Dacon 828

Desde 1975 Paulo Goulart planejava construir um carro pequeno, mais a falta de um motor nacional pequeno o fez desistir da idéia até que, em 1981, ao mexer em um motor de uma moto BMW percebeu que o mesmo era praticamente um motor de Fusca cortado ao meio. Em julho daquele ano resolveu construit o carro, a partir de um chassi de Fusca cortado de forma que o banco traseiro ficasse na posição do dianteiro. Para Paulo, o carro deveria ter rodas proporcionais ao tamanho, e para o primeiro protótipo escolheu as rodas aro 10" utilizadas no Mini Cooper. Para os freios desta primeira versão, havia-se decidido por utilizar o sistema do Fusca, mas como eram muito grande acabou optando-se pelos tambores utilizados no Gol. Ao mesmo tempo em que um grupo de mecânicos trabalhavam no chassi, outro grupo foi foi destacado para desmontar um motor Volkswagen 1300 retirado de um Gol. Com o motor desmontado, foram retirados dois pistões e as respectivas bielas, deixando apenas os mais próximos para evitar torções no virabrequim. À noite o carro estava pronto, e Paulo não resistiu a dar uma volta no carro, que atingiu 120 km/h na Marginal. No dia seguinte o conjunto foi pesado, chegando a um valor de 360 kg. Como o objetivo de Paulo era um carro com 250 kg a menos que um Fusca, lastro foi adicionado para realizar o primeiro teste de consumo. O protótipo, ainda em forma de chassi obteve uma média de 20 km/l a 80 km/h constantes, o mesmo valor obtido pelo Fusca. Descobriu-se então que o motor estava trabalhando muito frio, e após diminuir a refrigeração da ventoinha e voltar a regulagem do carburador ao original, conseguiu-se uma média de 22 km/l nas mesmas condições.

Anísio Campos e um dos desenhos do carro.

No final de julho, durante uma visita a Paulo Goulart, Anísio Campos viu o chassi e perguntou "-Que brinquedo é esse?". Após a explicação, pegou uma trena e começou a tirar as primeiras medidas. Em seguida, em uma folha de caderno começou a desenhar o primeiro croqui ali mesmo. O primeiro objetivo erta fazer um carro que despertasse o desejo de tê-lo, e o design inspirado no Porsche 928 agrada, apesar de não ser referência em estilo. O primeiro protótipo começou a ser feito a mão em 13 de agosto de 1981 com carroceria feita de chapas de aço, ficando pronto duas semanas antes do GP do Brasil. À convite de Paulo e Anísio, Nélson Piquet foi conhecero carro e deu o seguinte depoimento a Revista Quatro Rodas:

"Eu fui conhecer o Dacon 828 depois de um convite feito pelo Paulo Goulart e o Anísio Campos. Fiquei impressionado com o carrinho, que estava em fase final de acabamento. Como estávamos perto do GP do Brasil pedi ao Paulo que terminasse o protótipo para que eu o experimentasse no Rio. Seria uma boa forma de promoção, pois toda a imprensa estrangeira estaria lá.

Na primeira visita, o Paulo me explicou que o carro seria muito econômico, que faria mais de 15 quilômetros com um litro de gasolina, etc. Só que no Rio de Janeiro ele estava equipado com um motor Volkswagen de 2100 cm3 era um verdadeiro foguete, principalmente porque é muito leve. Fiz uma expereiência com ele pra valer e numa curva perto do autódromo o Anísio Campos quase foi jogado para fora. É que o acrílico lateral soltou e o Anísio estava encostado nele.

Confesso que fiquei preocupado quado vi que o carro era equipado com rodas de Mini Cooper. É que tive um desses carrinhos na Inglaterra e ele pulava muito. Mas como o Dacon tem suspensão Volkswagen, mais macia, o conforto é maior.

De estabilidade e desempenho, com o motor 2100, o carro é muito bom, e também o espaço interno, mesmo com o banco inteiriço, me agradou bastante. É um carro que fará muito sucesso, principalmente nas grandes cidades, onde o tráfego é intenso e exsistem poucas vagas para estacionamento. Eu particularmente, fiz questão de usar o carrinho no Rio de Janeiro esperando congestionamentos para chegar ou sair do autódromo. Ele tem as vantagens da moto com a vantagem de nos proteger do mau tempo."

Nessa época o carro havia sido batizado de 828 (82 do ano e 8 do número do projeto). No protótipo utilizado por Piquet, a distância entre-eixos era de 162,5cm, que depois foi aumentada para 165cm. Dessa forma, o comprimento que a princípio deveria ser 2,5m (uma das vertentes que norteou o projeto) acabou ficando em 2,65m. A carroceria é montada sobre um chassi Volkswagen encurtado, onde ficam o túnel central e as "cangas" (quatro tubos, dois na frente e dois atrás) que servem de apoio. Essa carroceria forma uma estrutura extremamente resistente reforçada por uma estrutura metálica, conceito inspirado nas células de sobrevivência dos carros de F1 da época. Outra solução inspirada nos veículos de competição é o capô dianteiro, que pode ser completamente separado da carroceria através da retirada de dois parafusos laterais, quatro internos e do plugue responsável pela ligação dos faróis e lanternas. Dessa forma a suspensão dianteira, tanque de combustível, caixa de direção e sistema de freios ficam a mostra facilitando a manutenção. O motor fica localizado na traseira e pode ser acessado através de uma pequena tampa, mas a exemplo do capô a parte inferior da traseira pode ser removida através da retirada de quatro parafusos, o que faz com que o motor possa ser removido tão facilmente quanto o de uma Kombi.

A suspensão é de barras de torção, e a única modificação é que o feixe de barras de torção inferior é solto, para tornar o carro mais macio. Previam-se versões 650, 800, 1300, 1600 e 2100. As duas primeiras seriam equipadas com freio a tambor nas quatro rodas enquanto as outras teriam discos de 192 mm especialmente feitos para a Dacon na dianteira, com as pinças originais do Gol. A relação de diferencial deveria ser a original nos modelos 2 cilindros, mas seria alongada para as versões com motores maiores de modo a compensar o efeito das rodas aro 10. Na versão definitiva foi mantida apenas a opção de motor 1600 a álcool ou gasolina, e cogitava-se uma opção 900 obtida através da redução do curso dos pistões do motor VW1300. Além disso, na carroceira em fibra eliminaram-se os cantos vivos e os vidros laterais passaram a deslocar-se na vertical. Mantiveram-se ainda os faróis e volante de Passat TS, com as lanternas e grade de refirgeração da Kombi e painel, limpadores de pará-brisa e maçanetas do Gol. A suspensão traseira também recebeu modificações, adotando-se a da Variant II, que não altera a cambagem das rodas melhorando a estabilidade. No interior, o espaço para os passageiros e motoristas é melhor do que o de alguns carros médios de sua época, contando com acabamento de excelente qualidade e de ótimo isolamento acústico. O banco único possui encosto bipartido e pode ser reclinado individualmente através de um sistema de catraca. Jogo de ferramentas e bateria ficam sobre os assentos, enquanto o estepe e as bagagens tem seu lugar atrás dos bancos.

O interior do veículo é bem luxuoso, com destaque para o alto nível de acabamento e para o completo painel de instrumentos originário do Gol.

Na versão final o motor era o 1600 da Kombi, mas com radiador de óleo colocado por fora da caixa da ventoinha. Uma válvula bimetálica comanda um sistema que faz com que uma passagem de ar da ventoinha de refrigeração se abra ou feche, regulando a passagem de ar pelo radiador, de modo que o motor fique sempre na temperatura ideal. Na versão a álcool, foi o primeiro carro brasileiro a dispensar o reservatório de gasolina, graças a instalação de uma vela de pré-aquecimento dos motores diesel da Volkswagen. Em dias frios, antes de ligar a chave, basta apertar o acelerador até o fundo e soltá-lo para armar os afogadores automáticos, ligando-se em seguida a chave de ignição e apertando-se o botão responsável pelo acionamento das resistências por 15 segundos, bastando proceder normalmente após isso. As primeiras 11 unidades foram produzidas pela Puma, e ao todo cerca de 30 veículos foram produzidos. As primeiras unidades mostraram-se um tanto quanto instáveis e a solução foi susbstituir as rodas aro 10 por outras aro 13. Essa substituição foi feita de forma gratuita, mas alguns clientes recusaram, o que torna um desses carros com rodas pequenas ainda mais raros que os normais.

Acima o acesso ao reservatório de fluido de freio e ao tanque de gasolina. Abaixo, o pequeno espaço atrás dos bancos era o único local que podia acomodar alguma bagagem.

Ficha Técnica