A Mente Esquerdista: Causas Psicológicas da Loucura (Notas de Livro)

A Mente Esquerdista

As Causas Psicológicas da Loucura Política

Dr. Lyle H. Rossiter

 

A mente esquerdista -As causas psicológicas da loucura política/ Dr. Lyle H. Rossiter; tradução de Flávio Quintela - Campinas, SP: Vide Editorial, 2016

LYLE H. ROSSITER estudou medicina e psiquiatria na Universidade de Chicago. Serviu por dois anos como psiquiatra no Exército dos EUA. Especializado tanto em psiquiatria geral como forense, por mais de quarenta anos diagnosticou e tratou desordens mentais. 

Prefácio

ESTE LIVRO É SOBRE A NATUREZA HUMANA e a liberdade humana, e a relação entre elas. Seu conteúdo é o resultado de meu interesse de toda a vida em saber como funciona a mente. Esse interesse, iniciado na idade de 12 anos, levou-me às carreiras de psiquiatria clínica e forense e ao acesso específico que essas disciplinas fornecem à psicologia humana. 

Historicamente, é claro, as ideias ocidentais sobre liberdade e ordem social vieram de campos bem distantes da psiquiatria: filosofia, ética, jurisprudência, história, teologia, economia, antropologia, sociologia, arte e literatura, entre outros. 

Este livro é uma tentativa de conectar mecanismos da mente a certas condições econômicas, sociais e políticas, aquelas sob as quais a liberdade e a ordem podem florescer

L.H. Rossiter, Jr. Fevereiro de 2006


 Parte 1 

Capitulo 1 — A Natureza Bipolar do Homem

Visão geral

Este livro oferece um conceito amplo da natureza humana e explora suas implicações para a liberdade individual. A exploração começa com o fato de que o homem possui uma natureza bipolar: um ser humano é uma fonte autônoma de ação, por um lado, mas completamente envolvido em relações com outros através de processos econômicos, sociais e políticos, por outro lado. 

Dentro desta concepção bipolar eu distingo os elementos biológicos, psicológicos e sociais da natureza humana. Todos os três elementos dão força à iniciativa independente e à cooperação conjunta

Meu propósito neste trabalho é estabelecer uma base biológica, psicológica e social para uma forma particular de sociedade humana — a da liberdade ordenada. Eu busco uma teoria da liberdade baseada na natureza humana e nas realidades da condição humana. A partir desta teoria, ataco o paradigma socialista dominante, o estatismo do bem-estar e o relativismo moral da agenda esquerdista contemporânea, como uma distorção patológica dos instintos sociais normais

Termos iniciais

Algumas ideias básicas orientarão o leitor. Conforme seu uso neste livro, o termo "natureza humana" consiste nas características biológicas, psicológicas e sociais comuns a todos os seres humanos. A liberdade humana consiste na habilidade de se viver como se escolhe, sob certas restrições necessárias à manutenção da paz e da ordem. Como algumas pessoas interferem no equilíbrio social ao cometer crimes ou agir com imprudente descaso pela segurança de outros, a liberdade requer uma ordem que esteja baseada em regras, normas e leis, uma ordem que garanta a proteção e permita a segurança material. A liberdade não pode sobreviver na agressão aleatória ou na indiferença insensível da anarquia.

O Estado de Direito necessário à liberdade consiste nas regras que as pessoas impõem a si mesmas. Elas são escritas e aplicadas por um governo cujo poder é autorizado pelos governados

A chave para resolver esse problema, como bem argumentou Henry Hazlitt, é a cooperação social: os esforços combinados e voluntários de muitas pessoas na busca de objetivos comuns para benefício mútuo (Hazlitt, 1 988). 

Mas o indivíduo autônomo e colaborativo deve também conseguir governar a si mesmo sem um policial ao seu lado. Ele deve estar disposto a respeitar os diretos de outros e a viver pela regra da lei. 

Surge então a pergunta: numa sociedade, o conjunto de regras de conduta para assuntos humanos suporta os meios e fins da liberdade ordenada, ou os enfraquece? A análise presente neste livro responde a essa questão levando em conta o paradigma social dominante das sociedades ocidentais contemporâneas. A agenda esquerdista moderna, com suas políticas estatistas de bem-estar, relativismo moral e regulação invasiva, enfraquecem os fundamentos da liberdade, da ordem e da cooperação

No coração dos defeitos da agenda esquerdista está uma filosofia de coletivismo que ignora a natureza dos seres humanos corno indivíduos. Esta natureza não pode ser ignorada sem consequências terríveis. Uma análise cuidadosa da natureza e da liberdade humanas revela que uma sociedade pode sustentar a liberdade individual, a segurança econômica e a estabilidade social apenas se seus valores e instituições dominantes forem comprometidos com um individualismo racional, embora não radical: que seja definido pela autoconfiança, pela cooperação voluntária, pelo realismo moral e pelo altruísmo. Essas alegações são o assunto deste livro.

Capacidades básicas

Para uma introdução elementar à natureza psicológica do homem, será útil apelar à experiência comum. É fácil verificar que todos os seres humanos comuns podem fazer o seguinte: Escolher entre alternativas. Fazer as coisas acontecerem. Agir com propósitos. Agir com independência. Decidir o que é bom e ruim para si mesmos. Tomar conta de suas próprias vidas.

Essas habilidades podem ser classificadas: Pessoas que conseguem fazer as coisas acontecerem são conhecidas por sua iniciativa. Pessoas que conseguem agir com propósitos são conhecidas por sua atuação. Pessoas que conseguem agir com independência são conhecidas por sua autonomia. Pessoas que são competentes para decidir o que é bom e o que é ruim para si mesmas, e que conseguem tomar conta de suas próprias vidas, são conhecidas por sua soberania pessoal.

A tradição americana de liberdade individual tem afirmado que qualquer um com essas capacidades - escolha, iniciativa, atuação, autonomia e soberania - deve poder viver sua vida como bem desejar. 

A condição elementar

As capacidades de ação independente e de cooperação voluntária são inerentes à natureza humana. Elas consistem em funções evolutivas com valor adaptativo. O restante deste livro traz um exame detalhado de como essas capacidades operam em domínios econômicos, sociais e políticos complexos. Antes de iniciar essa tarefa, no entanto, será útil revisar as circunstâncias muito mais simples de um indivíduo fisicamente isolado, para evidenciar suas relações consigo mesmo e seu ambiente material. Eu apelo aqui para a história de Robinson Crusoé, em que um indivíduo solitário, como Daniel Defoe imaginou, naufragou e acabou numa ilha deserta, sem outras pessoas.

Pela natureza de suas circunstâncias, as ações de Crusoé deveriam acomodar apenas as condições econômicas, sociais e políticas mais elementares na condução de seus afazeres. Economicamente falando, Crusoé é o único produtor, distribuidor e consumidor de bens e serviços. De uma perspectiva social, ele só pode se relacionar consigo mesmo, já que sua situação não permite nem requer qualquer tipo de relacionamento com outros. E de um ponto de vista político, ele responde somente a si mesmo como única fonte de poder e autoridade em sua vida.

Sob essas condições, Crusoé possui liberdade absoluta para fazer o que quiser. Ele também recebe todos os benefícios e assume todos os riscos de tudo o que faz. Ele só tem a si mesmo para depender no tocante às necessidades materiais de sua existência. Estas realidades simples definem as condições da vida de Crusoé na ilha deserta. A ausência hipotética de outras pessoas nesse cenário de solidão traz os fatos materiais e biológicos de sua existência em foco. Ele precisa acomodar esses fatos ou morrer.

No entanto, além das realidades físicas de sua situação, Crusoé deverá também confrontar as realidades psicológicas que lhe pertencem como ser humano que é. Ele pode, por exemplo, sentir a necessidade de algum tipo de conexão amigável com animais (assumindo que haja algum) para lutar contra a solidão. Ele pode explorar a ilha para satisfazer sua curiosidade. Ele pode inventar algum tipo de atividade recreacional, criar algum objeto de prazer estético, aprender alguma coisa a penas pela satisfação de conhecer, ou desenvolver alguns rituais de culto.

Para viver o melhor possível sob essas circunstâncias, ele deve confrontar um mundo que inclui suas próprias necessidades e desejos bem como as possibilidades e limitações de satisfação de seu ambiente. Este princípio acaba sendo igualmente válido no caso de Crusoé estar acompanhado de um grupo de pessoas que também estejam engajadas na satisfação de suas necessidades de sobrevivência e conforto.

A moralidade da sobrevivência

Na maioria, se não em todas as suas ações, Crusoé terá de fazer um julgamento de valor sobre as coisas que pretende fazer, se valem o esforço ou não. Ele considerará cuidadosamente os benefícios, o custo laboral e os riscos de suas ações, porque sabe que pode depender apenas de si mesmo. Seus julgamentos e decisões são mais críticos do que se ele tivesse ao menos um parceiro que pudesse resgatá-lo de algum acidente ou de alguma insensatez. Sua responsabilidade por si mesmo cria um padrão de valor com respeito a qualquer ação não trivial a ser tomada por ele.

Este padrão de valor será refletido na construção de uma escala de ações boas ou racionais, e de ações ruins e irracionais, por Crusoé. As boas ações para Crusoé serão aquelas que protegem sua vida e sua segurança, e que aumentam seu conforto. As ações ruins farão o oposto. Para qualquer indivíduo sob circunstâncias parecidas, essas escalas de valores constituem uma moralidade do viver no tocante a si mesmo. Na ausência do desenvolvimento de algumas condições físicas extremamente dolorosas que tornem a vida insuportável, ou de uma desordem mental, um ser humano isolado empreenderá esforços muito vigorosos para sobreviver e para melhorar sua vida. Ele sentir-se-á completamente justificado nesses esforços, pois para ele a preservação e a melhoria de sua vida são uma coisa inequivocamente boa. Ele assumirá um direito a perseguir a felicidade. E claro, o que cada indivíduo em particular toma como felicidade dependerá de seus próprios interesses e capacidades. Mas, por causa de certas circunstâncias da natureza humana, a ideia de qualquer ser humano sobre o que significa viver bem e ser feliz tem muito em comum com a de outros, vivam eles em isolamento ou em comunidade.

Historicamente, os seres humanos têm feito grandes esforços para assegurar as condições que lhes ofereçam as melhores oportunidades de satisfazer suas necessidades e desejos. Qualquer indiferença prolongada para com essa tarefa leva a um estado de frustração crônica, no melhor caso, e pode terminar em grande sofrimento e morte. Sobre essa realização, os seres humanos desenvolvem naturalmente uma moralidade de segurança material e melhoria de vida baseada nos fatos biológicos e psicológicos mais elementares da vida: suas exigências físicas e desejos emocionais, suas vulnerabilidades a doenças e à morte, seus medos de perda e isolamento, sua busca inata por autopreservação. Estes são os fundamentos do que os seres humanos de fato percebem como sendo bom e ruim para si mesmos, seja à parte de outros ou em meio a múltiplos relacionamentos com outros. O valor da vida, percebida instintivamente, e sua melhoria, são os fundamentos de todos os códigos morais.

Vida em um grupo

Se uma segunda pessoa, Sexta-Feira, junta-se a Crusoé na ilha e os dois homens começam a interagir um com o outro, então o cenário torna-se muito mais complicado para Crusoé do que para Sexta-Feira. Crusoé não tem mais a liberdade absoluta para tudo o que deseja. Ele deve considerar os possíveis efeitos de suas ações sobre Sexta­-Feira, especialmente·ª possibilidade de efeitos negativos aos quais Sexta-Feira possa reagir. A não ser que Crusoé descubra uma maneira de dominar Sexta-Feira — o que, por si só, já é um problema —, ele precisa desenvolver alguns acordos mútuos de cooperação.

A nova situação exige arranjos econômicos, sociais e políticos para a condução das relações entre Crusoé e Sexta-Feira. Para serem efetivos, esses arranjos devem possuir o caráter normativo. Consistem em regras morais e éticas que determinem como duas ou mais pessoas devem se comportar quando fazem alguma coisa com ou para o outro. Para que tenham força normativa, devem ser regras que sejam adotadas por ambas as partes na condução das transações entre elas. Essa última exigência é crítica: ambas as partes precisam estar convencidas da razoabilidade das regras e, se comprometer moralmente a elas. Apenas esse comprometimento pode fornecer uma base para a coordenação pacífica de suas ações. De outra forma, a intimidação baseada na ameaça de violência, a moralidade da máfia, tornar-se-á o princípio político dominante em sua sociedade de duas pessoas.

Essas considerações aplicam-se a grupos maiores de pessoas, não somente a díades. Conforme as transações se tornam crescentemente complexas, as comunidades de muitos indivíduos criam regras para regular seus comportamentos: os costumes, a ética, a moral e as leis que guiam suas condutas. Esses arranjos prescrevem o que é certo e errado sobre as coisas que as pessoas fazem quando se relacionam umas com as outras. São as expressões dos julgamentos de valor mantidos pelas pessoas cujas vidas eles guiam e governam. Regras de conduta não podem, por definição, ser livres de valor. Elas especificam necessariamente quais ações são boas e ruins, desejáveis e indesejáveis, admissíveis e não admissíveis. Servem para limitar o comportamento antissocial, qualquer que seja sua definição. Elas precisam estar baseadas em algum conceito de certo e errado, expressas em princípios éticos e morais mais ou menos explícitos.

O perigo do governo

Se os arranjos informais falharem no controle do comportamento antissocial dentro da comunidade, por quaisquer que sejam as razões, então um sistema formal de leis e um judiciário de algum tipo devem surgir, para garantir a aplicação das leis de conduta, resolver disputas civis entre cidadãos e satisfazer os desejos das pessoas de punir os que agem erroneamente. Mas um sistema de leis aplicáveis autoriza um certo subgrupo da comunidade a controlar o comportamento de seus membros pela violência ou pela ameaça desta. Com este passo, qualquer coleção de indivíduos entra numa arena potencialmente perigosa da organização social. O perigo está no fato de que o poder agora é concentrado numa agência autorizada a usar a força física. A possibilidade de abuso desse poder é invariavelmente alta.

Quando apenas tal agência possui um monopólio sobre o uso da violência para a plicar regras, isso é chamado de "governo" . Os governos sempre declaram que seus propósitos são a proteção dos direitos das pessoas e a manutenção da ordem social. Mas mesmo com a melhor das intenções, eles violam rotineiramente os direitos dos indivíduos e desorganizam a ordem que deveriam proteger. Já que essa desorganização é tornada possível pelo monopólio da força, os problemas mais críticos na teoria política podem ser colocados nas seguintes questões: qual é o domínio da ação humana sobre a qual a violência do Estado pode ser aplicada, e como ela pode ser aplicada contra pessoas que violam as regras do Estado? Qual é o equilíbrio adequado entre a liberdade e as restrições sobre a mesma? Através de quais argumentos os cidadãos capazes de raciocínio moral independente devem ser convencidos de que o uso de força pelo governo é aceitável? As respostas a estas questões, entre outras, determinam a extensão em que a liberdade individual caracteriza a vida na sociedade.

Embora uma voz de liberdade individual ainda sej a bastante audível na América moderna, está claro que um viés distintivamente coletivista tem dominado todo o pensamento político ocidental. Este viés é destrutivo para os ideais de liberdade e ordem social, e para o crescimento do indivíduo até a competência adulta. Em vez de promover uma sociedade racional de adultos competentes, que resolvem problemas através de cooperação voluntária, a agenda esquerdista moderna cria uma sociedade irracional de adultos infantilizados que dependem dos cuidados do governo para com eles. Em seus esforças constantes para coletivizar os processos econômicos, sociais e políticos da sociedade, a agenda esquerdista enfraquece os traços de caráter essenciais para a liberdade individual, a segurança material, a cooperação voluntária e a ordem social.