Capitalismo: Uma Breve Introdução (Notas do Livro)

Introdução

O termo "capitalismo", apesar de sua desinência, não corresponde a uma construção do espírito ou a um sistema teórico. Foi forjado no século XIX por socialistas franceses, como Proudhon, Pierre Leroux ou Blanqui, que assim designavam o sistema econômico e social de sua época, um sistema que esperavam ver substituído, em um prazo mais ou menos longo, pelo "socialismo". Marx e Engels, não usavam esse termo, mas "modo de produção capitalista" ou "economia burguesa". Muito rapidamente, por efeito da pena dos doutrinários, esse neologismo adquiriu uma conotação pejorativa, associado como estava por eles a noções de injustiça ou exploração, a tal ponto que os autores liberais o substituíram por expressões que, em sua maneira de pensar, eram mais neutras, como "economia de livre empresa" ou "economia de mercado".

Desde o século XVIII, a palavra "capitalista" designava alguém que possuía capitais financeiros e que os empregava em investimentos.

A figura do capitalista era entendida em dois sentidos: 1) como possuidor de um capital que se esforçava para investir de forma a fazê-lo crescer; 2) empresário aplicando recursos na sua própria empresa. Possuidores de capitais e assalariados. Investir para crescer e ter lucro. O estado que permanece estacionário é estranho à essência do capitalismo.

Dentre as várias definições de capitalismo, prefere a de Schumpeter (1833-1950): o capitalismo define-se pela apropriação privada dos meios de produção; pela coordenação de decisões por meio de trocas, em outros termos, pelo mercado; finalmente, pela acumulação de capitais através de instituições financeiras, ou seja, pela criação do crédito. Por sua vez, o socialismo: trata-se de um sistema caracterizado pela apropriação coletiva dos meios de produção. A coordenação das decisões, a aplicação dos recursos produtivos e o ritmo da acumulação dos capitais são nele determinados por um conjunto de injunções previamente estabelecidas, ou seja, um Plano, que substitui o mercado.

Uma ressalva ao "comunismo". Trata-se de um sistema teórico que, segundo os termos do próprio Marx em sua Crítica ao programa de Gotha (1875), estava destinado a obedecer à fórmula: "De cada um conforme suas capacidades a cada um conforme suas necessidades". A realização desse plano parecia ser uma possibilidade longínqua, porque supunha um tal desenvolvimento das forças produtivas que a escassez seria totalmente abolida e todas as pessoas teriam acesso direto e gratuito a todas as coisas de que tivessem necessidade, deixando de lado até mesmo a moeda. Os russos, após a experiência trágica do comunismo, passaram a adotar a máxima: "De cada um conforme suas capacidades a cada um conforme o seu trabalho". O nome "socialismo" foi adotado então pelos próprios russos para designar esse regime transitório.

Capítulo 1 — As Origens do Capitalismo: Um Esboço Histórico

Caráter revolucionário. Revolução Industrial. Império Romano...

O nascimento e a evolução da economia medieval

O início do capitalismo, tal como entendemos hoje, poderia ser localizado a partir da Idade Média. É inegável que antes da Idade Média já existiam comerciantes, empresários e financistas. Todavia, foi na Europa, a partir do século XII, que se assistiu ao desenvolvimento de um sistema socioeconômico inteiramente orientado para a acumulação de riquezas e de capacidades produtivas.

O fim da ordem romana — no começo do feudalismo, o problema essencial das pessoas era segurança, segurança esta que não podia mais ser garantida pelo poder imperial enfraquecido. Mediterrâneo, chamado de Mare Nostrum, era o epicentro das trocas. A tomada de Constantinopla pelos turcos começaram a assumir as funções econômicas que antes pertenciam a Roma.

A ordem feudal: da defesa à expansão — Os principais traços do sistema feudal podem ser descritos como uma rede de prestações, contraprestações e sujeições em que cada indivíduo estava inserido. A autarquia das unidades rurais, a diminuição dos intercâmbios comerciais e o desaparecimento quase completo da moeda devido à tendência ao entesouramento, fizeram com que o escambo se tornasse a modalidade típica de trocas e transações. Vassalagem.

O direito de propriedade, nesse sistema, abrange então um direito sobre a pessoa do vassalo, o que se demonstra ainda mais verdadeiro no último degrau dessa sociedade ruralista: o servo, de fato, está ligado, com os seus, não só à pessoa do seu senhor, mas também à terra em que vive e trabalha.

A urbanização — A passagem da economia rural para economia urbana realizou pela Revolução Comunal, um movimento que se desenvolveu entre os séculos IX e XIV.

A abertura da economia fechada começa quando alguns dos habitantes dos domínios feudais começaram a sentir o desejo de melhorar sua condição de vida passando a morar nas antigas cidades romanas a fim de lucrar com as possibilidades de trocas abertas por essas aglomerações.

O comércio exterior — Todo comércio com outra cidade já pode ser classificado como exterior. A partir do momento em que esse movimento foi desencadeado, ele tendeu a se generalizar. Essas vantagens decorriam da divisão do trabalho e e do surgimento das especializações.

Sobre o estrito plano econômico, o efeito das cruzadas foi considerável. Além da intensificação das trocas comerciais entre a Europa e o Oriente Próximo, como se poderia esperar, foram elas que encorajaram algumas cidades da Itália (como repúblicas de Gênova e de Veneza) a se lançarem cada vez mais no empreendimento desse comércio rentável.

A expansão comercial das cidades-estados italianas provocou uma série de consequências econômicas: os mercadores comprometidos com essas expedições comerciais tiveram que refinar seus métodos de gestão. Foi assim que surgiu a contabilidade de partidas dobradas em Florença, a partir do final do século XII, até ser codificada em Veneza por Luca Paccioli em 1945.

As cruzadas foram a causa indireta da transformação do sistema feudal.

A abertura ao mundo

Enfrentar o alto-mar... Essa última ideia foi impondo-se progressivamente, ainda mais que a Europa começava a sofrer a escassez de metais preciosos, o ouro e a prata necessários para pagar, ao menos em parte, as mercadorias importadas do Oriente.

As grandes descobertas

Efetivamente, foi perto do final do século XV que se começou a assistir às grandes descobertas geográficas que permitiram aos europeus o acesso a terras até então desconhecidas, ou que facilitaram seu acesso marítimo a essas terras que até então somente podiam ser alcançadas por longas viagens, em boa parte por rotas terrestres.

Cristóvão Colombo (1492), Cabral (1500)...

A expansão monetária bancária

As fortunas podiam não ser mais unicamente terrenas: elas começavam a se revestir de uma aparência mais abstrata, desmaterializada, apresentando-se como soma de moedas e, inclusive, como somas algébricas, o excedente dos créditos sobre os débitos.

Observa-se que os principais traços distintivos do capitalismo já estão presentes a partir dessa época: o aumento cumulativo das riquezas, a racionalidade da condução dos negócios pela utilização das redes de comunicação, pela contabilidade, pelo refinanciamento das operações bancárias, pelo lucro e pelo espírito de aventura independente dos poderes locais.

A Revolução Industrial

Esta expressão designa o conjunto dos rápidos melhoramentos que beneficiaram as técnicas de produção nas manufaturas a partir do século XVIII, sobretudo de 1770 em diante. David Landes (1998) propõe em sua definição três princípios característicos: 1) a substituição da habilidade e do esforço humano pelas máquinas; 2) a substituição das fontes de energia animais por fontes inanimadas; 3) a substituição das substâncias vegetais e animais por matérias-primas novas e mais abundantes, em particular matérias minerais e eventualmente artificiais.

O Produto Interno Bruto mundial por habitante (em dólares, 1990) passou de 565 em 1500 para 651 em 1820, mas atingiu 5.145 em 1992. Por quê?

As causas da arrancada — No plano dos comportamentos, o espírito de independência e de responsabilidade pessoal desenvolveu-se como uma reação contra o poder real ou senhorial absolutista.

Dois fenômenos exerceram uma função primordial para o estabelecimento dessa nova visão social: a Reforma religiosa do século XVI e a revolução científica do século XVII.

A desigualdade das nações — Por que razão aqueles países que despontaram nas grandes descobertas — Portugal e Espanha — deixaram-se distanciar posteriormente de países como a Inglaterra, a Holanda e até mesmo a França. Ilusão mercantilista em virtude da descoberta de tantos tesouros na terras novas. Considerou-os como riquezas econômicas e que os levou a repousar sobre os louros conquistados.

As modalidades da Revolução Industrial — Uma característica desse fenômeno: jamais se tinha visto a produtividade per capita aumentar em tais proporções. E tudo de forma natural: as empresas simplesmente reagiam em função das solicitações do mercado e as interconexões foram aparecendo espontaneamente, em função das necessidades entre as indústrias.

O papel crescente dos bancos — Com a industrialização, os bancos foram fundamentais para o financiamento da indústria. Ao longo do século XIX, são criados bancos de investimento e bancos mercantis, cuja clientela é composta de empresas. Mais tarde, surgem as caixas econômicas, que transformam a poupança dos lares e dos funcionários das empresas em investimento de longo prazo.

A organização geral da produção — A Revolução Industrial foi um fenômeno tipicamente capitalista e nenhuma outra forma de organização econômica poderia ser o palco dessa inovação. Outro efeito da Revolução Industrial foi a transformação das condições de vida humana. Ao longo prazo, um número crescente de consumidores passou a ter acesso a bens que antigamente lhes eram inacessíveis, acabando por se beneficiar dos progressos técnicos.

Capítulo II — Os Ritmos da Atividade Econômica

Contrastes entre Períodos

Fase I (1820-1870) corresponde à industrialização progressiva da zona considerada.

Fase II (1870-1913) coincide com a difusão em caráter planetário dos progressos técnicos, juntamente com a mobilização dos fatores de produção (capitais e mão de obra).

Fase III (1913-1950) foi a mais trágica, por ter sido marcada por duas guerras mundiais, intermediadas por uma grande crise econômica.

Fase IV (1950-1973) diz respeito à emergência do que Jean Fourastié denominou de os "Trinta Anos Gloriosos". Os Estados Unidos tomaram a iniciativa de instalar dispositivos institucionais adequados ao favorecimento de uma economia de livre-comércio. Usou, para isso, investimentos e progresso técnico, como também métodos de administração e de políticas econômicas.

Fase V (1973-1994) começou sob condições desfavoráveis, isto é, sob os dois choques econômicos petroleiros consecutivos à Guerra de Yom Kippur e a Revolução Islâmica no Irã (1973 e 1979).

A partir de então, os países capitalistas da Europa começaram a praticar uma política de estabilização dos preços, com o qual se haviam comprometido através da assinatura do Tratado de Maastrich (1992), por sua vez ampliado em nível orçamentário, em 1997, pelo Tratado de Amsterdã, que estabeleceu "um pacto de estabilidade e de crescimento".

Ciclos e inovações: a hipótese dos longos ciclos econômicos

Em suas reflexões sobre os ciclos econômicos, Schumpeter havia, desde 1912, sugerido que a economia capitalista evoluía em função de desequilíbrios criados pelas inovações. Lembra que as inovações devem ser financiadas antes que os empresários possam beneficiar-se de seus resultados.

Em seu livro de 1939, Business Cycles, Schumpeter lança um olhar de grande alcance sobre o futuro. Depois de algumas hipóteses sobre os ciclos econômicos, Schumpeter retomou a ideia apresentada inicialmente por um economista russo, Nikolay Kondratieff (1892-1931), que identificou longas ondulações nas atividades econômicas, ou seja, ciclos de quarenta anos em média. Esses ciclos correspondiam às grandes inovações. Para Shumpeter, Inovação significa "novas combinações". Pode ser novo procedimento, novo bem material.

A aceleração da História — Pode ser explicada de três maneiras: 1.º) assistimos a uma espécie de aprendizagem, tanto das empresas, como dos consumidores; 2.º) as inovações mais notáveis são as inovações em rede ("novas tecnologias de informação e de comunicação); 3.º) propagam-se rapidamente, apesar das distâncias e para além das fronteiras.

Já faz algum tempo que se menciona o "paradoxo de Solow", que declarou em 1995: "Os computadores estão em toda parte, salvo nas estatísticas da produtividade".

Inovação e monopólio — Shumpeter havia chamado a atenção desde 1942, em seu livro Capitalismo, socialismo e democracia, que as grandes inovações nascem no contexto da concorrência. Entretanto, nada seria mais desfavorável às inovações do que um regime de concorrência perfeita. No que se refere à "nova economia", observaremos que as firmas inovadoras certamente se esforçam para obter uma vantagem monopolizadora sobre suas rivais, o que não impede que suas inovações tenham a propriedade de intensificar a concorrência entre as firmas usuárias.

A função dos mercados financeiros — A abertura das economias umas às outras deu origem a um papel crescente dos mercados financeiros, ou seja, das bolsas de valores.

Capítulo III — O Capitalismo e os Poderes Constituídos 

JESSUA, Claude. Capitalismo: Uma Breve Introdução. Tradução de William Lagos. Porto Alegre, RS: L&PM, 2019