Almanaque da Economia (Notas de Livro)

Almanaque da Economia

Dimas da Cruz Oliveira

São Paulo: Discovery Publicações



Introdução 

Considerado como um dos maiores sábios, senão o mais sábio de todos os homens que já existiram, o grego Aristóteles possui também o título de criador do conceito de economia; para ele, era preciso saber "administrar bem a própria casa": este é o significado exato da palavra "economia", em grego; a economia é, portanto, vista sob seu aspecto mais importante, "economia política", ou seja, implica no conhecimento das leis gerais que devem governar a administração dos bens da cidade, quer dizer, da sociedade. 

Capítulo 1 — Origens da Economia 

O Estudo da Economia

Embora tenha sido cientificamente formulada apenas na Idade Moderna, com o escocês Adam Smith [1725- 1790], a economia vista através de suas noções mais gerais sempre existiu, desde a Antiguidade. As leis que regem a administração dos bens foram investigadas a fundo por Aristóteles no segundo livro das suas Econômicas, mas também outros autores se preocuparam com esse tipo de estudo, dentre os quais se destacam Xenofonte...

A divisão do trabalho

A divisão do trabalho, entretanto, decorre do próprio aumento da produção, na medida em que a população crescente exige aquele aumento. Nós, modernos, estamos acostumados ao espetáculo da produção em larga escala, cujo auge parece ter sido alcançado no famoso conceito de globalização: para nós é muito simples dizer que o Japão produz alta tecnologia, a China brinquedos e calçados, os Estados Unidos maquinário para a indústria pesada...

As invenções

As origens da história da economia estão localizadas nas raízes mais profundas da inventividade humana: de um fragmento de sílex, surgiu o primeiro machado; de um tronco flutuante, a primeira canoa; de um galho envergado, o primeiro arco, e assim por diante. Valendo-se de machados, flechas, facas e lanças primitivas, a partir de uma simples haste com pontas inseridas, o homem das cavernas foi capaz de aumentar sua capacidade de perseguir e matar os animais em grandes expedições de caça...

O APERFEIÇOAMENTO DOS MÉTODOS DE PRODUÇÃO JAMAIS CESSA, EM TODO O DECORRER DA HISTÓRIA.

Porque estudar a história da economia?

De qualquer modo, ainda hoje, o estudo da formação da economia é bastante instrutivo para o nosso conhecimento do que é economia; e isso acontece não apenas pela curiosidade de conhecer o curso dos mais diversos procedimentos técnico-científicos, das mais diferentes invenções destinadas ao aumento da produção, mas principalmente pela penetração filosófica no significado da economia. 

John Stuart Mill

Nesse contexto, Stuart Mill não nos parece tão distante assim, com suas colocações sobre moral e economia; não podemos conceber os fenômenos econômicos, quaisquer que sejam nossas convicções políticas, de um modo alheio a considerações de ordem moral; temos que encarar a questão social associada à econômica; para isso pouco importa se somos ou não socialistas. 

NA CONTRAMÃO DA HISTÓRIA, ARISTÓTELES ACREDITAVA QUE A ESCRAVIDÃO É NECESSÁRIA E JUSTIFICADA.


Capítulo 2 — O Capital 

Uma vez que a matéria-prima, o trabalho e o capital representam os três fatores da produção, é necessário estudar mesmo em esboço a natureza do capital, a fim de melhor compreender a própria natureza da produção. 

O capitalismo inglês

A palavra capital é uma das mais importantes e, ao mesmo tempo, das menos compreendidas na história da economia. Uma crítica digna de observação a respeito desse fenômeno é a de que praticamente todas as nossas concepções econômicas clássicas foram derivadas de suas correspondentes inglesas, isto é, pertencem a um mundo grandioso, impressionante do ponto de vista econômico, porém limitado de qualquer modo. E o que levou a esse predomínio das ideias inglesas em economia? Foi, sem dúvida alguma, o fato de o país ter liderado a chamada Revolução Industrial, com sua radical transformação dos processos de produção...

O que é capital?

Mas, afinal, o que é o capital? A resposta mais clara é aquela que o define como sendo todo produto do trabalho que foi economizado a fim de ser usado num novo processo de produção: capital é, portanto, uma espécie de trabalho acumulado. 

Classificação do capital

Também foram os economistas clássicos ingleses que dividiram o capital em dois tipos básicos: o capital fixo e o capital circulante. 

DIRETAMENTE ASSOCIADOS UM AO OUTRO, CAPITAL E POUPANÇA IMPULSIONAM A ECONOMIA.

Capital e poupança

Convém ressaltar sempre o que é a poupança como base do capital, porque o capital nasce, por assim dizer, da poupança. 

Avareza e prodigalidade

Entretanto, poupar e, ao mesmo tempo, criar capital, é possível não quando se abstém de consumir, mas se consome de tal modo que daí provenha um instrumento destinado a aumentar a produção e o consumo. Nesse sentido, já se disse que o avarento é tão prejudicial ao progresso econômico quanto o pródigo, porque, paradoxalmente, a criação do capital mediante a poupança será tanto maior quanto for o trabalho produtivo e a inclinação do homem para a poupança. 

O DINAMISMO DA ECONOMIA CAPITALISTA É IMPRESSIONANTE E PARECE NÃO TER FIM APESAR DE PREVISÕES EM CONTRÁRIO.


Capítulo 5 Grandes Economistas 

Estudando a biografia dos grandes economistas, os criadores da chamada Economia Política, também nós podemos ter uma ideia dessa ciência difícil e tão necessária para a compreensão dos fenômenos sociais, seja em épocas passadas da História, seja em nossa própria época. Tendo sido por circunstâncias excepcionais o primeiro país industrializado, a Inglaterra nos apresenta um rol invejável de grandes economistas, como Adam Smith, David Ricardo e John Stuart Mill.

Antigos e Modernos

Naturalmente houve teóricos da economia em todos os tempos. Os gregos foram os primeiros a preocupar-se de maneira sistemática com questões econômicas, sendo seguidos por seus herdeiros espirituais; os romanos, menos dotados intelectualmente, mas impregnados de um espírito prático que lhes permitiu colecionar finas observações acerca da agricultura e do comércio, pelo menos. 

Assim, Aristóteles dedicou um conjunto de meditações intitulado “Econômicas" aos fenômenos típicos da administração pública e particular. Ao reconhecer as necessidades básicas associadas à sobre- vivência do homem, seja como indivíduo seja como socie- dade, o eminente pensador reconheceu, ao mesmo tempo, a importância de estudar essas necessidades a fim de melhor atendê-las. Assim como o médico examina, com olho clínico, o organismo doente e procura prescrever o remédio para sua cura, o economista procura conhecer a fundo o mecanismo do corpo social e indicar as leis e costumes cujo mau funcionamento o perturbam para, em seguida, descrever a ordem mais favorável à criação do conforto mediante o trabalho. Por isso a economia política já foi definida como a ciência que determina quais são as leis que os homens devem adotar, a fim de que eles possam, com o mínimo possível de esforços, adquirir o máximo de objetos úteis à satisfação de suas necessidades, repartindo-os conforme a justiça e os consumindo conforme a razão. 

O pensamento antigo

Entretanto, outros antigos economistas atraem nossa atenção sem atingir, porém, o mesmo elevado grau de sistematização de Aristóteles. De um modo geral, esses economistas nos deixaram observações incidentais acerca dos mais variados aspectos da vida econômica: Xenofonte trata da aplicação dos bens produzidos; Sêneca e Juvenal insistem na necessidade de moderação dos desejos a fim de conseguir a moderação das necessidades. 

OS ROMANOS DEDICARAM ESPECIAL ATENÇÃO ÀS ATIVIDADES AGRÍCOLAS

A Riqueza das Nações

Mas somente a Idade Moderna viu surgir a economia política propriamente dita, e isso também ocorreu na Inglaterra, a par de tantas transformações econômicas. O primeiro dos economistas modernos, o chamado "pai da economia política”, é Adam Smith; ele é o autor de um dos livros mais influentes que conhecemos: A Riqueza das Nações. Nesse livro encontramos uma notável contribuição para o estudo da economia, um esforço primoroso feito no sentido de tornar a economia uma ciência independente, algo jamais visto desde os tempos de Aristóteles. 

David Ricardo

Outro grande economista é o inglês, de origem judaica, David Ricardo [1772-1823]. Ele fez parte de um notável círculo de economistas que incluía James Mill, Jeremy Bentham e Thomas Malthus; com este último ele manteve ativa correspondência na qual discute, entre outros assuntos importantes, o papel dos proprietários de terra na sociedade; ainda participou do Clube de Economia Política e de uma original Sociedade Geológica; tudo isso serve para dar-nos uma ideia da variedade de interesses e do pragmatismo dos economistas ingleses, o que os torna tão importantes. Ricardo também se interessou por economia a partir da leitura da obra de Adam Smith, com sua teoria conhecida como da vantagem comparativa, defende o livre mercado. A vantagem comparativa, por sua vez, consiste na especialização de uma nação naquelas indústrias nas quais ela pode alcançar o mais alto nível de competitividade; sem dúvida alguma, a teoria da vantagem comparativa requer uma indústria e uma política comercial oficial, não fazendo entender que decisões empresariais possam ser tomadas de forma independente, apenas visando o lucro. De qualquer modo a teoria econômica de Ricardo foi muito criticada, mesmo por historiadores britânicos, porque ela deu ocasião ao comércio da troca desigual, cujo caso mais famoso consiste nas relações comerciais entre Inglaterra e Portugal do modo como foram estabelecidas através dos Tratados de Methuen: o livre comércio sufocou a incipiente indústria têxtil portuguesa, associando-se às consequências de um mercantilismo mal entendido, e favoreceu tão somente a exportação de vinho pelos portugueses. Isso aconteceu enquanto a Inglaterra exportava o algodão proveniente das suas colônias da América, o que, aliado aos outros capitais oriundos do mercantilismo, permitiu a evolução industrial do país. Também a falta de consideração da variedade da produção por parte de Ricardo recebeu críticas. É possível que a especialização industrial requerida por parte da teo- ria provoque desastres no mundo real da economia, mais sujeito a crises do que pensamos à primeira vista. 

John Stuart Mill

Juntamente com Ricardo, quem merece ser lembrado é John Stuart Mill [1806-1873], cuja obra Princípios de Economia Política apresenta um resumo crítico dos trabalhos anteriores de todas as escolas mais importantes da economia: desde Adam Smith até Ricardo, passando pelo mercantilismo e a fisiocracia de Quesnay. Stuart Mill era impregnado de preocupações morais, ao contrário do que muitas vezes a leitura de autores socialistas, direta ou indiretamente ligados a Marx, faz pressupor; neste sentido, é típico o pensamento de Mill: "supus que os trabalhadores sempre subsistem a partir do capital; e este é um fato óbvio, ainda que o capital não seja necessariamente fornecido por uma pessoa denominada capitalista”. Essa é a conclusão do economista ao estudar a natureza da produção, principiando pelo trabalho e sua relação com a natureza. Em seguida, ele tratou da distribuição enquanto fenômeno econômico; nesta parte, ainda fiel aos seus princípios morais, Stuart Mill chega à conclusão de que, embora a riqueza seja produzida de acordo com leis naturais, ela é distribuída segundo leis convencionais: "A distribuição da riqueza, portanto, depende das leis e costumes da sociedade. As regras pelas quais ela é determinada são feitas pelas opiniões e sentimentos que as partes dirigentes estabelecem e são muito diferentes em épocas e países diversos; e poderia ser ainda mais diferente se a Humanidade assim o escolhesse.” O pensamento econômico de Stuart Mill, associado à sua elevada moralidade, atrai nossa atenção, mas às vezes parece justificar a censura que lhe foi feita por alguns observadores: seria demasiado idealista, puro e quase ingênuo diante do mundo real dos fenômenos econômicos. Stuart Mill acreditava, por exemplo, que será possível algum dia atingir um estágio social no qual o senso de humanidade prevaleça sobre a avidez e busca do lucro: “um estado no qual embora ninguém seja pobre, ninguém deseja ficar mais rico, nem tem razões em temer ser passado para trás, em virtude do esforço de outros para ir em frente”. É difícil, mesmo fazendo uso de um esforço o mais forte e o mais sincero, imaginar que numa sociedade capitalista ninguém deseje ficar mais rico se tiver meios para conseguir esse acréscimo de riqueza. Convém lembrar aqui a curiosa etimologia da palavra rico, cujas raízes, em sânscrito, significam ser poderoso, dando origem ao título dos príncipes indianos: rajá, assim como dos reis e imperadores em latim e alemão, e dos grandes e poderosos em espanhol, os homens ricos. 

Karl Marx

Karl Marx [1818-1883], embora não tenha sido um economista no sentido estrito do termo, desempenha um papel da mais alta categoria por suas ideias sobre o papel da economia ou infraestrutura na formação dos demais fenômenos sociais ou superestrutura. Sua influência se estendeu por toda a segunda metade do século XIX e primeira metade do século XX, de maneira quase incontestada entre os teóricos socialistas e os autores da chamada práxis revolucionária, com destaque para Lênin e seus herdeiros políticos. Hoje, após o desaparecimento da antiga União Soviética e a implantação de uma economia abertamente capitalista nos territórios que a formavam, assim como na China, o questionamento sobre os pressupostos econômicos de Marx só fez aumentar, apresentando muitos desafios aos críticos e estudiosos.

Schumpeter

Entretanto, outro nome que merece ser lembrado é o do economista de origem austríaca Joseph Schumpeter [1883-1950] que coincidentemente nasceu no mesmo ano da morte de Karl Marx e do nascimento de outro notável economista: John May- nard Keynes. Para Schumpeter, era preciso integrar economia e sociologia, a fim de que suas teorias econômicas inovadoras alcançassem um nível mais alto de compreensão. Ele é autor de uma célebre teoria do ciclo econômico, que afirma que o equilíbrio econômico pode, deve, aliás, ser perturbado, num sentido positivo, por alguma inovação do ponto de vista econômico. Algumas dessas inovações são: a introdução de novo bem no mercado, a descoberta de novo método de produção ou de co- mercialização de mercadorias, a conquista de novas fontes de matérias-primas. Enfim, até mesmo uma alteração da estrutura de mercado vigente, na qual podemos incluir a introdução da concorrência onde ela não existia antes, pode significar a referida inovação econômica. Schumpeter foi um dos economistas contemporâneos que mais fez escola, isto é angariou discípulos através de sua atividade docente em renomadas universidades, sobretudo dos Estados Unidos.

Keynes e Marshall

Por sua vez, John Maynard Keynes e George Marshall foram responsáveis por toda uma política econômica seguida pelos governos dos Estados Unidos e da Europa nos períodos de grave crise que se seguiram à primeira e segunda guerra mundiais. As ideias de Keynes serviram de base para a política de recuperação econômica adotada pelo presidente Franklin Roosevelt no período que se segue à grande depressão e à famosa quebra da Bolsa de Nova York em 1929. Quanto a Marshall, ele é o elaborador do plano para a recuperação econômica da Euro- pa, principalmente Alemanha, assim como do Japão, ambos os países que foram derrotados e tiveram sua economia arrasada com a segunda guerra mundial.

O Neoliberalismo

Hoje em dia, a chamada economia neoliberal, que sob cer- tos aspectos representa o antigo livre mercado de Adam Smith devidamente aperfeiçoado sob uma perspectiva atual, globali- zante, parece impregnar o mundo econômico, isso pelo menos sob certos aspectos. De qualquer modo os desafios persistem, e a mesma atmosfera estranha parece rodear os especialistas, aqueles poucos homens que compreendem a linguagem miste- riosa da ciência econômica. Talvez precisemos mesmo do gênio de um Adam Smith, da finíssima capacidade de compreensão de um David Ricardo, ou ainda dos conhecimentos universais de Stuart Mill para compreendê-la em toda a sua complexidade.