Capital

Capital

CAPITAL. a) Como adjetivo significa axiologicamente o que é mais importante, o essencial de alguma coisa.

b) Como substantivo, na economia, significa o conjunto das riquezas que podem servir à produção de bens de consumo ou de rendas. Em linhas gerais, capital é toda riqueza que não se destina ao consumo imediato, mas sim à produção de outras riquezas.

O conceito de capital na economia: (do lat. caput, cabeça, e indica o principal, o que está acima de tudo.)   No sentido vulgar o termo capital tem uma acepção bastante vasta e de contornos indefinidos. Para uns é o conjunto dos bens aplicados à produção; para outros, incluem-se em seu âmbito até bens não econômicos como capital intelectual. Para o industrial é o conjunto de seu estabelecimento, máquinas, estoques, etc. enquanto para outros apenas os valores monetários, etc.

O capital está incluído no conjunto dos fenômenos econômicos e apresenta-se como resultado de um cálculo, de uma comparação entre as satisfações presentes e as futuras; consequentemente na conveniência de sacrificar bens presentes, já adquiridos ou por adquirir, para devotar o trabalho à realização desse novo elemento, que permitirá obter maior quantidade de bens ou de melhor qualidade.

O preço está ligado ao caráter econômico dos bens, isto é, à sua limitação ou raridade. Todos os bens limitados e raros têm um preço. Para exemplificar a formação de um capital, o homem era obrigado a sacrificar bens poupados, ou então ceder parte do seu trabalho, com sacrifício da satisfação das suas necessidades ou a aplicar maior soma de trabalho para obtenção dos utensílios que lhe era necessários, é o capital um bem ou bens que sofreram alterações, com o fim de servir para o aumento quantitativo ou qualitativo de novos bens. Assim, todo capital custa, é um bem limitado, raro.

Conceito e forma do capital: Quanto às doutrinas apresentadas Perroux assim as distribui:

1) As noções contábeis.

Sob este ponto de vista o capital é definido como o conjunto de valores monetários, tornados constantes pela prática da amortização. Numa indústria, as máquinas, o estabelecimento, os utensílios, etc., são bens perecíveis, quer em sua materialidade (uma máquina se usa, um instrumento se gasta), quer em sua eficacidade econômica (desuso das máquinas em consequência de progressos técnicos). Desta forma nos balanços anuais, uma soma determinada, julgada suficiente para que sejam reconstituídos os bens que se usam, é debitada sobre o produto de uma empresa. Assim o capital permanece constante, permanente, invariante, segundo muitos economistas. Essa constância é, entretanto, avaliável, porque se podemos prever exatamente a usura (de uso) de uma máquina, não o podemos, com a mesma exatidão, as transformações técnicas.

Esta noção de capital está ligada à de renda, que é um conjunto de valores monetários, que um indivíduo obtém do emprego de sua força de trabalho, e que pode ser empregada em bens de consumo, sem que seja atingido o capital, se o indivíduo o tiver. Segundo essa noção a renda é um excedente de valores monetários. Através dessa noção o capital e a amortização dependem da vontade do agente econômico que, premido por diversas circunstâncias, poderá reduzir, na prática, as amortizações.

2) As noções técnicas

Os economistas que expõem tecnicamente a noção de capital, argumentam com a divisão entre bens diretos e indiretos. Os primeiros são os bens de consumo, os segundos os de produção. Assim, na produção de um bem de indústria extrativa, como um cereal, a semente, a terra, a luz, as máquinas, que depois o transformam, são bens indiretos. Para combater essa doutrina bastaria perguntar se poderíamos pôr na mesma classificação as propriedades físicas e químicas do solo, da água, da luz com as máquinas e utensílios.

Os economistas clássicos ingleses definem o capital como o conjunto de bens de produção já produzidos. São os que tendem a uma transformação material de outros, e que têm a virtude de aumentar a sua propriedade em satisfazer as necessidades humanas. Assim o conjunto dos bens produzidos é o resultado de uma combinação de fatores naturais e do trabalho. Dessa forma excluem as propriedades naturais e gratuitas dos bens indiretos, evitando a noção acima exposta. Por essa explicação são distinguidos um dom gratuito e um esforço. Contudo é difícil distinguir o fator de o elemento natural. Imaginemos uma queda d'água que pela intervenção humana é transformada em força motriz. As propriedades físicas e químicas da água formam o fator natural. Mas o esforço humano a transformou. Como distinguir aqui o fator humano de o elemento natural?

Para solucionar as dificuldades a escola austríaca de Bohn Bawerk concluiu que o capital técnico é o conjunto dos bens indiretos ou intermediários que, mediante uma diminuição de tempo, tem a virtude tornar mais produtivo o trabalho humano. Por exemplo um homem que tem uma obra a executar. Antes de fazê-la, prepara-se para fazer instrumentos que tornarão mais fácil e eficiente o seu trabalho. Com isto poupa tempo e aumenta a produtividade. Tais análises permitiram à escola austríaca formular, embora abstratamente, uma noção do capital tecnicamente considerado. O ato de produção é uma combinação de fatores naturais, capital e trabalho, e o resultado é um produto. Uma fração desse produto global é imputável a cada fator. Os três são necessários para a integralidade do produto, mas se pode determinar (abstratamente, é lógico) uma fração deste para tal ou qual fator.

3) As noções jurídicas do capital.

O capital é um conjunto de valores monetários que, numa organização jurídica e social determinada oferece a particularidade de fornecer, a quem o possui, uma renda sem trabalho atual (em ato) Para Adam Smith capital é todo bem que permite obter renda, não distinguindo assim a noção técnica e a noção jurídica. Dessa forma a noção de capital, juridicamente considerado, é mais ampla que a de capital tecnicamente considerado, porque além de incluir os capitais técnicos, inclui ainda os direitos reais, a terra, etc. A renda, no campo jurídico, está coordenada com a mesma noção. Ela é sem trabalho atual, e pode se dar pelo empréstimo, decorrendo dele uns juros, pela inversão (ou investimento) na empresa, para obtenção de benefícios, comprando trabalho humano, etc.

4) A inclusão do tempo na noção de capital e renda.

Segundo Irving Fischer: a) o capital não é um grupo de bens determinados em relação a outros bens, mas o conjunto de todos os bens existentes num dado instante; b) a renda é o fluxo de serviços que decorrem desse conjunto de bens durante um período de tempo.

Uma série de problemas surgem daí: como decorrem serviços de certos bens? Por eles têm a propriedade de aumentar os serviços retirados pelo homem de outros bens? Perguntas que decorrem de uma concepção meramente quantitativa do capital. Ao formar-se uma nova estrutura, com uma nova forma, novo ser, tem ela uma tensão (coerência) diferente, nova, que não é apenas uma soma das tensões das partes componentes, mas especificamente diferente. Assim a tensão do corpo de um homem não é apenas uma soma das tensões dos sistemas que o compõem. Um bem produzido não é apenas o que é quantitativamente, mas diferente. E, quando em ação, pode produzir outros, cuja estrutura ou plano tem possibilidades novas e muitas vezes diferentes ou maiores que as que compõem as suas partes. Um bem pode, deste modo, permitir que aumentem os serviços retirados pelo homem de outros bens.

As quatro noções expostas oferecem apenas aspectos abstratos. São verdadeiras em suas afirmações, mas falsas quando se negam; isto é, quando querem anular as afirmações das outras, pois elas se completam, sem na realidade se oporem. Seu conjunto nos permite formar uma noção mais concreta do capital.

Quando o homem percebeu que, com o auxílio de determinados objetos, podia aumentar sua produtividade, criou o capital. Mas, nesse instante, criou uma série de possibilidades novas, porque já no primeiro instrumento de trabalho estava, em potência, todo o desenvolvimento posterior. O capital é, também, suas possibilidades, e permite que se atualizem possibilidades de bens que, sem ele, não poderiam atualizar-se. Por isso é que certos bens têm a propriedade de aumentar os serviços que o homem retira ou pode retirar dos outros.

Examinemos a noção geral de capital em face dos diferentes sistemas econômicos. Numa economia fechada os capitais técnicos estão presentes, embora o capital jurídico não tenha tanta importância. Numa economia socialista o capital jurídico é eliminado para subsistir apenas o técnico. Mas é preciso que essa economia socialista seja plenamente socialista. Quando os socialistas propõem-se a suprimir o capital, querem suprimir o capital jurídico. E, quando os liberais afirmam, que "o capital é eterno", fundam-se no capital técnico para justificar o jurídico. Ambos empregam a mesma palavra para significar realidades diferentes e concordam na impossibilidade de suprimir o capital técnico, mas em suas intenções, um ataca o que o outro quer defender.

Concretamente capital é o valor ou o conjunto de valores econômicos indiretos que permitem aumentar, atual ou potencialmente, a produtividade do trabalho, ou criar a renda sem trabalho atual.

Capitais fixos e capitais circulantes:

Antes de dar os enunciados dessas duas espécies, vejamos um exemplo. Um criador tem muitas cabeças de gado, algumas destinadas aos trabalhos de campo e da agricultura. Parte ele leva ao mercado para vender. Para Adam Smith o primeiro gado é capital fixo, e o que é vendido, capital circulante. Essa interpretação de Smith é combatida por muitos motivos: 1) é uma concepção fluídica e imprecisa de capital, pois ora parece querer referir-se a valores monetários, ora a bens em sua realidade material; 2) os fatos desmentiram as afirmações. Os capitais chamados fixos, como os estabelecimentos, as máquinas, tomaram uma importância preponderante. Além disso a classificação entre capital fixo e capital circulante, gera mal-entendidos. Adam Smith fundava-se no fato de permanecer o bem no patrimônio, e tínhamos um capital fixo, ou de sair do patrimônio, e tínhamos um capital circulante. Capitais fixos são os que podem concorrer em diversos atos de produção sem se transformarem materialmente. Exemplo: as máquinas, as instalações, etc. Capitais circulantes são os que se destroem ou se perdem no ato de produção em que intervêm. Dessa forma não se visa mais a um deslocamento patrimonial, como no caso de Adam Smith, mas a uma transformação ao mesmo tempo técnica e econômica do bem. No entanto essa classificação é relativa, pois a moeda é, para o empresário, um capital circulante; mas para o país é um capital fixo.

Clark, economista americano, propõe que essa classificação seja substituída pela de capitais ativos e capitais passivos. São ativos os capitais que têm a propriedade de conferir utilidade, e passivos os que têm a propriedade de receber a utilidade. Mas esta classificação também é relativa, pois capitais passivos podem tornar-se ativos e vice-versa. A classificação entre capitais fixos e circulantes está entranhada na prática comercial e industrial, razão pela qual perdura, apesar de seus defeitos. Entretanto algumas razoes de ordem filosófica explicam bem a angústia de alguns economistas quando se encontram ante essa classificação.

É um natural desejo do homem — de índole racional — fixar, delimitar, dar contornos nítidos, precisos, estáticos às suas compreensões, como querer que o capital seja isso ou aquilo, e que essa alternativa seja estática, e não compreender o dinamismo da vida, onde está incluída, naturalmente, a economia. Dessa forma a transitividade, o transitar de um capital para fixo ou circulante, para passivo ou ativo, não implica uma fraqueza dessas classificações, a não ser quando consideradas do ângulo da fixidez absoluta. A realidade concreta é dinâmica e a economia, sob pena de se tornar uma disciplina inane, tem de ser dinâmica. O capital é fixo ou circulante, ativo ou passivo em sua função no tempo e no espaço. O ferro, que serve para a confecção de um martelo, é um capital passivo, para tornar-se ativo. Recebe a utilidade no primeiro tempo e serve depois para conferir utilidades no segundo tempo. Sem incluirmos o tempo em nossos estudos econômicos, isto é, o dinamismo, o movimento, a intensidade, faremos uma análise abstrata. (1)

(1)  SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed. São Paulo: Matese, 1965.