Canto XIV

Do campo de batalha ao tálamo

Hecamede (Ἑκαμήδη) - Criada de Nestor, filha de Arsínoo. Conforme Il. 11.624-6, ela foi dada a Nestor como recompensa por seus sábios conselhos quando a cidade de Ténedo foi saqueada por Aquiles. Na referida passagem e em Il. 14.6, seu epíteto é εὐπλόκαμος "de belos cabelos ou de tranças bonitas". Mulheres cativas ou dadas a chefes gregos deveriam servir a seus novos mestres; em Il. 11.628-41, numa cena repleta de detalhes domésticos, Hecamede prepara a mesa e a bebida para Nestor e Macáone, ferido em combate; em Il. 14.6-7, ela limpa e cuida do corpo ferido de Macáone.

Macáone (Μαχάων) - É o filho de Asclépio e irmão de Podalírio. Sua mãe é, comumente, denominada Epíone. Foi também um dos pretendente da bela Helena e, por essa razão, participou da Guerra de Troia. Na cidade de Troia, juntamente com Podalírio, dedicou-se à medicina, aptidão essa que recebera de seu pai Asclépio. Macáone tornou-se deveras precioso ao ambiente bélico em virtude de seus conhecimentos terapêuticos e foi rapidamente resguardado do campo de batalha, uma vez que sua vida e suas habilidades eram imprescindíveis aos gregos. Entre os seus pacientes, está Menelau (cf. Il. 5.193 ss), que fora atingido por um seta de Pândaro. Em Il. 11.504-7, o próprio Macáone fora ferido por uma flecha advinda de Páris e levado por uma tenda a Nestor, sendo tratado por Hecamede. Sua destreza médica mais insigne foi a cura de Filoctetes, atingido por flecha de Héracles. Macáone é visto, na mitologia, como um cirurgião, enquanto seu irmão Podalírio seria o médico. (Por Antonio Mesquita)

Trasímedes (Θρασυμήδης) - É um dos filhos de Nestor, acompanhando o pai na Guerra de Troia, assim como o seu irmão Antíloco (este é descrito como belo e veloz na corrida, gozando da afeição de Aquiles). Quando da morte de Pátroclo, foi ele quem comunicou a Aquiles, chorando ambos a morte do querido amigo (Il. 17.684ss - 18.34). Participa, de forma secundária, de vários episódios, a saber, o combate junto ao corpo do irmão e contra Mémnon, o filho da Aurora (cf. Od. 3.108-12, 4.186-8). Figurou entre os guerreiros que tomaram lugar grande cavalo de madeira, que adentrou nas portas da cidade de Troia. Regressa ileso a Pilos no fim da guerra, e é acolhido por Telêmaco, este sendo filho de Odisseu. (Por Antonio Mesquita)

Porteu (Πορθεύς) - Antigo rei de Calidona e Pleurona, principais cidades da Etólia, e pai de Ágrio, Melante e Eneu. Do último, o mais valoroso dos filhos, nasceu Tideu; logo, Porteu figura na genealogia de Diomedes como avô de Tideu e bisavô do herói: Porteu > Ágrio, Melante e Eneu [ > Tideu > Diomedes]

Adrasto (Ἄδραστος) - É um rei de Argos, cuja lenda se liga à expedição dos Sete Chefes contra Tebas. Adrasto casou-se com Anfítea, a filha de Prónax, e juntos tiveram seis filhos. As suas quatro filhas, Argia, Hipodamia, Deipile, Egiale desposaram, respectivamente, Polinices, Pirítoo, Tideu e Diomedes. (Por Antonio Mesquita)

Ambrosia (ἀμβροσίη), v. 170 - nos poemas homéricos, a ambrosia ministrada por uma divindade servia para conservar os corpos dos heróis mortos: em Il. 19.38ss, Tétis a utiliza para manter fresco o corpo de Pátroclo (cf. Il. 16.670, para preservação do corpo de Sarpédone; cf. também Il. 23.186 para preservação do corpo de Heitor). nesse verso de Il. 14 Hera usa a ambrosia como um clarificador corporal, e Atena a utiliza como um creme facial para manter a beleza de Penélope (cf. Od. 18.192). A ambrosia, por vezes chamada de néctar (νέκταρ), também aparece como alimento específico (bebida e comida) dos deuses. em célebre passagem da Od. 5.194-9, vemos a ninfa Calipso compartilhar o alimento dos deuses com Odisseu:

Ambos, Calipso e o mortal, logo à côncava gruta chegaram,

indo sentar-se Odisseu na poltrona em que há pouco estivera

Hermes. A ninfa Calipso lhe serve variados manjares,

de que comer e beber, de que os homens mortais se alimentam.

Logo em seguida defronte do divo Odisseu foi sentar-se;

néctar e ambrosia na frente dos dois as criadas puseram.

v. 178-9: ...as magnificas vestes que Atena lhe havia| com diligência tecido. Atena também é a deusa das fiandeiras e bordadeiras. Relacionado a esse atributo está o mito de Aracne (Ἀραχνή), uma talentosíssima fiandeira da Lídia, a filha do tintureiro Ídmon, de Cólofon. A reputação de Aracne chegou até as ninfas dos campos, que vinham para contemplar as belas tapeçarias da mortal. A reconhecida habilidade fê-la aluna da deusa Atena, mas Aracne preferia pensar que o talento devia-se ao seu próprio esforço. Segura do que pensava, desafiou a própria deusa. Primeiro, Atena aparece disfarçada de velha e tenta demover da mortal a ideia do certame, aconselhando-a do perigo de desafiar os deuses. Aracne respondeu com soberba. Atena aceita o desafio e dá início ao certame. Palas representou numa tapeçaria os doze deuses olímpicos em tua majestade e poder, bordando nos quatro cantos episódios de derrotas de mortais que desafiaram os deuses. Aracne não entendeu o recado e representou noutra tapeçaria os amores indecorosos dos imortais, Zeus e Europa, Zeus e Danae entre outros. Atena, furiosa, rasgou a arte de Aracne que, sentindo-se ultrajada, tenta se enforcar. Palas não a deixou morrer e a transformou em aranha. (cf. Ovídio, Met. 6.5-145 e Virgílio, Geor. 4.246)

v. 394-401: um símile tríplice negativo

Tão fortemente não bramam as ondas nas praias sonoras,

quando no pélago Bóreas começa a soprar impetuoso;

nem tanto estrépido as chamas levantam de incêndio vorace,

que nos convales dos montes destroem florestas virentes;

nem tal barulho produzem nas copas dos altos carvalhos,

quanto os agitam os ventos que mais fortemente ressoam,

como o fragor horroroso que as vozes dos homens aquivos

e dos troianos causavam, quando eles o assalto iniciaram.