Moeda

Moeda

MOEDA. Numa sociedade primitiva a troca é feita sob a forma de um escambo direto de um produto ou de uma prestação de serviços, por outro produto ou por outra prestação de serviços. Esse ato se decompõe geralmente em uma venda e uma compra. Com a introdução da moeda que no grupo econômico é um bem que substitui, que representa outros, a troca pode ser feita entre o produto ou a prestação de serviços, pela moeda que pode representar, até certo grau, produtos e prestações de serviço. A moeda é uma coisa que recebemos em troca de uma mercadoria ou de um serviço prestado, ou que damos em troca de mercadorias ou serviços. Assim ela se torna também uma mercadoria, um sinal representativo concreto. As diversas modalidades de troca tomam o nome de venda, empréstimo com juros, aluguel, depósito e contrato de trabalho.

Nos manuais é definida como uma "mercadoria", que serve de "intermediário nas trocas" e de "medida comum dos valores". Na origem foi uma mercadoria. O homem não a inventou. O fato constante de receber uma mesma mercadoria de uso corrente e de fácil conservação como pagamento nas trocas, transformou essa mercadoria em moeda, mercadoria-moeda. Posteriormente foi recebida, não por si mesma, mas pela nova troca que permitia, tornando-se intermediária das trocas. Era trocada com todas ou quase todas as outras, por isso servia de medida comum de valores.  

Nas comunidades mais primitivas foi o sal, as conchas, o couro, o gado, e posteriormente os metais preciosos. No entanto temos hoje instrumentos monetários que não têm caráter de mercadoria, como os bilhetes inconvertíveis em metal, que chamamos moeda fiduciária, moeda de confiança (fidutia, em lat., confiança). Há exemplos de moeda abstrata, como a chamam alguns economistas, que é a moeda escritural, a que é registrada nos lançamentos de uma conta para outra, de um crédito para um débito sem necessidade do transporte de notas de uma caixa para outra, como se observa entre os bancos e as empresas ligadas entre si, etc. A existência de uma moeda fiduciária e de uma moeda escritural nos mostra que não podemos considerar como essencial (e nesse caso como invariante) do conceito de moeda o ser uma mercadoria. Entretanto, além de um instrumento de troca e de medida comum de valores, quem a recebe aceita-a como meio de pagamento, a título definitivo. Pode ser conservada por muito tempo em poder de quem a tem e, dessa forma, pode transformar-se num instrumento de poupança. Há também os casos em que fica estipulado pagar um devedor em certo tempo a um credor uma soma de moeda. Essa soma é para o credor uma soma futura; razão porque alguns economistas consideram que também tem ela um papel de acumulador de valor. Pode-se enumerar as seguintes funções da moeda: 1) instrumento de troca ou intermediário de troca; 2) medida comum de valores; 3) instrumento de pagamento; 4) instrumento de poupança ou acumulador de valor; 5) sinal de crédito, de capital, de dinheiro, etc. Em suma: sinal de todo valor econômico.

Análise — Não se pode estudar a moeda sem considerá-la sob seu aspecto intensista e extensista; sem observar seus aspectos qualitativos e heterogêneos e os quantitativos e homogêneos. A moeda é um conceito da economia, mas tem suas raízes no que constitui matéria de outras disciplinas. Estudá-la apenas sob um dos seus muitos aspectos, autonomamente, é tomá-la abstratamente. Se fixarmos aspectos separados (abstratos, portanto) não devemos, contudo, deixar de conexioná-los entre si, procurando a maior concreção possível, a fim de podermos construir uma visão geral, ampla e segura do conceito de moeda.

Há três espécies: a) a moeda-mercadoria (metais preciosos, por exemplo); b) a moeda fiduciária; c) a moeda escritural. Elas cumprem sua função como intermediárias de trocas, instrumento de pagamento, acumulador de valor e medida comum de valores, sinal de todos os valores econômicos. Contudo há diferenças no funcionamento dessas três espécies. Uma moeda metálica pode ser preferida como meio de pagamento a uma moeda papel. O papel moeda foi considerado durante muito tempo como uma mera promessa de pagamento; isto é, o portador tinha o direito a receber seu valor correspondente em espécies metálicas. Por outro lado, uma moeda fiduciária pode ter um poder de compra variável, enquanto a moeda metálica tem um poder estável. Além disso a moeda metálica pode ser preferida para a poupança (tesourização). Muitos economistas consideram que só a moeda metálica pode corretamente corresponder a uma comum medida de valores. Nessa função é que se usa a expressão padrão monetário.  

Admitamos uma mercadoria que hoje é trocada por uma determinada quantidade de unidades monetárias. Essa mesma mercadoria, num futuro dado, é trocada mas por uma quantidade dupla de unidade monetária (o que se troca hoje por 5, amanhã será por 10). Como instrumento de medida a moeda cumpriu sua função. Mas nesse período de tempo seu poder de compra variou. Dessa forma torna-se ela, que foi tão bom instrumento de medida, num mau instrumento de poupança e num mau instrumento de pagamento para contratos a longo prazo; ou seja, num mau acumulador de valor. Por isso é que muitos dizem que a moeda é um padrão variável.

Para os economistas o poder de compra da moeda varia segundo sua abundância. Aceita essa premissa, eles concluem que a moeda é causadora das mudanças nos preços, por ela fielmente registrados. Se tal se dá, não é ela um mau instrumento de medida? Tais raciocínios é que os levam a afirmação de que a moeda fiduciária e a escritural valem na base da sua conversibilidade em moeda metálica, em ouro propriamente, e é em relação ao metal que se fixariam os preços. Dessa forma concluem, embora se dê uma moeda fiduciária e uma escritural, ela é essencialmente uma "mercadoria".

Essa doutrina tradicional oferece diversos fundamentos. Comparamos uma mercadoria a outra mercadoria. As moedas desprovidas de uma base metálica mostraram-se incapazes de conservar uma relação de troca estável com as outras. Não resta dúvida que a moeda, no início, era uma mercadoria. Só depois se tornou um elemento intermediário habitual nas trocas. Mas com o tempo tomaram o nome de dracmas, denários, sóis, escudos, etc. E eles não significaram apenas um nome. Adquiriram um significado e um conteúdo diferentes e deixaram de indicar um peso de metal, para expressar uma unidade monetária. O peso do metal mudou, mas o nome permaneceu o mesmo.

Esse aspecto subjetivo não deve ser desprezado por quem deseja estudar finanças, porque a moeda não é apenas em si, mas para nós. Para muitos ela não foi uma mercadoria e que é, ainda, mercadoria. Quer dizer: é ela sempre mercadoria. As mercadorias destinam-se ao consumo e a moeda destina-se à circulação.

Ora, a mercadoria destina-se à satisfação de uma necessidade e, nessa função, alegam os economistas contrários, ela desaparece, não podendo pois funcionar de novo. A moeda destina-se a extinguir Tem uma função dupla: a de reserva e a de medida. Se A deve a B a quantia X, e B deve a C a mesma quantia X, dando A a B em pagamento X, e B dando a C a mesma quantia X, vemos que a mesma moeda passou por várias mãos. Já com as mercadorias não se dá o mesmo. E alegam que é sofisma dizer que qualquer mercadoria, tenha o mesmo efeito. E o sofisma consiste em que essa mercadoria, ao passar por diversas mãos, perdeu a sua função de mercadoria para transformar-se propriamente em moeda com força liberatória, que é uma de suas características.

As moedas reais, metálicas ou fiduciárias, podem ser classificadas em principais e secundárias. As principais são as que têm curso legal ilimitado; isto é, as que o devedor, de acordo e conforme com a lei, pode impor em pagamento ao seu credor qualquer que seja a importância da soma devida. As secundárias tem curso legal limitado, não podem ser impostas em pagamento senão numa soma determinada e têm nas trocas um papel acessório, anexo ao que é desempenhado pelas moedas principais.

Se as principais são ouro ou bilhetes convertíveis em ouro, a secundária, também chamada de moeda padrão, será o ouro. Se as principais forem em prata, a secundária será prata. Quando as principais são constituídas por bilhetes de banco não convertíveis, o país estará em regime de papel-moeda. Para que uma moeda padrão (secundária) permaneça em circulação é imprescindível que seu valor intrínseco, o valor do metal que a compõe, seja igual ao valor nominal que lhe é atribuído por lei. Se o valor intrínseco é inferior, ela será uma mercadoria depreciada, de que todos procurarão desfazer-se, transformando-a em outras mercadorias. O mesmo se dá quando a moeda padrão é um bilhete inconvertível.

Quanto às moedas secundárias não tem qualquer importância que tenham um valor intrínseco inferior ao valor nominal, pois seus papel como instrumento monetário é reduzido, tirando o seu valor do fato de serem trocáveis por moedas padrões. São também fabricadas com metais comuns, o cobre, o bronze, o níquel e ligas, e raramente prata.

Os bilhetes de banco, emitidos por bancos privados, podem circular entre as partes sem que o Estado torne sua aceitação obrigatória. Diz-se então que têm curso livre.  Quando o bilhete de banco não é mais convertível por decisão governamental, mas deve ser aceito nos pagamentos, tem curso forçado.

A cunhagem da moeda cabe ao Estado e este, devido às suas costumeiras dificuldades financeiras, tem abusado de seu direito, e no intuito de obter recursos, modificado a relação entre o ouro e a liga. Toda vez que tais abusos se processaram, isto é, quando em um país circulam peças do mesmo valor nominal, mas de valores intrínsecos diferentes, as peças que têm maior valor intrínseco desaparecem da circulação. São tesourizadas, enquanto as moedas mais fracas permanecem em circulação. Essa constatação é conhecida pelo nome de lei de Gresham que se enuncia pela frase: a moeda ruim expulsa a boa. A boa moeda é por isso guardada preferentemente enquanto a má continua em circulação.

Impõe-se que consideremos a moeda em sua relação estreita com a produção, sobretudo nos países em que ela tem curso forçado e não é convertível, bem como sua relação com as experiências modernas. Ela deve facilitar as trocas e falha quando não o faz. Ela se deprecia quando ultrapassa a quantidade necessária à troca. Mas também se deprecia por fatores de ordem qualitativa, por exemplo, quando não merece confiança.

Sistemas monetários — A moeda pode ser considerada como moeda-mercadoria, como fiduciária e como escritural. Os sistemas de moeda metálica caracterizam-se pelo emprego simultâneo de diversos metais. A moeda de banco caracteriza-se pela sua convertibilidade em um ao menos desses metais. Atualmente a maior parte é feita de papel, e apenas a divisionária, para trocos, é feita de metal ou de ligas metálicas, de caráter acessório. O uso do metal vem de longe. Cobre, chumbo, prata, circulavam em forma de lingotes, avaliados segundo o seu peso. Finalmente as moedas foram cunhadas, isto é, marcadas com um sinal de valor, não necessitando naturalmente ser mais pesadas para a sua avaliação ou pelo menos permitindo que a sua aceitação fosse mais fácil, cumprindo assim sua finalidade que é facilitar trocas. Hoje não se usa como moeda corrente o ouro nem mesmo a prata, substituídos pelo papel-moeda que facilita mais o manuseio.

Os antigos sistemas monetários são essencialmente sistemas de moeda metálica. O Estado comprava metais, amoedava-os e tarifava as espécies. Posteriormente admitiu-se a cunhagem livre. Ele recebia os lingotes dos particulares e os restituía sob a forma de moeda cunhada. Devolvia-se peso por peso, cabendo-lhe uma pequena parcela para cobrir as despesas da cunhagem, dando-lhe o título ou teor da moeda, expressa geralmente em milésimos, pois se toma como referência o quilograma. Assim, quando se diz ouro de milésimos ou 900/1000, quer significar que em 1000 partes da liga monetária há 900 partes de ouro.

O metal escolhido como a base de um sistema monetário se chama metal-padrão. Onde apenas um serve de padrão, temos o monometalismo e em regra geral é o ouro. Quando há dois (ouro e prata, por exemplo), temos o bimetalismo ou sistema de duplo padrão.

Papel-moeda — Distingue-se três espécies:

1) Certificados como os gold and silver certificates dos Estados Unidos. São declarações impressas em papel, que não são moeda papel senão na forma exterior, pois representam estritamente o ouro ou a prata que se encontra nas barras depositadas no Tesouro. Os portadores do certificado têm a faculdade de fazer devolver contra a entrega do mesmo a quantidade de moeda neles declarada, sabendo o portador que tem direito a ser reembolsado em seus bilhetes.

2) Bilhetes garantidos, como os bilhetes de banco e os de Estado, quando trazem uma garantia especial. No início o bilhete de banco era apenas uma promessa de pagar e não uma moeda. Permanecia convertível, isto é, o portador estava autorizado a pedir o reembolso em metal nos guichês dos bancos. Dessa forma aproximava-se ao certificado americano. Mas sucede que a emissão geralmente é superior ao encaixe de moeda e se todos os portadores reclamassem simultaneamente a conversão de seus bilhetes em espécie, não seria possível atendê-los. Há assim uma diferença entre a emissão e o encaixe. Neste caso diz-se que há bilhetes em descoberto.

3) Os bilhetes inconvertíveis em moeda metálica recebem a denominação de papel-moeda propriamente. É já uma forma degradada das anteriores, usada e abusada pelo Estado, que lhes dá curso-forçado. Dá-se o nome de inflação (de inflar, inchar) quando a emissão desse papel inconvertível está além das necessidades normais da troca (e realmente só aí). Esta moeda inconvertível é moeda apenas dentro do território do Estado, onde tem curso forçado, sem o mesmo fora dele, razão pela qual sofre o risco de flutuar o seu valor sem limites em relação às moedas estrangeiras. Na realidade essa flutuação depende da sua capacidade de troca. Ela vale pelo que ela pode dar em troca, quando oferecida para uma troca. Por isso esses regimes de papel-moeda se caracterizam pela instabilidade.

Após a guerra de 1914-18 a maioria dos países não tinham reservas suficientes para garantir e estabilizar a moeda circulante. Procuraram aberturas de crédito, isto é, obter de outras moedas, aceitar uma paridade e, portanto, uma troca, a fim de garantir a moeda sem lastro suficiente. Tal processo, no entanto, não pode levar à disposição de créditos ilimitados, por isso tal funcionamento supõe um equilíbrio aproximativo das trocas internacionais.

O funcionamento de um sistema monetário é caracterizado, sobretudo, pelas condições nas quais se estabelecem as relações com outros sistemas monetários. Atualmente as regulações internacionais se operam tanto quanto possível pela compensação, graças à negociação de letras de câmbio (trocas comerciais), assegurando assim a estabilidade da moeda. Exercem os estados modernos um grande controle nessas trocas, tendendo sempre ao maior equilíbrio ou a um saldo favorável sempre que possível.

Estes temas ultrapassam o campo propriamente da economia política, cabendo seu estudos às finanças e à administração pública. Há uma grande divergência de opiniões quanto as moedas e as teorias têm sido as mais antagônicas possíveis. Assim ela é riqueza; um produto; um direito que confere um poder de compra; um intermediário de trocas; um facilitador de trocas; um símbolo (protético); um instrumento de atividade econômica; intermediário de trocas ou apenas intermediário de avaliações; instrumento de liquidação de dívidas recíprocas ; meio de arbitragem entre os preços das mercadorias, tomadas duas a duas; um crédito garantido sobre o estoque de metal precioso, quer serve de cobertura à emissão dos bilhetes de banco; um instrumento de consumo e não de poupança; um instrumento apenas de poupança; reservatório de valor; soma do poder de aquisição; crédito sobre a produção; direito abstrato de comprar; unidade de conta; instrumento de transporte de reservas; medida comum de valores e dos serviços; instrumento de pagamento; dinheiro (É mister distinguir moeda e dinheiro. A moeda, como numerário, é representativa do dinheiro. Este tem um valor estável e aquela não. É verdade que são poucos os economistas que fazem distinção entre moeda e dinheiro, e estes mesmos fazem-na apenas relativamente). um instrumento de troca; um instrumento de troca e de crédito; mercadoria;meio de compor a troca; mercadoria-standard; poder de compra; valor abstrato; matéria, além de medida e poder de compra; convenção; valor constituído, ou seja, síntese do valor de uso e do valor de troca; expressão do trabalho; capital; instrumento de conta; direito; representante do valor; sinal de valor; fração da renda global de um país determinado, efetivamente consumida durante a unidade de tempo; um instrumento de circulação; o instrumento marcado pelo poder soberano; apenas um crédito; valor juridicamente instituído.

De início a moeda foi uma mercadoria, mas não só, já que esta de qualquer modo que for, poderia ser tomada como moeda, pois podemos considerar o valor de todas as coisas econômicas segundo uma determinada, por exemplo, dizer quanto é em trigo, um sapato, um chapéu, uma camisa, etc. Enquanto mercadoria, a moeda é riqueza, um produto, um intermediário de compras, de trocas, um direito sem dúvida, um instrumento de atividade econômica, um facilitador de trocas e de operações econômicas dessa espécie, um crédito, um instrumento de consumo e também de poupança, um reservatório de valor, uma soma de poder aquisitivo, um crédito sobre o que possa produzir, um direito de comprar, uma unidade de compra, um instrumento de transportes, de reservas, uma medida de valores e de serviços, uma unidade de conta, um instrumento de pagamento, um poder de compra, expressão do trabalho, capital, um instrumento de circulação, etc. Mas quando se procura saber o que uma coisa é não se indicam apenas as suas funções, a utilização que pode ter, o papel que pode desempenhar, o significado que tem, mas sim o que é, o que é em sua essência. Tudo quanto é acidental numa coisa é proporcionada à sua essência. Neste caso a essência da moeda tem de estar em proporção com tudo quanto pode representar, pode atualizar, pode ser, pode significar. Precisamente na caracterização nítida da sua essência é que os economistas encontraram a maior dificuldade. Já dizia Montesquieu: "não é que os economistas sejam pequenos, é que a sua ciência é demasiadamente grande para ser alcançada por eles".

Em primeiro lugar é preciso que se compreenda que podemos entender a economia em sua atividade sem a moeda. Há povos que tiveram, e têm, organização da vida econômica sem usar a moeda, nem conhecê-la. Desse modo ela não é imprescindível para que haja vida econômica. Portanto produção e consumo, como extremos da vida econômica, não a implicam necessariamente. Se não é algo essencial à economia é, portanto, acidental, algo que acontece àquela. Se pensarmos em sua gênese, notamos que nasceu com uma finalidade; ou melhor impõe-se ao homem como um meio de facilitar a própria atividade econômica, primeiramente facilitando as trocas fundamentais entre o produtor e o consumidor e, a seguir, representando uma poupança, tanto de um como de outro, servindo depois de crédito tanto para um como para outro e, finalmente, recebendo um valor constituído, com uma chancela jurídica de seu valor. Quando mercadoria valia o que ela era em sua ensidade econômica; como papel moeda, o valor que significava. Como mercadoria valia o que valia, com as alterações de valor da própria matéria econômica que era. Desse modo a moeda como mercadoria, com valor intrínseco era materialmente o que sua matéria econômica era e valia e, formalmente, era um instrumento econômico que significava em sua unidade a unidade de valor econômico de qualquer operação em sua especificidade.

A moeda cunhada tinha, no início, um valor permanente, o valor da matéria que possuía, ou seja relativamente à permanência do valor desta. Mas os governos que sempre têm grandes dificuldades monetárias dispõem menos de moedas do que gastam, usaram o recurso, a princípio desonesto, de mudar o título da moeda, ou seja de diminuir a matéria valiosa por meio de combinações ou por diminuição da mesma, embora mantendo o mesmo valor que expressava segundo o nome que possuía. Era distinguível um valor real e um valor nominal. O valor real é o que a moeda cunhada tem segundo a matéria que possui, e nominal, o valor do nome que recebe. Assim se a moeda é escudo e é de ouro, o valor real do escudo é o valor do ouro em sua proporção com outro metal, ou seja, o seu título, e o nominal é o valor do escudo tomado como significado econômico. Ora, como o valor nominal não mais corresponde ao anterior valor real, mas ao atual, esse escudo se desvaloriza. Consequentemente a moeda valoriza ou se desvaloriza consoante o grau de significabilidade que ela tem em relação valor real. Esta é uma verdade simples, mas segura.

Então por que há tanta celeuma em torno da moeda? Pela simples razão de que a que hoje é usada não é mais ou apenas não é a moeda de valor intrínseco, mas a de valor extrínseco, o papel-moeda. Esta aponta a um valor e este é valor de signifcabilidade, e não propriamente a matéria que a compõe. Não vale por esta, mas pelo valor que indica. Ora, se o valor que indica permanece o mesmo e o papel-moeda também permanece na mesma quantidade, ela vale o que ela vale. Mas acontece que o Estado, com as suas dificuldades financeiras, necessita pagar o que gasta e o que deve, e tem de fazê-lo por meio de papel-moeda, e como o seu débito é escriturado em unidades desse papel-moeda, a solução mais simples é emitir cada vez mais para pagar o débito. Essa emissão sendo um aumento de papel-moeda, redunda numa diminuição da significabilidade real do mesmo, embora sua significabilidade nominal permaneça a mesma. Diz-se, então, que a moeda se desvalorizou.

A proporção é simples:

a) aumento de papel-moeda sem aumento do significado real: desvalorização da moeda;

b) aumento do papel-moeda com proporcionado aumento do significado real: paridade da moeda;

c) permanência da quantidade de papel-moeda com aumento do significado real: valorização da moeda;

d) aumento do papel-moeda com aumento maior do significado real: valorização proporcional da moeda.

Falta descobrir qual o significado real da moeda ou seja: que valor o papel-moeda significa.  Sendo ele um significante de valor econômico, o que se exige de essencial para um significante? O termo genérico é sinal. Mas estes podem ser arbitrários ou naturais, ou seja: os primeiros significam convencionalmente; os segundos têm uma analogia com o significado. São os símbolos. Há muitos filósofos que confundem símbolos com sinais. O símbolo é genericamente um sinal, mas especificamente se caracteriza pela analogia que tem por participação com o significado. Essa participação é formal ou pode ser real. No caso da moeda-mercadoria esta tem um valor econômico em si mesma e a sua participação com a economia seria real. Teria um valor análogo a qualquer outro valor econômico em si mesma, e a sua participação com a economia seria real. Quando se trata do papel-moeda temos de distinguir o convertível e o não-convertível. O primeiro tem uma analogia com o valor econômico, porque significa uma matéria de valor econômico e o segundo tem um valor não real, mas abstrato, segundo alguns economistas e diríamos: um valor de significação quanto a um significado de valor econômico. Enquanto se trata da moeda convertível, as dificuldades não são tão grandes, mas se for uma moeda não-convertível é mister precisar qual o valor econômico ao qual ela se refere ao significá-lo. Como não é um valor determinado especificamente, pois não significa café, cacau, algodão, trigo e sim genericamente tudo isso, segundo a sua unidade de valor, podemos colocá-la neste esquema:

a) a moeda-papel convertível significa, segundo sua unidade, o valor econômico, tomado também unitariamente, da matéria que significa;

b) a moeda-papel inconvertível significa o valor unitário tomado abstratamente do valor econômico. Neste a moeda-papel inconvertível vale o que ele vale. E qual é esse valor econômico? Como não é uma moeda lastreada por um determinado bem econômico de valor, como o ouro ou a prata nos sistemas metalistas, só pode significar o que o país produz economicamente.

Esta é uma verdade econômica e financeira, e tanto o é que todas as tentativas de valorizações artificiais, por meio de artifícios jurídicos ou por providências despóticas do poder estatal, não a conseguiram modificar. O valor da moeda inconvertível é proporcionada ao montante do valor da atividade econômica. É comum falar-se na renda nacional, considerando-se incluso nesse conceito tudo quanto é produzido num país, num determinado período de tempo. À primeira vista o conceito é claro. Mas desde o momento que se procura precisá-lo, há dificuldades e controvérsias entre os economistas. Eles reconhecem a dificuldade em determinar estatisticamente essa renda nacional, global, que inclui toda a atividade econômica de um país.

Assim atividade econômica é tudo quanto se refere à produção de bens e de serviços e o consumo correspondente. Neste caso verificar-se-ia que a significabilidade da moeda inconvertível é bifronte. É patente que a precisão nítida, matemática, precisa do seu valor, torna-se praticamente impossível ante a variância dos fatos econômicos e a heterogeneidade das operações e da acidentalidade correspondente às mesmas.

São várias as razões e podemos salientar: se a emissão da moeda inconvertível destina-se diretamente ao consumidor, este poderá poupá-la e empregá-la para adquirir bens de que necessita. Neste caso a procura aumenta na proporção dessa destinação. Consequentemente os preços são estimulados a subir. Falamos em estímulo porque, como salientamos ao estudar o mecanismo dos preços, o fator psicossomático e outros, com raízes psicológicas, atuam no aproveitamento do interesse do comprador e a visão de lucros maiores leva ao aumento dos preços, já que estes não sobem apenas pelo mecanismo entre oferta e procura. Essa moeda das mãos dos intermediários tende a dirigir-se para o produtor e estimula, por sua vez, a produção, enquanto os preços permanecem na posição que alcançaram. Aumentando-se a oferta, dá-se o inverso, não numa proporção rigorosa, mas relativamente à capacidade de compra do consumidor, tendendo os preços a descerem. Dentro desses fluxos e refluxos atua a economia chamada liberal, dizem os economistas. Mas se observarmos os fatos, tal não se dá sempre nem precisamente assim, porque há muitos recursos que procuram "burlar" a lei da oferta e da procura que, como toda lei econômica, não tem a rigidez mecânica e matemática em sentido quantitativo dado pelos economistas. Ademais o Estado pretende também intervir na modificação dessa lei, como a história está cheia de exemplos, tabelando preços (sempre inutilmente), vendendo produtos a preços baixos (solução apenas provisória e que não soluciona nada), oferecendo subsídios, primas, etc., que também não solucionam, porque são retirados de disponibilidades que faltarão em outro lado e que, de qualquer forma, são pagos indiretamente pelo povo.

A solução deflacionária também não soluciona. Ao contrário, cria problemas maiores porque precipita a insuficiência de meios de pagamento em relação aos bens econômicos oferecidos, resultando daí uma perturbação no equilíbrio entre a produção e consumo. Há economistas que aconselham a retração de crédito já que uma redução radical levaria muitos industriais e comerciantes a liquidarem seus estoques, forçados a obterem numerário suficiente para atender seus compromissos, o que os levaria a baixar os preços e o consumidor levaria vantagem. Mas se o produtor é obrigado a vender sua mercadoria com lucro mínimo (ou nenhum) ou até com prejuízo, não é só ele que perde, porque há uma solidariedade na economia que não permite separar-se real-realmente um aspecto da vida econômica de outro. Se tal acontece, há um "resfriamento" no ímpeto produtivo. Crescem as perspectivas de riscos e os capitais tornam-se mais dificilmente mobilizáveis para a produção. Por outro lado há o "mirramento" de certas atividades econômicas e ademais o lucro não deve ser jamais compreendido como a perda de um lado a favor do outro. O não se ter tido uma noção clara do que ele é realmente e do que deve ser o lucro, levou a tanta confusão na economia e nas ideias sociais.

Há economistas que aconselham ao consumidor diminuir o consumo para forçar a baixa de preços. Mas tais soluções não são econômicas, são políticas. E não se deve confundir economia com política. Podem elas trazer resultados provisórios, não porém definitivos. Se o consumidor consome menos, priva-se de valores de que necessita, os estoques se abarrotam, os pedidos dos produtores decresce, a produção diminui, o desemprego aumenta, e termina o consumidor por não dispor de meios de pagamento nem para comprar o que já lhe custa menos. Essa solução gera outro ciclo vicioso com suas consequências críticas, perigosíssimas, além de criar clima para agitações sociais.

No entanto, a estimulação da produção é mais benéfica, porque ela fará aumentar a oferta, ao mesmo tempo que aumentará os meios de pagamento dos consumidores, e trás como consequência a redução de preços, a valorização da moeda, se não houver emissões, ou mesmo quando as haja, sejam apenas destinadas a aumentar a produção e a tudo quanto atua em consonância com esta, como transportes, aumento de energia elétrica, construção de silos, entrepostos, higiene, etc. O financiamento correto da produção é um financiamento indireto do consumo e só há equilíbrio econômico onde há equilíbrio entre produção e consumo.

Naturalmente para que os preços não baixem de modo a prejudicar a produção como poderia acontecer num excessivo financiamento da mesma, deverá este ser dosado nas proporções requeridas ou então num desejo amplo de desenvolvimento do país, ser acompanhado de um imediato financiamento do consumo, como se dá através do sistema de crediário, do financiamento das empresas crediaristas, e também pela realização de obras (não suntuárias) por parte do Estado, que se destinem a melhorar as condições da produção. Desse modo essas emissões não seriam inflacionárias porque estariam perfeitamente compensadas pelo aumento da produção e das condições que lhe são necessárias.

Além disso, e aqui está o mais importante, é mister cuidar da produtividade, do índice de intensidade da produção. Esta deve ser uma das maiores preocupações dos organismos interessados na mesma. E quais são eles? O Estado com seus políticos e seus burocratas? Não; mas as chamadas classes produtoras. Estas é que devem cooperar para solução deste problema de magna importância. Sem o aumento de produtividade, a produção por si só não realizará o equilíbrio desejado. Um aumento de produção sem aumento da produtividade implicaria um aumento de mão de obra, consequentemente alta desorientada de salários e consequente aumento do custo de produção; e todo o plano cairia em frangalhos...

A moeda é, pois, o significante do valor econômico proporcionado ao montante global da atividade econômica de um país num determinado período de tempo. Um povo que tem uma moeda, pode tê-la convertível ou não e gozar de créditos maiores ou menores ou não dispor de reservas de valor econômico ou não. Neste caso sua moeda dependerá ainda das reservas de valor que possua, e incluiríamos nesse conceito o crédito que dispõe. Eis o enunciado: a moeda é o significante do valor econômico, proporcionado ao montante global da atividade econômica de um país num determinado período de tempo e às reservas de valores econômicos que o mesmo possua.

Esses valores econômicos que constituem sua reserva dependerão de fatores não só econômicos mas também políticos, históricos, sociológicos, éticos, etc., porque a sua mobilização dependerá de tais fatores que poderão favorecer ou obstaculizar a sua atualização.

Há um fato importante na valorização ou desvalorização da moeda: o salário. Há salários solváveis e insolváveis. Solváveis são ao que são pagos para a produção de bens de certo modo reprodutivos, e insolváveis os que se referem aos que não o são. Não é fácil estabelecer o grau de reprodutividade. O pagamento do soldado é um salário insolvável, pois o exército é um grande consumidor. O salário de um vendedor de seguros de vida é insolvável. Contudo, o salário de um vendedor, de um taxista, é de certo modo insolvável mas também é solvável porque presta serviços ao consumidor e ao produtor, aproximando-os e estimulando as relações econômicas e favorecendo o estímulo à produção e ao consumo. O volume dos salários insolváveis e a sua percentagem sobre a produção é um dos fatores de encarecimento dos preços e de desvalorização da moeda.

A moeda inconvertível poderia parecer à primeira vista, como aliás parece para muitos economistas e financistas, que só a moeda convertível oferece a garantia desejada, o equilíbrio que se pretende para a vida econômica de um país. O Estado está sempre "faminto" de numerário e desejará obtê-lo à custa de empréstimos, e quando não os consegue por este meio, procurará a emissão, mesmo que essa seja controlada por um instituto independente; porque há sempre o recurso do Estado decretar a inconvertibilidade ou pelo menos a suspensão da convertibilidade dos bilhetes. Mas o Estado recorre à inflação para aumentar os meios de pagamento. É um mal, mas maior é haver carência de meios de pagamento em relação aos bens econômicos ofertados, o que decorre do desequilíbrio entre a produção e o consumo. Na verdade a inflação não é o melhor remédio, mas é o que surge logo aos olhos do governante inexperto. É preciso encontrar outro recurso que faça frente à dificuldade. O maior problema de toda organização econômica é a falta de correspondência entre o crescimento do volume dos meios de pagamentos e o crescimento do volume dos bens econômicos disponíveis. O verdadeiro problema a resolver é o desequilíbrio observado, e não a preocupação de maior ou menor emissão de moeda. O que é mister é que os meios de pagamento possam absorver todos os bens econômicos disponíveis, e que haja bens econômicos proporcionais, do contrário a crise é maior e mais perigosa.

Os que mais atacam a inflação são frequentemente aqueles que oferecem as piores soluções. Não basta apenas querer evitar a inflação que não nasce por geração espontânea, mas por imposições de desequilíbrio econômico. Não se trata de banir para sempre a inflação, mas sim de impedir o desequilíbrio entre os meios de pagamento e a produção.

Muitos economistas julgam que a única solução é a baixa dos preços, obtida pela ação combinada do Estado e das organizações privadas, ou para alguns liberalistas, deixar que as coisas sigam o seus caminho (laissez faire, laissez passer) de modo que a crise se resolva por si mesma pela baixa dos preços e pelo desaparecimento das empresas menos aparelhadas para resistir a concorrência. Mas essa solução traz prejuízos vários que precisamos saber se são ou não evitáveis. Se são, por que iremos preferir uma solução dessa espécie? Não haverá outros métodos capazes de alcançar os mesmos resultados sem necessidade de tantas consequências desastrosas?

Quando funcionava o sistema do padrão ouro, o estoque monetário real sofria um aumento relativamente pequeno de ano para ano. Mas ao mesmo tempo o estoque das mercadorias disponíveis crescia numa proporção muito maior, devido ao progresso técnico. Era o caso em que o volume de moeda crescia menos que o volume da produção. Os meios de pagamento não eram suficientes para dar vazão à produção e as crises provenientes dos estoques abarrotados eram inevitáveis, pois os produtores não conseguiam colocar tudo quanto produziam. Processavam-se então as crises cíclicas da produção e elas se sucediam de tal modo, que já se estabelecia serem inerentes ao regime capitalista como o proclamavam os socialistas e muitos capitalistas.

Não se tinha uma teoria clara, precisa das crises e, consequentemente, também não se tinha possibilidade de alcançar meios técnicos capazes de resolver tais crises. E o que se fazia? As práticas mais rudimentares e primárias foram usadas: emissão de moeda além do lastro, da cobertura, o que foi feito já abusivamente, a organização de um crédito sobre os estoques abarrotados, ao qual faltava a realidade e a base verdadeira. Desse modo aumentaram-se os meios de pagamento, mas esse foi feito de modo abusivo e prejudicial e deslocou-se a crise de um lado para outro, continuando a permanecer a mesma que surge do desequilíbrio entre os meios de pagamento e a produção. Os remédios não curavam, mas apenas retardavam os instantes catastróficos, e a crise irrompia, posteriormente, mais intensa!

Surgiu a dúvida: não seria essa crise inerente ao regime de produção e de distribuição em que vivemos? Poderão os economistas encontrar um remédio realmente eficaz? Em face de tais acontecimentos a teoria dos que julgam que o padrão ouro resolveria as crises esquecem-se que o padrão ouro não as evitou, e foram elas que fizeram abandoná-lo de vez. Há não poucos decênios atrás, era verdadeiro tabu o padrão ouro. Nem se suspeitava que pudesse ser posto à margem. Se à moeda subitamente se lhe tirasse o lastro, a cobertura que a garantia passaria a ser um mero papel pintado, sem valor algum. Contudo os fatos negaram as previsões. Moeda papel sem cobertura continuou valendo, embora menos é verdade, mas continuou valendo. E por quê? Porque com elas pagavam-se dívidas e impostos e por isso foram aceitas como meios de pagamento para os produtores e salariados. Afirmamos que se o padrão ouro oferece algumas vantagens, oferece inúmeras desvantagens, e não resolve o problema.

Desaparecida a cobertura metálica não desaparece o valor da moeda. Por outro lado não são suficientemente convincentes as razões que apresentam os defensores do padrão ouro, ademais dos fatos demonstrarem que se podem regular as transações sem tal espécie de moeda, quer internamente, quer externamente e não impede a emissão abusiva, não evita a inflação.

Não podemos nos excluir de duas realidades:

1) A Produção que gera a Oferta.

2) O Consumo que gera a Procura.

Ante as dificuldades que oferece a vida econômica não é de admirar que se pergunte por que meio ela poderá ser regularizada. Qual o organismo que poderá realizar essa função? Na verdade não há tal organismo porque o Estado não é capaz de fazê-lo.

Há economistas que acreditam que basta apenas o aumento da produção para que logo surjam, como por milagre, os meios de pagamento. É verdade que o aumento de produção cria aumento de salários e outras rendas, mas por si só não é capaz. E por quê? As injustiças sociais continuam, o enriquecimento exagerado de uns se realiza em detrimento de outros; a produção é irregular, muitas empresas perecem, há desemprego e as perturbações políticas não cessam. Em suma, uma série de fatores extra-econômicos atuam na economia. A crise que se instala no mundo inteiro tem raízes que vão além do campo da economia, porque não é só dela que vive o homem.

Mas qual é o valor da moeda? O valor subjetivo? Não. O que pode interessar à economia é o valor objetivo, o valor de compra, de aquisição. E esse é dado pela renda e não pela moeda em circulação, que é apenas o numerário e que não se deveria confundir com aquela. Afirma-se que a alta dos preços é uma decorrência do aumento das emissões, da circulação monetária. No entanto, sem sempre se verifica isso, mas o contrário, o aumento dos preços antecede as emissões.

Para alguns economistas se observa que em certos países e em certas circunstâncias a emissão de papel moeda produz uma alta de preço, mas assinalam que esta alta se deve a causas estranhas à injeção na circulação de um numerário superabundante. Por si só o numerário não aumenta os preços, O que aumenta é a desproporcionalidade da renda em relação à produção.

A inflação realizada pelo Estado nada mais é do que um empréstimo indireto e violento porque é unilateral, não sendo consultada a sua vítima, o povo, e ainda emite moeda falsa por boa. A distinção que se deve fazer entre o numerário e a renda está em que este poderá ser suficiente para todas as transações na quantidade que forem, mas a renda pode ser insuficiente para absorver toda a produção disponível. Não há uma equivalência entre os meios de pagamento e a produção, embora muitos pensem o contrário. E tal se dá porque há a poupança e nem todos compram tudo quanto podem comprar, nem pagam tudo quanto devem.

Em face das inúmeras teorias sobre a moeda, depois de se haver posto de lado aquelas concepções que apenas se fundavam nos aspectos acidentais e não captavam as suas verdadeiras propriedades, que são as fundadas na sua essência; depois de se considerar tudo quanto se disse e se escreveu sobre o assunto, o que se pode concluir é que a verdadeira garantia de uma moeda é constituída pela massa de bens econômicos disponíveis que por meio dela se podem adquirir. Referimo-nos à moeda e não ao numerário. Quanto a este seu valor é proporcionado à moeda (ou melhor dinheiro) que ele representa.

Se as emissões de papel moeda tendem a financiar o consumo é necessário financiar a produção para evitar que os preços subam. Quanto ao aumento dos preços é preciso não esquecer que estes não surgem apenas das emissões, pois sem elas podem eles subir, como elas podem ser a consequência da alta dos preços. Há muitos fatores que provocam a alta dos preços e muitos podem ser desviados.

Se a inflação é um mal, a deflação é um mal ainda maior. O que jamais se deve fazer é privar a nação de meios de pagamento, sem os quais não é possível nenhuma economia mais ou menos estável. Construir uma economia estável é uma ingenuidade. As crises são inerentes ao homem e consequentemente à economia. O que se pode fazer é atenuar seus males, suas consequências perniciosas e isso não é apenas conseguido através de medidas estatais, mas com o apoio de todos num grande ato de cooperação. Contudo se o que se tem chamado socialismo não tem sido também capaz de resolver as crises econômicas, há um regime que pode conseguir aminorá-las: é o cooperacional.

Um dos preconceitos mais comuns que só tem servido para prejuízo do homem, é julgar que devemos de uma vez para todas desterrar de nossos olhos os ideais. Mas tudo surge de não se ter claramente ante a mente o que significa ideal. Ideal é a perfeição não realizada facticamente, e que nunca o será por nenhum ser finito, contingente, limitado. Assim a sabedoria ideal é a sabedoria perfeita, o saber sem deficiências de mínima espécie, o saber imediato, capaz de penetrar o último mistério de todas as coisas. Esse saber é para nós um ideal. Jamais o homem o alcançará na sua plenitude, mas dele pode aproximar-se a pouco e pouco, através do seu esforço constante e da sua constante devotação ao trabalho intelectual. Também é assim a saúde ideal, a vida ideal e todas perfeições que somos capazes de captar. O que é capaz de ser alcançado realmente por nós, por nossos meios, por nossas próprias deficiências não é o ideal, mas apenas uma aproximação dele, um estado que dele participa.

Realmente toda ciência tem um ideal e a economia também. A sociedade economicamente perfeita jamais existirá. Já se foi a época das utopias renascentistas e das quimeras socialistas. Estamos agora na era da realidade social.

E que poderá levar o homem a essa revolução permanente, que não violenta os degraus porque eles se vingam, propiciando quedas espetaculares, essa revolução que se processa aos poucos, permanente é que o ideal alimenta, inspira e guia. Tudo isso nos vem à mente em face de financistas e economistas que julgam a economia capaz de encontrar a formula mágica, que resolverá por fim o problema da moeda, e fará o equilíbrio perfeito entre os meios de pagamento e a produção. É um ideal que facticamente jamais será alcançado, embora possa o homem aproximar-se desse equilíbrio perfeito. Para tal é preciso que se saiba realizá-lo, que exige um organismo capaz de realizá-lo, que só pode ser constituído pelos interessados num grande organismo social, e jamais o Estado, que é o menos competente, embora seja o todo-poderoso. Jamais se encontrará a forma perfeita, porque ante o dinamismo e o cinematismo da vida social e econômica e a quase impossibilidade de manter estatísticas perfeitas, o equilíbrio estável, estático, é impossível, e só um equilíbrio dinâmico é possível.

O problema da moeda tem a sua fórmula dinâmica de equilíbrio, sem magia, e que consiste apenas no que pode realizar entre os meios de pagamento e a produção. E esse equilíbrio será dinâmico e nunca estático. Também é outra ilusão julgar que poderemos alcançar uma sociedade humana sem crises, pois ela é inerente ao ser humano, que é um ser de crise e que dela jamais se separará. Nunca chegaremos a essa sociedade ideal. Ela apenas nos está a exigir a aproximação constante. É uma promessa que ultrapassa as nossas forças, mas suficientemente forte para nos desafiar. (1)

(1) SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed. São Paulo: Matese, 1965.