Métrica homérica

Hexâmetro e poesia épica

Uma visita a Aristóteles e Horácio

Hexâmetro é o nome dado à medida poética metro da poesia épica. Trata-se do mais marcante traço formal a ser considerado para uma poesia épica, conforme sugerem os testemunhos da crítica literária antiga. O critério formal teria sido, entre os antigos, um dos importantes aspectos para definir o gênero poético Aristóteles na Poética incluiu, dentro dos três critérios de classificação (meio, modo e objeto), o metro como um traço do critério de meio. a harmonia dos critérios, no entanto, deve ser levado em conta, uma vez que, exceto pelo metro, nada há em comum entre Homero e Empédocles, este seria um naturalista, aquele, um poeta (Poet. 1147b).

A tradição antiga tem submetido o estudo do hexâmetro a questões de estilo. Aristóteles tratou de detalhes significativos quanto à característica – e por consequência quanto ao emprego – do metro, sobretudo aquele que ele chamou de heroico, ou seja, o hexâmetro. Em um passo importante de seu argumento na Poet. (1459b17-1460b5), em que ele discute diferenças entre epopeia e tragédia, depois de ter percorrido os critérios miméticos e as diversas partes da linguagem poética, o filósofo afirmou que epopeia e tragédia diferem quanto à extensão da composição (τῆς συστάσεως τὸ μῆκος) e quanto ao metro (τὸ μέτρον).

Antes, em 1448b24-1449a1, Aristóteles declarou que a poesia tomou diferentes formas em razão da índole dos poetas, noutras palavras, por sua predisposição natural. Os mais sérios (σεμνότεροι) imitam as ações mais elevadas, os mais vulgares (εὐτελέστεροι), as ações mais baixas (φαύλων). Estes compuseram impropérios, aqueles hinos e encômios. Os compositores deste tipo ficaram conhecidos como poetas jâmbicos, porque se serviram de um metro apropriado para suas composições, o jâmbico. Os compositores daquele ficaram conhecidos como “poetas de versos heroicos” (οἱ ἡρωϊκῶν ποιηταί).

É notório que Aristóteles esteja pensando no hexâmetro como parâmetro para discutir os gêneros da epopeia e da tragédia, uma vez que, segundo ele, Homero foi o poeta máximo nesse tipo de composição. O que nos chama a atenção nesse passo é que o filósofo parece ter em mente um princípio de composição relacionada ao gênero poético: a natureza das matérias deve respeitar o seu metro. Quanto ao hexâmetro ou metro heroico, estamos autorizados a dizer que Aristóteles valorizou seu aspecto elevado. Em 1459b17-1460b5, o filósofo aprimorou o que dissera antes, aplicando a questão à diferença entre tragédia e epopeia: o metro heroico, o hexâmetro, “é o mais grave e amplo dos metros” (τὸ γὰρ ἡρωϊκὸν στασιμώτατον καὶ ὀγκωδέστατον τῶν μέτρων ἐστίν). Os superlativos “mais grave” (στασιμώτατον superlativo de στάσιμος, que também pode ter o sentido de mais pesado, firme, constante) e “mais amplo” (ὀγκωδέστατον superlativo de ὀγκώδης, que também pode significar forte, elevado, polido) reforçam a esfera semântica mais marcante do hexâmetro, a de ser o metro dos grandes temas, o mais apropriado para assuntos elevados, superlativos.

A opinião de Horácio, além de reforçar o caráter elevado desse metro, parece ser mais detalhada quanto ao seu emprego. Horácio, nos versos 73-85, nos oferece um tipo de visão geral dos gêneros literários e suas classificações, uma espécie de caput das normas dos gêneros poéticos, na qual se revela uma filiação a Aristóteles, dividindo os tipos de imitação por três critérios: meio, objeto e modo. Horácio, porém, adapta o critério de modo à imitação “ao modo de quem”. Os dois primeiros versos desse caput nos interessam. Eles dizem: res gestae regumque ducumque et tristia bella / quo scribi possent numero, monstrauit Homerus (“Em que metro se podem descrever os feitos dos reis, dos chefes, as tristes guerras, já o demonstrou Homero”). O hexâmetro se faz presente nesses versos com o termo numero. Homero, segundo Horácio, é o modelo, ele demonstrou em que metro podemos compor um poema épico, “os feitos dos reis, dos chefes, as tristes guerras”.


O hexâmetro propriamente dito

O hexâmetro tem o seguinte esquema métrico:

Os pés em poesia clássica são medidas (grupo de sílabas) de vários tempos. A métrica clássica leva em conta a quantidade das sílabas. Assim, uma sílaba breve equivale a um tempo, e uma longa equivale a dois tempos. Os pés que ocorrem no verso épico são:

dátilo = uma sílaba longa seguida de duas breves

espondeu = duas sílabas longas

troqueu = uma sílaba longa e uma breve

A quantidade das sílabas marca também o ritmo do verso. Quando há predominância de sílabas breves, diz-se que o verso é “rápido”, “alegre”; quando há predominância de sílabas longas, diz-se que o verso é “solene”, “grave”. O hexâmetro é chamado de datílico quando o quinto pé é composto por um dátilo (estrutura mais recorrente); e é chamado de espondaico (raro em poesia épica antiga) quando o quinto pé é composto por espondeu.