sul, entre Bagé e Caçapava do Sul e mais recente o Projeto de Mineração de Carvão, em São Sepé/RS.

Sabemos que além desses projetos altamente impactantes, estão iniciando as pesquisas para projetos de mineração de ouro em Lavras do Sul, justamente nas nascentes do Rio Camaquã e projetos de mineração de cobre em Caçapava do Sul, além de projetos de mineração de xisto em Dom Pedrito/RS.

Este é um momento decisivo para o Rio Grande do Sul, no qual o povo gaúcho precisa decidir seu futuro, se continuaremos um Estado voltado para produção de alimentos, com áreas preservadas, berços da vida animal e vegetal e da cultura gaúcha ou se viraremos um imenso canteiro de mineração, com barragens rompendo constantemente e arrasando com tudo que conservamos há tantas gerações.